O material a seguir irá explorar um dos temas mais importantes para sua prova de residência na área de cirurgia: a avaliação inicial no trauma e vias aéreas! Nele você encontrará os principais tópicos para dominar a avaliação inicial no ATLS e o manejo de vias aéreas. Para saber mais, continue nesse texto!
O Advanced Trauma Life Support (ATLS) foi desenvolvido nos EUA no final da década de 70 e tem como premissa básica a sistematização do atendimento a todo paciente vítima de trauma. Nesse contexto, ele respeita alguns princípios básicos que serão explorados a seguir:
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Princípios básicos do ATLS
Distribuição trimodal das mortes no trauma
1º pico: mortes imediatas. Casos de extrema gravidade, nos quais há poucas medidas a se fazer. O principal aqui é a prevenção;
2º pico: mortes precoces. Casos graves, porém, é justamente nessa fase que o ATLS, e seu atendimento adequado e sistematizado, reduz mortalidade e morbidade; e 3º pico: mortes tardias. Relaciona-se a acontecimentos e complicações tardias do trauma. No caso, o atendimento inicial e os cuidados intra-hospitalares refletem na redução de óbitos nessa fase;
Hierarquização do atendimento no trauma
Seu atendimento irá de afecções que matam mais rápido, devendo ser identificadas e resolvidos primeiro.
O atendimento SEMPRE respeitará a ordem “ABCDE” e você só está autorizado a prosseguir para próxima etapa quando toda etapa anterior tiver sido resolvida.
A – airway: proteção de vias aéreas e coluna cervical
B – breathing: respiração e ventilação
C – circulation: circulação e controle de hemorragia
D – disability: nível de consciência e déficits
E – exposure: exposição e controle de temperatura
Medidas auxiliares na avaliação primária
Confira abaixo os elementos complementares durante avaliação inicial.
ECG;
Oximetria de pulso;
Capnografia;
Gasometria arterial;
Sonda gástrica e urinária;
RX tórax e pelve ;
FAST e eFAST; e LPD (lavado peritoneal diagnóstico).
Cuidado com as indicações e contraindicações de algumas dessas medidas. É importante ressaltar que medidas diferentes dessas NÃO devem ser feitas na avaliação primária
Avaliação secundária no trauma
Exame minucioso para busca ativa de outras lesões em potencial. Seja por propedêutica clínica ou propedêutica armada
Medidas auxiliares: RX membros, TC de segmentos corporais, exames contrastados (angiografia, urografia, uretrocistografia retrograda), exames endoscópicos (EDA, broncoscopia)
** ATENÇÃO: a avaliação secundária é apenas feita em pacientes ESTÁVEIS. No caso de instabilidade hemodinâmica, está proibida a realização de tomografia
Vias aéreas e coluna no cervical no trauma
A seguir veremos o primeiro passo do ATLS, que consiste em garantir trocas gasosas e ventilação ao paciente, junto a proteger a coluna cervical.
Manejo inicial
Deve-se colocar colar cervical e prover fonte de oxigênio ao traumatizado por máscara não reinalante em alto fluxo (15L/min). A posteriori devemos observar se há ou não obstrução da via aérea por alguns sinais:
Vocalização ausente;
Respiração ruidosa; e
Esforço respiratório,
Na presença de qualquer um desses, suspeita-se de obstrução de via aérea. As medidas para retirar corpo estranho ou mover a língua desobstruindo a via aérea devem ser tomadas.
Via aérea definitiva
Por definição, sonda endotraqueal com cuff (balonete) insuflado abaixo das pregas vocais
Indicações de via aérea definitiva:
Risco iminente de comprometimento da via aérea (lesão inalatória, hematoma cervical);
Apneia ou oxigenação inadequada; GCS menor ou igual a 8 ou quadro convulsivo reentrante;
Risco de aspiração; e
Paciente combativo – a agitação pode representar hipoxemia.
Há métodos de obtenção de via aérea definitiva cirúrgicos e não cirúrgicos.
Tubo orotraqueal: método de eleição, avaliar contraindicações;
Tubo nasotraqueal: dependente de experiência, paciente em ventilação espontânea; Cricotireoidostomia: método cirúrgico de eleição no trauma, sempre que houver impossibilidade ao TOT; e
Traqueostomia: método de exceção no trauma,
*** ATENÇÃO: em casos de edema de glote, hemorragia profusa, trauma de face extenso, distorção de anatomia cervical, condições que impossibilitem visualizar ou transpor a laringe torna-se MANDATÓRIO a realização de via aérea cirúrgica
Vias aéreas alternativas
Trata-se de vias aéreas não definitivas e são utilizadas como situação provisória.
Máscara Laríngea: a que mais aparece em provas! Útil em pacientes com dificuldade de acesso a via aérea definitiva;
Máscara Laríngea com canal para intubação;
Tubo laríngeo;
Tubo esofágico multilúmen; e
Cricotireoidostomia por punção: medida de emergência para oxigenação temporária, com tempo máximo de 30-40 minutos. Não contraindicada em crianças.
Trauma torácico
Abaixo você verá os principais tópicos relacionados ao trauma torácico! São temas de elevadíssima incidência na sua prova de residência.
Lesão da árvore traqueobrônquica
Condição possivelmente fatal e que necessita de rápido diagnóstico, durante a avaliação inicial!
Quadro clínico: hemoptise, enfisema subcutâneo extenso, insuficiência respiratória, pneumotórax associado, vazamento de ar após drenagem tórax e ausência de expansão pulmonar mesmo após drenagem;
Diagnóstico: suspeição clínica, broncoscopia; e
Tratamento: inicialmente, com passagem de segundo dreno de tórax e realizando IOT sob broncoscopia, insuflando o cuff distalmente a lesão. Em definitivo, toracotomia e correção cirúrgica.
Pneumotórax simples
Extravasamento de ar para cavidade pleural, com ESTABILIDADE hemodinâmica
Quadro clínico: dor torácica súbita, murmúrio vesicular reduzido/ausente, hipertimpanismo à percussão, hipóxia;
Diagnóstico: clínico; e
Tratamento: drenagem de tórax. Exceção: pequenos pneumotóraces podem ser tratados conservadores se pequenos e assintomáticos.
Pneumotórax hipertensivo
Extravasamento de ar para cavidade pleural, com INSTABILIDADE hemodinâmica.
Quadro clínico: dor torácica súbita, murmúrio vesicular reduzido/ausente, hipertimpanismo à percussão, hipóxia, taquipneia, taquicardia, hipotensão, turgência jugular;
Diagnóstico: clínico; e
Tratamento: descompressão torácica. Desde o ATLS 10ª edição podemos realizar a descompressão digital durante a drenagem torácica ou por punção com agulha. O tratamento definitivo é feito pela drenagem.
Fique atento em fazer o diagnóstico sempre clínico do paciente! Atrasar a terapêutica pedindo exames desnecessários pode ser um erro grave na hora da prova
Pneumotórax aberto
Fenômeno em que há lesão torácica perfurativa com diâmetro superior a 2/3 da traqueia.
Quadro clínico: hipertimpanismo, taquipneia, hipoxemia, insuficiência respiratória; e
Tratamento: inicial – curativo de três pontas (formação de uma válvula).
definitivo – drenagem de tórax e reparação cirúrgica da lesão.
Hemotórax
Sangue na cavidade pleural. Considerado maciço se maior que 1500ml ou 1/3 do volume total torácico.
Quadro clínico: murmúrio vesicular diminuído, macicez à percussão, sinais de insuficiência respiratória ou choque hipovolêmico quando maciço;
Tratamento: drenagem torácica e suporte clínico. Realizar toracotomia de urgência se saída de 1500ml na drenagem inicial ou volume superior a 200ml/hora por 2-4 horas.
Tórax instável e contusão pulmonar
Fratura de dois arcos contais consecutivos em dois pontos distintos, gera o tórax instável e subjacente a ele, quase sempre, haverá lesão direta do parênquima pulmonar.
Quadro clínico: dor, respiração paradoxal, hipoxemia;
Diagnóstico: clínico-radiográfico (RX tórax ou TC tórax auxiliam fortemente); e
Tratamento: analgesia potente, suporte respiratório, fisioterapia respiratória.
Contusão miocárdica
Lesão direta do coração em decorrência do trauma.
Quadro clínico: arritmias diversas, isquemia miocárdica, choque hemodinâmico; e
Conduta: monitoramento eletrocardiográfico por pelo menos 24 horas.
Tamponamento cardíaco
Sangue no saco pericárdio, gera restrição ao enchimento cardíaco, levando a um quadro de choque obstrutivo.
Quadro clínico: tríade de Beck – hipofonese de bulhas, turgência jugular, hipotensão;
Diagnóstico: suspeição clínica, ECG (alternância elétrica), FAST (“swinging heart”); e
Tratamento: toracotomia de emergência; em casos de exceção realiza-se a pericardiocentese.
Laceração aórtica
Em traumas de grande energia, pode ocorrer dissecção traumática da aorta, principalmente na porção próxima ao ligamento arterioso.
Quadro clínico: inespecífico; e
Diagnóstico: RX do tórax – os achados mais cobrados são alargamento de mediastino e fratura de primeiro ou segundo arco costal. Caso suspeito, devemos realizar angiotomografia do tórax.
Trauma na transição toracoabdominal
Configuram-se como ferimentos que vão da linha mamilar até o rebordo costal. Tais lesões podem acometer fígado, baço, diafragma, cólon e até lesões cardíacas e pulmonares.
Nesse tipo de lesão, devemos ter alta suspeição clínica. A melhor conduta, tanto diagnóstica, quanto terapêutica, é:
Laparoscopia: pacientes estáveis;
Laparotomia: pacientes instáveis; e
O uso de tomografia, FAST e LPD podem auxiliar no diagnóstico.
Fique atento em indicar a videolaparoscopia nos pacientes com grande suspeição de lesão toracoabdominal. Tema bastante cobrado nas provas! Mas, não se esqueça de avaliar a estabilidade do paciente.
Trauma do diafragma
Lesão potencialmente grave mais comumente vista em traumas penetrantes, porém também é observada em traumas contusos de maior energia.
Quadro clínico: epigastralgia, vômitos, dispneia, disfagia;
Diagnóstico: videolaparoscopia!! Sempre lembrando que o paciente deve estar estável. Achados radiográficos: elevação de cúpula, presença de vísceras em tórax; e
Tratamento: correção cirúrgica de lesão por meio de videolaparoscopia.
Toracotomia de emergência
Procedimento realizado em situações pontuais que o bom candidato deve se lembrar na hora da prova. São elas:
Saída de mais de 1500ml de sangue na drenagem de hemotórax maciço;
Saída de mais de 200ml/hora de sangue no hemotórax maciço;
Tamponamento cardíaco;
Lesão da árvore traqueobrônquica;
Rotura traumática de aorta sem possibilidade de reparo endovascular; e
Rotura ou perfuração esofágica.