ResuMED de hiperplasia adrenal congênita – da fisiopatologia ao tratamento

ResuMED de hiperplasia adrenal congênita – da fisiopatologia ao tratamento

Como vai, futuro Residente? Você sabia que o tema hiperplasia adrenal congênita é muito cobrado nas provas de Residência Médica? Por isso, nós do Estratégia MED preparamos um resumo exclusivo com tudo o que você precisa saber sobre o assunto, incluindo seus principais pontos: choque neonatal, quadro clínico e características da genitália ambígua. Quer saber mais? Continue a leitura. Bons estudos!

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Introdução

A hiperplasia adrenal congênita (HAC) é um conjunto de doenças de herança autossômica recessiva, na maioria dos casos, causada por uma mutação no gene CYP21A2, responsável por codificar a enzima 21-hydroxylase. É uma doença de alta morbimortalidade no período neonatal, sobretudo no sexo masculinos, por isso merece muita atenção. 

Desde 2012, há a implementação da triagem neonatal para HAC, o que facilitou o diagnóstico precoce e ajudou na prevenção contra as formas graves de desidratação hiponatrêmica, além de erros no registro social de meninas acometidas por essa patologia. 

Fisiopatologia

Como dito anteriormente, a hiperplasia adrenal congênita é causada principalmente pela deficiência da enzima 21-hidroxilase, e, no Brasil, a segunda maior causa é a deficiência da enzima 17-alfa-hidroxilase. No caso da enzima 21-h, ocorre um bloqueio enzimático e duas reações são interrompidas:

  • A passagem de progesterona para desoxicorticosterona, que impede a produção de aldosterona;
  • Passagem de 17-hidroxiprogesterona para 11-desoxicortisol, que impede a produção de cortisol.

Assim, com o bloqueio enzimático, ocorre uma deficiência de cortisol, hormônio responsável pelo feedback entre a adrenal e a hipófise, assim como o hipotálamo. Esse bloqueio causa um aumento na secreção de hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), que estimula a esteroidogênese adrenal, causando um desvio na produção de hormônios da adrenal e aumentando a produção de testosterona. 

Além disso, o bloqueio também impede a produção de aldosterona, interferindo na reabsorção de sódio e excreção de potássio, causando hiponatremia e hipercalemia, caracterizadas por hipotensão, desidratação e choque. A redução do cortisol, também deficiente, causa hipoglicemia, fraqueza, perda de peso e sintomas gastrointestinais, como vômitos, diarreia e dor abdominal. 

Esse desequilíbrio hormonal na vida intrauterina causa ambiguidade genital, pois a genitália externa sofre sua diferenciação entre a 7° e a 12° semana de gestação.

Diferenciação genital

Em um primeiro momento, a genitália no embrião é indiferenciada. Por volta da 7ª semana de gestação, caso haja o cromossomo Y (XY), a testosterona induz a diferenciação para genitália externa masculina; ou caso não haja a presença de testosterona (XX), a genitália segue para diferenciação feminina. Esse processo é chamado de diferenciação sexual, o que permite explicar o porquê meninas que possuem hiperplasia adrenal congênita podem desenvolver ambiguidade genital. 

Sexo feminino:

A ambiguidade genital pode ser de diversos tipos, divididos, de acordo com a Escala de Prader, em 5 formas, o que permite perceber que algumas meninas apresentam aumento discreto do clitóris, enquanto outras apresentam genitália muito semelhante à do sexo masculino, mas sem os testículos palpáveis. O grau máximo de virilização pode causar graves problemas nas pacientes, incluindo o erro no registro social como sexo masculino, causando transtornos psicológicos muito importantes. 

P.S: recém-nascido com genitália de aspecto masculino, sem os dois testículos palpáveis → pensar em hiperplasia adrenal congênita!

Além disso, lembre-se que os órgãos genitais internos dessas pacientes são femininos, ou seja, elas possuem útero e ovários, pois suas estruturas internas são derivadas dos ductos de Muller, e não sofrem ação da testosterona durante a gestação.

Sexo masculino:

Em meninos, a virilização da genitália externa pode não ser percebida ao nascimento, pois manifestam apenas uma coloração mais escura na bolsa escrotal e discreto aumento peniano (macrogenitossomia), não havendo genitália ambígua. 

Classificação e quadro clínico

Nem todos os pacientes apresentam deficiência enzimática completa, o que faz com que as manifestações clínicas variem de acordo com o grau de deficiência enzimática. Pode ser dividida em forma clássica e não clássica.

Forma clássica: ocorre devido ao grave prejuízo na função enzimática

  • Incidência 1/20.000; zero atividade enzimática; baixa síntese de aldosterona;
  • Clínica: sinais e sintomas no período pré-natal → perda de peso, vômitos, desidratação, hiponatremia, hipercalemia, hipoglicemia, aumento da atividade de renina plasmática, sinais de hiperandrogenismo.

Forma não-clássica: bloqueio enzimático  parcial; sem perda de sal

  • Incidência 1/1.000, 20 a 50% de atividade enzimática, síntese de aldosterona normal;
  • Clínica: pubarca precoce, aceleração do crescimento e idade óssea
    • Sexo masculino: amento peniano, aumento da pilificação pubiana, infertilidade na idade adulta.
    • Sexo feminino: hisutismo, clitoromegalia, irregularidade menstrual, infertilidade, calvice temporal.

Diagnóstico

O diagnóstico foi facilitado após a implementação da dosagem da 17-hidroxiprogesterona na triagem neonatal, o conhecido “teste do pezinho”, pois esse é um dos hormônios pré-bloqueio enzimático. As alterações laboratoriais esperadas no teste são:

  • Aumento da 17 hidroxiprogesterona;
  • Aumento da androstenediona e testosterona;
  • Aumento da atividade de renina plasmática (forma clássica);
  • Hiponatremia (forma clássica); e
  • Hipercalemia (forma clássica).

O teste é realizado pela administração de ACTH endovenoso, pois estimula a esteroidogênese adrenal. Assim, são feitas coletas de sangue seriadas para análise dos precursores da aldosterona e do cortisol, possibilitando constatar se há acúmulo dos precursores. 

Na falha da interpretação do teste, os sinais de virilização na menina e crise de perda de sal podem ajudar a chegar ao diagnóstico. 

Tratamento

Os objetivos do tratamento incluem:

  • Suprir a produção deficiente de glicocorticoide (cortisol) e mineralocorticoide (aldosterona);
  • Inibir a hipersecreção de ACTH pela hipófise;
  • Permitir crescimento e puberdade adequados;
  • Evitar casos semelhantes nas famílias; e
  • Prover condições adequadas para o desenvolvimento psicológico.

Geralmente é feito com reposição de glicocorticoide, para interromper a hiperestimulação adrenal e reverter a produção excessiva de testosterona. Caso haja perda de sal, é indicado o uso de mineralocorticoides e a reposição de sódio, principalmente em lactentes. 

Além disso, meninas com ambiguidade genital grave (Prader 4 e 5), são indicadas à intervenção cirúrgica precoce, até pelo menos os 2 anos de vida.

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