Caso clínico de HTLV: diagnóstico, exames, tratamento e mais!

Caso clínico de HTLV: diagnóstico, exames, tratamento e mais!

E aí, doc! Vamos ver um caso clínico? O tema de hoje é HTLV, um retrovírus humano, que pode ser transmitido de várias formas e pode apresentar diversas manifestações clínicas ou simplesmente ser assintomático. 

O Estratégia MED quer te ajudar a entender mais um conceito, que com certeza vai auxiliar nos seus conhecimentos para ser um profissional melhor. Vamos lá!

Identificação do Paciente: DGCS, 45 anos, sexo feminino, professora, casada, natural do Rio de Janeiro, Brasil.

Queixa Principal (QP)

Sensação de fraqueza nas pernas há 6 meses

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Histórico da Moléstia Atual (HMA)

Maria Silva, 45 anos, relata que há aproximadamente 6 meses começou a perceber fraqueza muscular progressiva, principalmente nas pernas, o que tem dificultado suas atividades diárias. 

Ela descreve a sensação de cansaço e fadiga constante, mesmo após pequenos esforços. Além disso, apresenta episódios de dor nas articulações, principalmente nos joelhos e tornozelos. Maria também relata dificuldade para caminhar, especialmente em superfícies irregulares, e refere quedas frequentes devido à instabilidade ao andar. 

A paciente observou que a fraqueza muscular tem se agravado ao longo do tempo, interferindo em suas atividades profissionais e domésticas. A paciente nega histórico de lesões traumáticas recentes, febres recorrentes, perda de peso significativa ou alterações no funcionamento intestinal ou urinário.

Interrogatório Sistemático

Gerais: Tem sentido cansaço excessivo e fadiga constante. Não houve perda significativa de peso recentemente.

Pele: Não tem notado alterações na pele, como manchas, lesões ou coceira.

Músculo-esquelético: Além da fraqueza muscular, tem sentido dores musculares ou articulares. Não houve limitação de movimento nas articulações.

Cabeça: Não tem experimentado dores de cabeça frequentes ou intensas. Nega alteração na visão, audição ou sensibilidade facial.

Respiratório: Nega falta de ar, tosse persistente ou produção de catarro. Nega sangramento nasal, espirros frequentes ou obstrução nasal.

Cardiovascular: Nega alteração do ritmo cardíaco, cianose, palpitações, sopros. 

Digestivo: Nega vômitos, regurgitação, disfagia, halitose, pirose, dor abdominal, constipação, diarreia, tenesmo.

Genitourinário: Refere noctúria, aumento da frequência urinária, diminuição do jato urinário, incontinência e sensação de esvaziamento incompleto da bexiga. Nega alteração da cor da urina, alterações menstruais, corrimento vaginal. 

Neurológico: Além da fraqueza muscular, houve alterações na marcha, equilíbrio ou coordenação motora. Nega dores de cabeça intensas, tonturas ou perda de memória.

História Familiar (HF)

Não há relato de doenças neurológicas ou musculares na família. O marido e os filhos estão saudáveis.

Exame físico

Altura: 1,60 m    Peso: 58 kg     IMC: 19,53     FC: 89 bpm.   FR: 11 ipm

Gerais: BEG, orientada, hidratada, normocorada, nutrida, fácies atípica, acianótica, anictérica, condições de higiene adequadas, sem postura preferencial.

Pele: normocorada, quantidade e distribuição adequados ao sexo e idade; unhas coradas e lisas. Turgor firme e sem edemas.

Cardiovascular: Precórdio normodinâmico. Ictus invisível, palpável em 5º EIC na LHCE medindo cerca de 2 polpas digitais, não propulsivo. Ausência de atritos. RCR 2T c/ BNF. Ausência de sopros ou extrassístoles. Pulsos arteriais periféricos simétricos, sincrônicos e com boa amplitude.

Respiratório: Tórax e pulmões: simétricos, sem esforço respiratório. Expansibilidade preservada bilateralmente. FTV uniformemente palpável bilateralmente. Som claro atimpânico à percussão. MVBD s/ RA.

Abdominal: plano, sem lesões de pele, cicatrizes. RHA+ nos quatro quadrantes. Espaço de Traube livre. Abdome indolor à palpação superficial e profunda. Ausência de massas e visceromegalias. Som timpânico à percussão. 

Neurológico: fraqueza nas extremidades inferiores (MRC 4), espasticidade muscular, clônus do tornozelo e reflexos exacerbados (+4), instabilidade de marcha. Sinal de Babinski presente. Observa-se parestesia e perda do sentido de vibração em membros inferiores.

Exames laboratoriais

  • Hemograma: Hm: 4,8 milh/mm3; Hb: 12,3 g/dl; V.C.M: 89,1fl; H.C.M: 28,3 pg; C.H.C.M: 31,7 g/dl
  • Dosagem de creatina quinase (CK): 908 U/L (VR: 29.00 U/L e 168.00 U/L)
  • Eletroneuromiografia
    • Estudos de Nervo Motor (Membros Inferiores): A análise revelou aumento nos tempos de condução distal, indicativo de comprometimento na transmissão do impulso nervoso nos membros inferiores.
    • Estudos de Unidade Motora (Membros Inferiores): Foram observados sinais de recrutamento precoce e polifasia nas unidades motoras dos membros inferiores, sugerindo denervação e remielinização inadequada.
    • Estudos de Potencial Somato-Sensitivo (Membros Inferiores): Apresentaram diminuição na amplitude e prolongamento no tempo de condução, indicando comprometimento na condução sensorial nos membros inferiores.
    • Estudos de Potencial Evocado (Membros Inferiores): Os potenciais evocados motores e somatossensoriais nos membros inferiores exibiram alterações compatíveis com uma mielopatia, evidenciando disfunção nas vias neurais ascendentes e descendentes específicas desses membros.
  • Sorologia para HTLV-1 e HTLV-2: Positivo para HTLV-1

Hipóteses diagnósticas

1. Mielopatia associada ao HTLV-1 (HAM/TSP): A Mielopatia Associada ao Vírus da Leucemia Humana de Células T tipo 1 (HTLV-1), é uma condição neurológica crônica e progressiva. Resulta da infecção pelo HTLV-1. Os sintomas incluem fraqueza nas pernas, espasticidade, dor e dificuldades de locomoção. A condição afeta a medula espinhal, levando a danos nos nervos e comprometimento motor.

2. Polimiosite: A Polimiosite é uma doença inflamatória crônica dos músculos, caracterizada por fraqueza muscular, dor e inflamação. Afeta principalmente os músculos proximais, como os quadris e ombros. A etiologia exata é desconhecida, mas há uma associação com distúrbios autoimunes. A condição pode causar dificuldades na realização de atividades diárias e levar a complicações respiratórias em casos mais graves.

3. Esclerose lateral amiotrófica (ELA): A Esclerose Lateral Amiotrófica, também conhecida como doença de Lou Gehrig, é uma condição neurodegenerativa progressiva que afeta as células nervosas no cérebro e na medula espinhal. Isso resulta em perda progressiva de habilidades motoras voluntárias, levando à paralisia. A ELA não tem uma causa conhecida na maioria dos casos, e os sintomas incluem fraqueza muscular, espasmos e eventualmente dificuldades respiratórias. Infelizmente, a ELA não tem cura, e o tratamento visa principalmente aliviar os sintomas e melhorar a qualidade de vida.

Definição de HTLV

O HTLV, sigla para Human T-cell Lymphotropic Virus (Vírus Linfotrópico de Células T Humanas), é um retrovírus humano pertencente à família Retroviridae. 

Existem dois tipos principais de HTLV: HTLV-1 e HTLV-2. O HTLV-1 é associado a diversas condições clínicas, incluindo a paraparesia espástica tropical/mielopatia associada ao HTLV-1 (PET/MAH) e a leucemia/linfoma de células T do adulto (LLcTA). Por outro lado, o HTLV-2 está associado a condições neurológicas menos frequentes.

A infecção pelo HTLV ocorre principalmente por meio da transmissão de célula para célula, como a transmissão vertical (da mãe para o filho), relações sexuais desprotegidas, transfusão de sangue contaminado e compartilhamento de agulhas infectadas. 

A infecção pelo HTLV é endêmica em algumas regiões do mundo, como no sul do Japão, nas ilhas do Caribe e em algumas áreas da África, América do Sul e Oriente Médio.

A infecção pelo HTLV pode ser assintomática em muitos casos, mas em alguns indivíduos pode levar ao desenvolvimento de doenças neurológicas, hematológicas e imunológicas. 

Doenças relacionadas ao HTLV

A maioria das pessoas infectadas pelo HTLV-I não apresentam sintomas, mas existem duas associações de doenças bem conhecidas causadas pelo vírus:

Leucemia-linfoma de células T adultas (ATL)

O HTLV-I foi isolado pela primeira vez de um paciente com um linfoma cutâneo de células T em 1980. A leucemia-linfoma de células T adultas é caracterizada pela proliferação clonal de células CD4+ T contendo provírus HTLV-I integrado aleatoriamente, frequentemente associado a rearranjos do gene do receptor de células T. 

A ATL tem quatro formas clínicas distintas: aguda, linfomatosa, crônica e smoldering. O risco cumulativo ao longo da vida de ATL em um paciente com infecção por HTLV-I é estimado entre 2 e 5 por cento, sendo ligeiramente maior em homens. 

O início da ATL é tipicamente adiado por 20 a 30 anos após a infecção viral.

Mielopatia associada ao HTLV-I (HAM) ou paraparesia espástica tropical (TSP):

A HAM/TSP é caracterizada por um início insidioso de fraqueza progressiva e espasticidade de uma ou ambas as pernas, juntamente com hiperreflexia, clônus do tornozelo, respostas plantares extensoras e dor lombar. 

Não há terapia com benefício comprovado na HAM/TSP, mas os corticosteróides podem retardar a progressão e reduzir tanto a incapacidade quanto a dor. 

Outras manifestações clínicas do HTLV

Além disso, outras manifestações clínicas foram descritas em pacientes infectados pelo HTLV-I:

  • Dermatite infecciosa;
  • Uveíte;
  • Artropatia;
  • Síndrome de Sjögren;
  • Síndrome de Raynaud;
  • Polimiosite; e
  • Linfocitose alveolar pulmonar.

Diagnóstico do HTLV

O diagnóstico da infecção pelo HTLV é realizado por meio de testes sorológicos e moleculares no sangue periférico. Os testes sorológicos detectam a presença de anticorpos contra o HTLV no sangue, enquanto os testes moleculares detectam o material genético do vírus (DNA ou RNA) no sangue.

Os testes sorológicos incluem o ELISA (Enzyme-Linked Immunosorbent Assay) e o Western blot. O ELISA é um teste de triagem que detecta a presença de anticorpos contra o HTLV no sangue. Se o resultado do ELISA for positivo, o Western blot é realizado para confirmar o diagnóstico. O Western blot é um teste mais específico que detecta anticorpos contra proteínas específicas do HTLV.

Os testes moleculares incluem a PCR (Polymerase Chain Reaction) e a detecção de RNA viral. A PCR é um teste que amplifica o material genético do vírus presente no sangue, permitindo a detecção de baixas concentrações virais. A detecção de RNA viral é um teste que detecta o RNA do HTLV no sangue.

O resultado positivo do teste não significa necessariamente que o paciente desenvolverá doenças associadas ao HTLV.

Tratamento do HTLV

O tratamento do HTLV-I varia de acordo com as manifestações clínicas apresentadas pelos pacientes:

Leucemia-linfoma de células T adultas (ATL): O tratamento da ATL varia de acordo com a forma clínica da doença. As formas aguda, linfomatosa, crônica e smoldering da ATL têm apresentações e prognósticos variados. O tratamento da ATL é discutido em detalhes em outras fontes e pode incluir quimioterapia, terapia de suporte e, em alguns casos, transplante de células-tronco.

Mielopatia associada ao HTLV-I (HAM): Não há terapia com benefício comprovado na HAM, mas os corticosteroides podem retardar a progressão e reduzir tanto a incapacidade quanto a dor.

Outras manifestações clínicas: Para outras manifestações clínicas associadas ao HTLV-I, o tratamento é direcionado para controlar os sintomas e complicações específicas de cada condição. Isso pode incluir o uso de medicamentos anti-inflamatórios, imunossupressores, terapias sintomáticas e acompanhamento clínico regular.

Para indivíduos assintomáticos, o tratamento antiviral não é indicado. O manejo desses pacientes é focado no diagnóstico precoce de manifestações clínicas e na prevenção de complicações associadas à infecção pelo HTLV-I.

De olho na prova!

Não pense que esse assunto fica fora das provas, seja da faculdade, concurso ou residência. Veja um exemplo logo abaixo:

SCMM – Santa Casa de Misericórdia de Maceió – 2023

A leucemia-linfoma de células T do adulto (ATLL), está de acordo com o seguinte item:

A) é uma doença não linfoproliferativa agressiva de células T maduras, com diversas características clínicas, etiologicamente associada ao HTLV-1.

B) é uma doença linfoproliferativa agressiva de células T maduras, com diversas características clínicas, etiologicamente não associada ao HTLV-1.

C) é uma doença linfoproliferativa indolente de células T maduras, com diversas características clínicas, etiologicamente associada ao HTLV-1.

D) é uma doença linfoproliferativa agressiva de células T maduras, com diversas características clínicas, etiologicamente associada ao HTLV-1.

Opção correta: Alternativa “D”

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Veja também!

Referências 

FREEDMAN, Andrew R; ROBERTSON, Paul; Human T-lymphotropic virus type I: Disease associations, diagnosis, and treatment. In UpToDate. 2022

Castro-Costa, C. M. de, Araújo, A. Q. C., Menna-Barreto, M., Penalva-de-Oliveira, A. C., & Demais Membros da Equipe Técnica do Programa Nacional de DST e Aids do Ministério da Saúde. (2005). Guia de manejo clínico do paciente com HTLV: aspectos neurológicos. Arquivos de Neuro-Psiquiatria, 63(2-B), 548-551.

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