Resumo de Demência Frontotemporal: classificação e mais!
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Resumo de Demência Frontotemporal: classificação e mais!

Olá, querido doutor e doutora! A demência frontotemporal (DFT) é uma condição neurodegenerativa que compromete preferencialmente os lobos frontal e temporal do cérebro, manifestando-se por alterações progressivas do comportamento, da linguagem ou do controle motor. O início costuma ocorrer antes dos 65 anos, e muitas vezes o quadro é confundido com transtornos psiquiátricos. Este texto aborda de forma prática os principais aspectos da DFT, desde sua fisiopatologia até o diagnóstico e tratamento.

A desinibição e a apatia são manifestações comportamentais frequentes na fase inicial da doença.

Conceito 

A demência frontotemporal (DFT) é uma condição neurodegenerativa que se instala de forma progressiva, tendo como foco inicial os lobos frontal e temporal do encéfalo. Essa afecção resulta em prejuízos que podem se manifestar inicialmente por alterações de comportamento, dificuldades na linguagem ou por sintomas motores, a depender da região cerebral acometida.

Diferentemente de outras formas de demência, como a doença de Alzheimer, a DFT tende a surgir em pacientes mais jovens, frequentemente entre a quarta e sexta décadas de vida, e sem predomínio inicial de déficit de memória. A apresentação clínica pode variar conforme o subtipo, sendo os mais reconhecidos:

  • Forma comportamental, marcada por desinibição, apatia, impulsividade e perda de empatia;
  • Formas linguísticas, que compõem a afasia progressiva primária em suas variantes não-fluente/agramática e semântica;
  • Formas associadas a distúrbios do movimento, que incluem casos com sintomas sobrepostos à esclerose lateral amiotrófica ou à síndrome corticobasal.

Fisiopatologia  

A fisiopatologia da demência frontotemporal (DFT) está relacionada à degeneração progressiva dos lobos frontal e temporal, áreas envolvidas na regulação do comportamento, linguagem, emoções e funções executivas. Essa degeneração é causada pela acumulação anormal de proteínas no interior dos neurônios, levando à morte celular e atrofia das regiões afetadas.

As principais proteínas envolvidas na DFT são:

  • Tau, presente nas variantes associadas à degeneração lobar frontotemporal com depósito de tau (DLFT-tau);
  • TDP-43, uma proteína nuclear que, quando se acumula de forma patológica no citoplasma, está associada a um espectro amplo de sintomas cognitivos, comportamentais e motores;
  • FUS, menos comum, relacionada a formas agressivas e de início precoce da doença.

A expressão clínica da DFT depende do padrão topográfico de atrofia. Lesões no córtex orbitofrontal e na região anterior do cíngulo explicam sintomas como impulsividade, apatia e alteração no julgamento moral e social. Já o comprometimento da região frontoinsular e polos temporais compromete o processamento da linguagem e da semântica, levando às manifestações linguísticas progressivas.

Além disso, algumas formas de DFT têm origem genética, sendo a mutação nos genes MAPT, GRN e C9orf72 as mais frequentemente associadas à doença. Essas mutações afetam diretamente a regulação e estrutura das proteínas citadas, acelerando os processos de neurodegeneração.

Epidemiologia e fatores de risco

A demência frontotemporal (DFT) é uma das causas mais comuns de demência em indivíduos mais jovens, especialmente na faixa etária entre 45 e 64 anos. Estima-se que a DFT represente aproximadamente 10% a 20% dos casos de demência, com uma prevalência média de 15 a 22 por 100.000 habitantes nessa faixa etária. Em pessoas com menos de 65 anos, ela é superada em frequência apenas pela doença de Alzheimer.

Embora estudos populacionais sobre a DFT ainda sejam escassos no Brasil, levantamentos regionais sugerem que sua prevalência pode estar subestimada, especialmente devido à dificuldade diagnóstica em contextos com menor acesso a exames complementares e profissionais especializados.

Quanto aos fatores de risco, destacam-se:

  • Histórico familiar positivo, presente em até 40% dos casos, sendo que cerca de 10% a 15% têm padrão hereditário autossômico dominante, relacionado a mutações genéticas (como em MAPT, GRN e C9orf72);
  • Genética, especialmente mutações que promovem acúmulo patológico de proteínas tau ou TDP-43, com impacto direto na expressão clínica da doença;
  • Idade entre 45 e 65 anos, embora casos de início tardio também sejam reconhecidos;
  • Ausência de proteção cognitiva, como baixa escolaridade ou pouco engajamento intelectual e social, que pode reduzir a reserva cognitiva e antecipar o aparecimento dos sintomas.

Ainda não se estabeleceu uma associação clara entre DFT e fatores ambientais como estilo de vida, hábitos alimentares ou exposição a toxinas, o que diferencia esse grupo de demências de outros tipos mais comuns. Entretanto, alguns casos têm sido erroneamente diagnosticados como quadros psiquiátricos, atrasando o diagnóstico definitivo e, consequentemente, o manejo adequado.

Avaliação clínica

A apresentação clínica da demência frontotemporal (DFT) varia conforme a região cerebral acometida, resultando em três síndromes principais: a variante comportamental (vcDFT), a afasia progressiva primária (APP) e as formas associadas a distúrbios motores. Embora cada subtipo possua manifestações específicas, todos compartilham a característica de progressão lenta e insidiosa, com impacto funcional crescente ao longo do tempo.

Variante comportamental (vcDFT)

A forma mais frequente da DFT é marcada por alterações de conduta e personalidade. Os sintomas mais comuns incluem:

  • Desinibição: comportamentos inapropriados, impulsividade e perda de noção do contexto social;
  • Apatia: redução da iniciativa, desinteresse por atividades anteriormente valorizadas e isolamento social;
  • Perda da empatia: dificuldade em reconhecer e se sensibilizar com sentimentos alheios;
  • Comportamentos repetitivos: ações estereotipadas, compulsivas ou ritualísticas;
  • Hiperoralidade: aumento do apetite, preferência por doces ou alimentos específicos, ingestão de substâncias não comestíveis;
  • Alterações cognitivas: disfunção executiva com relativa preservação da memória episódica nos estágios iniciais.

Essas manifestações muitas vezes levam à confusão com transtornos psiquiátricos, como depressão, transtorno bipolar ou transtornos de personalidade.

Afasia progressiva primária (APP)

Caracteriza-se por comprometimento progressivo da linguagem, sem prejuízo inicial da memória ou das habilidades sociais. Divide-se em:

  • APP não-fluente/agramática (APP-NF/A): fala lenta, esforço para articular palavras, erros gramaticais e apraxia de fala;
  • APP semântica (APP-S): perda do significado das palavras, dificuldade em nomear objetos, uso de termos genéricos e empobrecimento do vocabulário;
  • APP logopênica (menos associada à DFT): marcada por pausas frequentes na fala e dificuldade em encontrar palavras, com preservação da gramática.

Com a progressão da doença, pode haver evolução para sintomas comportamentais e comprometimento de outras funções cognitivas.

Formas com alterações motoras

Alguns casos de DFT apresentam sintomas motores semelhantes aos de outras doenças neurológicas, como:

  • Paralisia supranuclear progressiva (PSP): rigidez axial, instabilidade postural e dificuldade de movimentos oculares;
  • Síndrome corticobasal: apraxia, rigidez assimétrica, tremores e distúrbios sensoriais;
  • DFT associada à esclerose lateral amiotrófica (DFT-ELA): fraqueza muscular, atrofia, fasciculações e alterações da linguagem ou comportamento.

Essas formas podem coexistir com os quadros cognitivos ou comportamentais, conferindo complexidade diagnóstica e impacto funcional mais amplo.

Diagnóstico 

O diagnóstico da demência frontotemporal (DFT) exige uma abordagem clínica detalhada, complementada por avaliação neuropsicológica, exames laboratoriais e métodos de imagem cerebral. Devido à diversidade fenotípica e à sobreposição com distúrbios psiquiátricos e outras demências, o reconhecimento precoce requer experiência clínica e familiaridade com os critérios diagnósticos específicos.

Avaliação clínica

A primeira etapa do diagnóstico é baseada em história clínica minuciosa, com ênfase na progressão dos sintomas comportamentais, linguísticos ou motores, associada à análise do impacto funcional no cotidiano. A entrevista com familiares é essencial para identificar:

  • Mudanças de personalidade ou conduta social;
  • Dificuldades linguísticas progressivas;
  • Alterações alimentares ou motoras.

A instalação típica é insidiosa e progressiva, o que ajuda a distinguir a DFT de quadros agudos ou episódicos como os psiquiátricos.

Critérios diagnósticos

A variante comportamental da DFT (vcDFT) é diagnosticada com base nos critérios de Rascovsky et al., que classificam os casos em:

  • Possível vcDFT: presença de ao menos 3 de 6 características clínicas (desinibição, apatia, perda de empatia, comportamentos repetitivos, hiperoralidade e disfunção executiva);
  • Provável vcDFT: preenche critérios de possível DFT, com declínio funcional e achados sugestivos em neuroimagem;
  • Definitiva: confirmação por exame histopatológico ou identificação de mutação patogênica.

Para a afasia progressiva primária (APP), o diagnóstico requer:

  1. Quadro clínico com predomínio de dificuldades de linguagem;
  1. Impacto funcional decorrente do distúrbio linguístico;
  1. Ausência de déficits cognitivos significativos em outras áreas no início.

A classificação em APP-NF/A ou APP-S depende do perfil de linguagem (agramatismo, apraxia de fala, perda semântica etc.).

Avaliação neuropsicológica

A testagem cognitiva deve explorar:

  • Funções executivas (ex: FAB, IFS, Teste de Trilhas);
  • Linguagem (ex: Teste de Nomeação de Boston, fluência verbal);
  • Cognição social (ex: Mini-SEA);
  • Memória episódica e funções visuoespaciais, que tendem a estar preservadas nas fases iniciais.

Exames laboratoriais

São utilizados para excluir causas reversíveis de demência. Incluem:

  • Hemograma, eletrólitos, função hepática e renal;
  • Vitamina B12 e ácido fólico;
  • Hormônios tireoidianos;
  • Sorologia para sífilis e HIV.

Neuroimagem

  • Ressonância magnética (RM): principal exame estrutural. Revela atrofia frontal, temporal ou insular conforme o subtipo clínico.
  • PET-FDG ou cintilografia cerebral: detectam hipometabolismo em regiões frontotemporais, especialmente útil quando a RM é normal nas fases iniciais.
  • PET amiloide: pode ajudar a diferenciar DFT da variante frontal da doença de Alzheimer.

Tratamento 

Até o momento, não existe terapia capaz de interromper ou reverter a progressão da demência frontotemporal (DFT). O tratamento, portanto, é voltado ao alívio dos sintomas e ao suporte funcional e emocional do paciente e seus cuidadores, sendo necessário um plano terapêutico personalizado de acordo com o subtipo clínico, gravidade do quadro e contexto social.

Intervenções não farmacológicas

São consideradas estratégias de primeira linha, especialmente nos estágios iniciais:

  • Psicoeducação dos familiares: auxilia na compreensão dos sintomas e no enfrentamento das mudanças de comportamento;
  • Terapias fonoaudiológicas, especialmente nas formas linguísticas (APP), para manter e treinar as habilidades comunicativas remanescentes;
  • Terapia ocupacional: promove a manutenção da autonomia e adaptação às perdas funcionais;
  • Intervenções comportamentais estruturadas: estratégias ambientais para reduzir estímulos disfuncionais e prevenir comportamentos de risco;
  • Apoio psicológico ao cuidador: fundamental para prevenir sobrecarga e desgaste emocional.

Tratamento farmacológico

Embora não haja medicamentos específicos para a DFT, algumas opções podem ser utilizadas para manejo sintomático:

  • Inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS): como sertralina ou paroxetina, frequentemente usados para tratar sintomas como impulsividade, compulsividade e desinibição;
  • Trazodona: pode ser útil para agitação, ansiedade ou distúrbios do sono;
  • Antipsicóticos atípicos: utilizados com cautela em casos de agressividade ou delírios, evitando-se riscos de efeitos extrapiramidais e sedação excessiva;
  • Modafinil: eventualmente utilizado para apatia ou sonolência excessiva, embora com evidências limitadas.

Anticolinesterásicos e memantina, usados na doença de Alzheimer, não têm eficácia comprovada na DFT e, em alguns casos, podem agravar os sintomas comportamentais.

Abordagens Específicas por Subtipo

  • Na vcDFT, o foco é no controle comportamental e na segurança do paciente;
  • Nas formas de afasia progressiva, a fonoaudiologia tem papel central, com adaptações na comunicação, uso de gestos, aplicativos de suporte à linguagem e treinamento de familiares;
  • Nos casos com síndromes motoras associadas, como DFT-ELA ou PSP, o manejo segue protocolos semelhantes aos dessas condições (reabilitação motora, suporte ventilatório, avaliação da deglutição e uso de recursos auxiliares).

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Referências Bibliográficas 

  1. DE SOUZA, Leonardo Cruz et al. Diagnóstico de demência frontotemporal: recomendações do Departamento Científico de Neurologia Cognitiva e do Envelhecimento da Academia Brasileira de Neurologia. Dementia & Neuropsychologia, v. 16, n. 3 supl. 1, p. 40-52, 2022. https://doi.org/10.1590/1980-5764-DN-2022-S103PT.
  1. NATIONAL INSTITUTE ON AGING (EUA). Frontotemporal Disorders: Causes, Symptoms, and Diagnosis. 2025.
  2. RIBEIRO, Luana de Oliveira; BATISTA, Daniel Souza. Visualização de demência frontotemporal e mania: as dificuldades do diagnóstico diferencial. Revista Interfaces Científicas – Saúde e Ambiente, 2017.
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