Olá, querido doutor e doutora! A epilepsia rolândica benigna é uma síndrome epiléptica infantil com crises focais caracteristicamente noturnas, predominante em meninos entre 7 e 10 anos. Com evolução autolimitada, costuma apresentar bom prognóstico e raramente causa sequelas neurológicas duradouras. O diagnóstico é clínico e eletroencefalográfico, sendo o tratamento reservado para casos selecionados.
A maioria das crianças apresenta remissão completa das crises até a adolescência, mesmo sem uso contínuo de medicações.
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Conceito
A epilepsia rolândica benigna é uma síndrome epiléptica de início focal, observada tipicamente na infância, caracterizada por descargas elétricas anormais na região centrotemporal do cérebro — mais precisamente no giro rolândico, área relacionada ao controle motor da face e orofaringe. Por isso, é comum que os episódios convulsivos envolvam movimentos involuntários faciais, salivação excessiva e dificuldade de fala.
Também conhecida como epilepsia com pontas centrotemporais ou pelas siglas BECTS (Benign Epilepsy with Centrotemporal Spikes), essa condição apresenta curso autolimitado e tende a desaparecer espontaneamente até a adolescência.
Fisiopatologia
Na epilepsia rolândica benigna, as crises têm origem no córtex sensoriomotor peri-silviano, mais especificamente na região rolândica — área responsável pela inervação motora da face, lábios, língua e faringe. A atividade elétrica anormal ocorre de forma focal, com descargas sincrônicas e breves de neurônios hiperexcitáveis localizados nesse território cortical.
Essa hiperatividade neuronal resulta em manifestações motoras e sensoriais típicas, como espasmos faciais, parestesias orais, sialorreia e bloqueio da fala. A distribuição somatotópica do córtex explica a predominância dos sintomas na face e orofaringe. Em alguns casos, as descargas podem se expandir para regiões adjacentes, provocando a chamada marcha jacksoniana, em que os sintomas motores progridem do rosto para os membros do mesmo lado do corpo.
As crises ocorrem principalmente durante o sono não REM, fase em que a excitabilidade cortical é naturalmente aumentada, o que facilita a ativação das descargas epileptiformes. Esse padrão explica o motivo pelo qual muitos episódios são noturnos e passam despercebidos.
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Epidemiologia e fatores de risco
A epilepsia rolândica benigna é a síndrome epiléptica mais comum da infância. Sua incidência gira em torno de 10 a 20 casos para cada 100.000 crianças por ano, representando cerca de 15% das epilepsias pediátricas diagnosticadas até os 15 anos de idade.
A faixa etária mais frequentemente acometida situa-se entre os 7 e 10 anos, embora os primeiros episódios possam ocorrer entre 1 e 14 anos. A condição é tipicamente autolimitada, desaparecendo espontaneamente durante a adolescência — na maioria dos casos, antes dos 16 anos.
Há uma discreta predominância em meninos, com uma razão de aproximadamente 1,5:1 em relação às meninas. Adultos não são afetados, e, quando os sintomas persistem além da adolescência, investiga-se outros diagnósticos.
Os principais fatores de risco conhecidos incluem:
- Histórico familiar de epilepsia ou crises febris: cerca de 25% das crianças com epilepsia rolândica apresentam familiares de primeiro grau com histórico semelhante.
- Predisposição genética: embora a maioria dos casos seja esporádica, estudos apontam para herança autossômica dominante com penetrância variável. Mutações em genes como KCNQ2, GRIN2A e ELP4 têm sido associadas à síndrome.
- Vulnerabilidade cortical no desenvolvimento infantil: a maturação do sistema nervoso central durante a infância pode favorecer a manifestação de descargas epileptiformes em determinadas regiões corticais, especialmente no córtex rolândico.
- Atividade epileptiforme ativada pelo sono, especialmente durante o sono não REM, é um fenômeno observado em pacientes com essa síndrome, o que pode servir como fator facilitador para as crises.
Vale lembrar que a presença de picos centrotemporais no EEG, mesmo em crianças assintomáticas, não configura diagnóstico isolado, já que esses achados também podem estar presentes como variante benigna do desenvolvimento.
Avaliação clínica
As manifestações da epilepsia rolândica benigna são marcadas por crises focais de curta duração, com início súbito e, na maioria das vezes, sem comprometimento da consciência. Essas crises geralmente ocorrem durante o sono ou ao despertar, o que contribui para que passem despercebidas nos estágios iniciais.
Os sintomas mais característicos envolvem estruturas faciais e orofaríngeas, devido à localização da descarga epiléptica no córtex sensoriomotor rolândico. São comuns:
- Contrações involuntárias na face (espasmos hemifaciais);
- Parestesias orais: formigamento em língua, gengiva, bochecha ou lábios;
- Dificuldade na fala (disartria ou mutismo transitório);
- Sialorreia intensa;
- Ruídos guturais ou vocalizações involuntárias.
Em parte dos pacientes, ocorre progressão motora do tipo marcha jacksoniana, com disseminação dos sintomas para o membro superior ipsilateral. Aproximadamente metade dos casos pode evoluir para crises generalizadas tônico-clônicas bilaterais, especialmente em episódios mais intensos.
As crises têm duração média de 2 a 3 minutos, e o estado pós-ictal costuma ser breve ou ausente. Não é comum que causem confusão prolongada ou sonolência intensa.
Diagnóstico
O diagnóstico da epilepsia rolândica benigna é feito com base na análise clínica detalhada associada ao eletroencefalograma (EEG). A anamnese deve investigar episódios noturnos com sintomas motores faciais, hipersalivação, dificuldade de fala e eventuais crises generalizadas secundárias.
O EEG é o principal exame complementar, e apresenta achados típicos que ajudam a confirmar o diagnóstico:
- Espículas centrotemporais de alta voltagem, frequentemente em rajadas repetidas;
- Atividade mais intensa durante o sono, especialmente na fase não-REM;
- Morfologia bifásica, com componente agudo negativo e deflexão positiva subsequente;
- Presença de dipolo horizontal, com negatividade máxima na região centrotemporal e positividade na área frontal ou no vértice;
- Pode haver atividade bilateral, mas geralmente com predominância unilateral.
Importante destacar que picos centrotemporais isolados também podem ocorrer em crianças sem epilepsia, como variante benigna do EEG, o que reforça a necessidade de correlação com o quadro clínico.
Outros exames, como ressonância magnética, são reservados para casos atípicos, como:
- Crises exclusivamente diurnas ou muito frequentes;
- Episódios prolongados ou em status epilepticus;
- Achados neurológicos focais;
- Regressão cognitiva ou alterações comportamentais progressivas.
Nessas situações, a imagem é indicada para excluir malformações corticais, lesões estruturais ou síndromes epilépticas mais complexas. No entanto, na maioria dos casos típicos, a neuroimagem é normal e não é obrigatória.
Tratamento e prognóstico
Por se tratar de uma síndrome com evolução autolimitada, o tratamento da epilepsia rolândica benigna nem sempre é necessário. A conduta inicial depende da frequência, intensidade e impacto das crises na vida da criança.
Quando tratar
A decisão de iniciar medicação é individualizada. O tratamento farmacológico costuma ser indicado nos seguintes casos:
- Crises diurnas ou frequentes;
- Episódios que evoluem para generalização tônico-clônica;
- Impacto na fala, linguagem, cognição ou comportamento;
- Desconforto emocional significativo para a família.
Medicações utilizadas
Na maioria dos casos, uma monoterapia é suficiente, com boa resposta clínica. Os fármacos mais usados incluem:
- Carbamazepina (opção preferencial em crises focais),
- Valproato de sódio (especialmente se houver crises generalizadas),
- Levetiracetam (associado a menor risco de efeitos adversos e possível benefício em funções linguísticas),
- Clobazam, frequentemente administrado à noite, para crises predominantemente noturnas.
Outras opções, como oxcarbazepina, lamotrigina, topiramato e fenitoína, podem ser consideradas em casos específicos ou refratários.
O tempo de tratamento varia, mas geralmente se recomenda manter a medicação por 1 a 2 anos após a última crise. A retirada é feita de forma gradual, mesmo que o EEG ainda apresente atividade epileptiforme.
Prognóstico
O desfecho da epilepsia rolândica benigna é, em geral, excelente. Em mais de 95% dos casos, as crises cessam espontaneamente até os 15 a 16 anos. Cerca de 10% a 20% dos pacientes têm apenas uma crise ao longo da vida.
Durante a fase ativa da doença, podem ocorrer alterações cognitivas leves, especialmente relacionadas à linguagem e à atenção. No entanto, esses efeitos tendem a reverter com o tempo, após a resolução das crises e normalização do EEG.
Casos com início muito precoce, crises prolongadas ou atividade elétrica contínua durante o sono podem exigir monitoramento mais rigoroso, mas ainda assim mantêm um bom prognóstico na maioria das vezes.
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Referências Bibliográficas
- SANTOS, Mikaellem Nogueira dos et al. Epilepsia Rolândica: uma revisão bibliográfica. Research, Society and Development, v. 13, n. 2, e11013245079, 2024.
- AMRUTKAR, Chaitanya V.; RIEL-ROMERO, Rosario M. Rolandic Epilepsy Seizure. StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing, 2025.