Olá, querido doutor e doutora! As alterações no alinhamento dos joelhos, como o genu varo e o genu valgo, são condições frequentemente observadas na infância e podem fazer parte do desenvolvimento normal ou sinalizar patologias ortopédicas. O entendimento clínico dessas deformidades permite distinguir padrões fisiológicos de quadros que exigem investigação e intervenção.
Nos primeiros anos de vida, é comum observar genu varo até os 2 anos e genu valgo entre os 2 e 6 anos, com tendência à correção espontânea até os 7 anos.
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Conceito
Os termos genu varo e genu valgo designam alterações no eixo frontal do joelho, resultando em desalinhamento entre o fêmur e a tíbia. No genu varo, os joelhos permanecem afastados mesmo com os maléolos mediais em contato, conferindo o aspecto popularmente conhecido como “pernas arqueadas”. Já no genu valgo, os joelhos se aproximam em excesso, afastando os tornozelos, o que gera o formato em “X”.
Essas alterações são particularmente comuns em pediatria, muitas vezes representando variações fisiológicas do desenvolvimento ósseo. Entretanto, quando persistem além da idade esperada, são assimétricas ou associadas a sintomas, podem indicar patologias subjacentes, como doença de Blount, raquitismo ou displasias esqueléticas.
Desenvolvimento fisiológico do alinhamento dos joelhos
Durante os primeiros anos de vida, o alinhamento dos membros inferiores sofre modificações previsíveis que refletem a maturação óssea e o padrão biomecânico da marcha. Esse processo ocorre em etapas bem estabelecidas:
- Do nascimento até cerca de 2 anos, predomina o genu varo fisiológico, em decorrência da posição intrauterina e da sobreposição dos membros inferiores. Nessa fase, é comum observar a aproximação dos maléolos e o afastamento dos joelhos.
- Dos 2 aos 6 anos, ocorre uma transição para o genu valgo fisiológico, com os joelhos se aproximando e os tornozelos se afastando. Esse padrão tende a se acentuar por volta dos 4 anos.
- A partir dos 7 anos, espera-se uma correção gradual para o alinhamento neutro, mantendo-se uma discreta angulação valgóide em adultos, especialmente nas mulheres, que fisiologicamente apresentam um ângulo Q maior.
Esse desenvolvimento é geralmente simétrico, indolor e autolimitado. Casos que fogem desse padrão, com deformidades acentuadas, assimétricas ou progressivas, devem levantar suspeita de causas patológicas e motivar investigação clínica e radiológica mais detalhada.
Genu Varo
Definição e características clínicas
O genu varo é definido pela angulação medial do joelho, fazendo com que os membros inferiores adotem um aspecto arqueado, com os joelhos afastados mesmo quando os tornozelos se tocam. Essa condição é frequentemente observada entre o nascimento e os 2 anos de idade como parte do desenvolvimento normal, sendo nesse caso considerada fisiológica. No entanto, quando persiste após essa faixa etária ou evolui com assimetria ou agravamento, passa a ser um achado clínico relevante.
Etiologias possíveis
As causas do genu varo podem ser classificadas em fisiológicas, idiopáticas ou secundárias. A forma fisiológica é comum nos primeiros anos de vida e tende a se corrigir espontaneamente. Entre as causas secundárias, destacam-se a doença de Blount (ou tíbia vara), mais frequente em crianças com obesidade ou que iniciam a marcha precocemente, e o raquitismo, que compromete a mineralização óssea. Outras etiologias incluem displasias esqueléticas, infecções como a poliomielite e epifisiodese assimétrica pós-traumática.
Aspectos do exame físico
O exame clínico deve avaliar a simetria da deformidade, a progressão do desalinhamento e sinais associados, como dor, marcha alterada ou deformidades rotacionais. Em casos de Blount, é possível palpar uma proeminência óssea na metáfise medial da tíbia. A medição da distância intercondilar com os tornozelos unidos fornece um parâmetro objetivo da gravidade da deformidade. Desvios progressivos após os 2 anos ou assimetrias marcadas indicam maior probabilidade de etiologia patológica.
Critérios de investigação complementar
A persistência do genu varo após os 2–3 anos deve motivar a realização de radiografias panorâmicas dos membros inferiores em carga, com análise do eixo mecânico, ângulos tibiofemorais e outros parâmetros específicos. Em casos com suspeita de distúrbio metabólico, pode ser necessário solicitar exames laboratoriais, como perfil fosfo-cálcico. Quando a deformidade é acentuada ou há sinais de doença sistêmica, a avaliação ortopédica especializada é indicada.
Potenciais repercussões clínicas
Quando não diagnosticado e acompanhado adequadamente, o genu varo pode evoluir com sobrecarga no compartimento medial do joelho, favorecendo o desenvolvimento de artrose precoce. Além disso, a deformidade pode comprometer a biomecânica da marcha e gerar compensações em outras articulações, como quadril e tornozelo. Em adolescentes atletas, especialmente no futebol, o varismo é frequentemente observado e pode estar associado à sobrecarga crônica na fase de crescimento.
Genu Valgo
Definição e quadro clínico
O genu valgo é caracterizado pela angulação lateral do joelho, em que os côndilos femorais se aproximam e os maléolos se afastam, gerando o aspecto em “X”. Essa configuração é esperada entre os 2 e 6 anos de idade, sendo parte do desenvolvimento fisiológico normal. Após os 7–8 anos, espera-se uma correção espontânea para um alinhamento neutro. A persistência do desalinhamento além dessa idade, especialmente se acentuada, assimétrica ou associada a dor, sugere origem patológica.
Etiologias mais comuns
As causas de genu valgo podem ser idiopáticas ou secundárias. A forma idiopática é mais frequente em adolescentes e, apesar de geralmente simétrica, pode vir acompanhada de dor anterior no joelho, instabilidade patelar e dificuldade na prática de atividades físicas. Entre as causas secundárias, destacam-se doenças metabólicas (como raquitismo e osteodistrofia renal), síndromes genéticas (Down, Marfan), infecções, traumas (como fraturas do platô tibial medial) e displasias esqueléticas.
Achados clínicos no exame físico
A avaliação do genu valgo deve incluir inspeção em pé, com atenção à distância intermaleolar quando os joelhos estão em contato — valores acima de 2 cm em crianças maiores de 7 anos sugerem desvio relevante. Outros achados incluem marcha em circundução, hiperlaxidão ligamentar e sinais de instabilidade patelofemoral. A presença de assimetria, marcha anormal ou queixas funcionais reforça a indicação de investigação mais aprofundada.
Avaliação complementar e critérios de encaminhamento
A radiografia panorâmica dos membros inferiores em carga é essencial na avaliação do genu valgo patológico. Ela permite mensurar ângulos como o fêmoro-tibial lateral distal e o medial proximal da tíbia, além de verificar o eixo mecânico. Em situações com suspeita de doenças metabólicas, exames laboratoriais devem ser incluídos. Crianças entre 6 e 8 anos com genu valgo persistente, especialmente se a DIM for superior a 9 cm ou houver sintomas funcionais, devem ser encaminhadas ao ortopedista.
Implicações biomecânicas e esportivas
O desalinhamento típico do genu valgo desloca a linha de carga para o compartimento lateral do joelho, resultando em sobrecarga sobre os meniscos e cartilagem lateral, além de tração lateral excessiva da patela. Em esportes com alta exigência biomecânica, como futebol e basquete, esse padrão pode predispor à dor femoropatelar, instabilidade crônica e maior risco de lesões ligamentares, especialmente em indivíduos com hiperlaxidão ligamentar associada.
Conduta
Abordagem inicial e vigilância clínica
A primeira etapa da conduta frente ao genu varo ou valgo é diferenciar a variante fisiológica das formas patológicas. Nos casos compatíveis com o padrão normal de desenvolvimento — ou seja, genu varo até os 2 anos e genu valgo entre 2 e 6 anos —, a observação clínica periódica é suficiente. Essas crianças devem ser reavaliadas em consultas regulares com medições objetivas e comparação com parâmetros de idade.
Indicações para encaminhamento especializado
O encaminhamento ao ortopedista é recomendado nas seguintes situações:
- Persistência da deformidade fora da faixa etária esperada;
- Assimetria entre os membros;
- Progressão do desvio ao longo do tempo;
- Deformidades marcantes (DIM > 9 cm ou intercondilar > 6 cm);
- Sintomas funcionais: dor, marcha anormal, instabilidade articular;
- Associação com doenças metabólicas, displasias ou síndromes genéticas.
Esses achados sugerem etiologia secundária ou risco de complicações futuras e devem motivar investigação por imagem e possível intervenção.
Tratamento conservador
Nos casos em que a deformidade é leve, assintomática e não progressiva, especialmente em crianças em crescimento, pode-se adotar uma conduta conservadora. O tratamento da causa de base, quando identificada (como o raquitismo), pode favorecer a regressão da deformidade. Em casos selecionados, fisioterapia e acompanhamento nutricional são úteis, principalmente quando há excesso de peso associado.
O uso de órteses, embora historicamente difundido, não tem evidência de eficácia nos casos fisiológicos. Seu uso é restrito a condições específicas e sempre com acompanhamento especializado.
Indicação cirúrgica
O tratamento cirúrgico está reservado para deformidades persistentes, sintomáticas ou progressivas, especialmente em crianças fora do padrão fisiológico de alinhamento ou em adultos com dor e degeneração articular. As principais técnicas incluem:
- Hemiepifisiodese temporária: bloqueio parcial da fise com placas ou grampos, indicado em crianças com potencial de crescimento e eixo de carga desviado.
- Osteotomia corretiva: utilizada em adolescentes e adultos, visa realinhar o eixo mecânico do membro. No genu varo, realiza-se geralmente osteotomia valgizante da tíbia proximal; no genu valgo, osteotomia varizante do fêmur distal.
A decisão cirúrgica deve considerar o grau da deformidade, presença de artrose, queixas funcionais e potencial de crescimento remanescente.
Seguimento a longo prazo
Mesmo após a correção, é fundamental o acompanhamento contínuo para monitorar o realinhamento, avaliar possíveis recidivas e prevenir sobrecarga articular. Em atletas ou adultos com desvios persistentes, o seguimento ortopédico visa minimizar riscos de lesões degenerativas, como condropatia e osteoartrite precoce.
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Referências Bibliográficas
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- NEVES, M. Cassiano; CAMPAGNOLO, João Lameiras. Desvios axiais dos membros inferiores. Revista Portuguesa de Clínica Geral, v. 25, p. 464–470, 2009.
- PELLEGRINO, Joan; PEKARSKY, Alicia R. Genu varum (bowlegs) and genu valgum (knock-knees). MSD Manual – Professional Edition, 2024.