Resumo de taquiarritmias: diagnóstico, abordagem e muito mais!

Resumo de taquiarritmias: diagnóstico, abordagem e muito mais!

As taquiarritmias são uma das principais emergências cardiológicas que você irá encontrar nos seus plantões. Por isso, confira agora os principais aspectos referentes às taquicardias, que aparecem nos atendimentos e como são cobrados nas provas de residência médica!

Definição da doença

A taquiarritmia é definida como ritmos cardíacos de causa patológica com frequência ventricular igual ou superior a 100 bpm. São causas frequentes de busca por atendimento ambulatorial ou no pronto-socorro.   

São classificadas em taquiarritmias de QRS estreito ou de QRS largo, supraventriculares ou ventriculares, mas também quanto ao seu ritmo em regular e irregular. É importante diferenciar esses grupos no momento da abordagem inicial, pois influencia na conduta. 

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Causas de taquicardias

Principais taquiarritmias de QRS estreito 

  • Taquicardia sinusal 
  • Taquicardia por reentrada nodal ou atrioventricular
  • Taquicardia atrial uni ou multifocal
  • Flutter atrial com ou sem condução aberrante
  • Fibrilação atrial (FA)

Principais taquiarritmias de QRS largo

  • Taquicardia supraventricular ou FA com condução aberrante ou bloqueio de ramo
  • Taquicardia ventricular monomórfica
  • Taquicardia ventricular polimórfica, incluindo torsades de pointes. 
  • Fibrilação ventricular

Veja abaixo os principais ritmos de taquicardia encontrados na sua prática clínica e que caem nas provas de residência médica. 

Taquicardia sinusal. Crédito: ACLS, 2020.
TSV por reentrada nodal. A onda P cai após o complexo na junção do QRS com  a onda T. Crédito: Wikimedia. 
Flutter atrial. Presença de ondas F. Crédito: ACLS, 2020.
1- Fibrilação atrial. 2- Taquicardia ventricular monomórfica. 3- Fibrilação ventricular. Crédito: Wikimedia
Torsades de pointes. Complicações de QT longo. Crédito: Wikipedia 
Taquicardia ventricular polimórfica.  Crédito: Wikimedia

Mecanismos das taquiarritmias 

O coração é composto didaticamente por dois tipos de células, as células miocárdicas, responsáveis pela contração, e as células marcapasso, responsáveis pela geração e condução dos estímulos elétricos. Os tecidos especializados que geram e conduzem impulsos elétricos através do coração, são o nó sinoatrial (nó SA), nó atrioventricular (nó AV), feixe de His e fibras de Purkinje. 

As taquiarritmias são causadas por alterações nesse sistema de condução cardíaco, provocadas por alterações estruturais anatômicas primárias ou por cardiomiopatias isquêmicas, valvares ou infiltrativas, além de intoxicação, alterações hidroeletrolíticas, entre outros. 

1- nó sinoatrial (nó SA)  2- nó atrioventricular (nó AV) 3 – feixe de His esquerdo 10 – feixe de His direito. Crédito: Wikipedia

Dentro das taquicardias de QRS estreito, a taquicardia sinusal é o mais comum, gerada por automaticidade normal aumentada e com causas variadas, como sepse e transtornos de ansiedade. 

O mecanismo de reentrada é a causa com alteração anatômica mais comum. A reentrada forma um circuito anatômico ou funcional a partir de duas vias de condução elétrica distintas ou tecidos com diferentes propriedades eletrofisiológicas que estão ligados. A forma típica conduz anterogradamente pela via lenta e retrogradamente pela via rápida (lenta-rápida). Na taquicardia atrial e juncional ocorre por automaticidade ectópica. 

Crédito: Otávio Ayres da Silva Neto1, Cássia Eliane Kusni. Rev. Fac. Ciênc. Méd. Sorocaba,v.8, n. 4,p.6-17, 2006.

A taquicardia ventricular é a causa mais comum de taquicardia de QRS largos, correspondendo a cerca de 80% de todos os casos. Geralmente ocorrem na presença de doença cardíaca estrutural significativa, por exemplo, infarto do miocárdio prévio, cardiomiopatia dilatada ou cardiomiopatia hipertrófica. 

Menos comumente, TV e FV ocorrem em corações que parecem normais. Em muitos desses casos, no entanto, há doença cardíaca subclínica, incluindo desarranjos dos canais iônicos cardíacos ou proteínas estruturais. 

Manifestações clínicas das taquiarritmias 

A determinação clínica mais importante é saber se o paciente apresenta ou não sinais de instabilidade devido à frequência cardíaca acelerada que impossibilita os ventrículos de encherem completamente, fazendo com que o débito cardíaco para

diminuir. Classicamente, avaliamos instabilidade a partir dos 4 D’s: 

  • Dor torácica (tipo isquêmica)
  • Diminuição da pressão (hipotensão)
  • Diminuição do nível de consciência 
  • Dispneia 

Frequências cardíacas superiores ou iguais a 150 batimentos por minuto geralmente causam sintomas. Os sintomas mais comuns relacionados à taquicardia são palpitações, ansiedade, dor precordial, sensação de peso no pescoço ou no tórax, fadiga e dispnéia.  

No exame físico podemos evidenciar o “sinal de frog” pela estase venosa jugular proeminente devido à contração atrial contra a valva tricúspide fechada. 

Abordagem inicial ao paciente com taquiarritmia 

A abordagem é baseada na presença ou não de sinais de instabilidade e para isso precisamos monitorizar o paciente, através de monitor cardíaco, de pressão arterial e oximetria de pulso. O  tratamento é também baseado na largura do QRS e se o ritmo é  regular ou irregular. 

#Ponto primordial: Se o indivíduo é instável, deve-se prossegur com cardioversão sincronizada imediata. 

Se o paciente não apresentar instabilidade hemodinâmica, uma abordagem não emergente para o diagnóstico do ritmo do paciente pode ser realizada. Um exame minucioso do ECG de 12 derivações deve permitir a identificação correta da arritmia em 80% dos casos. 

Pacientes com taquicardias de QRS estreito regular

1° Passo: realizar manobras vagas inicialmente, que inclui massagem de seios carotídeo, manobra de valsalva convencional e modificada.

A manobra de valsalva modificada consiste em fazer pressão padrão de 40 mmHg pela boca (pode se utilizar o êmbolo da seringa vazia para isto) por 15 segundos na posição semi-reclinada seguida de reposicionamento em decúbito dorsal com 15 segundos de elevação passiva da perna em um ângulo de 45 graus.

#Ponto importante: A manobra de valsalva modificada demonstrou ser mais bem-sucedida na restauração do seio ritmo para pacientes com taquicardia por reentrada nodal, a mais comum causa de taquiarritmia supraventricular. 

Manobra de Valsalva modifica. Crédito: researchgate

2° Passo: Se as manobras vagais forem ineficazes, a terapia farmacológica com um agente bloqueador nodal AV deve ser utilizada. A indicada pelo protocolo ACLS é o uso de  adenosina. Utiliza-se a dose de 6 mg, se nenhuma conversão, faz uma segunda dose com 12 mg. Pode-se tentar uma nova dose de 12 mg. É necessário fazer um flush com 20 ml de Sf 0,9% ou água destilada a cada dose. 

3° Passo: Se a adenosina for ineficaz, procedemos com Bloqueador dos canais de cálcio não dihidropiridínico IV  (verapamil ) ou betabloqueador IV  ( propranolol , metoprolol e esmolol) como agentes de segunda linha. Amiodarona também pode ser considerada. 

4° Passo: Se todas as medidas acima forem ineficazes podemos proceder com cardioversão elétrica sincronizada 50-100J. 

Pacientes com taquicardias de QRS estreito irregular

As taquicardias irregulares do complexo QRS estreito incluem Fibrilação atrial (cerca de 90% dos casos), Flutter atrial com condução irregular, Taquicardia atrial focal com condução variável e Taquicardia atrial multifocal. Elas se apresentam no ECG com onda P ausente ou formas variadas ou, no caso do Flutter atrial, como ondas F. 

Se o paciente tiver sinais de instabilidade hemodinâmica, a cardioversão elétrica urgente deve ser considerada para o paciente. Para pacientes estáveis, a base para abordagem inicial é controle de frequência cardíaca e anticoagulação, pensando principalmente na fibrilação atrial.

No pacientes estáveis, para controle de frequência são preferíveis com agentes de primeira linha os betabloqueadores e bloqueadores dos canais de cálcio não dihidropiridínicos. Para pacientes com FA com menos de 48 horas de duração nos quais a cardioversão química ou elétrica está planejada, pode-se considerar o uso de terapia antitrombótica com heparina não-fracionada ou heparina de baixo peso molecular antes da cardioversão para reduzir o risco de embolização. 

Para pacientes estáveis com FA com mais de 48 horas de duração ou duração desconhecida é recomendado pelo menos 03 semanas de anticoagulação oral antes da cardioversão, em oposição à cardioversão imediata. 

A triagem baseada em ecocardiografia transesofágica (ETE) para a presença de trombos atriais é recomendada se a cardioversão for desejada antes das 03 semanas. A anticoagulação deve ser continuada por um mínimo de quatro semanas após a cardioversão.

#Ponto importante: Para pacientes com FA de início recente que estão hemodinamicamente estáveis ​​(com apenas sintomas leves a moderados) e cuja frequência é ou foi controlada, uma decisão precisa ser tomada em relação ao benefício potencial de restaurar o ritmo sinusal. 

Mas quem devemos cardioverter no contexto da emergência?

Podemos cardioverter pacientes jovens, em primeiro episódio confirmado de fibrilação atrial, com menos de 48 horas de duração, sintomáticos, sem alterações estruturais de átrio esquerdo ou insuficiência cardíaca e quadros de FA de causa conhecida e reversível. 

Temos duas drogas disponíveis para cardioversão química no Brasil, a propafenona e a amiodarona. A primeira só é comercializada via oral e não pode ser utilizada em pacientes com função sistólica prejudicada ou desconhecida. A amiodarona é droga de escolha nesses casos, mas é uma droga com bastante toxicidade. 

  • Propafenona: Dose de ataque 600mg; manutenção: até 600mg/dia; 
  • Amiodarona:
    • Dose de ataque: 300mg + SG5% 100ml, correr em 30 min. 
    • Manutenção:  300mg + SG5% 100ml, correr em 30 min. 

#Ponto importante: Para os pacientes selecionados (sem cardiopatia estrutural ou isquemia e com poucos episódios de FA de alta resposta por ano) que receberam terapia com propafenona em ambiente hospitalar e tiveram ritmo restaurado, pode se tentar a estratégia da “Pílula do bolso”. Esta estratégia consiste na tomada de dose única via oral de propafenona 450-600mg em ambiente domiciliar para reversão química da FA em pacientes que abrirem sintomas. Deve-se usar Betabloqueador ou BCC até trinta minutos antes da dose da propafenona para se evitar alta resposta ventricular de rebote. 

Pacientes estáveis com QRS largo regular

As taquicardias regulares do complexo QRS largo incluem Taquicardia ventricular (TV) monomórfica, Taquicardia supraventricular com condução aberrante ou resposta ventricular estimulada. 

A cardioversão elétrica sincronizada, após sedação adequada, como terapia inicial para a maioria dos pacientes com TV estável. Em pacientes com taquicardia de complexo largo refratário ou recorrente, deve ser utilizado medicamento antiarrítmico classe I ou III intravenoso, como amiodarona, lidocaína ou procainamida. 

Pacientes estáveis com QRS largo irregular

As taquicardias irregulares do complexo QRS largo são a TV polimórfica, incluindo torsades de pointes, taquicardias supraventriculares irregulares de complexo estreito com condução aberrante, como FA pré-excitada ou FA com bloqueio de ramo direito, e Fibrilação ventricular (FV).

A TV polimórfica é geralmente um ritmo rápido e hemodinamicamente instável, e a desfibrilação urgente geralmente é necessária. Além da desfibrilação imediata, a terapia adicional destina-se a tratar distúrbios subjacentes e prevenir recorrências. 

#Ponto importante: Não se faz cardioversão sincronizada na TV polimórfica, pela impossibilidade do cardioversor identificar o complexo QRS. 

A desfibrilação imediata é indicada também em pacientes com torsades de pointes hemodinamicamente instáveis. Nos pacientes com torsade de points, sulfato de magnésio, dose inicial de 1 a 2 gramas IV durante 15 minutos, pode ser seguido por uma infusão contínua é a terapia de primeira linha, pois é altamente eficaz tanto para o tratamento quanto para a prevenção da recorrência de batimentos ectópicos ventriculares relacionados ao QT longo que desencadeiam torsades de pointes. 

A FV é encontrada, via de regra, em pacientes sem pulso e devem ser tratados de acordo com o algoritmo de suporte de vida cardíaco adulto. Lembrando que dentro dos ritmos de parada cardiorrespiratória, o que mais influencia no prognóstico da FV é a desfibrilação precoce associada a massagem cardíaca de alta qualidade. 

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Veja também:

Referências bibliográficas:

  • ACLS Suporte Avançado de Vida em Cardiologia – Aehlert, 2020. 
  • Overview of the acute management of tachyarrhythmias. Uptodate, 2022. 
  • Otávio Ayres da Silva Neto; Cássia Eliane Kusni. TAQUICARDIA SUPRAVENTRICULAR: DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO. Rev. Fac. Ciênc. Méd. Sorocaba,v.8, n. 4,p.6-17, 2006. 
  • Crédito da imagem em destaque: Pixabay.
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