E aí, doc! Vamos explorar mais um tema essencial? Hoje o foco é a dermatose neutrofílica febril aguda, também conhecida como síndrome de Sweet, uma condição rara caracterizada por febre, lesões cutâneas dolorosas e infiltrado rico em neutrófilos na derme, frequentemente associada a infecções, neoplasias ou uso de certos medicamentos.
O Estratégia MED está aqui para descomplicar esse conceito e ajudar você a aprofundar seus conhecimentos, promovendo uma prática clínica cada vez mais eficaz e segura.
Vamos nessa!
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Definição de Dermatose neutrofílica febril aguda
A dermatose neutrofílica febril aguda, também conhecida como síndrome de Sweet ou doença de Gomm-Button, é uma enfermidade cutânea inflamatória rara que apresenta predomínio em mulheres e tem início mais frequente entre a terceira e a sexta décadas de vida.
Caracteriza-se, do ponto de vista histopatológico, por um infiltrado dérmico denso composto predominantemente por neutrófilos, sem evidência de vasculite verdadeira. Sua etiologia é multifatorial e frequentemente associada a condições subjacentes, como infecções bacterianas ou virais, neoplasias hematológicas e sólidas, doenças inflamatórias intestinais, patologias autoimunes, gestação e reações a determinados fármacos.
Embora possa ocorrer de forma idiopática, a presença dessas associações clínicas reforça a importância de uma investigação minuciosa para identificação de possíveis causas ou fatores desencadeantes.
Classificação da Dermatose Neutrofílica Febril Aguda
A classificação da dermatose neutrofílica febril aguda, ou síndrome de Sweet, baseia-se na etiologia e é dividida em três subtipos principais: síndrome de Sweet clássica, síndrome de Sweet associada a malignidades e síndrome de Sweet induzida por fármacos.
Síndrome de Sweet clássica (idiopática)
Corresponde à maioria dos casos e é definida pela presença dos critérios diagnósticos sem relação com neoplasias ou uso de medicamentos.
- Associações frequentes:
- Infecções do trato respiratório superior ou gastrointestinal (geralmente surgindo 1 a 3 semanas após o quadro infeccioso).
- Doença inflamatória intestinal (doença de Crohn e retocolite ulcerativa).
- Gravidez.
- Associações menos comuns e ainda não totalmente estabelecidas:
- Infecção pelo HIV, tuberculose, clamídia e hepatites virais.
- Imunodeficiências primárias.
- Doenças autoimunes (lúpus eritematoso sistêmico, dermatomiosite, artrite reumatoide, síndrome de Behçet, policondrite recidivante, sarcoidose, tireoidite autoimune).
- Síndrome VEXAS, condição autoinflamatória descrita em homens adultos, frequentemente com manifestações cutâneas do tipo Sweet, além de condrite auricular e nasal, vasculite cutânea e angioedema periorbital.
Síndrome de Sweet associada a malignidades
Representa uma parcela relevante dos casos e pode surgir antes, durante ou após o diagnóstico do câncer, podendo indicar recorrência tumoral.
- Tipo de neoplasia mais associada: neoplasias hematológicas, especialmente leucemia mieloide aguda (LMA), seguida por síndromes mielodisplásicas e neoplasias mieloproliferativas.
- Tumores sólidos relacionados: carcinomas de órgãos geniturinários, mama e trato gastrointestinal.
- Fatores de risco para associação com malignidade: idade avançada, anemia, trombocitopenia, leucopenia e ausência de artralgia.
- Aspectos histológicos de maior risco: variantes histiocitoide e subcutânea, que apresentam maior frequência de associação com neoplasias hematológicas, particularmente a síndrome mielodisplásica.
Síndrome de Sweet induzida por fármacos
Pode ser desencadeada por diversos medicamentos.
- Fármaco mais frequentemente implicado: fator estimulador de colônias de granulócitos (G-CSF).
- Outros agentes: imunoterapias com inibidores de checkpoint (ex.: ipilimumabe), entre outros listados na literatura.
- Padrão temporal: costuma surgir cerca de duas semanas após a primeira exposição ao fármaco em pacientes sem contato prévio e tende a recidivar com a reexposição.
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Fisiopatologia da Dermatose Neutrofílica Febril Aguda
A fisiopatologia da dermatose neutrofílica febril aguda (síndrome de Sweet) ainda não está totalmente esclarecida, mas envolve múltiplos mecanismos propostos, incluindo reações de hipersensibilidade, desregulação de citocinas e fatores genéticos.
- Reação de hipersensibilidade: Acredita-se que a síndrome possa resultar de uma resposta imunológica a antígenos bacterianos, virais, neoplásicos ou de outra natureza. Essa resposta leva à produção de citocinas que estimulam a ativação e infiltração de neutrófilos nos tecidos. A hipótese é reforçada pela boa resposta ao uso de glicocorticoides sistêmicos e pela melhora observada após o tratamento de infecções ou neoplasias associadas.
- Desregulação de citocinas: Há evidências de que alterações na secreção de citocinas pró-inflamatórias, como interleucinas 1, 3, 6 e 8 (IL-1, IL-3, IL-6, IL-8), fator estimulador de colônias de granulócitos (G-CSF), fator estimulador de colônias de granulócitos e macrófagos (GM-CSF) e interferon-gama, desempenham papel central na doença. Essa desregulação pode provocar disfunção na apoptose de neutrófilos e aumento da sua proliferação e migração. Alterações na regulação transcricional da proteína tirosina fosfatase não receptora tipo 6 (PTPN6) também foram relacionadas à patogênese das dermatoses neutrofílicas. Em indivíduos geneticamente predispostos, esses desequilíbrios favorecem a produção e liberação exagerada de neutrófilos, com consequente infiltração cutânea.
- Papel do G-CSF: O G-CSF é produzido por diversos tecidos, incluindo endotélio e macrófagos, e sua produção pode estar aumentada em várias neoplasias. Níveis elevados dessa citocina ou maior sensibilidade celular aos seus níveis normais são considerados um possível mecanismo unificador das diferentes variantes da doença.
- Fatores genéticos: Foram identificados defeitos no controle transcricional do gene PTPN6 e mutações no gene MEFV, associado à febre familiar do Mediterrâneo, como possíveis contribuintes para o desenvolvimento da síndrome. Em populações japonesas, observou-se associação com o alelo HLA-B54.
- Outros achados: Em alguns pacientes, detectaram-se anticorpos contra antígenos citoplasmáticos de neutrófilos, embora seu papel na patogênese ainda não esteja definido.
Manifestações clínicas da Dermatose Neutrofílica Febril Aguda
As manifestações clínicas da dermatose neutrofílica febril aguda (síndrome de Sweet) abrangem sintomas sistêmicos, lesões cutâneas características, variantes de apresentação, e acometimento extracutâneo, podendo envolver múltiplos órgãos.
Sintomas sistêmicos
O termo febril no nome da doença se refere à ocorrência de temperatura acima de 38 °C. A febre é comum, especialmente nos casos induzidos por fármacos, mas pode estar ausente em 10% a 20% dos pacientes com formas clássica ou associada a malignidade. Outros sintomas gerais incluem:
- Mal-estar
- Artralgias
- Mialgias
- Cefaleia
Lesões cutâneas clássicas
O quadro típico é formado por pápulas, nódulos e placas eritematosas, dolorosas e não pruriginosas, localizadas preferencialmente na face, pescoço e parte superior do tronco. Essas placas frequentemente apresentam múltiplas pápulas translúcidas agrupadas, que simulam vesículas (pseudo-vesículas) ou pústulas (pseudo-pústulas), conferindo aspecto mamelonado.
- Pode ocorrer ulceração superficial, lembrando pioderma gangrenoso.
- Lesões em membros inferiores podem se assemelhar ao eritema nodoso, sendo diferenciadas histopatologicamente.
Sintomas locais relatados: dor, sensibilidade aumentada ou sensação de queimação.
Variantes cutâneas menos comuns
Dermatose neutrofílica das mãos: pápulas e nódulos violáceos ou hemorrágicos, bolhas e vesículas no dorso das mãos, com maior associação a malignidades.
Síndrome de Sweet subcutânea: lesões semelhantes a eritema nodoso, mas com infiltração neutrofílica no tecido adiposo subcutâneo.
Síndrome de Sweet bolhosa: vesículas e bolhas flácidas, podendo evoluir para ulceração tipo pioderma gangrenoso; associada a neoplasias hematológicas.
Síndrome de Sweet necrosante: quadro grave que imita fasciíte necrosante.
- Sweet gigante tipo celulite (giant cellulitis-like): placas inflamatórias extensas e infiltradas, com ou sem bolhas.
- Fenômeno de patergia: surgimento de lesão após trauma mínimo local.
Manifestações orais
Pouco frequentes na forma clássica, mas presentes em cerca de 12% dos casos associados a neoplasias hematológicas. Podem incluir:
- Úlceras na mucosa jugal ou língua (mais comuns)
- Bolhas, vesículas
- Hiperplasia gengival
- Periodontite ulcerativa necrosante
- Pápulas, pústulas, nódulos
- Edema de língua
Acometimento extracutâneo
A infiltração neutrofílica pode ocorrer em múltiplos órgãos:
- Ocular: conjuntivite, episclerite, esclerite, nódulos límbicos, ceratite ulcerativa periférica, irite, glaucoma, dacrioadenite, coroidite (presentes em 17%–72% dos casos clássicos).
- Musculoesquelético: artralgias, artrite, mialgias.
- Sistema nervoso central: encefalite, meningite asséptica.
- Pulmonar: alveolite neutrofílica, derrame pleural, obstrução de vias aéreas.
- Cardiovascular: miocardite, aortite, estenose aórtica, oclusão coronariana.
- Hepático: hepatite, hepatomegalia.
- Gastrointestinal: inflamação neutrofílica intestinal.
- Esplênico: esplenomegalia.
- Renal: glomerulonefrite mesangial, hematúria, proteinúria.
- Ósseo: osteomielite estéril.
Diagnóstico de Dermatose Neutrofílica Febril Aguda
O diagnóstico da dermatose neutrofílica febril aguda (síndrome de Sweet) é clínico-patológico, baseando-se em critérios propostos por Su e Liu, exames complementares e exclusão de outras condições.
Segundo Su e Liu, é necessário que ambos os critérios maiores estejam presentes e, adicionalmente, pelo menos dois critérios menores.
Critérios maiores
- Início abrupto de lesões cutâneas típicas.
- Histopatologia compatível com síndrome de Sweet (infiltrado dérmico denso de neutrófilos sem vasculite verdadeira).
Critérios menores
- Presença de uma condição associada: infecção ou vacinação recente, neoplasia, uso de medicamentos específicos ou gestação.
- Febre > 38 °C.
- Três das quatro alterações laboratoriais:
- Velocidade de hemossedimentação (VHS) > 20 mm/h
- Leucócitos > 8.000/mm³
- Neutrófilos > 70%
- Proteína C-reativa (PCR) elevada
- Resposta rápida a corticosteroides sistêmicos ou iodeto de potássio.
Exames essenciais
- Biópsia de pele (confirma achados histopatológicos).
- Hemograma completo (pesquisa de leucocitose e neutrofilia).
- VHS e PCR.
- Função hepática e renal.
Exames adicionais
Podem ser solicitados para investigação de condições associadas ou diagnósticos diferenciais:
- Função tireoidiana.
- Fator reumatoide.
- Títulos de anticorpos anti-estreptolisina O.
- Exames de urina e painel metabólico completo (avaliação de envolvimento sistêmico).
Achados laboratoriais comuns
- Leucocitose com neutrofilia: muito frequente nas formas clássica e nas associadas a neoplasias ou fármacos.
- Anemia e alterações plaquetárias: mais comuns em casos relacionados a câncer ou medicamentos, raras na forma clássica.
- Alterações metabólicas ou urinárias podem sugerir acometimento hepático ou renal.
Investigação de neoplasias ocultas
Indicada apenas quando há suspeita clínica (p. ex., perda de peso inexplicada) e ausência de outra causa evidente. Inclui:
- Exame físico completo de linfonodos, mamas e pelve (mulheres), próstata e testículos (homens).
- Sigmoidoscopia.
- PET scan.
Tratamento da Dermatose Neutrofílica Febril Aguda
O tratamento da dermatose neutrofílica febril aguda (síndrome de Sweet) tem como objetivo principal controlar a inflamação e reduzir a duração das lesões, com destaque para o uso de corticosteroides sistêmicos, que constituem a primeira linha terapêutica. A escolha do tratamento depende da extensão da doença, da presença de sintomas sistêmicos e das comorbidades do paciente.
Corticoterapia sistêmica (primeira escolha)
- É a base do tratamento devido à resposta rápida e eficaz.
- Prednisona oral: 0,5 a 1 mg/kg/dia.
- Melhora clínica em 48 horas.
- Lesões cutâneas geralmente desaparecem em 1 a 2 semanas.
- Após o controle, recomenda-se desmame gradual em 4 a 6 semanas.
- Também eficaz nas manifestações extracutâneas.
- Em casos graves ou refratários, pode-se utilizar pulsoterapia com metilprednisolona intravenosa (500–1000 mg/dia por 3 a 5 dias), seguida de desmame oral ou introdução de outro imunossupressor.
Corticoterapia tópica e intralesional
- Indicada para pacientes com poucas lesões cutâneas (<5% da superfície corporal) e sem sintomas sistêmicos.
- Corticosteroides tópicos de alta potência (ex.: clobetasol 0,05%), aplicados 2 vezes ao dia por 2 a 3 semanas.
- Pode-se associar oclusão para acelerar a resposta.
- Injeções intralesionais de corticosteroides são úteis em placas espessas resistentes ao tratamento tópico.
Terapias alternativas de primeira linha (quando se evita corticoide sistêmico)
- Indicadas quando há contraindicação ou necessidade de reduzir a exposição prolongada a corticosteroides.
- Principais opções:
- Colchicina: 0,5 mg, 3 vezes ao dia.
- Dapsona: 50–100 mg/dia (necessário avaliar atividade da G6PD antes do início).
- Iodeto de potássio (KI): 300 mg, 3 vezes ao dia.
- Podem ser usadas isoladamente ou em combinação com doses baixas de corticosteroides.
Agentes de segunda linha / poupadores de corticoide
- Usados quando não há remissão em até 3 meses ou em casos refratários.
- Incluem: ciclosporina, ciclofosfamida, talidomida, clofazimina, imunoglobulina intravenosa, antagonistas de TNF-α.
Novas terapias e casos refratários
- Relatos recentes sugerem eficácia de:
- Rituximabe, adalimumabe, infliximabe, tocilizumabe, ustekinumabe.
- Inibidor de JAK (baricitinibe).
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Referências
Joseph F Merola, MD, MMSc, FAAD, FACR. Sweet syndrome (acute febrile neutrophilic dermatosis): Pathogenesis, clinical manifestations, and diagnosis. UpToDate, 2024. Disponível em: UpToDate
Joseph F Merola, MD, MMSc, FAAD, FACR. Sweet syndrome (acute febrile neutrophilic dermatosis): Management and prognosis. UpToDate, 2024. Disponível em: UpToDate
Majmundar VD, Saleh HM, Baxi K. Acute Febrile Neutrophilic Dermatosis. [Updated 2024 Feb 1]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2025 Jan-. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK559142/