E aí, doc! Vamos explorar mais um tema essencial? Hoje o foco é a Embolia Séptica, uma condição grave caracterizada pela disseminação de êmbolos infectados pela corrente sanguínea, geralmente originados de focos como endocardite infecciosa, cateteres contaminados ou infecções profundas.
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Definição de Embolia Séptica
A embolia séptica é uma condição caracterizada pela obstrução vascular causada por um trombo infectado que se desprende de um foco infeccioso primário e se dissemina pela corrente sanguínea até um local distante.
Esse processo resulta em um duplo mecanismo fisiopatológico, envolvendo isquemia decorrente da oclusão do vaso e um insulto infeccioso associado, que pode evoluir com inflamação local, infarto tecidual e formação de abscessos.
A etiologia mais frequente da embolia séptica é a endocardite infecciosa, embora outros focos infecciosos também possam estar envolvidos. Trata-se de uma condição potencialmente grave, com manifestações clínicas variadas conforme o órgão acometido, exigindo reconhecimento e manejo precoces para redução da morbimortalidade.
Etiologia da Embolia Séptica
A embolia séptica tem como principal causa a endocardite infecciosa, na qual fragmentos de vegetações valvares contaminadas se desprendem e embolizam para diferentes territórios vasculares, com manifestações clínicas dependentes do tamanho e da localização do êmbolo. Historicamente, também esteve associada à tromboflebite pélvica séptica, especialmente em contextos de aborto séptico e infecções puerperais, situação hoje menos frequente.
Atualmente, os principais fatores de risco incluem o uso de drogas intravenosas, a presença de cateteres vasculares de longa permanência e dispositivos cardiovasculares protéticos, como próteses valvares, marcapassos, cardiodesfibriladores e cateteres para hemodiálise. A embolização ocorre a partir do foco infeccioso primário, seguindo a drenagem venosa ou arterial correspondente.
Os microrganismos mais comumente envolvidos são Staphylococcus aureus, estafilococos coagulase-negativos, estreptococos do grupo viridans e enterococos, além de infecções polimicrobianas. Bacilos gram-negativos são menos frequentes, e agentes fúngicos, como Candida e Aspergillus, podem estar implicados, especialmente em pacientes imunossuprimidos ou com dispositivos invasivos.
Eventos embólicos são frequentes na endocardite infecciosa, com destaque para acometimento do sistema nervoso central. Outras fontes descritas incluem abscessos hepáticos, infecções orbitárias complicadas, tromboses sépticas associadas a cateteres venosos centrais e trombos intracardíacos.
Em situações específicas, pode ocorrer embolização paradoxal, quando material infectado do coração direito alcança a circulação sistêmica por meio de um shunt intracardíaco, como o forame oval patente.
Fisiopatologia da Embolia Séptica
A embolia séptica se origina de um foco infeccioso associado à bacteremia, no qual microrganismos se depositam em áreas vasculares vulneráveis, como vegetações valvares, dispositivos cardíacos implantáveis, cateteres ou enxertos intravasculares. Fragmentos dessas estruturas infectadas podem se desprender e embolizar para sítios distantes pela circulação.
O êmbolo séptico causa um duplo insulto fisiopatológico: obstrução vascular com isquemia e possível infarto, associada à inoculação local de microrganismos, que desencadeia inflamação, infecção ativa e formação de abscessos.
Na endocardite direita, a embolização ocorre predominantemente para a circulação pulmonar, resultando em embolia pulmonar séptica. Na endocardite esquerda, os êmbolos atingem com maior frequência a circulação sistêmica, especialmente o sistema nervoso central, causando acidente vascular cerebral isquêmico. Em pacientes com forame oval patente, pode ocorrer embolização paradoxal, permitindo a passagem de êmbolos do coração direito para a circulação arterial.
No sistema nervoso central, a embolia séptica pode evoluir com infarto cerebral, abscesso encefálico ou aneurisma micótico. A evolução clínica depende da virulência do patógeno, sendo agentes como Staphylococcus aureus associados a lesões mais agressivas e de rápida progressão, enquanto estreptococos tendem a causar processos mais indolentes. Além do cérebro, pulmões, rins, baço e pele podem ser acometidos, refletindo a complexa interação entre isquemia, infecção e resposta inflamatória do hospedeiro.
Manifestações clínicas da Embolia Séptica
A embolia séptica apresenta um espectro clínico amplo, variando de formas assintomáticas até quadros graves e potencialmente fatais. Devido à heterogeneidade das apresentações, é fundamental manter alto grau de suspeição, especialmente em pacientes com dispositivos endovasculares, cateteres vasculares recentes ou bacteremia persistente, grupos com maior risco de infecção endovascular e complicações embólicas.
As manifestações clínicas dependem do foco infeccioso primário e do território vascular acometido. A embolização pode ocorrer tanto para a circulação pulmonar quanto para a sistêmica, produzindo síndromes clínicas específicas conforme o órgão afetado.
Sistema Pulmonar
Na endocardite infecciosa direita, os êmbolos atingem preferencialmente a circulação pulmonar, causando embolia pulmonar séptica. Os principais sintomas incluem febre, dispneia, dor torácica pleurítica, tosse e, ocasionalmente, hemoptise.
Sistema Nervoso Central
A embolização cerebral é frequente na endocardite esquerda e pode resultar em acidente vascular cerebral isquêmico, déficits neurológicos focais, abscesso cerebral ou aneurisma micótico. Ressalta-se que muitos eventos embólicos cerebrais podem ser clinicamente silenciosos, sendo detectados apenas por exames de imagem, especialmente a ressonância magnética.
Sistema Cardiovascular
A embolização séptica das artérias coronárias, embora rara, pode ocorrer principalmente na endocardite da valva aórtica, simulando uma síndrome coronariana aguda e exigindo diagnóstico e intervenção rápidos para evitar desfechos fatais.
Sistema Gastrointestinal e Mesentérico
Êmbolos sépticos podem acometer a circulação mesentérica, levando à isquemia intestinal, infarto, formação de aneurismas micóticos e necessidade de ressecção intestinal. O quadro pode estar associado à endocardite mitral ou a infecções intra-abdominais complicadas.
Fígado e Baço
O baço é o órgão abdominal mais frequentemente acometido por embolização sistêmica, podendo evoluir com infarto esplênico, hemorragia ou abscesso. A pioflebitite, caracterizada por trombose séptica da veia porta, surge a partir de infecções intra-abdominais como colangite ou diverticulite, manifestando-se com febre e dor abdominal inespecífica. Abscessos hepáticos piogênicos também podem cursar com disseminação hematogênica e embolização séptica à distância.
Extremidades e Pele
A embolia séptica das extremidades geralmente se manifesta como isquemia aguda de membros, com gravidade variável, desde quadros transitórios até necrose extensa com necessidade de amputação. Na pele, as manifestações típicas incluem lesões de Janeway, nódulos de Osler e hemorragias em estilhaço, achados clássicos da endocardite infecciosa.
Trato Orofaringeano
A síndrome de Lemierre é uma causa específica de embolização séptica, caracterizada por infecção orofaríngea por Fusobacterium necrophorum, seguida de tromboflebite séptica da veia jugular interna e disseminação hematogênica, com acometimento predominante de pulmões e fígado.
Sistema Renal
Os êmbolos sépticos renais podem causar infarto renal, hemorragia ou abscesso, podendo evoluir para insuficiência renal quando há comprometimento significativo do parênquima.
Diagnóstico de Embolia Séptica
O diagnóstico da embolia séptica exige uma abordagem abrangente, que integra suspeição clínica com exames laboratoriais e métodos de imagem direcionados. Essa avaliação deve ser guiada pelo provável foco infeccioso, pela presença de bacteremia persistente e pelos territórios vasculares potencialmente acometidos.
Avaliação Laboratorial
A investigação inicial baseia-se na coleta de hemoculturas, fundamentais para a identificação do agente etiológico e para o direcionamento da terapia antimicrobiana. A positividade persistente das hemoculturas, apesar do tratamento adequado, sugere infecção endovascular ativa e maior risco de complicações embólicas.
Exames complementares, como hemograma, marcadores inflamatórios, incluindo proteína C-reativa, velocidade de hemossedimentação e procalcitonina, além de testes de função renal e hepática, auxiliam na avaliação da gravidade sistêmica e no monitoramento da resposta terapêutica.
Métodos de Imagem
Os exames de imagem são essenciais para confirmar a presença de êmbolos sépticos e identificar sua localização. Estudos vasculares com ultrassonografia Doppler arterial e venosa são úteis na detecção de embolias arteriais e tromboflebites sépticas.
A ecocardiografia ocupa papel central na investigação, sendo a ecocardiografia transesofágica o método de escolha, devido à maior sensibilidade em relação à ecocardiografia transtorácica para identificar vegetações valvares, abscessos e comprometimento de próteses cardíacas.
Na suspeita de embolia pulmonar séptica, a radiografia de tórax pode mostrar achados inespecíficos, enquanto a tomografia computadorizada de tórax com contraste é o exame diagnóstico de escolha, evidenciando nódulos periféricos múltiplos, com ou sem cavitação. Quando o uso de contraste é contraindicado, a cintilografia de ventilação e perfusão pode ser utilizada como alternativa.
A ultrassonografia abdominal pode identificar lesões hipoecoicas em órgãos sólidos, como baço e rins, porém a tomografia computadorizada abdominal é recomendada de forma rotineira, especialmente em pacientes com endocardite infecciosa, devido à alta frequência de embolização esplênica.
Para avaliação do sistema nervoso central, a ressonância magnética com e sem gadolínio é o método preferencial para diagnosticar embolias cerebrais sépticas. Técnicas avançadas, como a tomografia por emissão de pósitrons associada à tomografia computadorizada com 18F-fluordesoxiglicose, têm demonstrado elevado valor diagnóstico na detecção de êmbolos periféricos, particularmente em pacientes com endocardite infecciosa e infecções associadas a dispositivos cardíacos.
Tratamento da Embolia Séptica
O manejo da embolia séptica deve ser estruturado e individualizado, tendo como objetivos principais erradicar o foco infeccioso, prevenir novas embolizações e tratar as complicações isquêmicas e infecciosas associadas.
Antibioticoterapia
A antibioticoterapia prolongada constitui a base do tratamento. O esquema deve ser guiado pelo agente etiológico identificado nas hemoculturas, pelo local de embolização e pelas propriedades farmacocinéticas e farmacodinâmicas dos antimicrobianos.
Nos casos associados à endocardite infecciosa, recomenda-se tratamento intravenoso por 4 a 6 semanas, conforme diretrizes vigentes. Ajustes terapêuticos devem ser realizados de acordo com a resposta clínica, microbiológica e laboratorial.
Controle do foco infeccioso
O controle da fonte é essencial para interromper a bacteremia persistente e prevenir novas embolizações. Isso inclui a remoção de cateteres infectados, a extração de dispositivos cardíacos implantáveis quando indicados e a abordagem cirúrgica de vegetações valvares ou focos infecciosos refratários ao tratamento clínico.
Anticoagulação
O uso de anticoagulação permanece controverso. De modo geral, recomenda-se manter a anticoagulação apenas em pacientes com indicação prévia estabelecida, especialmente na endocardite esquerda, desde que não haja contraindicações, como sangramento ativo ou risco elevado de hemorragia intracraniana.
Tratamento Cirúrgico e Intervencionista
A intervenção cirúrgica precoce pode ser decisiva em pacientes com endocardite infecciosa grave, instabilidade clínica, falha do tratamento antimicrobiano ou complicações embólicas recorrentes. Quando realizada nos primeiros dias após o diagnóstico, associa-se à melhora dos desfechos clínicos.
Procedimentos endovasculares para tratamento de eventos isquêmicos secundários à embolia séptica são considerados caso a caso, pois ainda não há diretrizes consolidadas que sustentem sua aplicação rotineira.
Manejo das Complicações Específicas
- Abscessos esplênicos: geralmente tratados com esplenectomia ou drenagem percutânea guiada por imagem, embora o tratamento conservador com antibióticos possa ser considerado em casos selecionados;
- Infecções de dispositivos cardíacos implantáveis: indicam, na maioria dos casos, extração transvenosa completa do sistema;
- Aneurismas micóticos: requerem abordagem cirúrgica com ressecção do aneurisma, remoção de trombos infectados e, quando necessário, correção simultânea da valva cardíaca infectada.
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Referências
Elsaghir H, Al Khalili Y. Septic Emboli. [Updated 2025 Sep 14]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2025 Jan-. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK549827/
Daniel J Sexton, MD. Complications and outcome of infective endocarditis. UpToDate, 2025. Disponível em: UpToDate



