Resumo sobre Encefalopatia Urêmica: definição, manifestações clínicas e mais!
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Resumo sobre Encefalopatia Urêmica: definição, manifestações clínicas e mais!

E aí, doc! Que tal mergulhar em mais um tema essencial para a prática médica? Hoje o foco é a Encefalopatia Urêmica, uma complicação neurológica grave decorrente da insuficiência renal, marcada por alterações cognitivas, motoras e comportamentais.

O Estratégia MED está aqui para facilitar a sua compreensão sobre esse quadro, abordando os principais mecanismos envolvidos, manifestações clínicas e condutas terapêuticas, sempre com foco na excelência do atendimento ao paciente. Vamos juntos nessa?

Definição de Encefalopatia Urêmica

Encefalopatia urêmica é uma disfunção cerebral causada pelo acúmulo de toxinas resultante da insuficiência renal aguda ou crônica, geralmente ocorrendo em pacientes com taxa de filtração glomerular estimada inferior a 15 mL/min. 

Caracteriza-se por um quadro clínico variável, que pode evoluir de forma sutil até manifestações graves, com progressão inevitável se não tratada. Sua fisiopatologia envolve alterações no metabolismo hormonal, retenção de solutos urêmicos, distúrbios hidroeletrolíticos e ácido-base, alterações na barreira hematoencefálica, disfunção vascular e processos inflamatórios. 

O diagnóstico é desafiador, sendo frequentemente realizado de forma retrospectiva após melhora dos sintomas com a terapia renal substitutiva, que representa o tratamento indicado e pode reverter, ao menos parcialmente, o quadro.

Etiologia da Encefalopatia Urêmica

O acúmulo de toxinas pode ocorrer em pacientes com lesão renal aguda que, por diferentes motivos, não conseguem eliminar adequadamente os solutos, seja pela falência na resposta ao tratamento, seja pela impossibilidade de realizar terapia renal substitutiva. 

Entre as causas comuns desse acúmulo estão o uso de fármacos nefrotóxicos, exposição a toxinas, hipotensão prolongada, desidratação, sepse e perdas sanguíneas. Em pacientes com DRC, episódios agudos como infecções, uso inadequado de medicamentos ou distúrbios hidroeletrolíticos provocados por vômitos ou diarreia, podem precipitar a encefalopatia urêmica. 

Além disso, indivíduos em hemodiálise correm risco de desenvolver a síndrome quando recebem tratamento inadequado, seja por não adesão à terapia, seja por disfunção da fístula arteriovenosa.

Fisiopatologia da Encefalopatia Urêmica

A fisiopatologia da encefalopatia urêmica envolve principalmente o acúmulo de diversas neurotoxinas devido à falência renal, como ureia, sulfato de indoxila, compostos guanidínicos, ácidos indólicos, fenóis e lanthionina. Essas substâncias, classificadas em solúveis em água, ligadas a proteínas e moléculas médias, contribuem para a disfunção cerebral.

Não há um mecanismo único, mas três processos principais explicam a síndrome: desequilíbrio entre neurotransmissores inibitórios e excitatórios, degeneração neuronal e inflamação vascular. A hipótese mais aceita sugere aumento de glicina e redução de glutamina e GABA, além de acúmulo de compostos guanidínicos que ativam receptores NMDA (excitadores) e inibem receptores GABA (inibitórios), promovendo hiperexcitabilidade neuronal.

Estudos recentes destacam a disfunção endotelial vascular como contribuinte importante para a deterioração cognitiva. O estresse oxidativo desempenha um papel central: toxinas como ácido úrico, sulfato de indoxila e metilguanidina estimulam neurônios presimpáticos da medula rostral ventrolateral (RVLM), aumentando sua atividade, revertida pelo uso de antioxidantes, o que confirma a participação de espécies reativas de oxigênio (ROS).

A disfunção mitocondrial é fundamental nesse processo: o metabolismo alterado do paciente urêmico reduz a eficiência das vias energéticas dependentes de ATP, favorece a geração de ROS e perpetua um ciclo de dano celular. Isso resulta em lesão endotelial, dano à mielina, nitratação de proteínas cerebrais e produção adicional de toxinas urêmicas, agravando o quadro neurológico.

Embora a ureia seja um marcador amplamente utilizado, não há evidências diretas de sua relação causal com a encefalopatia, ao contrário do sulfato de indoxila, associado à inflamação vascular e sintomas neurológicos.

Manifestações clínicas da Encefalopatia Urêmica

As manifestações clínicas da encefalopatia urêmica variam de acordo com a velocidade de progressão da disfunção renal. Trata-se de uma síndrome clínica sem critérios diagnósticos definidos, o que torna sua apresentação bastante heterogênea.

Em pacientes com declínio lento da taxa de filtração glomerular (TFG), os sintomas iniciais são inespecíficos, como fadiga, anorexia, perda de peso e náuseas. O comprometimento cognitivo tende a ser sutil, progressivo e de instalação lenta, com queixas como sonolência, inquietação, dificuldade de concentração e lentificação do raciocínio. Nestes casos, a identificação do envolvimento do sistema nervoso central pode exigir testes psicométricos.

Já nos pacientes com deterioração rápida da função renal, o quadro clínico costuma ser mais florido e grave. Podem ocorrer confusão mental, delirium, convulsões, desorientação, labilidade emocional e coma. 

Ao exame físico, observam-se sinais de disfunção cognitiva, como prejuízo da memória, julgamento e cálculo mental. Além disso, são comuns sinais neurológicos como hiperreflexia, asterixis (tremor involuntário nas mãos), papiledema e nistagmo. Neuropatias periféricas e miopatias também podem estar presentes.

Diagnóstico de Encefalopatia Urêmica

O diagnóstico da encefalopatia urêmica é essencial, pois essa condição representa uma indicação absoluta para o início imediato da terapia de substituição renal. No entanto, trata-se de uma síndrome clínica de apresentação variável e muitas vezes sutil, sem um teste diagnóstico específico, o que pode atrasar sua identificação.

Avaliação clínica e diferencial

O diagnóstico é baseado na exclusão de outras causas de encefalopatia, como infecções, acidentes vasculares cerebrais, hematomas subdurais, encefalopatia hipertensiva, desmielinização osmótica e síndrome do desequilíbrio dialítico. A identificação precoce depende da observação de alterações cognitivas em pacientes com insuficiência renal avançada, especialmente quando há deterioração aguda da função renal.

Exames laboratoriais

Não existem exames confirmatórios específicos para encefalopatia urêmica. Os testes laboratoriais geralmente mostram níveis elevados de ureia e creatinina. Devem ser solicitados também:

  • Hemograma completo (para avaliar infecção);
  • Eletrólitos séricos e glicemia (para excluir distúrbios como hiponatremia, hipernatremia e estados hiperosmolares);
  • Cálcio, magnésio, fósforo e paratormônio (que podem contribuir para encefalopatia metabólica);
  • Lactato e exames toxicológicos; e
  • Proteína C reativa, se houver suspeita de infecção; punção lombar só é indicada caso não haja melhora após diálise, para investigar outras causas neurológicas.

Avaliação neurológica

O eletroencefalograma (EEG), apesar de inespecífico, pode ajudar a excluir crises epilépticas. Na encefalopatia urêmica, o EEG pode mostrar lentificação generalizada, perda do ritmo alfa e presença de ondas teta e delta. O grau de lentificação costuma se correlacionar com a gravidade da disfunção renal. Após o início da diálise, o padrão do EEG tende a estabilizar, mas nem sempre retorna ao normal.

Testes cognitivos

Testes como o trail-making test (velocidade psicomotora), teste de memória de curto prazo e teste de tempo de reação podem ajudar a detectar prejuízos cognitivos.

Neuroimagem

A tomografia computadorizada serve para excluir lesões focais. Já a ressonância magnética (RM) pode evidenciar alterações difusas, como lesões na substância branca subcortical, córtex, gânglios da base e hipocampo. Três padrões de envolvimento são descritos:

  1. Cortical e subcortical, com possibilidade de síndrome da leucoencefalopatia posterior reversível (PRES);
  2. Gânglios da base bilaterais, especialmente em diabéticos;
  3. Apenas substância branca, o que é raro.

A reversibilidade das alterações na RM pode ocorrer após sessões de hemodiálise intermitente, mais eficaz na remoção rápida de toxinas do que a diálise peritoneal. Essas alterações reforçam a relação entre disfunção vascular e neuronal na fisiopatologia da encefalopatia urêmica.

Tratamento da Encefalopatia Urêmica

O tratamento da encefalopatia urêmica baseia-se na iniciação imediata da terapia de substituição renal, pois essa condição representa uma indicação absoluta para diálise. Mesmo pacientes em diálise peritoneal com Kt/V adequado podem desenvolver encefalopatia urêmica, como observado em estudo com três casos resolvidos após a transição para hemodiálise. Esses indivíduos apresentavam hipoalbuminemia e sinais de desnutrição, fatores que possivelmente contribuíram para o quadro.

Início ou ajuste da diálise

  • Hemodiálise intermitente tem eficácia superior à diálise peritoneal na remoção de solutos.
  • Pode ser necessária uma prova terapêutica de diálise em casos suspeitos para avaliar melhora clínica.
  • A encefalopatia urêmica aguda costuma regredir com a diálise, embora possa haver um intervalo de 1 a 2 dias até a normalização do estado mental. Mesmo após a diálise, dificuldades cognitivas sutis podem persistir em pacientes com doença renal crônica.
  • A ausência de melhora clínica significativa após a diálise deve levantar suspeitas para outras causas de encefalopatia, como hematoma subdural.
  • Risco de síndrome do desequilíbrio dialítico deve ser considerado na hemodiálise inicial, podendo ser prevenido com manitol (25 g intravenoso nas três primeiras sessões). O manitol reduz significativamente a queda de osmolalidade plasmática e os sintomas associados.

Tratamento e manejo da DRC associada

  • Correção da anemia com agentes estimuladores de eritropoiese.
  • Controle do metabolismo mineral, com quelantes de fosfato e reposição de cálcio.
  • Ajustes nutricionais para corrigir desnutrição e hipoalbuminemia.

Planejamento adequado do acesso dialítico

  • Diretrizes atuais recomendam a abordagem individualizada: “o acesso certo, no paciente certo, no momento certo, pelas razões certas”.
  • A preparação para a terapia de substituição renal ou transplante deve ser considerada quando a taxa de filtração glomerular (eGFR) estiver abaixo de 20 mL/min.

Avaliação neurológica complementar

  • O EEG pode ajudar a avaliar a gravidade da encefalopatia. As alterações mais comuns incluem ondas lentas, atividade rítmica teta frontal e ondas delta de alta voltagem. Ondas trifásicas frontais e atividade epileptiforme (em até 14% dos casos) também podem estar presentes.
  • A neuroimagem deve ser realizada para descartar lesões estruturais, como hematoma subdural.

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Referências

Olano CG, Akram SM, Hashmi MF, et al. Uremic Encephalopathy. [Updated 2024 Jul 6]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2025 Jan-. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK564327/

Julio A Chalela, MD. Acute toxic-metabolic encephalopathy in adults. UpToDate, 2024. Disponível em: UpToDate

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