E aí, doc! Vamos explorar mais um tema essencial? Hoje o foco é a Vasculite Urticariforme, uma forma rara de vasculite de pequenos vasos caracterizada por lesões urticariformes persistentes, que diferem da urticária comum por apresentarem duração prolongada, dor ou sensação de queimação e potencial acometimento sistêmico.
O Estratégia MED está aqui para descomplicar esse conceito e ajudar você a aprofundar seus conhecimentos, promovendo uma prática clínica cada vez mais eficaz e segura.
Vamos nessa!
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Definição de Vasculite Urticariforme
A vasculite urticariforme é uma entidade clínico-patológica rara caracterizada por inflamação dos pequenos vasos da pele, manifestada por lesões urticariformes de curso prolongado. Diferencia-se da urticária comum porque suas lesões persistem por 24 horas ou mais e tendem a deixar alterações residuais na pele, como hiperpigmentação.
Trata-se de uma condição que pode ter origem idiopática, porém também pode surgir em associação a fatores externos ou sistêmicos, como exposição a determinados medicamentos, infecções e distúrbios imunológicos ou hematológicos.
Em alguns casos, apresenta relação com doenças autoimunes ou neoplásicas e, mais recentemente, tem sido descrita em contexto de infecções virais, como COVID-19 e influenza A/H1N1.
Embora predominem as manifestações cutâneas, pode apresentar extensão sistêmica, configurando um espectro de apresentação variado conforme o grau de envolvimento orgânico.
Etiologia da Vasculite Urticariforme
A etiologia da vasculite urticariforme é multifatorial e frequentemente idiopática. Em parte dos casos, relaciona-se a fatores desencadeantes como uso de medicamentos, especialmente antibióticos e anti-inflamatórios, além de infecções virais ou bacterianas que provocam resposta imunológica anômala.
Pode também associar-se a doenças autoimunes, como lúpus eritematoso sistêmico e síndrome de Sjögren, bem como a distúrbios hematológicos e neoplasias, refletindo desregulação imunológica.
Mais recentemente, foram descritas associações com infecções como COVID-19 e influenza A/H1N1, reforçando o papel de estímulos infecciosos como gatilhos para seu desenvolvimento.
Fisiopatologia da Vasculite Urticariforme
A fisiopatologia da vasculite urticariforme baseia-se em um processo de hipersensibilidade do tipo III, mediado por imunocomplexos. Anticorpos se ligam a antígenos endógenos ou exógenos e formam complexos que se depositam na parede dos pequenos vasos, ativando o sistema complemento pela via clássica. A ativação gera fragmentos como C3a e C5a, que promovem degranulação de mastócitos e liberação de citocinas e quimiocinas, desencadeando inflamação local.
Neutrófilos são recrutados para o local e liberam enzimas proteolíticas que contribuem para o dano vascular característico da doença, resultando em edema e injúria tecidual. Eosinófilos também participam do processo inflamatório, com infiltração mais significativa do que a observada na urticária comum.
Além disso, sugerem-se papéis adicionais de mediadores inflamatórios, como a interleucina 1 (IL-1), dado o benefício observado com inibidores dessa citocina em casos refratários. Assim, a fisiopatologia envolve interação complexa entre imunocomplexos, complemento, células inflamatórias e mediadores pró-inflamatórios que culminam na vasculite dos pequenos vasos.
Manifestações clínicas da Vasculite Urticariforme
No envolvimento cutâneo, observam-se pápulas e placas eritematosas endurecidas semelhantes às da urticária, porém com características que permitem a diferenciação. As lesões persistem por mais de 24 horas, podem durar dias e frequentemente deixam hiperpigmentação equimótica residual ao regredir. São pouco ou parcialmente esbranquiçáveis à digitopressão, apresentam área central vermelho-escura ou acastanhada e medem entre 0,5 e 5 cm.

Fonte: UpToDate
Diferentemente da urticária comum, raramente confluem em grandes placas e tendem a ser dolorosas ou associadas a sensação de queimação, com prurido menos proeminente. Em média, os episódios têm duração de 4 a 8 semanas, com resolução espontânea em até 1 ano em parte dos pacientes, embora formas crônicas também sejam descritas. A dermatoscopia pode auxiliar na visualização de alterações vasculares quando a púrpura não é evidente clinicamente.

(B) A diascopia causa o desaparecimento do halo eritematoso, revelando púrpura clinicamente inaparente.
Fonte: UpToDate
O acometimento sistêmico é mais frequente nas formas hipocomplementêmicas ou na presença de anticorpos anti-C1q. Sintomas musculoesqueléticos, como artralgias e mialgias, estão entre os achados extracutâneos mais comuns. Alterações renais ocorrem em parcela dos casos e envolvem predominantemente glomerulopatias, com manifestações como hematúria e proteinúria.
Comprometimento pulmonar pode manifestar-se por doença pulmonar obstrutiva crônica, pleurite ou dispneia, sendo esta a principal causa de mortalidade associada à doença. Sintomas gastrointestinais, como dor abdominal, náuseas, vômitos e diarreia, também podem ocorrer, além de raros casos de isquemia intestinal.
Entre as manifestações oculares destacam-se uveíte, episclerite e conjuntivite. Em menor frequência, podem surgir complicações cardíacas e neurológicas, como pericardite, derrame pericárdico, paralisias de nervos cranianos e mielite transversa.
Diagnóstico da Vasculite Urticariforme
O diagnóstico da vasculite urticariforme é baseado na associação de achados clínicos e histopatológicos. Clinicamente, a doença se manifesta por lesões urticariformes persistentes, enquanto a confirmação histológica depende da identificação de vasculite leucocitoclástica em biópsia cutânea.
A presença ou ausência de hipocomplementemia e de condições associadas permite classificar a doença em subtipos específicos: hipocomplementêmica urticariforme (HUV), hipocomplementêmica urticariforme com síndrome associada (HUVS) ou normocomplementêmica (NUV). Além disso, a avaliação de doenças concomitantes auxilia na definição de possíveis processos patogênicos subjacentes que podem estar relacionados ao quadro de vasculite.
Tratamento da Vasculite Urticariforme
O tratamento da vasculite urticariforme segue uma abordagem escalonada, baseada na gravidade clínica e na presença de acometimento sistêmico, uma vez que não há terapias aprovadas especificamente para a doença e os dados disponíveis provêm principalmente de relatos de casos e séries clínicas.
Identificação e controle de fatores desencadeantes
Antes de iniciar qualquer terapia, é fundamental investigar e tratar possíveis condições subjacentes, como infecções, doenças autoimunes ou uso de medicamentos implicados. A remoção do agente causal ou o tratamento da doença associada pode resultar em melhora significativa dos sintomas.
Primeira linha de tratamento (casos leves, restritos à pele)
- Antibióticos orais: como doxiciclina, com efeito anti-inflamatório;
- Colchicina e dapsona: utilizadas em dermatoses neutrofílicas, incluindo vasculite cutânea;
- Hidroxicloroquina: indicada especialmente em pacientes com associação a lúpus eritematoso sistêmico;
- Anti-inflamatórios não esteroides (AINEs): úteis para sintomas musculoesqueléticos;
- Anti-histamínicos: não atuam na fisiopatologia da doença, mas podem ser usados quando há angioedema ou lesões urticariformes concomitantes.
Segunda linha de tratamento (quadros refratários ou com envolvimento sistêmico):
- Imunossupressores: metotrexato, micofenolato mofetil, azatioprina ou ciclosporina, isoladamente ou combinados a corticosteroides, mostrando maior eficácia em casos moderados a graves;
- Corticosteroides sistêmicos: como prednisona, eficazes para controle rápido de lesões cutâneas e sintomas extracutâneos, embora seu uso prolongado possa levar a recidivas após a suspensão.
Terapias biológicas e alternativas (casos refratários)
- Rituximabe (anti-CD20): geralmente associado a outras terapias imunomoduladoras, com boa taxa de resposta;
- Omalizumabe (anti-IgE): eficaz especialmente em pacientes normocomplementêmicos; resultados em hipocomplementêmicos são inconsistentes;
- Inibidores de interleucina-1 (anakinra e canaquinumabe): demonstraram melhora clínica e laboratorial, sugerindo participação dessa citocina na fisiopatologia da doença;
- Imunoglobulina intravenosa: opção em casos selecionados com acometimento cutâneo e sistêmico.
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Referências
Jerry D Brewer, MD, MS, FAAD, FACMSMark DP Davis, MD, FAAD. Urticarial vasculitis. UpToDate, 2024. Disponível em: UpToDate
Gu SL, Jorizzo JL. Urticarial vasculitis. Int J Womens Dermatol. 2021 Jan 29;7(3):290-297. doi: 10.1016/j.ijwd.2021.01.021. PMID: 34222586; PMCID: PMC8243153.
 
 

