Resumo sobre Pericardiocentese: indicações, contraindicações e mais!
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Resumo sobre Pericardiocentese: indicações, contraindicações e mais!

E aí, doc! Preparado para mais um tema importante? Hoje vamos abordar a Pericardiocentese, um procedimento crucial para o manejo de complicações cardíacas. A pericardiocentese é a drenagem de líquido ou sangue acumulado no espaço pericárdico, visando aliviar a pressão sobre o coração e restaurar sua função normal.

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Vamos lá!

Definição de Pericardiocentese

A pericardiocentese é um procedimento médico invasivo que consiste na inserção de uma agulha ou cateter no espaço pericárdico para drenar o líquido acumulado no saco pericárdico. Esse procedimento pode ser realizado com ou sem drenagem contínua do fluido, dependendo da gravidade e da causa do derrame pericárdico. 

Historicamente, a pericardiocentese era realizada de forma “às cegas”, sem auxílio de imagens, sendo o método padrão até o final do século XX. No entanto, com o avanço das tecnologias, a técnica guiada por ultrassonografia ou ecocardiografia tornou-se a abordagem preferida devido à maior segurança e precisão, minimizando o risco de complicações. 

Em situações emergenciais, a pericardiocentese pode ser realizada à beira do leito ou na sala de emergência, enquanto em ambientes controlados, como na sala de cateterismo cardíaco, o uso de ferramentas de imagem e monitorização cardíaca facilita a execução do procedimento. 

A pericardiocentese é um procedimento que todo clínico deve conhecer, pois, quando realizada corretamente, pode ser vital para salvar a vida do paciente, aliviando rapidamente a pressão sobre o coração e restabelecendo a função cardíaca.

Saco Pericárdico

O saco pericárdico é uma membrana fibrosserosa que envolve o coração e os grandes vasos, localizado no mediastino anterior, entre as pleuras pulmonares e o diafragma. Possui duas camadas: o pericárdio fibroso, externo e resistente, e o pericárdio seroso, interno e mais delgado. O pericárdio seroso se divide em folheto parietal, que reveste internamente o pericárdio fibroso, e folheto visceral (epicárdio), aderido à superfície do coração.

Entre essas camadas, há normalmente 15 a 30 mL de líquido transparente, que reduz o atrito durante os batimentos cardíacos. O acúmulo excessivo desse fluido, chamado derrame pericárdico, pode ser seroso, sanguinolento (hemopericárdio) ou purulento (pericardite purulenta).

O impacto desse acúmulo varia conforme o volume e a velocidade da formação. Quando ocorre lentamente, o pericárdio pode se distender e acomodar até 2000 mL sem comprometer a função cardíaca. Porém, um acúmulo rápido, mesmo de cerca de 200 mL, pode elevar a pressão intrapericárdica, dificultando o enchimento do coração e reduzindo o débito cardíaco (DC). Nos casos graves, isso pode levar ao tamponamento cardíaco e até à parada cardiorrespiratória com atividade elétrica sem pulso (AESP).

Fonte: GHIGGI, Karine Cristina; PEREIRA, Hugo Cataud Pacheco. Pericardiocentese. Vittalle – Revista de Ciências da Saúde, v. 33, n. 1, p. 101-110, 2021.

Manifestações clínicas e diagnóstico de tamponamento cardíaco

Manifestações Clínicas e Diagnóstico do Tamponamento Cardíaco

O tamponamento cardíaco ocorre devido à restrição do enchimento das câmaras cardíacas pelo acúmulo de líquido no espaço intrapericárdico, aumentando a pressão sobre o coração. A gravidade do quadro depende do volume e da velocidade do acúmulo de fluido.

Manifestações clínicas

A apresentação clínica varia, mas pode incluir:

  • Dispneia e desconforto respiratório, sem sinais de congestão pulmonar na radiografia;
  • Taquicardia e hipotensão progressiva, seguidas de bradicardia nos casos mais graves;
  • Pulso paradoxal (queda da pressão arterial sistólica >10 mmHg na inspiração);
  • Turgescência da veia jugular, indicando aumento da pressão venosa central;
  • Alteração do estado mental, podendo evoluir para torpor e atividade elétrica sem pulso (AESP).
    A Tríade de Beck (hipotensão, turgência jugular e bulhas cardíacas abafadas) é um achado clássico, mas raramente observada antes da parada cardiorrespiratória.

Diagnóstico

O diagnóstico clínico do tamponamento cardíaco baseia-se na avaliação dos sinais e sintomas decorrentes da restrição ao enchimento cardíaco. A suspeita clínica deve ser confirmada por exames complementares, como ecocardiografia, eletrocardiograma e radiografia de tórax, para avaliação detalhada do comprometimento cardíaco, mas não essenciais em casos de emergência.

  • Eletrocardiograma (ECG): pode ser normal ou apresentar baixa voltagem do QRS e alternância elétrica (QRS de amplitudes variáveis).
  • Radiografia de tórax: pode mostrar cardiomegalia em derrames volumosos (“coração em moringa”), mas não detecta pequenos volumes (<200 mL).
  • Ecocardiografia: exame de escolha para confirmar o diagnóstico, identificando líquido pericárdico, colapso diastólico do átrio e ventrículo direito, além da dilatação da veia cava inferior sem variação respiratória.

Indicações da Pericardiocentese

A pericardiocentese é indicada nos seguintes casos:

  • Tamponamento cardíaco com choque refratário ou parada cardíaca em pacientes instáveis.
  • Investigação etiológica de derrame pericárdico, como em casos de pericardite purulenta, tuberculose ou neoplasia, após avaliação de um especialista.
  • Derrame pericárdico sintomático, não responsivo a outras terapias, com mais de 20 mm de líquido à diástole no ecocardiograma.
  • Derrame pericárdico traumático, quando a cirurgia emergencial não é possível.

Contraindicações da Pericardiocentese

Contraindicações absolutas

  • Dissecção aórtica
  • Ruptura de parede livre miocárdica pós-infarto

Contraindicações relativas

  • Coagulopatia não corrigida
  • Anticoagulação plena
  • Trombocitopenia (plaquetas < 50.000/mm³)
  • Derrame pericárdico traumático com sinais vitais instáveis e pericardite purulenta (cirurgia preferível)
  • Pacientes com derrame pericárdico e sinais vitais estáveis (monitorização e drenagem programada podem ser mais indicadas)
  • Ruptura miocárdica

A pericardiocentese de emergência pode ser realizada em casos de risco iminente de vida, mesmo com contraindicações relativas, desde que tenha o objetivo de estabilizar o paciente até que a abordagem definitiva seja possível.

Procedimento da Pericardiocentese

A pericardiocentese é um procedimento invasivo realizado para a remoção de líquido acumulado no saco pericárdico, podendo ser diagnóstica ou terapêutica. O procedimento pode ser realizado na emergência, no leito do paciente ou em ambiente controlado, como a sala de cateterismo cardíaco, preferencialmente sob orientação de ultrassonografia ou ecocardiografia​.

1. Preparação para o procedimento

Antes de iniciar a pericardiocentese, é essencial garantir a disponibilidade de todos os materiais e equipamentos necessários, além de realizar a monitorização contínua do paciente.

1.1 Materiais necessários

  • Equipamentos de proteção individual: luvas estéreis, avental descartável, gorro, propés, máscara cirúrgica e óculos de proteção.
  • Materiais para antissepsia: clorexidina alcoólica 0,5%, gaze estéril, cuba pequena, pinça para antissepsia e campo fenestrado estéril.
  • Materiais para punção:
    • Agulha de aspiração (18G – 40×1,2 mm)
    • Agulha de infiltração (22G – 0,7×30 mm)
    • Seringa de 10 mL (para anestesia local)
    • Lidocaína 1% sem vasoconstritor
    • Jelco® 16G ou 18G ou kit de cateterismo venoso central
    • Lâmina de bisturi nº 11
    • Torneira de 3 vias e equipo de soro
    • Frasco milimetrado para medida do volume drenado
  • Monitorização: eletrocardiograma (ECG) contínuo e oxigenação suplementar (5 a 10 L/min, se necessário).
  • Carrinho de emergência disponível, com desfibrilador e medicações para ressuscitação.

1.2 Posicionamento do paciente

O paciente deve ser colocado em decúbito dorsal com a cabeceira do leito elevada entre 30º e 45º, o que facilita o deslocamento do líquido para a região inferior do pericárdio, permitindo melhor acesso à punção​.

2. Escolha do local da punção

A pericardiocentese pode ser realizada por diferentes abordagens, sendo a subxifoide a mais comum na emergência. Quando disponível, o uso de ultrassonografia é preferível para aumentar a precisão e reduzir riscos​.

2.1 Abordagem subxifoide (mais comum em emergências)

  • O local de punção é 1 a 2 cm abaixo e à esquerda da junção xifocondral.
  • A agulha deve ser introduzida em ângulo de 30º a 45º, direcionada para a escápula esquerda.
  • A punção deve ser realizada de maneira lenta, aspirando constantemente para identificar a entrada no espaço pericárdico.
  • Durante a punção, o monitoramento eletrocardiográfico é essencial para detectar sinais de contato da agulha com o miocárdio, como elevação do segmento ST​.

3. Etapas do Procedimento

  1. Realizar a antissepsia da pele na região de punção com clorexidina alcoólica 0,5%.
  2. Se houver tempo e condições, infiltrar lidocaína 1% no local da punção para anestesia local.
  3. Colocar campos estéreis ao redor da área de punção.
  4. Inserir a agulha lentamente na pele no ponto previamente definido, direcionando-a para o ombro esquerdo, aspirando continuamente.
  5. Monitorar sinais de entrada no espaço pericárdico, como:
    • Retorno de líquido seroso ou sanguinolento na seringa.
    • Redução da pressão na seringa ao aspirar.
    • Melhora clínica do paciente, caso haja tamponamento cardíaco.
  6. Caso a agulha entre em contato com o miocárdio (detectado por elevação do segmento ST no ECG), recuar levemente até a normalização do traçado.
  7. Após obtenção do líquido pericárdico, conectar um equipo de drenagem à torneira de 3 vias para permitir remoção contínua do líquido.
  8. Interromper a drenagem quando os sinais vitais do paciente se estabilizarem e não houver mais líquido fluindo.
  9. Reavaliar o paciente por ecocardiografia para confirmar o esvaziamento adequado e monitorar sinais de recorrência do derrame​.

4. Coleta e análise do líquido pericárdico

O líquido aspirado deve ser encaminhado ao laboratório para investigação diagnóstica, conforme a suspeita clínica.

  • Tubo 1 (soro fisiológico 0,9%) – Gram, cultura e antibiograma.
  • Tubo 2 (soro fisiológico 0,9%) – Análises bioquímicas.
  • Tubo 3 (soro fisiológico 0,9%) – Pesquisa e cultura de fungos ou tuberculose.
  • Tubo 4 (formaldeído) – Citometria e citologia oncótica​.

5. Cuidados pós-procedimento e monitorização

Após a pericardiocentese, o paciente deve ser mantido sob monitorização rigorosa para avaliar possíveis complicações e evitar reacúmulo do líquido.

  1. Realizar nova ecocardiografia e radiografia de tórax para avaliar a presença de derrame residual e descartar complicações como pneumotórax.
  2. Observar sinais vitais constantemente, como pressão arterial, frequência cardíaca e saturação de oxigênio.
  3. Manter o paciente sob observação por pelo menos 24 horas, caso o quadro clínico justifique.
  4. Se houver sinais de reacúmulo de líquido, considerar nova drenagem ou abordagem cirúrgica definitiva, como a pericardiotomia​.

Complicações da Pericardiocentese

A pericardiocentese, apesar de ser um procedimento que pode salvar vidas, apresenta riscos significativos. As complicações mais comuns incluem:

  • Arritmias cardíacas (ex.: taquicardia ventricular, fibrilação ventricular).
  • Perfuração do miocárdio, levando a hemopericárdio e piora do tamponamento.
  • Síndrome de descompressão ventricular, causando edema pulmonar e choque cardiogênico.
  • Laceração de vasos coronários, podendo resultar em hemopericárdio grave.
  • Pneumotórax devido à punção inadvertida do pulmão.
  • Punção inadvertida de órgãos adjacentes, como esôfago, estômago ou fígado.
  • Infecção secundária no local da punção.
  • Obstrução do cateter de drenagem, necessitando de reposicionamento ou troca

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Referências

Alan C Heffner, MD. Emergency pericardiocentesis. UpToDate, 2023. Disponível em: UpToDate

GHIGGI, Karine Cristina; PEREIRA, Hugo Cataud Pacheco. Pericardiocentese. Vittalle – Revista de Ciências da Saúde, v. 33, n. 1, p. 101-110, 2021.

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