ResuMED de derrame pleural: fisiopatologia, caso clínico, exames e mais!

ResuMED de derrame pleural: fisiopatologia, caso clínico, exames e mais!

Como vai, futuro Residente? O tema derrame pleural é muito cobrado nas provas de Residência Médica. Por isso, nós do Estratégia MED preparamos um resumo exclusivo. Para saber mais, continue a leitura. Bons estudos!

Introdução

O derrame pleural é uma síndrome decorrente de diferentes patologias e mecanismos, caracterizada por “água entre as pleuras”. Vamos relembrar um pouco de anatomia. 

Os pulmões possuem um tecido de revestimento chamado pleura, quea é dividida em duas, a pleura visceral (interna) e a parietal (externa) e entre elas temos o espaço pleural, uma cavidade que armazena líquido pleural, cerca de 1L/dia em equilíbrio dinâmico. No derrame pleural, ocorre um desequilíbrio desse líquido da cavidade, por diversos mecanismos fisiopatológicos que mostraremos a seguir. 

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Fisiopatologia

Como dito anteriormente, o derrame pleural é causado por um desequilíbrio dinâmico no líquido pleural, o qual pode ser classificado como transudato ou exsudato, dependendo do mecanismo fisiológico. No caso de transudato, indica que não há agressão pleural, diferente do exsudato, que indica um processo inflamatório com aumento de permeabilidade capilar e liberação de mediadores, assim como recrutamento celular. 

Podem ser diversos os mecanismos formadores de derrame pleural.

  • Aumento da pressão hidrostática (transudato);
  • Diminuição da pressão oncótica do plasma (transudato);
  • Aumento da permeabilidade capilar (exsudato);
  • Aumento da pressão negativa do espaço pleural (transudato); e
  • Passagem transdiafragmática ou ruptura de vasos intratorácicos ou do ducto torácico (transudato ou exsudato).

Caso clínico

Os sintomas mais recorrentes nas doenças pleurais são inespecíficos e dependem de múltiplos fatores, como: volume e velocidade de formação do derrame, reserva cardiopulmonar do paciente, presença ou não de processo inflamatório pleural, a extensão do acometimento pleural e da doença de base, e a distensibilidade da caixa torácica e do parênquima pulmonar. 

Existe uma tríade clássica da síndrome do derrame pleural, que consiste em tosse seca, dor torácica de dispneia. A tosse seca é esporádica e pouco intensa e a dispneia está relacionada ao tempo do derrame, a velocidade e volume de líquido acumulado, estado funcional do paciente e presença de comprometimento pulmonar. Já a dor torácica é caracteristicamente ventilatório-dependente.

O exame físico pode ser normal, em derrames leves, mas pode ser alterado, quando o volume de líquido supera 300 mL na cavidade pleural. Na semiologia notamos hemitórax abaulado e expansibilidade reduzida na inspeção, macicez à percussão, ausência do murmúrio vesicular e frêmito toracovocal abolido. 

Existem sinais muito comuns e característicos de derrame pleural, como o Sinal de Lemos Torres, caracterizado por um abaulamento expiratório localizados nos últimos espaços intercostais e a Parábola de Damoiseau, em que à percussão do limite superior dos derrames pleurais, forma-se uma linha curva com concavidade voltada para cima, entre outros sinais que você pode ver no material completo do Estratégia MED!

Exames complementares

Após anamnese e suspeita diagnóstica, podemos seguir para exames subsidiários, com exames de imagem e laboratoriais.

Exames de imagem

A princípio, o exame de imagem mais utilizado para diagnóstico de derrame pleural é a radiografia de tórax, em que podemos enxergar opacificação homogênea do recesso costofrênico, com borda nítida, côncava, voltada para o mediastino (parábola de Damoiseau). 

Pode ser realizado também uma ultrassonografia de tórax, para detecção de líquido em pequenas quantidades, se livre ou inoculado, identificar septações, distinção entre derrame e espessamento pleural e permite estimar o volume total de líquido e determinar o melhor local para punção, biópsia e/ou drenagem torácica. Na ultrassonografia observamos imagem anecoica (preta), delimitada por linhas hiperecogênicas, que representa a pleura parietal e a sombra acústica formada pela pleura visceral e pelo pulmão aerado.

A tomografia computadorizada de tórax é utilizada para diferenciar os derrames pleurais livres ou inoculados e as estruturas sólidas, além de permitir análise do parênquima pulmonar adjacente. Porém, não é o exame de escolha para o diagnóstico do derrame pleural.

Exames laboratoriais

Em geral, o líquido pleural é removido por toracocentese, um procedimento simples, seguro e de baixo custo, no qual se introduz uma agulha no espaço pleural para remoção do líquido e permitir que ele seja analisado em laboratório, para estimar a provável causa do derrame pleural.

Dependendo do aspecto do líquido, suspeitamos de etiologias diferentes, observe:

  • Amarelo citrino: mais prevalente em derrames pleurais, podendo ser transudato ou exsudato.
  • Sanguinolento: neoplasia, embolia pulmonar, trauma, acidente de punção.
  • Leitoso: quilotórax ou pseudoquilotórax.
  • Purulento: empiema.
  • Amarronzado: infecção fúngica, abscesso amebiano, pancreatite. 

Dependendo da hipótese diagnóstica, outros exames podem ser solicitados, como:

  • Critérios de Light: permite diferenciar o líquido em transudato e exsudato.
  • Glicose: afasta diagnósticos de causas infecciosas, neoplásicas, colagenosas, ruptura de esôfago e hemotórax. 
  • pH: pH inferior a 7,2 pode indicar colagenoses, pleurite tuberculosa, neoplasias malignas e hemotórax, indicando um pior prognóstico.
  • Adenosina deminase: utilizada para diagnóstico de pleurite tuberculosa.
  • Lípides ou lipídeos: em derrames exsudativos crônicos pode haver pseudoquilotórax (colesterol elevado), e em doenças que comprometem o ducto torácico pode haver triglicérides alterados.
  • Amilase: utilizada para diagnóstico de derrame pleural secundário à pancreatite, mas também pode estar elevada em casos de ruptura esofágica e neoplasias. 
  • Citologia diferencial e oncótica: ajuda na investigação diagnóstica, mas não diferencia exsudato e transudato. 
  • Hematócrito do líquido pleural: auxilia na diferenciação de hemotórax.
  • Análise microbiológica: permite identificar patógenos além da avaliação da evolução e prognóstico de algumas doenças.

Para análise da pleura parietal, podemos obtê-la por biópsia pleural fechada, realizada por agulha de Cope ou por visualização direta na biópsia dirigida por videotoracoscopia.

Ao exame anatomopatológico, observamos principalmente atipia celular, nos casos de neoplasias malignas, ou presença de granuloma, principalmente nos casos de tuberculose, mas também em infecções fúngicas, sarcoidose, granulomatose com poliangeíte, entre outras. 

Manejo clínico

Existem alguns procedimentos padrões quando se trata de derrame pleural para auxiliar no diagnóstico e tratamento, sendo eles: toracocentese e biópsia pleural. 

Toracocentese diagnóstica e terapêutica

A toracocentese é uma punção com agulha fina no espaço pleural para recolher fluidos, neste caso, o líquido pleural.

A toracocentese diagnóstica é realizada nos casos de derrame pleural de causa não estabelecida, para análise do líquido pleural, já a toracocentese terapêutica ou de alívio é realizada em pacientes sintomáticos para alívio dos sintomas, com a retirada de cerca de 1500 mL.  

Sua técnica consiste em uma punção aspirativa na borda superior da costela inferior (geralmente entre a 5ª e 6ª costela), para que não haja o risco de lesão no feixe vasculonervoso na borda inferior da costela superior. 

Nos casos de derrame pleural, devemos nos perguntar duas coisas:

  • Tem ausência de diagnóstico etiológico ou evolução atípica ou desfavorável?
  • Tem presença de sintomas pelo derrame pleural que precisam ser aliviados?

Caso a resposta seja sim para qualquer uma das perguntas, deve ser realizada a toracocentese diagnóstica na primeira e de alívio para a segunda, exceto algumas contraindicações, como distúrbios de coagulação e lesões de pele no sítio de punção.

Complicações

Em alguns casos raros, pode haver complicações, principalmente pneumotórax, tosse, dor torácica e reflexo vasovagal, além de hemotórax, infecções pleurais, lacerações hepáticas e esplênicas. Porém, o mais cobrado nas provas de Residência Médica é o edema de reexpansão, que pode ocorrer após a realização de uma toracocentese de alívio. 

O edema pulmonar de reexpansão ocorre depois da retirada de grande volume de líquido pleural, geralmente acima de 1500 mL, e caracteriza-se por reexpansão pulmonar abrupta após o esvaziamento da cavidade pleural, com aparecimento de pressão negativa intrapulmonar. O tratamento consiste em suporte ventilatório, diuréticos e vasodilatadores. 

Não é necessária a realização de radiografia de tórax de rotina após a realização da toracocentese, apenas quando houver suspeita de complicações ou eventos adversos. 

Biópsia pleural por agulha

A biópsia pleural por agulha é indicada para auxiliar no diagnóstico de derrames pleurais exsudativos, principalmente nos casos de suspeita de tuberculose pleural e neoplasias. Porém, é contraindicado para pacientes com distúrbios de coagulação e empiema. 

Assim como a toracocentese, pode haver complicações, neste caso incluindo pneumotórax, hemotórax, dor, reflexo vasovagal e laceração de órgãos. 

Situações especiais – etiologias específicas

Existem algumas situações especiais que envolvem etiologias específicas do derrame pleural, onde é possível diagnosticar, de acordo com o líquido, se é transudato ou exsudato.

  • Transudato: insuficiência cardíaca crônica, cirrose hepática, síndrome nefrótica, hipoalbuminemia, diálise peritoneal, mixedema, obstrução de veia cava superior, embolia pulmonar, atelectasia.
  • Exsudato: causas infecciosas, neoplásicas, indução por drogas, hemotórax, quilotórax, colagenoses, embolia pulmonar, pancreatite, pós infarto agudo do miocárdio. 

Cerca de 90% dos casos de derrame pleural são causados por insuficiência cardíaca, cirrose, ascite, infecções pleuropulmonares, neoplasias e embolia pulmonar. Mas a principal causa do mundo é a insuficiência cardíaca.

Nos casos de derrame pleural exsudativo, as principais causas são: insuficiência cardíaca congestiva, hidrotórax hepático e doenças renais, como doença renal crônica ou síndrome nefrótica, e o tratamento é baseado na doença de base. 

Derrame pleural parapneumônico

Nos casos de suspeita de derrame pleural parapneumônico, deve ser realizada a toracocentese para avaliar os critérios de pior prognóstico, de acordo com o pH, glicose e DHL do líquido pleural. Esse quadro caracteriza-se pela presença de um exsudato neutrofílico e sua evolução clínica ocorre em 3 estágios:

  • Fase I ou exsudativa: acúmulo de líquido estéril com baixo número de leucócitos, DHL baixo, glicose e pH normais. O tratamento é realizado por antibioticoterapia.
  • Fase II ou fibrinopurulenta ou complicada: valores de DHL maiores que 1000 UI/L, glicose menor que 40 mg/dL e pH menor que 7,2, com risco de loculações e espessamento da pleura. Seu tratamento consiste em drenagem do líquido pleural e antibioticoterapia. Podem ser usados fibrinolíticos. 
  • Fase III ou organizada: consiste na formação do tecido de granulação com uma cápsula compressiva que restringe a expansão pulmonar (fibrotórax). Geralmente, a intervenção cirúrgica com decorticação é a mais escolhida. 

A abordagem cirúrgica é indicada apenas na falha do tratamento pós drenagem pleural. Já o tratamento com antibióticos é mandatório em todos os estágios e deve ser mantido de 3 a 4 semanas, existem também algumas recomendações específicas no caso de derrame pleural parapneumônico/empiema.

Após o diagnóstico, a antibioticoterapia deve ser iniciada esporadicamente e ajustada conforme os resultados das culturas:

  • Adquirido na comunidade:
    • Cefalosporina de 3a geração associada a metronidazol ou clindamicina; ou
    • Quinolona respiratória associada a metronidazol ou clindamicina; ou
    • Penicilina com inibidor de β-lactamase venosa.
  • Pneumonia hospitalar:
    • Betalactâmico antipseudomonas IV associado a metronidazol ou clindamicina; ou
    •  Ampicilina/sulbactam ou amoxicilina/clavulanato.
  • Hospitais com alta prevalência de S. aureus resistentes à meticilina:
    • Evitar aminoglicosídeos no manejo do empiema;
    • Sem papel para a administração intrapleural de antibióticos;
    • Se possível, escolha o antibiótico com base nos resultados da cultura; e
    • Considere continuar a cobertura anaeróbia empiricamente quando as culturas forem negativas. 

Derrame pleural maligno

Cerca de 15 a 45% dos casos de derrame pleural exsudativo são por neoplasias, geralmente unilaterais e volumosas, exsudativos, linfocíticos, sanguinolentos e recidivantes e representam doença metastática, principalmente para câncer de pulmão, câncer de mama, linfoma, câncer de ovário e câncer gástrico.

A principal neoplasia maligna primária pleural é o mesotelioma pleural maligno, com predisposição nos casos de histórico de exposição prolongada a asbesto, associada ao derrame pleural volumoso. Sua clínica apresenta dor progressiva e dispneia, e ao raio-X encontra-se espessamento circunferencial da pleural.

Seu diagnóstico etiológico é feito por citologia oncótica positiva no líquido pleural e/ou análise histológica do fragmento pleural.

Derrame pleural tuberculoso

É uma das principais causas de derrame pleural, principalmente em jovens, em que na maioria dos pacientes é possível observar lesão parenquimatosa concomitante, e apresenta-se classicamente com exsudato unilateral, linfocítico, hiperproteico, com elevação de ADA, raras células mesoteliais e raros eosinófilos. 

O padrão-ouro para diagnóstico é a biópsia pleural, em que se observa um processo granulomatoso crônico, geralmente associado à necrose caseosa, e seu tratamento é semelhante ao tratamento da forma pulmonar. 

Outras etiologias de derrame pleural

Quilotórax: acúmulo de linfa na cavidade pleural, apresentada como exsudato linfocítico com elevados níveis protéicos. Suas principais causas são exsudatos crônicos, por derrame tuberculoso e derrame por artrite reumatoide. O tratamento é baseado na doença de base, e pode ser clínico ou cirúrgico.

Tromboembolismo pulmonar: decorrente da evolução de embolia pulmonar, usualmente pequeno, unilateral, como exsudato neutrofílico ou eosinofílico, hemorrágico. 

  • Dor torácica súbita + dispneia + derrame pleural = pensar em embolia!

Colagenoses: todas as doenças de colágeno podem evoluir com derrame pleural.

Pancreatite: apresenta-se como exsudato, geralmente à esquerda, linfocítico, coloração acastanhada ou sero-hemática e proteína total pleural maior que 3 g/dL.

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