Resumo sobre Restrição do Crescimento Fetal: etiologias, manejo e mais!
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Resumo sobre Restrição do Crescimento Fetal: etiologias, manejo e mais!

E aí, doc! Vamos explorar mais um tema essencial? Hoje o foco é a Restrição do Crescimento Fetal, uma condição caracterizada pelo crescimento insuficiente do feto em relação ao esperado para a idade gestacional, geralmente relacionada a alterações placentárias, maternas ou fetais. 

O Estratégia MED está aqui para descomplicar esse conceito e ajudar você a aprofundar seus conhecimentos, promovendo uma prática clínica cada vez mais eficaz e segura.]

Vamos nessa!

Definição de Restrição do Crescimento Fetal

A restrição do crescimento fetal (RCF) é uma condição caracterizada pela incapacidade do feto de atingir todo o seu potencial de crescimento intrauterino determinado geneticamente, em decorrência de um processo patológico, mais frequentemente relacionado à disfunção placentária. 

Embora classicamente seja suspeitada quando o peso fetal estimado ou a circunferência abdominal encontram-se abaixo do percentil 10 para a idade gestacional, a RCF não deve ser definida apenas pelo tamanho fetal, pois muitos fetos pequenos são constitucionalmente normais. 

O diagnóstico adequado envolve a avaliação integrada do crescimento fetal seriado, da circunferência abdominal e da Dopplervelocimetria obstétrica, especialmente da artéria umbilical, permitindo diferenciar o feto pequeno constitucional daquele com crescimento verdadeiramente restrito. 

A RCF está associada a aumento significativo do risco de óbito intrauterino, morbidade neonatal e mortalidade perinatal, além de repercussões metabólicas e cardiovasculares na vida adulta.

Etiologias do Restrição do Crescimento Fetal

A etiologia da restrição do crescimento fetal (RCF) é multifatorial e envolve alterações que comprometem a adequada interação entre os componentes materno, placentário e fetal. Embora diversas causas sejam reconhecidas, em parcela significativa dos casos a etiologia permanece indefinida.

FetaisMaternasPlacentárias
Malformações fetaisDesnutrição materna e baixo ganho ponderal na gestaçãoInsuficiência placentária
CromossomopatiasHipertensão arterial crônica ou gestacionalInserção baixa da placenta
Infecções congênitasAnemia maternaPlacenta circunvalada
Gestação múltiplaCardiopatias e pneumopatiasCorioangioma
Uso fetal indireto de drogas por exposição maternaDoenças autoimunes como lúpus eritematoso sistêmico e síndrome do anticorpo antifosfolípideInserção velamentosa do cordão umbilical
Uso materno de drogas ilícitas, tabagismo e etilismoArtéria umbilical única
Estresse materno crônico

Fisiopatologia da Restrição do Crescimento Fetal

A fisiopatologia da restrição do crescimento fetal (RCF) decorre, na maioria dos casos, da insuficiência placentária, que reduz de forma crônica o aporte de oxigênio e nutrientes ao feto, levando à hipóxia fetal crônica. Esse cenário desencadeia uma sequência de respostas adaptativas progressivas com o objetivo inicial de manter a sobrevivência fetal, mas que podem evoluir para descompensação e óbito intrauterino .

A primeira resposta adaptativa é a diminuição das taxas de crescimento fetal, especialmente do fígado, com redução do acúmulo de glicogênio e gordura. Esse processo resulta em diminuição da circunferência abdominal, considerado o marcador biométrico mais sensível da RCF. Paralelamente, ocorre redução do ganho ponderal fetal.

Com a persistência da hipóxia, instala-se a segunda resposta adaptativa, caracterizada pela redistribuição do fluxo sanguíneo fetal, conhecida como centralização da circulação. Há vasodilatação dos órgãos nobres, como cérebro, coração e adrenais, e aumento da resistência vascular placentária e periférica. Do ponto de vista Dopplervelocimétrico, observa-se aumento da resistência da artéria umbilical e redução da resistência da artéria cerebral média, refletindo o mecanismo de preservação de órgãos vitais.

Associado a isso, o feto passa a economizar energia, com diminuição da movimentação fetal e da reatividade cardíaca. A hipoperfusão renal leva à redução da diurese fetal, culminando em oligoâmnio, achado frequente nos quadros mais avançados de RCF.

Na fase de descompensação progressiva, os mecanismos compensatórios tornam-se insuficientes, ocorrendo comprometimento dos órgãos vitais e acidose fetal. Surgem então alterações no Doppler do ducto venoso, com redução, ausência ou reversão da onda “a”, indicativas de falência cardíaca fetal iminente. Sem intervenção obstétrica adequada, esse processo pode evoluir para sofrimento fetal grave e morte intrauterina.

Classificação da Restrição do Crescimento Fetal

A classificação da restrição do crescimento fetal (RCF) é fundamental para o adequado diagnóstico, acompanhamento e definição da conduta obstétrica, pois os diferentes tipos apresentam gravidade, fisiopatologia, padrões Dopplervelocimétricos e prognóstico distintos. De acordo com o documento enviado, a RCF pode ser classificada quanto ao momento de início e quanto ao padrão de crescimento fetal, sendo ambas as classificações complementares e clinicamente relevantes .

Classificação quanto ao momento de início

A RCF é classificada em precoce ou tardia, conforme a idade gestacional em que é diagnosticada. Essa distinção é essencial, pois influencia diretamente a evolução clínica e o risco perinatal.

CaracterísticaRCF PrecoceRCF Tardia
Idade gestacionalAntes de 32 semanasA partir de 32 semanas
FrequênciaMenos comumMais frequente
GravidadeMais graveGeralmente mais leve
Associação com pré-eclâmpsiaFrequenteMenos frequente
Principal alteração Doppler inicialArtéria umbilical e ducto venosoArtéria cerebral média e relação cérebro-placentária
Principais causasAnomalias cromossômicas e infecções congênitasInsuficiência placentária
Facilidade diagnósticaMais fácilMais difícil e mais sutil

Independentemente do tipo, peso fetal estimado ou circunferência abdominal abaixo do percentil 3 confirmam o diagnóstico de RCF. Valores entre os percentis 3 e 10 exigem critérios adicionais, especialmente Dopplervelocimetria .

Classificação quanto ao padrão de crescimento

Outra forma de classificar a RCF baseia-se na proporcionalidade do crescimento fetal, refletindo o momento e o tipo de agressão intrauterina.

Tipo de RCFCaracterísticasFrequênciaPrincipais causasHipóxia fetal
Tipo I SimétricaCrescimento proporcional de todo o corpo fetalCerca de 20%Infecções congênitas, cromossomopatias, malformações fetaisGeralmente ausente
Tipo II AssimétricaDesproporção entre cabeça e tronco, com redução da circunferência abdominalCerca de 75%Insuficiência placentária, hipertensão maternaFrequente
Tipo III MistaCombinação de características simétricas e assimétricas5 a 10%Desnutrição materna, tabagismo, etilismo e drogas ilícitasFrequente

Na RCF simétrica, a agressão ocorre desde fases iniciais do desenvolvimento fetal, afetando hiperplasia celular. Já na RCF assimétrica, a agressão é mais tardia, comprometendo principalmente a hipertrofia celular e levando à centralização do fluxo fetal. A forma mista envolve agressões em diferentes fases do crescimento fetal .

Tratamento da Restrição do Crescimento Fetal

A conduta na restrição do crescimento fetal (RCF) tem dois pilares no documento: investigar a etiologia e, após excluir causas genéticas e infecciosas, monitorar a vitalidade fetal e definir o melhor momento do parto, já que não existe tratamento efetivo para reverter a RCF durante a gestação. O objetivo é identificar precocemente os fetos com maior risco de descompensação e óbito e antecipar o parto no momento mais seguro, equilibrando risco de natimortalidade e prematuridade .

1) Primeira conduta: investigar a etiologia

Ao confirmar ou suspeitar de RCF, a primeira etapa é investigar a causa, incluindo:

  • História clínica e obstétrica detalhada
  • Ultrassonografia morfológica fetal detalhada
  • Dopplervelocimetria obstétrica
  • Investigação de infecções congênitas: toxoplasmose, citomegalovírus, rubéola, herpes, sífilis, malária e Zika vírus
  • Se houver suspeita de causa genética ou infecciosa associada a alterações morfológicas: considerar amniocentese para cariótipo ou PCR de agentes infecciosos .

Excluídas causas genéticas e infecciosas, a condução se volta principalmente para RCF por insuficiência placentária, com seguimento baseado em Doppler, PBF e cardiotocografia .

2) Seguimento: vigilância da vitalidade e crescimento

A vigilância se baseia em:

  • Ultrassonografia seriada para velocidade de crescimento
  • Volume de líquido amniótico
  • Dopplervelocimetria (principalmente artéria umbilical e, conforme o caso, ACM, relação C/P e ducto venoso)
  • Perfil biofísico fetal
  • Cardiotocografia (incluindo computadorizada quando aplicável) .

O intervalo de acompanhamento e o momento do parto variam conforme a gravidade e o padrão Doppler.

EstágioDescriçãoRisco de óbito fetalControle de vitalidadeParto
Feto PIGP3 > PFE < P10 (pequeno constitucional)BaixoVitalidade com Doppler a cada 15 diasAté 40 semanas; via obstétrica (indução)
Estágio 1PFE < P3 com Doppler normal ou P3 > PFE < P10 com IP médio de artérias uterinas > p95BaixoDoppler quinzenal até 34 semanas e semanal a partir de 34 semanasEntre 37 (se PFE < p1) e 38 semanas; indução (evitar prostaglandinas)
Estágio 2RCF com Doppler: AUmb IP > p95 e ou ACM < p5 e ou centralização (RCP < 1)Baixo< 34 semanas: Doppler 2 a 3x/semana. ≥ 34 semanas: considerar internação e vitalidade diáriaCom 37 semanas; indução cuidadosa (evitar prostaglandinas)
Estágio 3Doppler da AUmb com diástole zero severaMaior riscoInternação e vitalidade diária com Doppler (inclui DV), PBF e CTG computadorizadaCom 34 semanas; cesárea eletiva
Estágio 4AUmb com diástole reversa ou IP do DV > p95Deterioração fetal avançadaInternação; vitalidade diária. Avaliar corticoterapia se for aguardar (com Doppler, CTG comput. e PBF diários)A partir de 26 semanas (viabilidade conforme UTI neonatal); cesárea eletiva. Alguns protocolos: a partir de 30 semanas
Estágio 5DV com onda “a” zero ou reversa ou STV na CTG comput < 3 ms ou desaceleração da FCFAcidose fetal e alto risco de óbitoInternação, corticoterapia e partoNa viabilidade, conforme suporte neonatal; cesárea eletiva

Observação prática do material: quando o feto está entre P3 e P10 com Doppler normal (PIG), pode-se acompanhar a cada 1 a 2 semanas e aguardar até 40 semanas em alguns protocolos. Já nas RCF em estágios mais avançados, a decisão de parto é guiada principalmente por alterações da AUmb e, sobretudo, do ducto venoso, que sinaliza descompensação .

Via de parto e indução

  • Quando há diástole presente na artéria umbilical e PBF/CTG normais, pode-se optar por indução do parto, mesmo com colo desfavorável, preferindo métodos mecânicos (ex.: cateter de Foley) e evitando prostaglandinas pelo maior risco de sofrimento fetal intraparto .
  • Quando há diástole ausente ou reversa, ducto venoso alterado ou alteração importante de vitalidade, o documento orienta priorizar cesárea eletiva .
  • Em fetos prematuros com indicação de resolução, prescrever corticoterapia para maturação pulmonar e sulfato de magnésio para neuroproteção, seguindo protocolo de prematuridade. O material ressalta que não se deve aguardar corticoterapia em situações de alto risco imediato (ex.: DV muito alterado, CTG categoria III, PBF muito baixo ou risco materno) .

Veja também!

Referências

Chew LC, Osuchukwu OO, Reed DJ, et al. Fetal Growth Restriction. [Updated 2024 Aug 11]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2025 Jan-. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK562268/

Zugaib Obstetrícia 5ª ed., Manole, 2023.

Manual de alto risco, Ministério da Saúde, 2022. 

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