1. Na planície pedregosa, à noitinha, mulheres e crianças fugitivas escondem-se num buraco. São a escória do mundo. Foi assim que o diretor Andrea de Rosa, no Festival Verdi, de Parma, concebeu o início da ópera Attila, de Giuseppe Verdi. Attila, o rei dos hunos, encarna a barbárie e a tirania.
2. Wagner e Verdi nasceram em 1813. Tiveram trajetórias paralelas. Tornaram-se gigantes da ópera. Não podiam ser mais diferentes, porém. Wagner construiu para seu uso próprio a imagem de gênio ao qual a humanidade deve tudo. Encontrou no rei Luís 2º da Bavária um protetor que financiou a construção de seu teatro e de seu magnífico palácio com jardins.
3. Verdi lutou com a indústria da ópera de seu tempo. Viveu com o que lhe rendiam seus trabalhos. Comprou um sitiozinho perto de Parma, mantendo-se fiel à região onde nasceu. Ergueu um asilo em Milão para os velhos músicos, legando-lhe toda a renda de seus direitos autorais, e pediu para ser enterrado ali. Escreveu: “Das minhas obras, a que mais me agrada é a casa que fiz construir para acolher os velhos artistas do canto que não foram favorecidos pela fortuna ou que não possuíram, na juventude, a virtude da poupança”. Aqui, o humanismo é comovente: os que dilapidaram seus ganhos não são culpados. Velhos, pobres e frágeis, são sempre nossos irmãos.
4. Quem é maior, Verdi ou Wagner? A essa pergunta, clássica e incômoda, é melhor dar a resposta prudente de Mário de Andrade: não se mede altura entre altíssimos.
5. Wagner exige do ouvinte uma longuíssima passividade, uma embriaguez de ópio: seu O Anel do Nibelungo se desdobra por cerca de 15 horas. O esforço para ouvi-lo é elemento importante dessa estética e de sua sacralização.
6. Verdi, ao contrário, estimula emoções violentas com efeitos breves. Sua música é ativa, cheia de melodias boas de cantar e de lembrar. Esse material popular faz parte de sua estética. E aqui está uma grande dificuldade: um grande número de críticos desdenha essa facilidade de superfície, sem perceber que Verdi criou um mundo sonoro e reflexivo de infinita profundidade.
7. Sua música, além do papel militante que teve nas lutas pela unificação da Itália, põe em cena tiranos autoritários, mas ainda prostitutas, ciganos, escravos, para melhor nos revelar a humanidade dos excluídos. Verdi é um iluminista para quem a fraternidade constitui o mais forte dos valores. Sua obra nos dá ânimo para lutar por um mundo mais justo.
(Adaptado de: COLI, Jorge. Disponível em: www1.folha.uol.com.br)
Considere as afirmações abaixo.
I. O segmento Aqui, o humanismo é comovente... (3º parágrafo) alude ao caráter social da música de Verdi, cuja altivez contrapõe-se ao despojamento das composições de Wagner.
II. Ao comparar as obras de Verdi e Wagner, ambos grandes expoentes da ópera, o autor assinala diferenças de ordem estética entre as duas, como, por exemplo, o fato de a obra de Verdi, cuja melodia é boa de cantar, pode ser fruída com facilidade, diferentemente da de Wagner.
III. O autor recorre à citação de Mário de Andrade (4º parágrafo) a fim de explicitar que seria irrelevante julgar a superioridade artística da obra de Wagner frente à de Verdi e vice-versa.
IV. No texto, o autor relata alguns fatos da biografia de Verdi, destacando o caráter fraterno e generoso do artista.
Está correto o que consta APENAS de