GABARITO: ALTERNATIVA C

Pacientes falciformes com histórico de AVE (acidente vascular encefálico) tem indicação de serem avaliados para iniciar um regime de transfusões crônicas. Vamos entender por quê?

A anemia falciforme é a doença hereditária monogênica mais comum no Brasil, decorrente de uma mutação autossômica recessiva que determina a presença de uma hemoglobina anômala chamada HbS, com propriedades físico químicas particulares. Quando há homozigose SS, a produção de HbS é quase exclusiva, compondo 90% das hemoglobinas do paciente e favorecendo o chamado processo de falcização.

Nesse quadro, a HbS perde solubilidade quando as hemácias deixam o oxigênio nos tecidos, formando longos polímeros que alteram a membrana eritrocitária, dando-lhe a forma de meia-lua. Essas hemácias em foice são menos deformáveis que as normais e assim são propensas a sofrer hemólise precoce e obstruir a microcirculação dos tecidos.

É essa a fisiopatologia de todo o quadro da anemia falciforme, um estado hemolítico crônico marcado por inúmeros fenômenos vaso-oclusivos na circulação dos órgãos.

O sistema nervoso central é muito acometido, sendo o acidente vascular encefálico (AVE) uma das mais graves e debilitantes complicações dessa doença. É importante notar que acomete frequentemente as crianças: enquanto AVEs são raros na população pediátrica geral, estima-se que 11% dos portadores de anemia falciforme terão um episódio até os 20 anos de idade.

Em doentes com menos de 20 anos e em adultos com mais de 30 anos, há predomínio do AVE isquêmico. Já entre os 20 e 30 anos, é mais comum o acidente vascular encefálico (AVE) hemorrágico.

Caso o paciente não seja tratado após o primeiro evento cerebral agudo, a chance de recorrência de acidente vascular encefálico (AVE) é de 70%. Assim, é de suma importância instituir uma terapia com objetivo de reduzir a chance de novos episódios de AVE, sendo a principal medida o regime transfusional crônico.

O objetivo das transfusões de sangue nessa situação é reduzir a concentração da HbS para menos de 30% e assim diminuir a chance de falcização. Isto é feito com transfusões de hemácias regulares a cada 3 a 6 semanas, a depender dos níveis de HbS e de hemoglobina antes e depois desses procedimentos. A instituição de regime crônico de transfusão de sangue reduz dramaticamente o risco anual de recorrência a menos de 10%.

Essa terapia é tão efetiva que também é recomendada como profilaxia primária em pacientes de alto risco para primeiro episódio de AVE. A triagem precoce e o rastreamento sistemático para identificação de risco de doença cerebrovascular são feitos pelo doppler transcraniano anual, indicado em todo paciente falcêmico com idade entre 2 e 16 anos.

Pacientes com velocidade de fluxo cerebral maior de 200cm/s são classificados como de alto risco para AVE, devendo ser considerados para regime de transfusões crônicas.