Para responder a esta questão, inicialmente temos que relembrar alguns conceitos sobre trauma cervical PENETRANTE. Inicialmente, vamos conceituar trauma cervical penetrante: este é definido pela existência de uma solução de continuidade da pele e por lesões que PENETRAM O MÚSCULO PLATISMA, atingindo, assim, estruturas cervicais profundas.

Clinicamente, o pescoço é dividido em três zonas anatômicas:

Zona I – Estende-se do limite inferior da região cervical (uma linha que se estende da fúrcula do esterno até o processo espinhoso da sétima vértebra cervical, passando sobre a clavícula) até a margem inferior da cartilagem cricoide;

Zona II – Estende-se da margem inferior da cartilagem cricoide até uma linha paralela à margem inferior do corpo e ângulo da mandíbula. Esta é a zona mais frequentemente envolvida no trauma cervical penetrante, com uma incidência de 50 a 80% dos casos.

Zona III – Estende-se da linha paralela à margem inferior do corpo e ângulo da mandíbula até a base do crânio.

Quais são as estruturas importantes que encontramos em cada uma destas zonas?

Zona I – Artérias e veias subclávias, artérias vertebrais, plexo braquial e cadeia simpática, ducto torácico à esquerda, e vísceras como traqueia, esôfago e as cúpulas pleurais.

Zona II – Localizam-se as artérias carótidas comum direita e esquerda, e suas respectivas divisões terminais, artérias vertebrais, veias jugular interna direita e esquerda, nervos vago direito e esquerdo, nervos laríngeos recorrentes e frênicos, laringe, traqueia e esôfago. Nessa zona, a bainha carotídea envolve a artéria carótida comum e sua divisão, a veia jugular interna e o nervo vago.

Zona III – Representa a área de maior complexidade anatômica devido ao arcabouço ósseo que protege as estruturas nervosas e um grande número de vasos – artérias carótidas interna e externa e seus ramos, artéria vertebral, início da veia jugular interna. Além disso, a zona III contém pares cranianos (IX, X, XI, XII) e a faringe.

A associação entre o mecanismo de trauma, a localização da lesão na região cervical e os achados do exame físico permite ao médico suspeitar quais lesões podem ter ocorrido e selecionar os exames mais apropriados para o seu diagnóstico e a conduta.

Os achados do exame clínico são classificados como:

- SINAIS "GRAVES” ou “MAIORES”: São diagnósticos de lesão. No paciente com sinais maiores de lesão, o tratamento cirúrgico de emergência é necessário – Realiza-se cervicotomia acompanhando a borda anterior do músculo esternocleidomastoideo da zona I à zona III.

- SINAIS “LEVES” ou “MENORES”: São aqueles que são suspeitos de lesão. Os pacientes com sinais menores devem ser estudados por meio de métodos de imagem e/ou endoscópicos, para confirmar a lesão e estabelecer qual o melhor tratamento a ser realizado.

Observe quais são os sinais menores e sinais maiores no exame clínico cervical:

Ou seja, a evidência de hemorragia ativa ou lesão aerodigestiva óbvia são indicações de exploração cirúrgica imediata, independentemente da localização anatômica, enquanto que as lesões estáveis do pescoço podem ser avaliadas por meio de exames diagnósticos seletivos.

Veja que este paciente apresenta um sinal maior (“ferida soprante") e, portanto, deve ser abordado cirurgicamente - neste caso, deve ser submetido à cervicotomia exploradora para reparo da lesão laríngea ou traqueal já identificada na sala de trauma. Veja, entretanto, que o autor nos questiona qual a primeira conduta que deve ser adotada e, assim como qualquer trauma, o atendimento de uma vítima de um ferimento penetrante no pescoço deve seguir o “ABCDE” da avaliação primária.

Na suspeita de comprometimento da via aérea, devemos garantir uma via aérea definitiva, e um tubo orotraqueal deve ser introduzido cuidadosamente, preferencialmente sob visão direta, para não exacerbar uma lesão existente.

A edição mais recente do ATLS, 10a edição, diz que a obstrução total da via aérea ou insuficiência respiratória grave, decorrentes de trauma da laringe ou traqueia, justificam a tentativa de intubação orotraqueal (auxiliada com o uso de um fibroscópio flexível, se prontamente disponível).

A utilização do fibroscópio flexível permite a identificação da lesão e avaliação de sua gravidade, bem como proporcionará a capacidade de aspirar sangue e muco para melhorar a visão. Ainda, a intubação com fibra óptica não requer hiperextensão do pescoço para laringoscopia direta e, portanto, pode ser realizada mantendo a estabilização da coluna cervical. Finalmente, a orientação broncoscópica pode permitir que o balonete do tubo endotraqueal seja posicionado além do nível da lesão antes da insuflação. A alternativa correta é a letra B).

Uma via aérea cirúrgica está indicada nas seguintes situações:

• Falha de intubação orotraqueal;

• Distorção anatômica das vias aéreas superiores (por exemplo, desvio de traqueia causado por hematoma cervical volumoso);

• Traumatismo facial extenso com sangramento orofaríngeo importante que impossibilita a aspiração adequada e visualização das cordas vocais;

• Edema de glote.

Nessas situações, geralmente a via aérea cirúrgica realizada é a cricotireoidostomia, mas, na suspeita de uma lesão de laringe, a via aérea cirúrgica de escolha é a traqueostomia, porque a cricotireoidostomia pode ser ineficaz.