Caso Clínico de Acidente Automobilístico: como proceder, tempos do trauma e mais!

Caso Clínico de Acidente Automobilístico: como proceder, tempos do trauma e mais!

E aí, doc! Vamos ver mais um caso clínico? O tema de hoje é Acidente Automobilístico, uma das principais causas de morte no Brasil e no mundo. 

O Estratégia MED está aqui para contribuir com seu entendimento e enriquecer seus conhecimentos, ajudando você a se tornar um profissional mais capacitado. Vamos começar!

Identificação

Paciente FLD, 32 anos, sexo feminino, trazida à emergência pela SAMU após sofrer um acidente automobilístico.

Queixa Principal

Muita dor na região do peito e dificuldade para respirar.

História do trauma

Paciente estava voltando do trabalho de carro, quando colidiu com outro carro desgovernado que vinha na direção contrária. Ela relatou que foi tudo muito rápido, o airbag foi acionado, mas mesmo assim, bateu o tórax no volante. Após isso, começou a sentir muita dor no peito e dificuldade de respirar. 

Avaliação primária

A: Via aérea (Airway): via aérea livre; abertura de via aérea do paciente com extensão do pescoço. Paciente chegou com cateter nasal e logo foi trocado por uma máscara Venturi à 50%.

B: Respiração (Breathing): redução do murmúrio vesicular e do frêmito tóraco-vocal em lado esquerdo, diminuição local da expansibilidade torácica com aumento do volume do hemitórax envolvido e hipertimpanismo à percussão. FR: 27 ipm; STO2: 94% (pós máscara Venturi).

C: Circulação: Hemodinamicamente estável. Pulsos cheios e simétricos. Ausência de cianose. Exame abdominal sem alterações, pelve estável. FC: 120 bpm; PA: 130 x 90 mmHg.

D: Avaliação neurológica: Pupilas isocóricas, fotorreagentes. Glasglow 14 (AO=4, RV=4, RM=6)

E: Exposição: Paciente possui algumas escoriações em face e membros superiores. Apresenta equimose em região torácica esquerda.

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Avaliação Secundária

  • S: Sinais e Sintomas: Apresenta dor no peito e dificuldade de respirar;
  • A: Alergias: Nega alergias medicamentosas;
  • M: Medicamentos: Não faz uso de nenhum medicamento diariamente;
  • P: Passado médico: Nega cirurgias prévias;
  • L: Líquidos e alimentos ingeridos recentemente: lanchou uma barra de cereal no trabalho;
  • A: ambientes e eventos relacionados com o trauma: Paciente estava voltando do trabalho quando colidiu com outro carro desgovernado que vinha na direção contrária. Ela relatou que foi tudo muito rápido e o airbag foi acionado, mas mesmo assim, bateu o tórax no volante.

Hipóteses diagnósticas

Pneumotórax: nesse contexto, o pneumotórax ocorre quando há a presença de ar no espaço pleural, causando o colapso parcial ou total do pulmão afetado. A história de trauma automobilístico, associada à dor torácica aguda, dificuldade respiratória e diminuição do murmúrio vesicular no exame físico, sugere inicialmente essa possibilidade. A confirmação do diagnóstico é obtida por meio de exames de imagem, como a radiografia de tórax, que evidenciaria a presença de ar na cavidade pleural. Vale ressaltar que o pneumotórax pode ocorrer isoladamente ou associado a outras lesões torácicas.

Hemotórax: envolve a acumulação de sangue no espaço pleural devido a lesões nos vasos sanguíneos torácicos. No caso em questão, a contagem ligeiramente aumentada de hemácias no hemograma pode levantar a suspeita de um possível hemotórax associado ao trauma automobilístico. A presença de dor torácica, dificuldade respiratória e sinais de hipovolemia, como hipotensão, podem apoiar essa suspeita clínica. 

Definição de Pneumotórax 

O pneumotórax simples ocorre quando o ar penetra no espaço virtual entre as camadas da pleura, a visceral que envolve os pulmões e a parietal que reveste a parede torácica. Normalmente, a cavidade torácica está preenchida pelo pulmão, mantendo um contato íntimo com a parede torácica devido à tensão superficial entre as superfícies pleurais. 

A presença de ar no espaço pleural interrompe a aderência entre as camadas da pleura, levando ao colapso do pulmão. Esse colapso afeta a ventilação/perfusão, pois o sangue que circula em áreas não ventiladas não recebe oxigênio.

O pneumotórax pode ser causado tanto por trauma penetrante quanto contuso. Após um trauma contuso, a laceração pulmonar com vazamento de ar é a causa mais frequente de pneumotórax. Isso destaca a importância do reconhecimento precoce e do tratamento adequado, uma vez que o vazamento de ar compromete a integridade do espaço pleural, impactando significativamente a função pulmonar e a oxigenação do sangue.

O pneumotórax hipertensivo ocorre quando há um mecanismo de escape de ar do pulmão para o espaço pleural que age como uma válvula unidirecional, impedindo que o ar saia. Isso resulta no colapso completo do pulmão afetado. O mediastino, estrutura que separa os pulmões, é deslocado para o lado oposto, causando compressão no pulmão do lado contrário e reduzindo o retorno venoso. 

Esse deslocamento do mediastino diminui significativamente o retorno de sangue para o coração, levando a uma diminuição acentuada no débito cardíaco. Esse estado de choque, decorrente da obstrução do retorno venoso, é conhecido como choque obstrutivo. Esse quadro clínico exige intervenção urgente para aliviar a pressão no espaço pleural e restaurar a função pulmonar e circulatória adequadas.

Fonte: ATLS – 10ª Edição, 2018

Diagnóstico de Pneumotórax Simples

Ao realizar uma avaliação detalhada do tórax em um paciente após um trauma, é fundamental verificar a presença de manchas roxas (equimoses), cortes (lacerações) e inchaços (contusões) na área torácica. 

Examine cuidadosamente a superfície do tórax em busca de hematomas, marcas de impacto ou feridas. Durante essa inspeção, avalie também a sensibilidade local, inchaço e possíveis deformidades que possam indicar lesões subjacentes.

Observe o movimento da parede torácica durante a respiração para identificar qualquer assimetria, restrição ou anormalidade que possa sugerir uma lesão, como uma possível fratura costal ou pneumotórax. Compare o som e a intensidade do murmúrio vesicular ao auscultar os pulmões com um estetoscópio, analisando possíveis diferenças entre os lados. No caso de um pneumotórax, é comum observar uma diminuição do murmúrio vesicular no lado afetado.

Quando se suspeita de um pneumotórax, a percussão do tórax pode fornecer informações adicionais. A presença de hipertimpanismo, indicando um som mais agudo e ressonante ao percutir, pode sugerir a presença de ar no espaço pleural. 

Para confirmar o diagnóstico, uma radiografia de tórax, preferencialmente realizada durante a expiração, pode ser útil. Entretanto, é importante considerar que essa abordagem pode não ser apropriada em casos de trauma contuso, sendo mais indicada em situações de trauma penetrante.

Tratamento de Pneumotórax Simples

O tratamento para um pneumotórax simples geralmente envolve a inserção de um dreno de tórax no quinto espaço intercostal, na linha axilar anterior. Essa técnica é eficaz para aliviar a pressão no espaço pleural e permitir a reexpansão pulmonar. A observação e aspiração de um pneumotórax assintomático podem ser consideradas em alguns casos, mas a decisão deve ser tomada por um médico qualificado.

Após a inserção do dreno de tórax, este é conectado a um sistema de selo d’água, podendo ou não incluir aspiração. Após essa intervenção, é necessário realizar uma radiografia de tórax para confirmar a reexpansão pulmonar e garantir o sucesso do tratamento. 

É importante ressaltar que pacientes vítimas de pneumotórax traumático ou com risco de desenvolvê-lo durante procedimentos cirúrgicos não devem ser submetidos à anestesia geral ou ventilação mecânica com pressão positiva até que o tórax seja drenado.

Em situações selecionadas, como quando um pneumotórax subclínico é diagnosticado, a equipe médica pode optar pela observação cuidadosa quanto a sinais clínicos de expansão do pneumotórax. No entanto, a abordagem mais segura, especialmente para evitar a evolução para um pneumotórax hipertensivo, é realizar a drenagem torácica precocemente.

Para pacientes com pneumotórax que necessitam de transporte aéreo, é recomendável realizar a drenagem antes do transporte, mesmo em ambientes pressurizados, a fim de prevenir complicações durante o voo.

De olho na prova!

Não pense que esse assunto fica fora das provas, seja da faculdade, concurso ou residência. Veja um exemplo logo abaixo:

SP – SECRETARIA MUNICIPAL DA SAÚDE DE SÃO PAULO – SMS – 2024

Um paciente de 35 anos de idade foi levado ao hospital por uma ambulância após um acidente de trânsito de alta velocidade. O paciente estava dirigindo um veículo sem utilizar o cinto de segurança, quando colidiu frontalmente com outro carro. No local do acidente, ele foi encontrado preso às ferragens e retirado com a ajuda dos bombeiros. Ao exame físico, encontrava-se com temperatura = 36,8 °C, FC = 120 bpm, FR = 30 irpm, PA= 80 mmHg X 60 mmHg e SatO2 = 88% a.a. O paciente apresentava dispneia, deformidades no membro superior esquerdo, distensão abdominal e hematomas na face. A radiografia do tórax revelou múltiplas costelas fraturadas e um pneumotórax à esquerda. A tomografia computadorizada do abdome mostrou uma ruptura de baço e uma lesão no fígado.

Com base nesse caso clínico, no que se refere à conduta inicial mais apropriada para esse paciente, assinale a alternativa correta:

A) Realizar uma laparotomia exploratória imediatamente.

B) Iniciar antibióticos de amplo espectro para prevenir infecções.

C) Realizar drenagem torácica fechada em selo d’água à esquerda.

D) Estabilizar o paciente com cristaloides e concentrado de hemácias.

E) Realizar uma broncoscopia para avaliar a árvore brônquica.

Opção correta: Alternativa “C”

Comentário da questão:

A) O paciente tem indicação de laparotomia para controle da hemorragia (C). Mas antes, devemos drenar o tórax esquerdo devido ao pneumotórax (B)

B) Deve ser feita antibioticoprofilaxia antes da indução anestésica, mas não é a prioridade nesse momento.

C) CORRETA. Drenagem torácica esquerda é a prioridade nesse caso.

D) Esta conduta está correta, mas faz parte do C (circulação e controle de hemorragia) e deverá ser feita após o B (respiração e ventilação – drenagem torácica).

E) No cenário de trauma, a broncoscopia só estaria indicada para diagnóstico de lesão da árvore traqueobrônquica, em pacientes estáveis. 

Não é o caso do nosso paciente.

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Referências

AMERICAN COLLEGE OF SURGEONS. ATLS – Advanced Trauma Life Support for Doctors. 10. ed. Chicago: Committee on Trauma, 2018.

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