Olá, meu Doutor e minha Doutora! Esse caso clínico apresenta uma jovem de 24 anos que procura atendimento devido à irregularidade menstrual crônica, aumento de pelos no corpo e ganho de peso progressivo. Diante desses achados, foi realizada uma investigação clínica e laboratorial. Vamos ao caso!
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Informações do paciente
- Nome: J. S.
- Idade: 24 anos
- Motivo de consulta: “meu ciclo menstrual é muito irregular e tenho muito cabelo no rosto e no corpo.”
Histórico da moléstia atual
Ciclo menstrual
- DUM: última menstruação há aproximadamente 3 meses.
- Ciclos: ciclos irregulares desde a menarca, variando entre 40 a 90 dias. Episódios de amenorreia prolongada.
- Menarca: menarca aos 12 anos
- Sexarca: sexarca aos 18 anos.
- Relações sexuais: ativas.
- Número de parceiros: dois parceiros nos últimos anos.
- Preservativo: uso inconsistente.
- Método contraceptivo: não utiliza método contraceptivo atualmente. Já fez uso de anticoncepcionais orais na adolescência para regularizar os ciclos, mas descontinuou há um ano.
- GPA (gestações, partos e abortos): G0P0A0
- Papanicolau: último exame há 2 anos, sem alterações.
- Secreção vaginal: nega corrimento anormal, prurido ou odor desagradável.
- TRH (Terapia de Reposição Hormonal): não aplicável no momento.
Crescimento dos pelos
- Início: desde a adolescência, com piora progressiva nos últimos anos.
- Localização: rosto (buço, mento e mandíbula), tórax (região esternal), abdome (linha alba) e dorso (região lombossacra).
- Intensidade: moderada a intensa, classificada como hirsutismo com escore de Ferriman-Gallwey ≥ 8.
- Características: pelos grossos, escuros e de padrão masculino. Paciente refere necessidade frequente de depilação.
- Frequência: crescimento acelerado e necessidade de remoção a cada poucos dias.
- Fator de melhora: nenhum fator de melhora identificado.
- Fator de piora: ganho de peso, períodos prolongados sem uso de anticoncepcionais hormonais.
- Quadro prévio: relata que o crescimento dos pelos já era perceptível na adolescência, mas piorou após os 18 anos.
Outros sintomas
Associado à irregularidade menstrual, acne inflamatória, rarefação capilar e ganho de peso progressivo.
História patológica pregressa
- Doença de base: nenhuma doença crônica diagnosticada previamente.
- Uso de medicamentos contínuos: não faz uso regular de medicamentos. Já utilizou contraceptivo oral para regularizar o ciclo, mas descontinuou há um ano.
- Alergias: nega.
- Cirurgias e hospitalizações prévias: nega internações ou cirurgias.
Histórico familiar
- Mãe com histórico de ciclos irregulares na juventude, sobrepeso e diagnóstico de Diabetes Mellitus tipo 2.
- Irmã com diagnóstico de SOP.
- Parentes de primeiro grau com história de obesidade, hipertensão arterial sistêmica e resistência à insulina.
Histórico social
- Etilismo: socialmente, raramente.
- Tabagismo: nega.
- Alimentação: rica em carboidratos refinados e alimentos ultraprocessados. Refere consumo insuficiente de fibras e proteínas.
- Sono: relata padrão de sono irregular, dormindo em média 5-6 horas por noite.
- Atividade física: sedentária.
- Trabalho: trabalha como assistente administrativa, com rotina predominantemente sedentária.
Exame físico
Sinais Vitais
- Pressão arterial: 130/85 mmHg
- Frequência cardíaca: 78 bpm
- IMC: 30 kg/m² (obesidade grau I)
- Relação cintura/quadril: 0,78
Achados no exame físico
- Pele: presença de acantose nigricans em região cervical e axilar. Acne inflamatória moderada em face e região torácica superior.
- Pelos: hirsutismo com escore de Ferriman-Gallwey ≥ 8.
- Cabelos: rarefação capilar padrão androgenético.
- Exame abdominal: discreta adiposidade central. Sem massas palpáveis.
- Exame ginecológico: sem alterações aparentes.
Exames complementares
Exames Laboratoriais
- Glicemia de jejum: 105 mg/dL (limítrofe para pré-diabetes)
- Hemoglobina glicada (HbA1c): 5,8%
- Insulina basal: 22 µU/mL (aumentada, sugestiva de resistência à insulina)
- Teste de tolerância à glicose: pico glicêmico de 180 mg/dL após 2h
Perfil lipídico
- Triglicerídeos: 160 mg/dL (elevado)
- HDL: 42 mg/dL (reduzido)
- LDL: 140 mg/dL (limítrofe)
Hormônios reprodutivos
- LH: 12 mUI/mL
- FSH: 4,5 mUI/mL (relação LH/FSH > 2:1)
- Testosterona total: 75 ng/dL (aumentada)
- Testosterona livre: 10 pg/mL (aumentada)
- Androstenediona: 250 ng/dL (aumentada)
- Estrona: 80 pg/mL (elevada)
- Estradiol: 50 pg/mL (níveis da fase folicular precoce)
- Progesterona (21º dia do ciclo): 1,5 ng/mL (indicando anovulação)
- Prolactina: Normal
- TSH: Normal
- 17-OH-progesterona: Normal
- Cortisol urinário 24h: Normal
Exames de imagem
Ultrassonografia transvaginal
- Ovários aumentados de volume, com múltiplos folículos periféricos (≥ 20 folículos entre 2-9 mm);
- Volume ovariano aumentado (> 10 cm³); e
- Estroma ovariano espessado.
Diagnóstico
A paciente apresenta Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP), baseada nos Critérios de Rotterdam, com irregularidade menstrual crônica (oligo/anovulação), sinais clínicos e laboratoriais de hiperandrogenismo (hirsutismo, acne, elevação de testosterona livre) e achados ultrassonográficos sugestivos (ovários aumentados e multifoliculares). O quadro também está associado à resistência à insulina e síndrome metabólica, evidenciada por acantose nigricans, hiperinsulinemia e alterações no perfil glicêmico e lipídico.
Resumo da síndrome dos ovários policísticos (SOP)
Definição
A Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP) é um distúrbio endócrino caracterizado por hiperandrogenismo, anovulação crônica e presença de múltiplos folículos ovarianos, sendo uma das principais causas de infertilidade feminina.
Etiologia
A origem da SOP ainda não é completamente compreendida, mas acredita-se que seja multifatorial, envolvendo predisposição genética e fatores ambientais. A resistência periférica à insulina desempenha um papel central, levando ao aumento da insulina circulante, que reduz os níveis da globulina transportadora de hormônios sexuais (SHBG) e eleva a testosterona livre. O excesso de andrógenos contribui para a anovulação crônica e hiperandrogenismo, gerando sintomas clínicos como hirsutismo, acne e irregularidade menstrual.
Epidemiologia e Fatores de Risco
A SOP é a endocrinopatia mais comum em mulheres em idade reprodutiva, afetando entre 5 a 10% dessa população. Além disso, está presente em 30-40% das mulheres com infertilidade e 80% das pacientes com hiperandrogenismo.
Os principais fatores de risco incluem história familiar de SOP, obesidade, resistência à insulina, síndrome metabólica e fatores ambientais como dieta desbalanceada e sedentarismo.
Sintomas
O quadro clínico da SOP é variável e pode incluir oligomenorreia ou amenorreia, acne, seborreia, hirsutismo (escore de Ferriman ≥ 8) e alopécia androgenética. Também pode haver obesidade central, acantose nigricans, resistência à insulina, dislipidemia e maior risco cardiovascular. A infertilidade é uma queixa comum e algumas pacientes podem apresentar abortamento de repetição.
Diagnóstico
O diagnóstico da SOP é baseado nos Critérios de Rotterdam, que exigem pelo menos dois dos três critérios:
- Oligo/anovulação (irregularidade menstrual crônica);
- Sinais clínicos ou bioquímicos de hiperandrogenismo (hirsutismo, acne, elevação de andrógenos); e
- Padrão ultrassonográfico sugestivo (≥ 20 folículos de 2-9 mm e/ou volume ovariano > 10 cm³).
Tratamento
O tratamento da SOP é individualizado, com foco em controle dos sintomas e prevenção de complicações metabólicas. A mudança do estilo de vida é a primeira abordagem, incluindo redução de peso, dieta equilibrada e atividade física.
Para controle do hiperandrogenismo e regulação do ciclo menstrual, indicam-se anticoncepcionais orais combinados com efeito antiandrogênico (Etinilestradiol + Ciproterona). O hirsutismo pode ser tratado com Espironolactona, Finasterida ou Acetato de Ciproterona.
Nos casos de resistência à insulina, a Metformina é uma opção terapêutica para melhorar a sensibilidade à insulina e restaurar a ovulação. Para pacientes que desejam engravidar, o tratamento pode incluir indutores da ovulação, como Citrato de Clomifeno ou Letrozol, e, em casos refratários, fertilização in vitro (FIV) pode ser considerada.
Questões para orientar o caso clínico
Quais são os critérios de Rotterdam para o diagnóstico de SOP?
Oligo/anovulação, hiperandrogenismo clínico ou laboratorial e ovários policísticos na ultrassonografia (≥ 20 folículos ou volume > 10 cm³).
Qual é a principal alteração metabólica associada à SOP?
Resistência à insulina, que pode levar à hiperinsulinemia, síndrome metabólica e maior risco cardiovascular.
Qual é a primeira linha de tratamento para a SOP em pacientes sem desejo reprodutivo?
Anticoncepcionais orais combinados com efeito antiandrogênico (ex: Etinilestradiol + Ciproterona) e mudança do estilo de vida (dieta e atividade física).
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Referências Bibliográficas
- BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção Especializada à Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas – Síndrome de Ovários Policísticos. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2019.