Resumo sobre Síndrome da Bexiga Dolorosa: definição, manifestações clínicas e mais!
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Resumo sobre Síndrome da Bexiga Dolorosa: definição, manifestações clínicas e mais!

E aí, doc! Vamos explorar mais um tema essencial? Hoje o foco é a Síndrome da Bexiga Dolorosa, também conhecida como cistite intersticial, uma condição crônica caracterizada por dor pélvica, urgência e frequência urinária. 

O Estratégia MED está aqui para descomplicar esse conceito e ajudar você a aprimorar seus conhecimentos, garantindo uma prática clínica cada vez mais assertiva.

Vamos nessa!

Definição da Síndrome da Bexiga Dolorosa

A síndrome da bexiga dolorosa (SBD), também chamada de cistite intersticial (CI), é uma condição inflamatória crônica que afeta a parede da bexiga. A dor característica da SBD tende a se intensificar com o enchimento da bexiga e geralmente alivia, pelo menos parcialmente, após o esvaziamento vesical.

Embora a causa exata da SBD ainda não seja totalmente compreendida, diversas hipóteses foram levantadas. Entre elas, destacam-se a possibilidade de infecções crônicas, doenças autoimunes, disfunções do urotélio, ativação de mastócitos, inflamação neuronal, exposição a toxinas ou elementos dietéticos, além de fatores psicossomáticos. 

Essa condição pode coexistir com outras síndromes de dor crônica, como fibromialgia e síndrome do intestino irritável, e está associada a uma redução significativa da qualidade de vida dos pacientes. 

Fisiopatologia da Síndrome da Bexiga Dolorosa

Evidências sugerem uma combinação de fatores genéticos, alterações na barreira urotelial, inflamação e disfunção neurológica como os principais contribuintes para o desenvolvimento da condição.

Um possível fator genético é indicado pela maior concordância de SBD entre gêmeos monozigóticos em comparação com dizigóticos, sugerindo uma predisposição hereditária. Além disso, pacientes com SBD apresentam várias anormalidades uroteliais, como:

  • Alteração na expressão de antígenos de classe I e II do complexo principal de histocompatibilidade (HLA).
  • Redução da expressão de uroplaquina e sulfato de condroitina.
  • Perfil alterado de citoqueratinas, aproximando-se de células escamosas.
  • Integridade comprometida da camada de glicosaminoglicanos (GAG).
  • Defeitos nas proteínas de Tamm-Horsfall.
  • Aumento da expressão de interleucina-6 e receptores de ATP P2X3.
  • Ativação exacerbada do gene NFkB.

A camada de GAG, que normalmente protege a superfície urotelial e impede a permeabilidade aos solutos, parece desempenhar um papel central na SBD. Defeitos nessa camada permitem a entrada de irritantes urinários no urotélio, desencadeando inflamação, ativação de nervos subjacentes e lesão tecidual. Esses processos agravam a dor e aumentam a sensibilidade vesical. Além disso, mastócitos da bexiga podem contribuir para o dano contínuo após um insulto inicial.

Outro componente importante é a disfunção neurológica. A sensibilização central e a ativação aumentada dos neurônios sensoriais da bexiga durante o enchimento normal podem resultar em dor exacerbada. 

Essa hipersensibilidade pode estar localizada na própria bexiga ou estar relacionada a alterações nos caminhos neurais centrais, levando à amplificação da percepção da dor. Essa alteração também explica a sensibilidade suprapúbica frequentemente observada em pacientes com SBD.

Manifestações clínicas da Síndrome da Bexiga Dolorosa

As manifestações clínicas da síndrome da bexiga dolorosa (SBD), ou cistite intersticial, caracterizam-se principalmente por sensações persistentes e desagradáveis atribuídas à bexiga, com desconforto que se intensifica durante o enchimento vesical e alivia após a micção. Esses sintomas podem incluir dor, pressão, desconforto ou espasmos, variando em intensidade de leve a severa.

A localização típica da dor é suprapúbica ou uretral, mas pode envolver dor unilateral no abdômen inferior ou na região lombar, especialmente com o enchimento vesical. Os sintomas, geralmente de início gradual, tendem a piorar ao longo de meses, embora alguns pacientes relatem início abrupto ou severo.

Além disso, a dor e outros sintomas podem ser exacerbados por alimentos ou bebidas específicos, estresse, atividades como exercícios físicos ou relações sexuais, sedentarismo prolongado e, em mulheres, pela fase lútea do ciclo menstrual.

Os pacientes frequentemente apresentam aumento da frequência miccional, não para evitar incontinência, mas para manter volumes vesicais baixos e, assim, minimizar o desconforto. 

Em casos extremos, há relatos de pacientes que permanecem longos períodos no banheiro, deixando a urina escorrer continuamente para aliviar a dor. A urgência urinária e a noctúria também são comuns, embora a incontinência urinária seja rara.

No exame físico, é comum encontrar sensibilidade variável na parede abdominal, no assoalho pélvico, na base da bexiga e na uretra. Essa sensibilidade decorre da sensibilização de fibras nervosas aferentes associadas à bexiga. Homens podem apresentar dor escrotal e peniana, e mulheres frequentemente relatam disfunção sexual, muitas vezes associada à coexistência de vulvodínia.

Muitos pacientes com SBD apresentam sintomas de outras condições de dor crônica, como síndrome do intestino irritável, fibromialgia e vulvodínia, que podem contribuir para o comprometimento da qualidade de vida. Os sintomas levam frequentemente à interrupção de atividades diárias, afetando tanto a vida pessoal quanto a profissional.

Diagnóstico de Síndrome da Bexiga Dolorosa

A Síndrome da Bexiga Dolorosa (SBD) é diagnosticada em três etapas principais. Primeiro, identificam-se pacientes com suspeita clínica, considerando sintomas como dor pélvica relacionada ao enchimento da bexiga, aumento da frequência urinária, urgência e noctúria. 

Em seguida, excluem-se condições que expliquem os sintomas, como infecções urinárias e doenças ginecológicas. Por fim, a classificação depende da presença de características específicas na cistoscopia, como glomerulações e úlceras de Hunner, embora a ausência dessas lesões não exclua o diagnóstico.

A anamnese detalhada é essencial e busca associar os sintomas à fase de enchimento vesical e identificar fatores agravantes, como dieta, estresse e ciclo menstrual. O exame físico avalia a região pélvica, com atenção à sensibilidade suprapúbica e do colo vesical, enquanto diários miccionais ajudam a mensurar a frequência e o padrão das micções. Análises laboratoriais, como exame de urina e urocultura, descartam infecções e hematúria, enquanto a cistoscopia é usada para excluir neoplasias e identificar lesões típicas da SBD.

Exames adicionais, como hidrodistensão vesical, são indicados em casos específicos, especialmente na busca por glomerulações e avaliação da capacidade vesical. Testes de imagem, como ultrassonografia, podem ser úteis em situações que demandam exclusão de patologias anatômicas.

O diagnóstico frequentemente enfrenta atrasos, com média de três a sete anos após o início dos sintomas. Isso ocorre devido à complexidade dos critérios diagnósticos e à sobreposição com outras condições, como fibromialgia, endometriose e vulvodínia. Essas condições associadas devem ser investigadas, pois impactam o manejo e a qualidade de vida do paciente.

FLuxograma do diagnóstico
Fonte: Tratado de Ginecologia FEBRASGO – 1. ed.

Tratamento da Síndrome da Bexiga Dolorosa

As medidas conservadoras representam a primeira linha terapêutica para o tratamento da SBD, sendo complementares às medidas educativas. Essa abordagem tem como foco mudanças no estilo de vida e estratégias comportamentais para reduzir os sintomas e melhorar a qualidade de vida das pacientes.

Dieta: evitar alimentos que podem exacerbar os sintomas, como café, chá, frutas cítricas, bebidas alcoólicas e derivados do trigo, é fundamental. Recomenda-se a suspensão desses itens por duas semanas, com reintrodução gradual para identificar possíveis desencadeantes.

Modificação do estilo de vida: a prática regular de exercícios físicos e o abandono do tabaco e drogas recreativas auxiliam no controle dos sintomas, sendo eficazes em até 65% dos casos.

Treinamento vesical: consiste no aumento gradual do intervalo entre as micções, buscando ampliar a capacidade da bexiga e reduzir episódios de urgência.

Suporte psicológico: medidas como redução do estresse, terapia, prática de meditação e ioga são essenciais para pacientes com sintomas crônicos e impacto emocional significativo.

Além das medidas conservadoras, pode incluir abordagens farmacológicas, intervenções minimamente invasivas e, em casos mais graves, procedimentos cirúrgicos. Veja abaixo as principais opções:

1. Tratamento farmacológico:

  • Analgésicos e anti-inflamatórios: para alívio da dor, podem ser usados medicamentos como paracetamol e AINEs, com foco no controle dos sintomas.
  • Antidepressivos tricíclicos (ex.: amitriptilina): auxiliam na redução da dor crônica e na modulação da sensibilidade nervosa.
  • Antiespasmódicos (ex.: hioscina): reduzem as contrações involuntárias da bexiga, diminuindo a urgência urinária.
  • Antihistamínicos (ex.: hidroxizina): para pacientes com histórico de alergias, atuam na redução da hiperatividade mastocitária da bexiga.
  • Glicosaminoglicanos orais (ex.: pentosano polissulfato de sódio): reconstituem a camada protetora do epitélio vesical, reduzindo a inflamação local.

2. Tratamento intravesical:

  • Instilações vesicais: consistem na administração de medicamentos diretamente na bexiga, como dimetilsulfóxido (DMSO), lidocaína, ou ácido hialurônico, com objetivo de aliviar a dor e melhorar a função vesical. Esse método é indicado para casos refratários ao tratamento oral.

3. Intervenções minimamente invasivas:

  • Hidrodistensão vesical: realizada por meio de cistoscopia, consiste em distender a bexiga com líquido sob pressão. Pode proporcionar alívio temporário da dor em alguns pacientes.
  • Neuromodulação sacral: indicado para pacientes com sintomas graves, utiliza estímulos elétricos nos nervos sacrais para reduzir a dor e melhorar o controle vesical.

4. Tratamento cirúrgico:

Em casos graves e refratários a todas as outras abordagens, pode-se considerar procedimentos cirúrgicos como:

  • Cistectomia parcial ou total: remoção de parte ou de toda a bexiga, geralmente associada à reconstrução do trato urinário.
  • Cirurgias reconstrutivas: para restaurar ou substituir áreas afetadas da bexiga.

O plano terapêutico deve ser individualizado, considerando a gravidade dos sintomas, as condições clínicas da paciente e a resposta às terapias iniciais. A combinação de diferentes modalidades pode ser necessária para alcançar melhores resultados.

Veja também!

Referências

J Quentin Clemens, MD, FACS, MSCI. Interstitial cystitis/bladder pain syndrome: Clinical features and diagnosis. UpToDate, 2024. Disponível em: UpToDate

Tratado de Ginecologia FEBRASGO – 1. ed. – Rio de Janeiro: Elsevier, 2019. BEREK, J.S.

J Quentin Clemens, MD, FACS, MSCI. Interstitial cystitis/bladder pain syndrome: Management. UpToDate, 2024. Disponível em: UpToDate

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