Quer saber mais sobre a apendicite? O Estratégia MED separou as principais informações sobre o assunto para você. Vamos lá!
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O que é apendicite
A apendicite é o quadro de inflamação do apêndice, uma estrutura vermiforme, intraperitoneal, tubular e ligada ao ceco. A principal função relacionada a essa estrutura é imunológica, especialmente por possuir diversos folículos linfóides localizados nas camadas submucosa e serosa, agregado nomeado de GALT (gut associated lymphoid tissue). Costuma ter entre 8 a 10 centímetros de comprimento e está próximo à válvula ileocecal. Sua projeção sobre a parede abdominal anterior está localizada no ponto de McBurney, definido como os dois terços distais de uma linha traçada entre a cicatriz umbilical e a crista ilíaca anterossuperior direita. Importante mencionar que, em relação ao ceco, o apêndice pode apresentar diversas posições que, inclusive, podem influenciar a abordagem cirúrgica. As principais são:
- Retrocecal;
- Paracecal;
- Pré-ileal;
- Pós-ileal;
- Subcecal; e
- Pélvica.
O quadro de apendicite aguda é uma das situações inflamatórias mais comuns no mundo, pode apresentar etiologia multifatorial e possuir envolvimento infeccioso, especialmente por bactérias (como Escherichia coli, Pseudomonas e Peptostreotococcus) ou por helmintos, em até 3% dos casos (como teníase, ascaridíase, angiostrongilíase, multiparasitose e enterobiose).
Tipicamente, a apendicite é causada por sua obstrução luminal, o que pode acontecer devido a tumores, parasitas, hiperplasia linfonodal, fecalito ou corpo estranho. Acontece, então, hipersecreção de muco com grande aumento na pressão na luz do apêndice. Por fim, há uma importante compressão vasculonervosa com estase venosa, falta de irrigação, isquemia e, consequentemente, necrose. Infecções bacterianas podem, também, serem secundárias a esse processo que acaba comprometendo a integridade da barreira mucosa. Algumas das consequências possíveis do quadro são: perfuração da víscera, peritonite generalizada ou formação de abscesso.
No mundo, são registrados mais de 300 mil casos novos todos os anos e a incidência da afecção pode chegar a 2% na população geral. A faixa etária mais comprometida é a de indivíduos entre 20 e 30 anos, com pequena predileção por homens.
Evolução clínica da apendicite
O principal sintoma inicial da apendicite aguda é a dor abdominal que pode se apresentar junto com vômitos, náuseas e anorexia. Normalmente a dor apresenta importante piora dentro de 12 a 24 horas do seu início. A apresentação clínica mais comum (que acontece entre 50 e 60% dos casos) é descrita na sequência de Murphy, quando a dor começa na região epigástrica ou periumbilical, com característica de ser dor visceral, que não é aliviada pela evacuação ou flatos. Então, os sintomas seguintes são: anorexia, vômitos e náuseas. Após 6 a 12 horas, a dor tende a se tornar mais localizada e intensa na região da fossa ilíaca direita. Constipação e febre baixa, assim como interrupção da liberação de flatos, podem estar presentes.
Outros sintomas menos frequentes que são comumente encontrados são: dor no hipocôndrio esquerdo (especialmente nos casos de apendicite com localização retrocecal), queixas retais e disúria.
Com a evolução clínica do quadro, o exame físico da parede abdominal pode indicar descompressão dolorosa e rigidez da parede, além disso, abscessos periapendiculares podem ser palpados. Vale ressaltar que casos com evolução para perfuração do apêndice possuem elevada taxa de morbidade e mortalidade, quando pode apresentar sinais difusos de peritonite, sepse e piora intensa da dor.
Alguns achados semiológicos que podem estar presentes são:
- McBurney: com dor ou reflexo de defesa à palpação do quadrante inferior direito do abdômen;
- Dunphy: quando o paciente relata melhora da dor em posições com a flexão do quadril;
- Psoas: quando há dor durante o movimento de hiperextensão da coxa direita;
- Flexão do quadril: quando há hiperestesia da pele do quadrante inferior direito do abdômen, além de dor à compressão;
- Blumberg: quando há piora da dor com compressão ou descompressão súbita do ponto de McBurney, se positivo, há forte indicação de peritonite;
- Rovsing: quando há piora da dor localizada no quadrante inferior direito ao tossir e quando há dor no quadrante inferior direito ao realizar palpação do quadrante inferior esquerdo; e
- Obturador: quando o paciente refere dor ao realizar rotação interna da coxa.
Diagnóstico
O diagnóstico da apendicite aguda deve começar com uma boa história e um exame físico preciso. Vale ressaltar que a dor no quadrante inferior direito do abdômen não é patognomônica do quadro que tem como importantes diagnósticos diferenciais:
- Colecistite aguda;
- Pancreatite aguda;
- Adenite mesentérica;
- Diverticulite de Meckel;
- Obstrução intestinal;
- Úlcera péptica perfurada;
- Cólica ureteral;
- Pielonefrite;
- Infecções no trato geniturinário;
- Gastroenterite aguda;
- Cetoacidose diabética, ressaltando que a apresentação clínica em pacientes diabéticos pode ser um desafio para o diagnóstico;
- Doença inflamatória intestinal;
- Gravidez ectópica;
- Torção de cisto de ovário;
- Salpingite ou doença inflamatória pélvica; e
- Ruptura de folículo ovariano.
Dessa forma, a hipótese diagnóstica, normalmente, pode ser comprovada com auxílio de exames laboratoriais e de imagem, mesmo o diagnóstico sendo predominantemente clínico. Importante mencionar que, diante de casos altamente sugestivos, o paciente deve ser encaminhado para tratamento cirúrgico imediato em detrimento a exames complementares.
Exames de imagem
Podem ajudar a afastar outras hipóteses diagnósticas e possuem importante papel nos quadros menos clássicos e mais duvidosos. A ultrassonografia pode ser útil e confirmar a apendicite aguda, os achados mais frequentes são: diâmetro total > 6 mm, diâmetro da parede > 3 mm, visualização de estrutura hipoecoica com conteúdo líquido, formato tubular ou em alvo na região da fossa ilíaca direita, apêndice aperistáltico, apêndice não compressível, coleção gasosa, fecalito, líquido livre circunscrito e aumento da ecogenicidade do tecido gorduroso periapendicular. Vale ressaltar, que tem baixo valor preditivo negativo, é de difícil realização em pacientes muito obesos, além de ser operador-dependente.
Por outro lado, a tomografia computadorizada possui sensibilidade e especificidade acima de 90% o que, normalmente, permite a visualização de uma estrutura espessada, borramento da gordura periapendicular, aumento da vascularização local, abscesso ou massa pericecal e apendicolite.
Contudo, a real importância da realização de exames de imagem vem sendo muito discutida, enquanto alguns estudos mostram desfecho semelhante, outros apontam para menor taxa de apendicectomias brancas em pacientes que foram submetidos a eles. Dessa forma, muitas vezes a demora para realizar exames de imagem, diante de um quadro clínico típico, pode atrasar a cirurgia e piorar o prognóstico. A Sociedade Americana de Cirurgia recomenda a realização de tomografia computadorizada com contraste, especificamente se houver necessidade de realização de algum exame de imagem complementar.
Alguns serviços também adotam a realização de raio-x em pacientes suspeitos de apendicite.
Exames laboratoriais
São exames que podem mostrar a ocorrência de processo inflamatório e/ou infeccioso no corpo do paciente. O leucograma completo encontra-se alterado em quase 80% dos doentes e, normalmente, mostra leucocitose com predomínio de neutrófilos. Outros marcadores de inflamação, como proteína C reativa e velocidade de hemossedimentação, respectivamente PCR e VHS, também podem ajudar. O exame de urina pode estar alterado em 40% dos pacientes.
Escores para diagnóstico
Existem muitos escores que podem ajudar no diagnóstico da apendicite aguda. O escore de Alvarado, normalmente, é a ferramenta adotada. Sua utilização pode ser bastante útil, especialmente, para afastar o diagnóstico de apendicite em pacientes com pontuação de baixa probabilidade. Costuma ser bom para homens, mas para crianças e mulheres pode não ser o ideal.
O escore de Alvarado apresenta as seguintes características:
- Migração da dor: +1;
- Anorexia: +1;
- Náuseas: +1;
- Desconforto no quadrante inferior direito do abdome: +2;
- Descompressão dolorosa: +1;
- Elevação da temperatura: +1;
- Leucocitose: +2; e
- Desvio à esquerda no leucograma: +1.
Segundo o escore de Alvarado, a probabilidade de apendicite varia da seguinte forma, assim como a melhor conduta indicada:
- Pontuação entre 1 e 4: 30%, devem ser liberados;
- Pontuação entre 5 e 6: 66%, devem ficar sob observação e os exames devem ser repetidos;
- Pontuação entre 7 e 10: 93%, devem ser submetidos a apendicectomia; e
- Além disso, o corte de 5 é um indicador sensível para afastar a possibilidade de apendicite aguda.
Classificação da apendicite
A apendicite pode ser classificada em graus com base nos achados inflamatórios presentes. Antes da cirurgia pode haver suposição do grau, que é confirmado após análise da peça cirúrgica. A classificação mais usual é:
- Grau 1: apêndice normal;
- Grau 2: apêndice hiperemiado e edemaciado;
- Grau 3: apêndice com exsudato fibrinoso; e
- Grau 4: apêndice perfurado podendo evoluir para peritonite generalizada.
Tratamento
A cirurgia é o tratamento mais adotado para a apendicite aguda há mais de 1 século. Existem 2 técnicas mais comuns para a realização do procedimento: laparotomia convencional aberta ou laparoscopia. A escolha entre os dois métodos é feita baseada em fatores como idade, associação a outras comorbidades, histórico de cirurgias, gravidade do quadro, habilidade do cirurgião, disponibilidade de equipamentos (uma das condições mais relevantes no Brasil) e estilo de vida do paciente. Outra variável importante é o grau de certeza e confirmação do diagnóstico, nesse sentido, em casos de diagnóstico duvidoso a via laparoscópica é a melhor opção, inclusive para confirmação do quadro. Ela também é a escolha preferível em mulheres, obesos e idosos.
Parte considerável dos procedimentos cirúrgicos são de apendicectomias negativas (número que pode variar entre 15 e 25%) e, nesses casos, deve ser feita uma pesquisa minuciosa no intraoperatório de outras possíveis causas do quadro clínico, além disso, o apêndice deve ser removido para análise patológica.
A administração de antibióticos parece reduzir possíveis complicações no pós-operatório, como abscesso e infecção da ferida. Em pacientes com apendicite não complicada, a conduta recomendada é de 1 a 2 g de cefoxitina em dose única, tendo como alternativa a administração de 2 a 3 g de cefazolina junto com 500 mg de metronidazol por via endovenosa.
Apendicite aguda não complicada
A escolha da conduta entre antibioticoterapia e cirurgia ainda necessita de maiores estudos, mas a abordagem mais conservadora parece apresentar taxa importante de recorrência que varia entre 4 e 15%. O tratamento com antibioticoterapia para essa classe de pacientes é tida como falha quando o doente apresentar PCR> 4 mg/dL, presença de fecalitos visto nos exames de imagem, suboclusão intestinal e leucograma com desvio > 10%.
Apendicite aguda complicada
Marcada pela situação de apendicite aguda associada à peritonite generalizada e perfuração e/ou quadro de sepse que pode evoluir para choque séptico com dano a outros órgãos. Para esses pacientes, a antibioticoterapia é indicada, especialmente com drogas de amplo espectro, e deve ser direcionada contra Gram-negativos entéricos e patógenos anaeróbios, tendo como exemplos a associação ceftriaxona + metronidazol ou piperacilina + tazobactam. Vale ressaltar que para esses doentes a abordagem cirúrgica deve ser indicada em caráter de urgência.
Apendicite com apresentação tardia
Caracterizada por casos que não são diagnosticados de imediato, mas apenas após 4 a 5 dias. Uma das apresentações típicas é o abscesso intra-abdominal ou flegmão, que são consequência de perfuração do órgão. Para esses pacientes, o mais indicado é que seja feita a antibioticoterapia, a cirurgia nesse momento possui maior número de complicações possíveis como reoperações, formação de novos abcessos, fístulas, aderências, pneumonia, sepse, tromboembolismo venoso e obstrução, devendo ser adiada algumas semanas e estudada com cautela. Em alguns desses casos, pode ser necessária a nomeada apendicectomia de intervalo.
Cuidados e Recuperação pós-procedimento
Os cuidados médicos necessários após a apendicectomia são principalmente direcionados para os casos em que houve perfuração do apêndice com extravasamento de conteúdo para o interior da cavidade abdominal. Para esses pacientes, a internação pós-operatória é mais prolongada e os riscos envolvidos são consideravelmente maiores. Caso haja perfuração, a antibioticoterapia deve ser continuada após o procedimento até que o paciente apresente temperatura e contagem leucocitária normais. Em alguns casos, pode ser necessária a colocação de drenos.
Além disso, para os casos não complicados, normalmente o tempo de internação pós-operatória é de 1 ou 2 dias, o recomendado é repouso absoluto por 7 dias e exercícios ou esforços físicos devem ser evitados por um período de 1 mês.
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