Resumo da Síndrome de Alagille: causas, diagnóstico e mais!
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Resumo da Síndrome de Alagille: causas, diagnóstico e mais!

Olá, querido doutor e doutora! A síndrome de Alagille é uma condição genética rara, de expressão clínica variável e envolvimento multissistêmico, que desafia o raciocínio diagnóstico e a conduta médica. 

A colestase intra-hepática é geralmente o primeiro sinal clínico, podendo evoluir com prurido intenso, xantomas e disfunção hepática progressiva.

Conceito 

A síndrome de Alagille é uma condição genética de transmissão autossômica dominante, com expressão fenotípica altamente variável e envolvimento multissistêmico. Caracteriza-se predominantemente pela hipoplasia dos ductos biliares intra-hepáticos, levando à colestase crônica desde os primeiros meses de vida, associada a malformações cardíacas, anomalias vertebrais, alterações oftalmológicas e dismorfismos faciais típicos.

Fisiopatologia  

A fisiopatologia da síndrome de Alagille está diretamente relacionada a alterações na via de sinalização NOTCH, um mecanismo altamente conservado e envolvido na regulação do desenvolvimento embrionário de múltiplos órgãos e tecidos. A maioria dos casos decorre de mutações no gene JAG1, localizado no braço curto do cromossomo 20 (20p12), que codifica uma proteína transmembrana ligante da via NOTCH. Em menor proporção, há envolvimento do gene NOTCH2, no cromossomo 1 (1p11–p12).

A interação entre a proteína JAG1 e o receptor NOTCH2 é essencial para a diferenciação celular e organização tecidual, especialmente em estruturas do sistema biliar, cardiovascular, esquelético, renal e ocular. A disfunção nessa sinalização compromete o processo de ramificação e formação dos ductos biliares intra-hepáticos, levando à ductopenia e à colestase progressiva.

No fígado, a redução dos ductos biliares interlobulares compromete o fluxo biliar, resultando em acúmulo de ácidos biliares, bilirrubina conjugada e colesterol, o que contribui para manifestações como xantomas, prurido severo e, eventualmente, fibrose hepática.

No sistema cardiovascular, a desregulação da angiogênese durante o desenvolvimento fetal favorece a ocorrência de malformações congênitas, especialmente estenose da artéria pulmonar, que está presente na maioria dos casos. Alterações semelhantes também são observadas no sistema nervoso central e renal, refletindo o impacto sistêmico do distúrbio molecular.

Epidemiologia e fatores de risco

A síndrome de Alagille é uma condição considerada rara, com prevalência estimada entre 1 a cada 30.000 a 100.000 nascidos vivos, embora esse número possa ser subestimado devido à ampla variabilidade fenotípica e à possibilidade de apresentações leves não diagnosticadas.

A transmissão ocorre por herança autossômica dominante, com risco de 50% de recorrência em filhos de indivíduos afetados. No entanto, entre 50% e 70% dos casos representam mutações de novo, ou seja, ocorrem espontaneamente sem histórico familiar conhecido.

Apesar de afetar ambos os sexos igualmente, o padrão de acometimento entre os membros da mesma família pode variar substancialmente, tanto em termos de órgãos comprometidos quanto da gravidade clínica. Essa expressividade variável torna a identificação precoce mais desafiadora em familiares com manifestações discretas ou isoladas.

Fatores de risco ambientais ou modificáveis não estão claramente estabelecidos, já que a síndrome é de origem genética. Contudo, em famílias com histórico conhecido da doença, a avaliação genética pré-natal ou o rastreamento de recém-nascidos sintomáticos pode permitir o diagnóstico precoce e o início de acompanhamento multidisciplinar.

Avaliação clínica

Colestase e manifestações hepáticas

A colestase intra-hepática crônica é uma das primeiras manifestações da síndrome de Alagille, surgindo frequentemente nas primeiras semanas ou meses de vida. Os pacientes apresentam icterícia persistente, fezes hipocólicas, prurido intenso e aumento de bilirrubina conjugada. Exames laboratoriais evidenciam elevação de ácidos biliares, colesterol e enzimas hepáticas, além de hipertrigliceridemia. Em fases avançadas, pode ocorrer hepatomegalia, hipertensão portal, fibrose hepática e progressão para insuficiência hepática. Xantomas tendem a aparecer em locais como cotovelos, superfícies extensoras e glúteos, especialmente em contextos de dislipidemia grave.

Cardiopatias congênitas

Mais de 90% dos pacientes com a síndrome apresentam algum tipo de malformação cardíaca, sendo a estenose da artéria pulmonar o achado mais prevalente. Outros defeitos incluem tetralogia de Fallot, comunicação interventricular (CIV), comunicação interatrial (CIA), estenose aórtica e coarctação da aorta. As cardiopatias complexas estão associadas a maior risco de mortalidade precoce, exigindo avaliação e intervenção cardiológica desde o diagnóstico.

Alterações oftalmológicas

O embriotóxon posterior, definido como uma linha branca espessa na borda da córnea visível ao exame com lâmpada de fenda, é um achado comum, presente em até 90% dos casos. Embora, isoladamente, possa ocorrer na população geral, sua presença em conjunto com outros sinais sugere fortemente o diagnóstico. Outras alterações possíveis incluem microcórnea, catarata, ceratopatia em banda e distrofia macular congênita, embora a acuidade visual seja frequentemente preservada.

Alterações esqueléticas

A principal anomalia óssea é a presença de vértebras em “asa de borboleta”, evidenciadas em radiografias da coluna vertebral, especialmente na projeção anteroposterior. Essa alteração resulta de uma falha de fusão dos centros de ossificação vertebrais. Também podem ser observadas hemivértebras, espinha bífida oculta, sinostoses, encurtamento de falanges e osteopenia, predispondo a fraturas espontâneas.

Disformismo facial característico

Os pacientes geralmente apresentam um padrão facial típico: fronte ampla e proeminente, olhos profundos com hipertelorismo, nariz reto com ponta bulbosa, queixo afilado e orelhas grandes. Embora essa fácies não seja patognomônica, sua presença em conjunto com as demais alterações reforça a suspeita diagnóstica. No período neonatal, essas características podem estar pouco evidentes.

Comprometimento renal e urinário

A síndrome pode envolver o sistema urinário em até 70% dos casos, com achados como rins hipoplásicos ou displásicos, nefropatia túbulo-intersticial, refluxo vesicoureteral e acidose tubular renal. Apesar das alterações estruturais e funcionais, a evolução para doença renal terminal é rara. A avaliação nefrológica periódica é recomendada para monitoramento e prevenção de complicações.

Anormalidades vasculares e neurológicas

Alguns pacientes desenvolvem alterações vasculares significativas, como estenoses de grandes artérias, aneurismas intracranianos, síndrome de Moyamoya e tromboses espontâneas, aumentando o risco de eventos neurológicos graves. Do ponto de vista neurológico, há relatos de atraso no desenvolvimento neuropsicomotor, dificuldades de aprendizagem, retardo puberal e baixa estatura, o que reforça a necessidade de acompanhamento multidisciplinar ao longo da vida.

Diagnóstico 

O diagnóstico da síndrome de Alagille é eminentemente clínico, baseado na combinação de achados multissistêmicos. O reconhecimento precoce é dificultado pela variabilidade fenotípica, que pode ser ampla mesmo entre familiares com a mesma mutação genética.

Critérios clínicos

Tradicionalmente, o diagnóstico é estabelecido pela presença de pelo menos três das cinco manifestações principais:

  1. Colestase intra-hepática crônica;
  1. Cardiopatia congênita, especialmente estenose da artéria pulmonar;
  1. Embriotóxon posterior;
  1. Vértebras em “asa de borboleta”;
  1. Fácies dismórfica característica.

A presença dos cinco elementos define a forma completa da síndrome. Quando há apenas três ou quatro manifestações, incluindo necessariamente a colestase, considera-se a forma incompleta. Em indivíduos com história familiar conhecida de síndrome de Alagille, a presença de dois desses critérios já pode ser suficiente para o diagnóstico.

Critérios secundários

Outros achados clínicos que reforçam a suspeita incluem: xantomas, retardo de crescimento, infecções respiratórias recorrentes, hipotireoidismo, anormalidades vasculares, alterações na voz, déficit cognitivo, hipogonadismo, puberdade tardia e alterações renais ou pancreáticas.

Avaliação laboratorial e de imagem

Exames laboratoriais geralmente revelam hiperbilirrubinemia direta, aumento de ácidos biliares, colesterol elevado e elevações de transaminases e GGT. A biópsia hepática, embora não obrigatória, pode mostrar escassez de ductos biliares interlobulares, com uma relação ducto/área porta menor que 0,4 (o normal é entre 0,8 e 1,8). A ultrassonografia hepática pode demonstrar fígado de aspecto nodular, decorrente da distribuição desigual dos ductos.

Exames complementares incluem:

  • Ecocardiograma: para detecção de cardiopatias congênitas;
  • Radiografias de coluna: para identificação de vértebras em asa de borboleta;
  • Oftalmoscopia com lâmpada de fenda: para visualizar embriotóxon;
  • Ultrassonografia renal e vias urinárias;
  • Avaliação do crescimento e desenvolvimento neuropsicomotor.

Testes genéticos

A confirmação molecular pode ser feita pela detecção de mutações nos genes JAG1 (em cerca de 94–97% dos casos) ou NOTCH2 (1–2%). A análise pode ser realizada por sequenciamento gênico, MLPA ou FISH. Em famílias com mutação conhecida, é possível realizar diagnóstico pré-natal ou pré-implantacional.

Tratamento e Prognóstico

O tratamento da síndrome de Alagille é baseado no alívio sintomático e manejo das complicações, sendo imprescindível o acompanhamento por equipe multidisciplinar. A colestase é tratada com fármacos como ácido ursodesoxicólico, rifampicina, colestiramina ou naltrexona. A dieta deve incluir triglicerídeos de cadeia média e vitaminas lipossolúveis, devido à má absorção de gorduras. O transplante hepático é indicado em casos de prurido refratário, desnutrição severa, cirrose ou hipertensão portal significativa. Já as cardiopatias exigem avaliação individualizada, com possíveis abordagens percutâneas ou cirúrgicas. Alterações renais e vasculares também devem ser monitoradas de forma contínua.

O prognóstico é bastante variável, influenciado principalmente pelo grau de acometimento hepático, cardíaco e vascular. Casos com colestase persistente, prurido grave ou cardiopatias complexas têm maior risco de desfechos desfavoráveis. A taxa de mortalidade global estimada está entre 10% e 20%. O transplante hepático pode melhorar significativamente a sobrevida e qualidade de vida. O seguimento precoce e regular com especialidades envolvidas é essencial para prevenir complicações e orientar condutas terapêuticas ao longo do tempo.

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Referências Bibliográficas 

  1. CARRIJO, Nathália Guedes et al. Principais características da Síndrome de Alagille: revisão narrativa. Revista Eletrônica Acervo Saúde, v. 13, n. 6, 2021. 
  1. DIAZ-FRIAS, Josue; KONDAMUDI, Noah P. Alagille Syndrome. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2023. 
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