Olá, querido doutor e doutora! A Síndrome de Kleine-Levin (KLS) é um distúrbio neurológico raro caracterizado por episódios recorrentes de hipersonolência, associados a alterações cognitivas, comportamentais e, em muitos casos, a hiperfagia ou hipersexualidade. Acomete predominantemente adolescentes do sexo masculino e costuma ter curso prolongado, mas autolimitado, com resolução espontânea ao longo dos anos.
Durante as crises, o paciente pode dormir de 12 a 24 horas por dia, despertando apenas para necessidades básicas.
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Conceito
A Síndrome de Kleine-Levin (KLS) é um distúrbio neurológico raro caracterizado por episódios recorrentes de hipersonolência intensa, que podem durar dias ou semanas, acompanhados de alterações cognitivas, comportamentais e, em muitos casos, mudanças nos hábitos alimentares e sexuais. Durante as crises, o paciente costuma dormir entre 12 e 24 horas por dia, despertando apenas para atividades básicas como se alimentar ou ir ao banheiro.
Entre os episódios, há um retorno completo ao estado basal, sem déficits neurológicos evidentes, o que reforça o caráter episódico e transitório da síndrome. Essa flutuação entre períodos de normalidade e crises torna o diagnóstico desafiador, já que muitas vezes o paciente pode permanecer meses assintomático antes da recorrência.
Etiologia e fatores associados
A etiologia da Síndrome de Kleine-Levin (KLS) permanece incerta, mas várias hipóteses têm sido propostas a partir de achados clínicos e de neuroimagem.
- Disfunção hipotalâmica: o envolvimento do hipotálamo é sugerido pela sua função no controle do sono, apetite e comportamento sexual. Entretanto, exames de imagem estrutural raramente mostram alterações específicas nessa região.
- Mecanismo autoimune ou pós-infeccioso: muitos pacientes relatam um quadro infeccioso semelhante à gripe antes do primeiro episódio, o que levou à suspeita de que processos inflamatórios possam atuar como gatilho. A presença do alelo HLA-DQB1*0201 em alguns pacientes reforça a possibilidade de predisposição imunogenética.
- Alterações metabólicas de neurotransmissores: estudos pontuais identificaram desequilíbrios nos sistemas serotoninérgico e dopaminérgico, sugerindo desregulação das vias responsáveis por sono, humor e comportamento.
- Predisposição genética: embora a maioria dos casos seja esporádica, existem relatos familiares, indicando possível herança multifatorial em alguns pacientes.
Esses achados sugerem que a KLS pode resultar da interação entre fatores ambientais desencadeantes (como infecções ou privação de sono) e uma susceptibilidade individual genética ou imunológica.
Epidemiologia
A Síndrome de Kleine-Levin é considerada uma condição extremamente rara, com prevalência estimada em cerca de 1 caso por milhão de habitantes. Até hoje, o número de pacientes descritos na literatura é limitado, reforçando seu caráter incomum.
A doença acomete predominantemente o sexo masculino, com uma razão aproximada de 2:1 em relação às mulheres. O início dos sintomas ocorre tipicamente na adolescência, por volta dos 15 anos de idade, embora existam relatos de casos que variam desde a infância até a vida adulta.
Há registros em diferentes regiões do mundo, mas foi observado um número relativamente maior de casos em indivíduos de origem judaica, sugerindo possível predisposição genética. Em geral, os episódios iniciais tendem a surgir de forma abrupta e recorrente durante a segunda década de vida, sendo incomuns antes da puberdade.
Quadro clínico
O quadro clínico da Síndrome de Kleine-Levin (KLS) é marcado por episódios recorrentes de sintomas que duram dias a semanas, com remissão completa no período intercrítico. Os principais achados incluem:
Hipersonolência
O sintoma mais característico e obrigatório para o diagnóstico. Durante as crises, os pacientes podem dormir entre 12 e 24 horas por dia, despertando apenas para necessidades básicas. Acordados, apresentam irritabilidade e sonolência persistente, muitas vezes retornando rapidamente ao sono.
Alterações cognitivas e comportamentais
São frequentes confusão mental, lentificação do pensamento, déficit de memória e atenção, desorientação temporal e espacial. Muitos pacientes não recordam os eventos durante o episódio. Há relatos de fala empobrecida, incoerente ou infantilizada. Entre as crises, o funcionamento cognitivo costuma retornar ao normal.
Distúrbios alimentares
Aproximadamente 80% dos pacientes desenvolvem hiperfagia (megafagia), muitas vezes seletiva por doces e alimentos incomuns, com consequente ganho ponderal. Em casos menos comuns, pode ocorrer hiporexia transitória.
Alterações de humor e irritabilidade
Sintomas depressivos transitórios são comuns, assim como irritabilidade intensa, especialmente quando há tentativa de restringir sono, alimentação ou comportamentos compulsivos. Alguns pacientes apresentam ideação suicida durante episódios.
Hipersexualidade e impulsividade
Mais prevalente em homens, manifesta-se por masturbação excessiva, avanços sexuais inadequados e comportamentos socialmente desinibidos. Também podem ocorrer outros impulsos, como cantar de forma compulsiva, roer lábios ou retirar papéis das paredes.
Sintomas perceptivos e dissociativos
Muitos pacientes relatam derealização (sensação de irrealidade do ambiente), despersonalização, alucinações visuais ou auditivas e, em alguns casos, delírios transitórios. Essa alteração da percepção é considerada uma das manifestações mais específicas da síndrome.
No período entre as crises, o paciente retorna ao estado basal, sem déficits neurológicos ou cognitivos evidentes, o que diferencia a síndrome de doenças neurológicas progressivas.
Diagnóstico
Critérios clínicos
O diagnóstico da Síndrome de Kleine-Levin (KLS) é definido principalmente pela observação do padrão clínico. A doença pertence ao grupo das hipersonolências recorrentes, caracterizada por episódios de hipersonolência intensa com duração de 2 dias a 4 semanas. Durante as crises, além do excesso de sono, é comum a presença de cognição alterada, irritabilidade, hipersexualidade ou hiperfagia compulsiva. Entre os episódios, o paciente retorna ao estado basal, sem déficits neurológicos evidentes.
Exames complementares
Embora não existam exames específicos para confirmar a KLS, alguns métodos auxiliam na exclusão de outras condições. O eletroencefalograma (EEG) geralmente mostra lentificação difusa, sem descargas epilépticas. A ressonância magnética e a tomografia de crânio tendem a ser normais. Em exames funcionais, como SPECT ou PET, já foram descritas áreas de hipoperfusão em tálamo e regiões frontotemporais durante os episódios. O estudo do líquor geralmente não mostra alterações significativas, mas ocasionalmente há discreto desequilíbrio de neurotransmissores.
Diagnóstico diferencial
Como não há marcadores específicos, o diagnóstico é de exclusão. Devem ser afastadas causas psiquiátricas, como transtorno bipolar ou depressão maior, além de outras hipersonolências primárias, como a narcolepsia. Também é necessário descartar epilepsia do lobo temporal, doenças neurológicas (como esclerose múltipla) e encefalopatias metabólicas. O uso de substâncias ou medicamentos sedativos, como benzodiazepínicos e álcool, também pode mimetizar o quadro.
Tratamento e prognóstico
Tratamento durante os episódios
Não existe uma terapia curativa para a Síndrome de Kleine-Levin (KLS), e as medidas terapêuticas são direcionadas para o alívio dos sintomas e a segurança do paciente. Durante as crises, recomenda-se manter o indivíduo em ambiente protegido, evitando atividades de risco como dirigir ou manusear máquinas. O uso de estimulantes, como modafinil, metilfenidato ou anfetaminas, pode reduzir a hipersonolência, mas não melhora de forma significativa os déficits cognitivos.
Tratamento preventivo
Para diminuir a frequência e a gravidade das crises, alguns pacientes podem se beneficiar do uso de estabilizadores do humor, sendo o lítio o mais estudado, com resposta satisfatória em parte dos casos. A carbamazepina também já foi utilizada com relatos de benefício, embora com menor consistência. Em mulheres com sintomas relacionados ao ciclo menstrual, há recomendações do uso de anticoncepcionais orais como estratégia de prevenção.
Limitações terapêuticas
Outros fármacos, como anticonvulsivantes diversos, antidepressivos, neurolépticos e até imunomoduladores, foram testados em relatos isolados, mas sem evidências consistentes de eficácia. Em muitos pacientes, os tratamentos não modificam substancialmente a evolução da doença, reforçando a necessidade de acompanhamento clínico e medidas de suporte.
Prognóstico
O curso clínico da KLS é geralmente autolimitado, com tendência à resolução espontânea após anos de evolução. A média de duração é de 10 a 20 anos, embora haja variação individual. Os pacientes podem apresentar cerca de 12 episódios ao longo da vida, com duração de 1 a 3 semanas e intervalos de meses entre eles. Com o passar do tempo, as crises tendem a se tornar menos intensas e menos frequentes até desaparecerem completamente. Casos associados a hipersexualidade tendem a apresentar um curso mais prolongado.
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Referências Bibliográficas
- RAMDURG, S. Kleine–Levin syndrome: Etiology, diagnosis, and treatment. Annals of Indian Academy of Neurology, v. 13, n. 4, p. 241-246, 2010.
- EBSCO Information Services. Central Disorders of Hypersomnolence – DynaMed. Updated Apr 2025.