Olá, querido doutor e doutora! A síndrome de Prune Belly é uma condição congênita rara caracterizada pela tríade clássica de deficiência da musculatura abdominal, alterações do trato urinário e criptorquidia bilateral em meninos. O espectro clínico é amplo, variando de formas graves incompatíveis com a vida até apresentações leves que permitem desenvolvimento próximo ao normal.
A mortalidade perinatal gira em torno de 10% a 25%, principalmente em casos associados a hipoplasia pulmonar grave.
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Conceito
A síndrome de Prune Belly é uma anomalia congênita rara caracterizada pela tríade clássica:
- Deficiência ou ausência de musculatura abdominal, conferindo ao abdome aspecto flácido e enrugado, semelhante à superfície de uma ameixa seca;
- Alterações do trato urinário, como megabexiga, ureteres dilatados e hidronefrose, frequentemente associadas à estase urinária e infecções de repetição;
- Criptorquidia bilateral nos meninos, geralmente com testículos localizados em posição intra-abdominal.
Embora predominante em indivíduos do sexo masculino, casos em meninas podem ocorrer, mas sem comprometimento gonadal. A síndrome também é conhecida como Eagle-Barrett syndrome, triad syndrome ou abdominal musculature deficiency syndrome.
Etiologia e patogênese
Teoria da obstrução uretral intrauterina
Uma das hipóteses mais aceitas é a de que uma obstrução da uretra durante a vida fetal leva à distensão progressiva da bexiga. Esse aumento de pressão comprometeria o desenvolvimento da musculatura abdominal, impediria a descida normal dos testículos e causaria dilatações importantes no trato urinário.
Defeito do mesoderma lateral
Outra explicação considera um defeito no mesoderma lateral, tecido embrionário responsável pela formação dos ureteres, bexiga, próstata, uretra e gubernáculo. Alterações nesse estágio do desenvolvimento justificariam a associação entre as malformações abdominais, urinárias e genitais.
Hipóteses genéticas
Pesquisas recentes sugerem a participação de mutações genéticas em genes como HNF1B, ACTG2 e CHRM3. Esses achados indicam possíveis padrões de herança esporádica ou familiar, mas até o momento não há consenso sobre um gene único determinante.
Mecanismos fisiopatológicos
Do ponto de vista funcional, a musculatura lisa normal do trato urinário pode ser substituída por tecido fibroso, reduzindo a contratilidade dos ureteres e da bexiga. Isso favorece a estase urinária, aumenta o risco de infecções recorrentes e acelera a deterioração da função renal. A criptorquidia bilateral, característica da síndrome, relaciona-se tanto a falhas mecânicas pela distensão abdominal quanto a alterações no desenvolvimento testicular e do gubernáculo.
Epidemiologia
A síndrome de Prune Belly é uma condição rara, com incidência estimada em cerca de 3,6 a 3,8 por 100.000 nascidos vivos do sexo masculino, sendo os casos em meninas bastante incomuns (<5%). Mais de 95% dos pacientes são meninos, nos quais a criptorquidia está presente como parte da tríade clássica. A literatura descreve maior prevalência em populações afro-caribenhas, em filhos de mães mais jovens e em gestações gemelares, enquanto menor frequência foi observada em populações hispânicas em comparação às brancas. A mortalidade perinatal situa-se entre 10% e 25%, geralmente associada a hipoplasia pulmonar grave e disfunção renal decorrentes do oligodrâmnio.
Classificação Clínica (Woodard)
Categoria I
Corresponde a cerca de 20% dos casos e representa a forma mais grave. Os pacientes apresentam obstrução uretral severa, bexiga extremamente dilatada, oligodrâmnio acentuado e hipoplasia pulmonar, que frequentemente leva ao óbito neonatal. Além disso, há maior risco de displasia renal, azotemia e infecções recorrentes.
Categoria II
Engloba aproximadamente 40% dos pacientes, caracterizando um quadro de gravidade intermediária. Estão presentes as alterações típicas da síndrome – deficiência da musculatura abdominal, hidroureteronefrose e criptorquidia bilateral – associadas a displasia renal de intensidade variável. Embora a função renal inicial possa ser razoável, existe risco significativo de deterioração progressiva ao longo da vida.
Categoria III
Também abrange cerca de 40% dos casos, sendo a forma mais branda. Os pacientes apresentam manifestações incompletas ou leves da tríade, podendo a criptorquidia estar ausente em alguns meninos. O comprometimento urológico é discreto, a função renal costuma ser preservada e a expectativa de vida é próxima ao normal.
Avaliação clínica
A síndrome de Prune Belly caracteriza-se inicialmente por um abdome flácido e enrugado, consequência da ausência parcial ou total da musculatura abdominal. Além disso, destacam-se as alterações do trato urinário, como megabexiga, ureteres dilatados e hidronefrose bilateral, que favorecem infecções recorrentes e perda progressiva da função renal. Nos meninos, a criptorquidia bilateral é quase constante, geralmente com testículos intra-abdominais. O comprometimento pulmonar também é frequente nas formas graves, em especial a hipoplasia pulmonar associada ao oligodrâmnio, levando a insuficiência respiratória neonatal.
Outros sistemas podem ser afetados, incluindo o cardíaco, com defeitos como comunicação interatrial, interventricular e persistência do ducto arterial; o gastrointestinal, com má rotação, atresias, onfalocele ou constipação relacionada à dificuldade em realizar manobras de Valsalva; e o musculoesquelético, com escoliose, pés tortos congênitos e artrogripose. Esses achados reforçam o caráter multissistêmico da síndrome, cuja gravidade varia de casos letais até formas leves compatíveis com desenvolvimento quase normal.
Diagnóstico
Avaliação pré-natal
O diagnóstico pode ser suspenso já no ultrassom obstétrico entre 11 e 14 semanas, quando são identificados sinais como megabexiga, hidronefrose bilateral, ureteres dilatados e oligodrâmnio. Em alguns casos selecionados, a análise do líquido vesical fetal pode ser realizada para estimar a função renal. A presença de oligoâmnio grave associada a pulmões hipoplásicos sugere prognóstico reservado.
Avaliação pós-natal
Ao nascimento, o diagnóstico clínico é feito pela tríade característica: abdome flácido e enrugado, alterações do trato urinário e criptorquidia bilateral. O exame físico deve incluir a pesquisa de anomalias respiratórias, cardíacas, gastrointestinais e esqueléticas, dada a natureza multissistêmica da síndrome.
Exames de imagem
O ultrassom renal e vesical é indicado logo nos primeiros dias de vida, permitindo avaliar hidronefrose, dilatação ureteral e presença de uraco patente. A cistouretrografia miccional (VCUG) é fundamental para detectar refluxo vesicoureteral e alterações da uretra. Em casos selecionados, a cintilografia renal (MAG3 ou DMSA) ajuda a determinar função diferencial, presença de cicatrizes ou displasia renal.
Exames laboratoriais
A investigação laboratorial inclui ureia, creatinina e eletrólitos séricos, permitindo monitorar a função renal e identificar distúrbios metabólicos. O acompanhamento seriado da creatinina no primeiro ano de vida é especialmente útil, sendo valores persistentemente acima de 0,7 mg/dL associados a maior risco de evolução para insuficiência renal crônica.
Tratamento
Manejo conservador
Nos casos mais leves, pode-se optar por acompanhamento clínico com medidas como antibioticoprofilaxia para prevenção de infecções urinárias, controle rigoroso da função renal e cateterismo vesical intermitente em pacientes com esvaziamento incompleto da bexiga. Orientações sobre ingestão hídrica, suporte nutricional e monitorização laboratorial frequente fazem parte da rotina de cuidados.
Intervenções cirúrgicas
O tratamento cirúrgico é individualizado conforme a gravidade. A orquidopexia bilateral deve ser realizada precocemente (entre 6 e 12 meses de idade) para reduzir riscos de infertilidade e neoplasia testicular. As anomalias do trato urinário podem exigir ureterostomia, reimplante ureteral, cistoplastia redutora ou reconstrução vesical. Em adolescentes ou em associação a outros procedimentos, a abdominoplastia é indicada tanto por motivos funcionais (melhora do esforço respiratório e evacuatório) quanto estéticos.
Terapias avançadas
Pacientes que evoluem com insuficiência renal crônica podem necessitar de diálise peritoneal como medida temporária até a realização de transplante renal. Antes do transplante, deve-se garantir que a bexiga apresenta baixa pressão e esvaziamento adequado, a fim de reduzir complicações no enxerto.
Prognóstico
O desfecho clínico é bastante variável. Aproximadamente 20% dos pacientes pertencem ao grupo grave, com hipoplasia pulmonar e insuficiência renal precoce, evoluindo muitas vezes para óbito neonatal. Cerca de 40% apresentam função renal inicial razoável, mas estão sob risco de deterioração progressiva ao longo da vida, exigindo acompanhamento contínuo. Outros 40% exibem formas leves, com função renal preservada e sobrevida próxima ao normal. A fertilidade masculina, antes considerada improvável, hoje é possível graças ao manejo precoce da criptorquidia e às técnicas de reprodução assistida.
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Referências Bibliográficas
- POMA JZL, AJ.; SANKARARAMAN, S. Prune Belly Syndrome. StatPearls. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2025. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK544248/. Acesso em: 20 ago. 2025.
- WIENER, J. S.; VAN ZUUREN, E. J.; BARRON, S. A. Prune Belly Syndrome. DynaMed. EBSCO Information Services, 2023. Disponível em: https://www.dynamed.com/condition/prune-belly-syndrome. Acesso em: 20 ago. 2025.