Resumo de Tricoleucemia: fisiopatologia, sintomas e mais!
StarPearls.

Resumo de Tricoleucemia: fisiopatologia, sintomas e mais!

Olá, querido doutor e doutora! A tricoleucemia é uma neoplasia linfoproliferativa rara de linfócitos B maduros, com curso indolente e predileção por homens de meia-idade. Sua forma clássica é marcada pela mutação BRAF V600E e excelente resposta aos análogos de purina. Já a variante da doença exige estratégias terapêuticas mais intensivas. O diagnóstico depende da integração entre morfologia, imunofenotipagem e biologia molecular.

A ausência da mutação BRAF V600E na forma variante está associada a menor resposta aos tratamentos convencionais e curso clínico mais agressivo.

Conceito 

A tricoleucemia é uma neoplasia linfoproliferativa rara de origem nos linfócitos B maduros, caracterizada pela infiltração da medula óssea, baço e sangue periférico por células com projeções citoplasmáticas finas e irregulares, que conferem o aspecto “cabeludo” ao microscópio óptico. Essas células anômalas expressam marcadores B específicos e, na forma clássica da doença, apresentam a mutação BRAF V600E, que contribui para a ativação persistente de vias de sinalização associadas à sobrevivência celular.

Fisiopatologia  

A fisiopatologia da tricoleucemia envolve a transformação neoplásica de linfócitos B maduros, com alterações moleculares que favorecem sua proliferação, sobrevida prolongada e infiltração em órgãos hematopoéticos. A compreensão desses mecanismos difere entre a forma clássica e a variante da doença.

Ativação da via MAPK/ERK na HCL clássica

Na tricoleucemia clássica, a grande maioria dos casos apresenta a mutação BRAF V600E, uma substituição valina→glutamato no exon 15 do gene BRAF. Essa mutação promove a ativação constitutiva da via MAPK/ERK, estimulando a proliferação celular e a resistência à apoptose. Como consequência, os linfócitos B transformados passam a se acumular na medula óssea, no baço (especialmente na polpa vermelha) e, em menor grau, no sangue periférico. A ativação dessa via também está relacionada às características morfológicas “cabeludas” das células e à sua sensibilidade aos inibidores de BRAF.

Adesão e homing tecidual

As células da tricoleucemia expressam receptores de adesão e quimiocinas como CXCR4, VLA-4 e CD51, que favorecem sua migração e retenção na medula óssea e no baço. A interação entre CXCR4 e CXCL12 secretada pelas células estromais, bem como entre VLA-4 e VCAM-1, é crucial para o homing das células neoplásicas. Isso explica a tendência à hipocelularidade da medula óssea, com substituição por infiltrado linfocitário difuso.

Alterações adicionais e mutações associadas

Além da mutação BRAF, outras alterações genéticas podem estar presentes na HCL clássica, como mutações em genes reguladores do ciclo celular (CDKN1B/p27, CCND1) e de remodelação de cromatina (ARID1A, KMT2C, CREBBP). Há também, com frequência, hipermutação somática do gene IGHV, sendo a presença da rearranjo IGHV4-34 associada a pior prognóstico e menor resposta aos análogos de purina.

HCL variante: mecanismos distintos

Na variante da tricoleucemia, a mutação BRAF V600E está ausente, e os mecanismos moleculares são menos definidos. Algumas séries identificaram mutações em MAP2K1, que também atuam na via MAPK/ERK, mas sua frequência varia entre os estudos. Outras mutações reportadas incluem TP53, CCND3 e alterações em fatores de splicing como U2AF1, com impacto ainda não totalmente esclarecido. A ausência de fibrose medular acentuada e a maior presença de células no sangue periférico refletem essas diferenças biológicas.

Classificação

A tricoleucemia compreende duas entidades clínicas distintas reconhecidas pela Organização Mundial da Saúde: a tricoleucemia clássica (HCL clássica) e a variante da tricoleucemia (HCL-v). Apesar de ambas apresentarem células com projeções citoplasmáticas finas, suas diferenças moleculares, morfológicas e clínicas justificam abordagens diagnósticas e terapêuticas diferentes.

Tricoleucemia clássica

A forma clássica da doença é a mais prevalente e apresenta um curso geralmente indolente. Do ponto de vista molecular, caracteriza-se pela presença da mutação BRAF V600E em mais de 90% dos casos, sendo essa alteração um marcador diagnóstico importante e uma via terapêutica potencial. O perfil imunofenotípico dessas células inclui a expressão dos marcadores CD19, CD20, CD22, CD25, CD103, CD123, CD200 e anexina A1. A infiltração da medula óssea é frequentemente intersticial e difusa, associada à fibrose reticulínica intensa, o que pode dificultar a obtenção de aspirado medular, resultando no clássico “dry tap”. Clinicamente, muitos pacientes permanecem assintomáticos por anos, e a resposta aos análogos de purina, como cladribina ou pentostatina, costuma ser duradoura.

Variante da tricoleucemia

A variante da tricoleucemia representa uma entidade separada, com comportamento mais agressivo e menor sensibilidade aos tratamentos convencionais. Diferencia-se por não apresentar a mutação BRAF V600E e por exibir um imunofenótipo distinto, negativo para CD25, CD123, CD200 e anexina A1, mas mantendo a positividade para CD19, CD20, CD22 e CD103. As células neoplásicas possuem morfologia semelhante às da forma clássica, mas com nucleolo proeminente e sem a mesma densidade de fibrose medular. A HCL-v costuma se manifestar com esplenomegalia significativa, leucocitose, e menor grau de citopenias em comparação com a HCL clássica. Devido à sua menor resposta aos análogos de purina, o tratamento geralmente exige esquemas combinados, como cladribina associada ao rituximabe ou outras terapias-alvo.

Epidemiologia

A tricoleucemia é uma neoplasia rara, representando aproximadamente 2% das leucemias linfóides, com incidência anual estimada entre 0,1 e 0,3 por 100.000 pessoas na forma clássica, enquanto a variante é ainda mais incomum. Acomete predominantemente homens entre 55 e 70 anos, com razão de até 4:1 em relação às mulheres, sendo extremamente rara em crianças. 

Estudos sugerem associação com exposição ocupacional a pesticidas, produtos derivados de petróleo e radiação ionizante, especialmente em indivíduos que vivem ou trabalham em zonas rurais. A forma variante costuma afetar pacientes mais idosos e tem comportamento clínico mais agressivo.

Avaliação clínica

As manifestações clínicas da tricoleucemia decorrem principalmente da infiltração da medula óssea e do baço por linfócitos B neoplásicos, resultando em citopenias, esplenomegalia e sintomas sistêmicos. Embora algumas apresentações sejam discretas, outras podem demandar abordagem imediata.

Sinais e sintomas iniciais

Pacientes com tricoleucemia clássica podem ser diagnosticados de forma incidental durante exames laboratoriais de rotina, devido a pancitopenia ou monocitopenia. Quando sintomáticos, os principais achados incluem fadiga, infecções de repetição, febre, sudorese noturna, perda de peso e equimoses espontâneas. A esplenomegalia está presente em boa parte dos casos, podendo causar desconforto ou dor abdominal. Menos frequentemente, há hepatomegalia e linfadenomegalia.

Formas incomuns e manifestações atípicas

Apesar de raras, manifestações autoimunes como anemia hemolítica e trombocitopenia imune podem ocorrer. Alterações cutâneas, efusões pleurais e até lesões ósseas líticas foram descritas em subgrupos com carga tumoral elevada. A infiltração da pele por células tricoleucêmicas (leucemia cutis) é rara, mas possível.

Diferenças clínicas na HCL variante

A variante da tricoleucemia tende a se apresentar com quadro mais agressivo, raramente sendo assintomática. Nessa forma, é comum o achado de esplenomegalia volumosa (maior que 10 cm), acompanhada de leucocitose significativa. As citopenias são menos intensas do que na forma clássica, e a neutropenia profunda é incomum. A linfadenopatia retroperitoneal pode estar presente e, em alguns casos, é o principal achado em exames de imagem.

Diagnóstico 

O diagnóstico da tricoleucemia é baseado na combinação de dados clínicos, morfológicos, imunofenotípicos e moleculares, permitindo não apenas a identificação da doença, mas também a diferenciação entre sua forma clássica e a variante.

Exames laboratoriais iniciais

O hemograma costuma revelar pancitopenia, com monocitopenia marcante, presente em até 98% dos casos da forma clássica. Anemia, trombocitopenia e neutropenia são frequentes. Já na forma variante, pode haver leucocitose, com menor frequência de citopenias. O esfregaço de sangue periférico mostra células com projeções citoplasmáticas finas e núcleo com cromatina homogênea — os chamados “hairy cells”.

Estudo da medula óssea

A biópsia de medula óssea é fundamental. Na HCL clássica, observa-se infiltração difusa ou intersticial por células linfóides pequenas a médias, geralmente com intensa fibrose reticulínica, o que frequentemente dificulta a aspiração (fenômeno do “dry tap”). Na HCL variante, o infiltrado tende a ser mais discreto, com menor fibrose e medula hipercelular.

Imunofenotipagem

A imunofenotipagem, por citometria de fluxo ou imuno-histoquímica, confirma o diagnóstico e diferencia as variantes. Ambas as formas expressam CD19, CD20 e CD22, mas a HCL clássica também é positiva para CD25, CD103, CD123, CD200 e anexina A1. Já a variante é negativa para CD25, CD123 e anexina A1, e pode expressar CD27 e FMC7. A detecção do VE1 (anticorpo contra BRAF V600E) por imuno-histoquímica tem sensibilidade e especificidade elevadas para a forma clássica.

Avaliação molecular

A pesquisa da mutação BRAF V600E é altamente específica para a HCL clássica. Em casos duvidosos, especialmente quando o perfil imunofenotípico é atípico, o teste molecular auxilia na confirmação diagnóstica. Na ausência da mutação BRAF, pode-se investigar MAP2K1 ou outras alterações associadas à forma variante. Além disso, o rearranjo IGHV4-34 está presente em parte dos casos e pode indicar prognóstico menos favorável.

Exames complementares

A tomografia computadorizada (TC) pode ser solicitada para avaliar esplenomegalia, linfadenopatia ou infiltração hepática. Em pacientes que receberão tratamento, é recomendada a testagem para hepatites B e C, além de avaliação da função renal, dado o impacto potencial de algumas terapias.

Tratamento 

O manejo da tricoleucemia depende do perfil clínico do paciente, da gravidade das citopenias, da presença de sintomas sistêmicos e da forma da doença (clássica ou variante). Nem todos os pacientes necessitam de tratamento imediato, e a decisão terapêutica deve ser cuidadosamente individualizada.

Indicações para tratamento

Na forma clássica, o tratamento é indicado quando há citopenias significativas (hemoglobina < 11 g/dL, plaquetas < 100.000/mm³, neutrófilos < 1.000/mm³), esplenomegalia sintomática, infecções recorrentes, fadiga impactante ou progressão evidente da doença. Pacientes assintomáticos ou com alterações discretas podem ser apenas acompanhados, com reavaliações clínicas e laboratoriais periódicas.

Terapia de primeira linha na HCL clássica

O tratamento de escolha para a maioria dos pacientes com HCL clássica é baseado em análogos de purina, principalmente cladribina ou pentostatina. A cladribina é preferida por sua posologia mais simples e boa tolerabilidade, administrada em um único ciclo de 5 a 7 dias, com taxas de remissão completa superiores a 80%. A pentostatina também é eficaz, mas exige múltiplas aplicações semanais. A associação com rituximabe, especialmente quando administrado nas primeiras semanas, aumenta as taxas de resposta completa e erradicação da doença residual.

Manejo da HCL variante

Na HCL-v, a resposta aos análogos de purina isoladamente é limitada. Por isso, recomenda-se o uso de cladribina combinada com rituximabe como tratamento inicial. Em casos refratários ou com recidiva precoce, outras opções como bendamustina com rituximabe, ibrutinibe, trametinibe ou esplenectomia paliativa podem ser consideradas. O tratamento deve ser mais agressivo e monitorado de perto, dada a maior instabilidade clínica desses pacientes.

Terapias-alvo e situações especiais

Pacientes com mutação BRAF V600E e refratários ao tratamento convencional podem se beneficiar de inibidores de BRAF como vemurafenibe ou dabrafenibe, isoladamente ou associados ao rituximabe. Em indivíduos com infecção ativa ou pancitopenia grave, pode-se utilizar interferon-alfa como ponte terapêutica até que o paciente esteja em condições de receber quimioterapia. Durante a gestação, o interferon também é a principal opção terapêutica.

Suporte e profilaxias

Devido à imunossupressão prolongada induzida pelos análogos de purina, é recomendada profilaxia antimicrobiana contra herpesvírus e Pneumocystis jirovecii, além do uso de produtos hemoterápicos irradiados quando necessário. Vacinação e acompanhamento infeccioso são essenciais durante e após o tratamento. A avaliação de resposta é feita com hemograma, exame clínico e, se necessário, biópsia de medula óssea após 4 a 6 meses.

Venha fazer parte da maior plataforma de Medicina do Brasil! O Estratégia MED possui os materiais mais atualizados e cursos ministrados por especialistas na área. Não perca a oportunidade de elevar seus estudos, inscreva-se agora e comece a construir um caminho de excelência na medicina! 

Curso Extensivo de Residência Médica

Curso Extensivo Residência Médica - 12 meses

Estude com nosso curso mais completo e tenha acesso a um material multimídia, elaborado por professores especialistas, de acordo com o conteúdo cobrado nas provas. Ideal para quem tem mais tempo para estudar e quer se dedicar ao máximo para obter os melhores resultados na sua preparação.
12x R$ 583,15
No Cartão de Crédito ou 10% de desconto no Boleto ou Pix à vista: R$ 6.298,11
Promoção válida até: 30/07/2025
Saiba mais

Curso Extensivo Residência Médica - 18 meses

Estude com nosso curso mais completo e tenha acesso a um material multimídia, elaborado por professores especialistas, de acordo com o conteúdo cobrado nas provas. Ideal para quem tem mais tempo para estudar e quer se dedicar ao máximo para obter os melhores resultados na sua preparação.
12x R$ 659,85
No Cartão de Crédito ou 10% de desconto no Boleto ou Pix à vista: R$ 7.126,38
Promoção válida até: 30/07/2025
Saiba mais

Curso Extensivo Residência Médica - 24 meses

Estude com nosso curso mais completo e tenha acesso a um material multimídia, elaborado por professores especialistas, de acordo com o conteúdo cobrado nas provas. Ideal para quem tem mais tempo para estudar e quer se dedicar ao máximo para obter os melhores resultados na sua preparação.
12x R$ 824,85
No Cartão de Crédito ou 10% de desconto no Boleto ou Pix à vista: R$ 8.908,38
Promoção válida até: 30/07/2025
Saiba mais

Curso Extensivo Residência Médica - 30 meses

Estude com nosso curso mais completo e tenha acesso a um material multimídia, elaborado por professores especialistas, de acordo com o conteúdo cobrado nas provas. Ideal para quem tem mais tempo para estudar e quer se dedicar ao máximo para obter os melhores resultados na sua preparação.
12x R$ 1.074,85
No Cartão de Crédito ou 10% de desconto no Boleto ou Pix à vista: R$ 11.608,38
Promoção válida até: 30/07/2025
Saiba mais

Curso Extensivo Residência Médica - 36 meses

Estude com nosso curso mais completo e tenha acesso a um material multimídia, elaborado por professores especialistas, de acordo com o conteúdo cobrado nas provas. Ideal para quem tem mais tempo para estudar e quer se dedicar ao máximo para obter os melhores resultados na sua preparação.
12x R$ 1.149,85
No Cartão de Crédito ou 10% de desconto no Boleto ou Pix à vista: R$ 12.418,38
Promoção válida até: 30/07/2025
Saiba mais

Veja Também

Canal do YouTube 

Referências Bibliográficas 

  1. DYNAMED. Hairy Cell Leukemia. EBSCO Information Services, atualizado em 18 jul. 2023.
  1. NAING, Phyu Thin; ACHARYA, Utkarsh; KUMAR, Abhishek. Hairy Cell Leukemia. In: STATPEARLS. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2025. 
Você pode gostar também