E aí, doc! Vamos explorar mais um tema essencial? Hoje o foco é a Fascite plantar, uma das principais causas de dor no calcanhar, geralmente relacionada à inflamação da fáscia plantar, tecido que conecta o osso do calcanhar aos dedos do pé.
O Estratégia MED está aqui para descomplicar esse conceito e contribuir para o seu aprofundamento teórico e prático, fortalecendo uma atuação clínica cada vez mais precisa e resolutiva.
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Definição de Fascite Plantar
A fascite plantar é uma das causas mais frequentes de dor no pé e no calcanhar em adultos, sendo responsável por cerca de um milhão de consultas médicas por ano apenas nos Estados Unidos. Trata-se de uma inflamação que acomete, principalmente, a origem da fáscia plantar na tuberosidade medial do calcâneo.
A fáscia plantar, também conhecida como aponeurose plantar, é um tecido espesso e esbranquiçado que se estende desde o calcâneo até os tendões flexores dos dedos, dividindo-se em cinco extensões, uma para cada dedo. Essa estrutura é fundamental para a sustentação do arco longitudinal do pé.
Durante a marcha, a extensão dos dedos provoca o tensionamento da fáscia, o que eleva o arco plantar, promove a inversão do retropé e gera rotação externa da perna. Alterações nesse mecanismo podem sobrecarregar a região de inserção da fáscia, resultando em microtraumas repetitivos e inflamação local.
A fascite plantar acomete com frequência adultos que apresentam dor na planta do pé, especialmente ao dar os primeiros passos pela manhã ou após períodos de repouso.
Etiologia e fatores de risco
A fascite plantar apresenta etiologia multifatorial, sendo resultado de diversos fatores que contribuem para o surgimento da dor na região do calcanhar. Embora muitos estudos sejam observacionais e não permitam estabelecer relações causais definitivas, algumas associações importantes foram identificadas.
Entre os principais fatores de risco, destacam-se:
- IMC elevado (acima de 27);
- Obesidade ou sobrepeso;
- Permanência prolongada em pé ou caminhando;
- Atividades físicas de alto impacto, como corrida, balé e dança aeróbica;
- Aumento súbito de carga de treino;
- Uso de calçados inadequados;
- Corrida em superfícies rígidas;
- Pé plano (pes planus), pé cavo (pes cavus) ou tornozelos pronados;
- Diminuição da dorsiflexão do tornozelo;
- Esporões de calcâneo;
- Diabetes tipo 2;
- Encurtamento dos músculos isquiotibiais;
- Baixo nível de atividade física;
- Baixo nível socioeconômico;
- Condições de saúde mental (ansiedade e depressão);
- Doenças reumáticas, como as espondiloartrites.
Manifestações clínicas da Fascite Plantar
As manifestações clínicas da fascite plantar são bastante características e ajudam no diagnóstico, mesmo na ausência de exames complementares. A seguir, estão os principais sinais e sintomas:
Dor plantar no calcanhar
A principal queixa dos pacientes é dor na região inferior do calcanhar, geralmente na inserção medial da fáscia plantar no osso calcâneo. Essa dor pode, ocasionalmente, irradiar para a região lateral.
Padrão típico da dor
- Início gradual da dor no calcanhar.
- Piora com os primeiros passos pela manhã ou após períodos de repouso.
- A dor costuma diminuir com a movimentação e o aquecimento dos tecidos ao longo do dia.
- Retorna ou piora no fim do dia, especialmente após longos períodos em pé ou caminhando.
Fatores agravantes
A dor pode se intensificar ao:
- Caminhar descalço;
- Andar em superfícies duras;
- Ficar muito tempo em pé.
Diagnóstico de Fascite Plantar
O diagnóstico da fascite plantar é clínico, baseado principalmente em dois achados:
- História de dor na região inferior do calcanhar, especialmente pior ao iniciar a caminhada após repouso (como ao sair da cama pela manhã);
- Sensibilidade localizada na origem da fáscia plantar, na tuberosidade medial do calcâneo.
Durante o exame físico, o profissional pode dorsifletir os dedos do paciente para deixar a fáscia plantar tensa, facilitando a palpação e a identificação de pontos dolorosos ao longo da fáscia.
Exames de imagem, como ressonância magnética ou ultrassonografia, são reservados para casos com sinais atípicos ou quando se suspeita de outras causas, como fratura por estresse, bursite ou artrite inflamatória. Exames laboratoriais e biópsias não são indicados na rotina, pois não contribuem para o diagnóstico.
Sinais que sugerem diagnósticos alternativos incluem sintomas neurológicos, histórico de trauma, presença de infecção ou câncer, ou ainda sintomas bilaterais e sinais de espondiloartrite.
Diagnósticos diferenciais de Fascite Plantar
Os diagnósticos diferenciais da fascite plantar envolvem outras causas, embora sejam raras, para dor no calcanhar plantar. Entre elas estão:
- Causas neurológicas, como a síndrome do túnel do tarso (compressão do nervo tibial posterior), neuropatia periférica e radiculopatia S1.
- Causas ósseas, como fratura por estresse no calcâneo, contusão óssea, osteomielite, neoplasias, doença de Paget e deformidade de Haglund.
- Causas dos tecidos moles, incluindo tendinopatia de Aquiles, tendinites dos tendões tibial posterior e flexor longo dos dedos, atrofia da almofada do calcanhar, bursite retrocalcaneal, síndrome do calcanhar doloroso em corredores, ruptura da fáscia plantar e pápulas piezogênicas.
- Distúrbios inflamatórios, como artrite reativa, espondiloartrites e sarcoidose.
Tratamento da Fascite Plantar
O tratamento inicial da fascite plantar inclui medidas conservadoras, como repouso, evitar fatores agravantes e reduzir a pressão no calcanhar com o uso de palmilhas de silicone pré-fabricadas. Embora amplamente recomendadas, essas intervenções apresentam eficácia incerta em acelerar a resolução do quadro.
Repouso e redução de impacto
A recomendação é que o paciente evite atividades que aumentem o impacto sobre o calcanhar, como correr, dançar ou saltar. A redução na carga de treinamento, em termos de frequência, duração ou distância, tem associação com menor risco de lesões nos tecidos moles dos membros inferiores, incluindo a fascite plantar.
Calçados adequados e palmilhas
O uso de calçados com bom amortecimento ajuda a reduzir a sobrecarga sobre o calcanhar. Palmilhas de silicone são sugeridas como uma alternativa eficaz e de baixo custo. Estudos mostraram que a combinação de exercícios de alongamento com o uso dessas palmilhas proporciona maior alívio dos sintomas em comparação com alongamento isolado.
Tratamento de condições associadas
É importante tratar fatores predisponentes, como obesidade ou pé plano sintomático, embora ainda não esteja claro se essa abordagem previne novos episódios de fascite plantar.
Injeções de glicocorticoide para dor intensa
Em pacientes com dor mais intensa, principalmente com piora matinal ou após períodos de inatividade, as injeções de glicocorticoide são uma opção. Elas oferecem alívio modesto e de curto prazo.
- A técnica consiste em injetar uma mistura de glicocorticoide (como triamcinolona ou betametasona) com anestésico local, diretamente na fáscia plantar, preferencialmente por via medial, que é menos dolorosa.
- Pode ser realizada com ou sem o auxílio de ultrassonografia, sem diferença significativa em termos de eficácia.
Plasma rico em plaquetas (PRP)
As injeções de PRP vêm sendo estudadas como alternativa aos corticosteroides. Algumas evidências sugerem melhora sustentada da dor e da função, porém os estudos disponíveis apresentam limitações metodológicas e resultados inconsistentes. Além disso, trata-se de uma terapia de custo elevado e ainda sem padronização quanto à forma de preparo e aplicação, o que restringe seu uso na prática clínica.
Terapia por ondas de choque (ESWT)
A terapia por ondas de choque extracorpóreas, embora amplamente divulgada, apresenta eficácia questionável. Revisões sistemáticas e estudos controlados de boa qualidade não demonstraram benefício significativo dessa abordagem para o tratamento da fasceíte plantar. Assim, seu uso de rotina não é recomendado.
Intervenção cirúrgica
A cirurgia representa a última alternativa e deve ser reservada para pacientes com sintomas refratários após pelo menos seis a doze meses de tratamento conservador adequado. O procedimento mais comum é a liberação parcial da fáscia plantar. No entanto, os riscos da cirurgia, como dor persistente, instabilidade do pé e complicações neurológicas, tornam essa opção restrita a casos bem selecionados.
Talas noturnas
As talas noturnas mantêm o tornozelo em posição neutra durante o sono, promovendo o alongamento da fáscia plantar. No entanto, os resultados dos estudos são inconsistentes. Algumas pesquisas sugerem benefícios semelhantes aos das palmilhas personalizadas, enquanto outras mostram ausência de melhora clínica significativa. O uso pode ser considerado em casos persistentes, principalmente quando há dor acentuada ao primeiro passo pela manhã.
Taping (bandagens funcionais)
A técnica de Low-Dye taping visa sustentar o arco medial do pé e reduzir a tensão sobre a fáscia plantar. Pode ser útil em casos agudos com dor intensa, especialmente nos primeiros dias após o diagnóstico. O efeito tende a ser temporário, e seu uso prolongado não é indicado. A aplicação correta requer técnica específica para evitar desconforto ou reações adversas na pele.
Massagens e crioterapia
Massagens de fricção profunda e aplicação de gelo são abordagens complementares, utilizadas principalmente como forma de alívio sintomático. Embora não existam evidências robustas sobre sua eficácia isolada, ambas podem ser incluídas em programas domiciliares de alongamento, com potencial benefício de curto prazo.
Laserterapia
A aplicação de laser (em baixa ou alta intensidade) na região plantar tem sido investigada como forma de estimular a regeneração tecidual. Revisões sistemáticas apontam melhora discreta e de curto prazo na dor, porém os resultados são comparáveis aos de terapias ineficazes como a ESWT, sugerindo efeito similar ao placebo. Portanto, seu uso não é recomendado de forma rotineira.
Injeção de toxina botulínica
A injeção de toxina botulínica na fáscia plantar pode ser uma opção em casos persistentes de fascite plantar. Revisões sistemáticas que analisaram entre 6 e 10 ensaios clínicos apontaram melhora na dor e na função em comparação com grupos controle.
No entanto, os estudos disponíveis têm amostras pequenas, risco de viés e resultados bastante variáveis. Por isso, a evidência é considerada de baixa certeza.
Essa intervenção pode ser considerada em pacientes com sintomas refratários, desde que sejam esclarecidas as limitações do tratamento.
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Referências
Rachelle Buchbinder, MBBS, MSc, PhD, FRACP, FAHMS, FAA. Plantar fasciitis. UpToDate,2025. Disponível em: UpToDate
ARAGÃO, Felipe Matheus Sant’Anna et al. Tratamento da fascite plantar. Brazilian Journal of Implantology and Health Sciences, [S.l.], v. 6, n. 10, p. 1417-1439, 2024. Disponível em: https://doi.org/10.36557/2674-8169.2024v6n10p1417-1439.