E aí, doc! Vamos aprofundar mais um tema importante? Hoje o assunto é o Lipedema, uma alteração crônica marcada pelo depósito anormal e simétrico de gordura, principalmente nas pernas e, em alguns casos, nos braços.
O Estratégia MED está aqui para simplificar esse tema e ajudar você a consolidar seus conhecimentos, tornando sua prática clínica cada vez mais segura e resolutiva.
Vamos nessa!
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Definição de Lipedema
O lipedema é uma doença crônica descrita inicialmente na década de 1940 por Allen e Hines, caracterizada pela deposição anormal, simétrica e desproporcional de tecido adiposo.
Acomete com maior frequência mulheres e apresenta predileção pelos membros inferiores, podendo também afetar quadris, coxas, braços e nádegas, mas geralmente poupa pés e tronco. Diferencia-se do edema comum por se tratar de uma alteração no volume e na distribuição do tecido adiposo, de provável base genética.
Entre suas principais manifestações estão o aumento progressivo do volume dos membros, dor, sensibilidade à palpação, fácil formação de hematomas e presença de nódulos firmes no tecido subcutâneo.
O aspecto clínico confere ao lipedema uma aparência desproporcional do corpo, com predomínio do acúmulo de gordura nas extremidades em comparação ao restante do organismo. Essa condição, além de impactar a estética corporal, compromete a qualidade de vida devido ao desconforto físico e às limitações funcionais que pode gerar.
Epidemiologia do Lipedema
A epidemiologia do lipedema mostra dados subestimados devido à frequente subnotificação e dificuldade diagnóstica. A doença acomete principalmente mulheres, com raros casos em homens. Estima-se prevalência de cerca de 11% em adultos, incluindo 6,5% nos Estados Unidos e entre 15% e 18% em países europeus, embora alguns números apontem 1 caso a cada 72.000 pessoas.
Fisiopatologia da Lipedema
A fisiopatologia do lipedema envolve múltiplos mecanismos ainda não completamente esclarecidos. Originalmente, Allen e Hines sugeriram que a condição poderia resultar da baixa resistência do tecido adiposo à passagem de fluidos dos capilares para o interstício.
Observa-se uma relação com fatores hormonais, já que o lipedema frequentemente surge na puberdade ou após a gravidez, períodos em que há predomínio de estrogênio. Embora raro em homens, casos descritos estão associados a estados de hiperestrogenismo, como doenças hepáticas, baixos níveis de testosterona e síndrome dos ovários policísticos.
Entre as principais alterações descritas estão a hipertrofia dos adipócitos, aumento da fibrose intercelular e infiltração de células inflamatórias, especialmente macrófagos, que contribuem para dor, hipóxia e necrose gordurosa.
Há também perda de elasticidade nos tecidos conjuntivos, o que compromete a função dos vasos linfáticos e facilita extravasamento de líquidos e capilaridade aumentada. Esse processo pode levar à formação de microaneurismas nos vasos linfáticos e favorecer a sobreposição com quadros de linfedema.
Outro aspecto relevante é o estímulo à proliferação de células-tronco no tecido adiposo pela ação do fator de crescimento endotelial vascular (VEGF), desencadeado pela hipóxia local. Pacientes com lipedema apresentam alterações vasculares, como aumento da rigidez aórtica e mudanças na mecânica de rotação ventricular esquerda, sugerindo que a doença também impacta a função cardiovascular de forma indireta.
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Manifestações clínicas do Lipedema
As manifestações clínicas do lipedema apresentam um padrão característico, geralmente iniciado na puberdade, embora o surgimento também possa ocorrer em fases posteriores da vida.
Muitas pacientes relatam que, mesmo com peso normal ou discretamente aumentado, os membros inferiores tornam-se dolorosos, aumentados e desproporcionais em relação ao restante do corpo. O histórico familiar positivo em mulheres com quadro semelhante é comum, sugerindo componente hereditário.
Características clássicas do lipedema
- Acomete quase exclusivamente mulheres;
- Aumento simétrico e bilateral de quadris, coxas, pernas e nádegas, com preservação dos pés;
- Presença de almofadas de gordura na região maleolar;
- Dor espontânea ou à palpação das áreas afetadas;
- Tendência a equimoses de fácil formação;
- Ausência de infecções locais;
- Impacto psicossocial relevante.
Exame físico
Observa-se tecido adiposo desproporcional que se estende dos quadris até os tornozelos, com demarcação nítida na região maleolar. O sinal de Stemmer é negativo, indicando preservação da função linfática. Quando há envolvimento de membros superiores, o padrão é semelhante, com mãos poupadas.
Evolução clínica
Em pacientes com índice de massa corporal (IMC) dentro da normalidade, o quadro tende a permanecer estável. Contudo, o ganho de peso compromete a função linfática, favorece o aparecimento de edema e aumenta o risco de evolução para linfedema irreversível. Até 80% das pacientes apresentam IMC acima de 30 kg/m², condição que intensifica o acúmulo de tecido adiposo e a progressão das alterações nos membros inferiores.
Diagnóstico de Lipedema
O diagnóstico do lipedema é, em grande parte, clínico, baseado na história do paciente e no exame físico. Dois critérios principais são considerados fundamentais: o aumento desproporcional e simétrico do tecido adiposo, predominantemente nos membros inferiores, e a presença de dor nessas regiões.
Geralmente, adolescentes e mulheres jovens apresentam os sinais clássicos, relatando que, por volta dos 18 anos, já havia desproporção evidente entre as pernas e o restante do corpo, mesmo com peso normal ou apenas discretamente aumentado.
Em adultos, a avaliação pode ser mais complexa, especialmente quando há índice de massa corporal (IMC) acima de 30 kg/m². Nesses casos, os sinais típicos tornam-se menos evidentes, o que dificulta a diferenciação entre lipedema, obesidade isolada ou linfedema associado. É importante destacar que o aumento de gordura sem dor (lipohipertrofia indolor) não é compatível com o diagnóstico de lipedema.
Embora o diagnóstico seja essencialmente clínico, exames complementares podem auxiliar em situações específicas. A linfocintilografia é útil em pacientes com sobrepeso ou obesidade, ajudando a distinguir lipedema de condições como obesidade sem linfedema (OWL) e linfedema induzido pela obesidade (OIL). Esse exame apresenta alta sensibilidade e especificidade para linfedema, sendo capaz de demonstrar função linfática normal em pacientes com lipedema, desde que o IMC não ultrapasse 40 kg/m².
A ressonância magnética (RM) também pode contribuir, principalmente em casos de dúvida diagnóstica ou para planejamento cirúrgico. Nas imagens, observa-se aumento circunferencial e simétrico do tecido adiposo subcutâneo, sem acometimento muscular ou ósseo, achado típico da doença.
Tratamento do Lipedema
O tratamento do lipedema tem como objetivos principais controlar a dor, prevenir o desenvolvimento de linfedema secundário e suas complicações, e melhorar a função física e psicossocial dos pacientes.
Medidas conservadoras
O manejo da dor pode incluir encaminhamento a serviços especializados. A terapia compressiva pode ser útil em pacientes com sobrepeso ou edema associado, embora em indivíduos com IMC menor e edema mínimo possa não trazer benefícios e até piorar a dor.
Manter peso saudável, por meio de alimentação adequada e prática regular de exercícios, ajuda a reduzir a inflamação do tecido adiposo e melhora o bem-estar físico e psicológico. Pacientes com sobrepeso ou obesidade podem ser encaminhados a programas de perda de peso que incluam estratégias nutricionais, medicamentosas ou cirúrgicas, quando indicadas.
Suporte psicossocial
O acompanhamento psicológico e o incentivo à autogestão contribuem para a melhora da qualidade de vida, auxiliando no controle da dor, nas dificuldades funcionais e nas limitações estéticas causadas pela doença.
Intervenção cirúrgica
A lipoaspiração é considerada em casos sintomáticos, visando reduzir a dor, melhorar a aparência e a qualidade de vida. Estudos mostram que a lipoaspiração é mais eficaz em estágios iniciais do lipedema e em pacientes com IMC inferior a 35 kg/m².
Para pacientes com IMC elevado, programas de perda de peso, incluindo cirurgia bariátrica quando indicado, podem ser realizados antes da lipoaspiração para reduzir riscos e melhorar os resultados.
O procedimento cirúrgico geralmente é realizado em um membro por vez, com intervalo mínimo de seis semanas, permitindo mobilização precoce e redução do risco de trombose venosa.
Após a cirurgia, os pacientes usam curativos compressivos e, posteriormente, vestimentas de compressão por pelo menos seis semanas para otimizar a retração da pele e auxiliar na recuperação. Estudos indicam melhora significativa na função física, qualidade de vida e satisfação com a aparência após a lipoaspiração em pacientes com lipedema.
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Referências
Arin K Greene, MD. Diagnosis and management of lipedema. UpToDate, 2024. Disponível em: UpToDate
Vyas A, Adnan G. Lipedema. [Updated 2023 Jan 30]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2025 Jan-. Available from: https://www-ncbi-nlm-nih-gov.translate.goog/books/NBK573066/?_x_tr_sl=en&_x_tr_tl=pt&_x_tr_hl=pt&_x_tr_pto=tc