Resumo sobre o Esôfago de Barrett: etiologias, diagnóstico e mais!
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Resumo sobre o Esôfago de Barrett: etiologias, diagnóstico e mais!

E aí, doc! Vamos explorar mais um tema essencial? Hoje o foco é o Esôfago de Barrett, uma condição caracterizada pela substituição do epitélio escamoso normal do esôfago por epitélio colunar, geralmente como resposta a danos crônicos causados pelo refluxo gastroesofágico. 

O Estratégia MED está aqui para descomplicar esse conceito e ajudar você a aprofundar seus conhecimentos, promovendo uma prática clínica cada vez mais precisa e segura.

Vamos nessa!

Definição de Esôfago de Barrett

O esôfago de Barrett (EB) é uma condição caracterizada pela substituição do epitélio escamoso do esôfago distal por epitélio colunar, identificável por endoscopia e confirmado histologicamente como metaplasia intestinal. 

Esse processo patológico, descrito inicialmente pelo professor Norman Barrett, está associado a um maior risco de desenvolvimento de adenocarcinoma esofágico, especialmente em casos com displasia de baixo grau, cuja incidência anual é de 0,54%. 

A prevalência do EB varia globalmente, sendo crescente no mundo ocidental. No Brasil, essa variação se deve à miscigenação da população e aos hábitos alimentares. 

Os principais fatores de risco para a progressão do EB ao adenocarcinoma incluem gênero masculino, idade superior a 50 anos, refluxo gastroesofágico prolongado, obesidade central, tabagismo e um comprimento metaplásico superior a 3 cm.

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Fatores de risco para Esôfago de Barrett

Os principais fatores de risco para o desenvolvimento do esôfago de Barrett (EB) incluem condições clínicas, características genéticas e hábitos de vida que contribuem para a inflamação crônica e a progressão da metaplasia esofágica.

  • 1. Doença do refluxo gastroesofágico (DRGE): Pacientes com DRGE sintomática apresentam um risco aumentado de desenvolver EB, especialmente aqueles com esofagite erosiva. Estudos indicam que a esofagite erosiva confere um risco cinco vezes maior para EB em cinco anos. A relação entre estenose péptica e EB também foi sugerida, embora ainda existam controvérsias.
  • 2. Obesidade central: A obesidade abdominal é um fator de risco significativo para DRGE e EB. Uma meta-análise demonstrou um aumento do risco de EB em pacientes com índice de massa corporal (IMC) superior a 30 kg/m². No entanto, estudos sugerem que a distribuição da gordura corporal, medida pela relação cintura-quadril, pode ser um preditor mais forte do que o IMC isolado.
  • 3. Histórico familiar: O EB e o adenocarcinoma esofágico apresentam agregação familiar, sendo encontrados em até 28% dos parentes de primeiro grau de pacientes com câncer de esôfago. Mutações genéticas em MSR1, ASCC1 e CTHRC1, além de variantes nos cromossomos 6p21 e 16q24, foram associadas ao risco aumentado da condição.
  • 4. Tabagismo: O tabagismo tem um efeito sinérgico com a DRGE no aumento do risco de EB. Estudos demonstram que fumantes apresentam um risco até 1,7 vezes maior de desenvolver EB em comparação com não fumantes sem DRGE.

Além desses fatores, o esôfago de Barrett pode evoluir para adenocarcinoma esofágico por meio de alterações genéticas e epigenéticas associadas à progressão displásica, o que reforça a importância da vigilância em indivíduos com fatores de risco significativos.

Fisiopatologia do Esôfago de Barret

A fisiopatologia do esôfago de Barrett (EB) envolve uma resposta adaptativa ao dano crônico causado pelo refluxo duodenogastroesofágico. A exposição prolongada do epitélio esofágico ao ácido gástrico e à bile leva a um processo inflamatório e lesão do epitélio escamoso nativo, desencadeando sua substituição por epitélio colunar metaplásico, característico do EB. Esse epitélio metaplásico pode conter células intestinais especializadas, incluindo células caliciformes.

A progressão do EB ocorre por meio de uma sequência de alterações histológicas e moleculares, iniciando-se com a metaplasia e evoluindo para displasia de baixo grau, displasia de alto grau e, finalmente, adenocarcinoma esofágico. 

Esse processo envolve modificações na expressão gênica e ativação de vias moleculares que favorecem a proliferação celular descontrolada. Devido ao risco de malignização, recomenda-se vigilância endoscópica periódica com biópsias para detecção precoce de alterações displásicas.

Evolução da metaplasia no eôfago de Barrett Fonte: Tratado de gastroenterologia: da graduação à pós-graduação. 3. ed. Rio de Janeiro: Atheneu, 2023

Manifestações clínicas do Esôfago de Barret

O esôfago de Barrett (EB) em si não causa sintomas, pois a metaplasia colunar intestinal especializada característica da condição é assintomática. No entanto, a maioria dos pacientes é diagnosticada devido a sintomas associados à doença do refluxo gastroesofágico (DRGE), principal fator de risco para EB.

  • Sintomas relacionados à DRGE: Pacientes com EB frequentemente apresentam azia e regurgitação, sintomas clássicos da DRGE. O EB de segmento longo está mais associado a esses sintomas, enquanto o EB de segmento curto pode ocorrer sem manifestações evidentes de refluxo.
  • Disfagia e odinofagia: Em casos de complicações, como ulceração ou estenose esofágica, os pacientes podem apresentar dificuldade para engolir (disfagia) ou dor ao engolir (odinofagia).
  • Sangramento gastrointestinal: Embora raro, o EB pode levar a sangramento secundário a ulcerações, resultando em hematêmese ou melena.

Triagem para Esôfago de Barrett

A triagem para esôfago de Barrett (EB) é recomendada para pacientes com múltiplos fatores de risco para adenocarcinoma, como idade acima de 50 anos, sexo masculino, DRGE crônica, obesidade central, tabagismo, herança familiar e presença de hérnia de hiato. 

A endoscopia digestiva alta com biópsia é o método padrão para diagnóstico, com sensibilidade e especificidade variáveis conforme o comprimento do segmento afetado. O sistema de classificação de Praga é utilizado para determinar a extensão do EB.

Técnicas avançadas, como cromoendoscopia e dispositivos como Cytosponge, têm sido investigadas para melhorar a identificação do EB, mas ainda não são amplamente adotadas. 

Embora a triagem possa detectar EB e adenocarcinoma em estágios iniciais, há limitações quanto à eficácia em reduzir a mortalidade, e muitos casos de adenocarcinoma ocorrem em pacientes que não se qualificariam para a triagem baseada apenas nos sintomas de DRGE.

Diagnóstico de Esôfago de Barrett 

O diagnóstico do Esôfago de Barrett (EB) é realizado por meio de exames endoscópicos e histopatológicos, sendo fundamental para a identificação precoce da condição e a prevenção do adenocarcinoma esofágico.

Diagnóstico Endoscópico

A endoscopia digestiva alta é o principal exame para a identificação do EB, permitindo a visualização direta da mucosa esofágica. O EB se caracteriza pela presença de uma mucosa de coloração salmão ou rosa, que contrasta com o tom cinza-claro da mucosa escamosa normal do esôfago. Entretanto, a confirmação diagnóstica exige exame histológico, realizado por meio de biópsias.

A extensão da metaplasia pode ser classificada em três grupos:

  • Barrett longo: extensão da mucosa metaplásica de 3 cm ou mais.
  • Barrett curto (BC): extensão inferior a 3 cm.
  • Metaplasia intestinal da cárdia: localizada na região da junção gastroesofágica.

Para padronizar a avaliação endoscópica, recomenda-se o uso da classificação de Praga, que determina a extensão do EB com base em pontos anatômicos, como a junção escamocolunar e a junção gastroesofágica.

A realização de biópsias segue o protocolo de Seattle, que orienta a coleta de amostras em quatro quadrantes a cada 1 cm a 2 cm ao longo da mucosa metaplásica. Essa abordagem visa aumentar a detecção de displasia e câncer esofágico, visto que a neoplasia do esôfago pode ser focal e facilmente perdida caso as biópsias não sejam bem direcionadas.

Cromoscopia

A cromoscopia auxilia na detecção de lesões precoces, que poderiam passar despercebidas na endoscopia convencional. Pode ser realizada de duas formas:

  • Cromoscopia química: utiliza corantes como azul de metileno e ácido acético, sendo este último mais acessível e amplamente disponível.
  • Cromoscopia digital ou óptica: tecnologia avançada que melhora o contraste das lesões, diferenciando a vascularização superficial e profunda. Apesar de sua eficácia, seu alto custo ainda limita o uso no Brasil.

Diagnóstico Histopatológico

O exame histopatológico das biópsias confirma o diagnóstico de EB por meio da identificação do epitélio colunar especializado com células caliciformes, caracterizando a metaplasia intestinal. Esse achado é essencial, pois somente esse tipo de epitélio colunar está associado ao risco de malignização.

O EB pode ser classificado em diferentes estágios histológicos, que refletem sua evolução:

  • Não displásico: epitélio regenerador sem sinais de displasia.
  • Displasia de grau indeterminado: quando há dúvida diagnóstica sobre a presença de displasia.
  • Displasia de baixo grau: semelhante a um adenoma tubular de baixo grau do cólon, sem estratificação nuclear.
  • Displasia de alto grau: exibe maior atipia citológica, com núcleos aumentados, pleomorfismo e mitoses frequentes.
  • Carcinoma intramucoso ou adenocarcinoma invasivo: estágios mais avançados da doença.

A diferenciação entre displasia de alto grau e adenocarcinoma pode ser desafiadora devido a fatores como inflamação e ulceração. Para aumentar a precisão diagnóstica, estudos apontam o uso de biomarcadores, como a ciclina A e o Ki-67, para auxiliar na identificação da displasia.

Diante da complexidade do diagnóstico histológico, recomenda-se que pacientes com displasia de baixo grau tenham seus exames revisados por patologistas especializados para uma estratificação de risco mais precisa.

Tratamento de Esôfago de Barrett

O tratamento do esôfago de Barrett (EB) envolve uma abordagem multifacetada, que inclui medidas comportamentais, terapias farmacológicas, quimioprevenção, terapias endoscópicas e, em casos mais avançados, intervenção cirúrgica. A escolha do tratamento depende da gravidade do EB, da presença de displasia e do risco de progressão para o câncer de esôfago.

Medidas Comportamentais

O tratamento inicial do EB foca em corrigir o refluxo gastroesofágico, principal fator causal da condição. Recomenda-se a adoção de hábitos de vida saudáveis, como a modificação da dieta, a perda de peso (principalmente em casos de obesidade ou sobrepeso) e o controle do uso de alimentos que agravam o refluxo. Essas mudanças comportamentais podem ajudar a reduzir os sintomas e prevenir a progressão da doença.

Tratamento Farmacológico

O tratamento farmacológico inclui o uso de antissecretores, como inibidores da bomba de próton (IBPs), que são eficazes no controle da secreção ácida e no alívio dos sintomas. Estudos têm mostrado que os IBPs podem reduzir significativamente o risco de progressão do EB para adenocarcinoma esofágico, especialmente quando combinados com anti-inflamatórios não hormonais, como a aspirina.

Quimioprevenção

Embora a quimioprevenção com IBPs tenha mostrado efeitos positivos na redução do risco de progressão para o câncer, os consensos internacionais não recomendam o uso crônico dessas medicações devido aos riscos associados. A combinação de IBPs com anti-inflamatórios não hormonais tem demonstrado ser eficaz em reduzir as concentrações de prostaglandinas, contribuindo para a prevenção da progressão do EB.

Terapia Endoscópica

A terapia endoscópica tem ganhado destaque no tratamento do EB, especialmente em pacientes com displasia ou câncer intramucoso. Técnicas endoscópicas, como a ablação por radiofrequência e a ressecção endoscópica da mucosa, oferecem alternativas à esofagectomia, que é considerada uma opção de último recurso. A ablação por radiofrequência tem mostrado altas taxas de erradicação do EB, com sucesso em pacientes com displasia de baixo e alto grau. No entanto, essas técnicas exigem cuidado, pois podem causar complicações, como perfurações e estenoses esofágicas.

Tratamento Cirúrgico

Quando as medidas comportamentais e a terapia farmacológica não são suficientes para controlar o refluxo, o tratamento cirúrgico pode ser considerado. A fundoplicatura laparoscópica, que consiste na reconstrução do esfíncter esofágico inferior, é o procedimento mais comum. Estudos indicam que a fundoplicatura pode resultar em uma reversão mais eficaz do EB, em comparação ao tratamento clínico com IBPs. No entanto, a taxa de recidiva do refluxo é alta, especialmente em pacientes com EB e complicações adicionais.

Esfagectomia

A esofagectomia, que envolve a remoção do esôfago, era tradicionalmente indicada para casos de EB com displasia de alto grau ou carcinoma intramucoso. No entanto, devido à alta morbimortalidade associada a esse procedimento, a abordagem endoscópica tem se tornado a preferida. A esofagectomia é reservada para casos mais graves, quando outras opções de tratamento não são eficazes.

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Referências

Stuart J Spechler, MD. Barrett’s esophagus: Epidemiology, clinical manifestations, and diagnosis. UpToDate, 2024. Disponível em: UpToDate

Stuart J Spechler, MDRhonda F Souza, MD, AGAF, FASGE, FACG. Barrett’s esophagus: Surveillance and management. UpToDate, 2024. Disponível em: UpToDate

ZATERKA, Schlioma; PASSOS, Maria do Carmo Friche; CHINZON, Décio (Eds.). Tratado de gastroenterologia: da graduação à pós-graduação. 3. ed. Rio de Janeiro: Atheneu, 2023.

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