E aí, doc! Bora aprofundar mais um tema fundamental? Hoje o destaque é a Síndrome Compartimental, uma emergência médica caracterizada pelo aumento da pressão dentro de um compartimento muscular, comprometendo a circulação e a função dos tecidos ali presentes.
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Definição de Síndrome Compartimental Aguda
A síndrome compartimental aguda (SCA) é uma emergência cirúrgica caracterizada pelo aumento da pressão dentro de um espaço fascial fechado e inelástico, resultando em comprometimento do fluxo sanguíneo e redução da perfusão tecidual.
Esse processo pode levar à dor isquêmica intensa, dano irreversível aos tecidos e risco significativo de perda do membro afetado. A SCA ocorre geralmente após uma redução volumétrica ou um aumento no conteúdo do compartimento, sendo mais comum em lesões de alta energia, como traumas, esmagamentos ou lesões vasculares, mas também pode ocorrer em casos de menor gravidade, como imobilizações prolongadas.
Embora seja mais frequentemente associada à perna, pode acometer outras regiões, como nádegas, coxa e pé. O diagnóstico depende principalmente da avaliação clínica seriada realizada por um profissional experiente, podendo ser complementado pela medição da pressão intracompartimental.
Epidemiologia da Síndrome Compartimental Aguda
A síndrome compartimental aguda (SCA) tem como principal causa as fraturas, que correspondem a aproximadamente 75% dos casos. A fratura da diáfise da tíbia destaca-se como a etiologia mais comum, representando até 36% de todas as ocorrências de SCA, enquanto o antebraço aparece como a segunda região mais frequentemente acometida, com até 9% dos casos.
Embora a fratura exposta possa teoricamente reduzir o risco de síndrome compartimental ao criar espaço adicional para a expansão do tecido, estudos indicam que não há diferença significativa entre fraturas expostas e fechadas em relação à pressão intramuscular e ao risco de desenvolvimento da síndrome.
A incidência de SCA é consideravelmente maior na população masculina, chegando a ser até 10 vezes superior em comparação com as mulheres, possivelmente devido ao maior índice de massa muscular nos homens. O grupo mais vulnerável corresponde a homens de aproximadamente 35 anos com fratura de tíbia. Além disso, pacientes vítimas de traumas de alta energia, com fraturas ou lesões significativas em tecidos moles, também apresentam risco elevado.
Outras causas relevantes incluem fatores iatrogênicos, como a compressão prolongada de um membro em posições cirúrgicas específicas, por exemplo, litotomia ou Trendelenburg, bem como a injeção inadvertida de fluido pressurizado dentro de um compartimento.
O esforço muscular repetitivo é outro fator de risco, podendo desencadear uma forma crônica da síndrome compartimental. A SCA também pode ocorrer em situações de síndrome de esmagamento, hemorragia espontânea em pacientes com coagulopatias, como a hemofilia, ou após procedimentos ortopédicos, como a colocação de haste intramedular.
Fisiopatologia da Síndrome Compartimental Aguda
A fisiopatologia da síndrome compartimental aguda (SCA) baseia-se no aumento da pressão dentro de um compartimento fascial, seja por causas externas ou internas, que comprometem a perfusão tecidual local. Esse aumento pressórico ocorre, principalmente, em decorrência do acúmulo de sangue e outros fluidos após uma lesão, formando uma massa no interior do compartimento miofascial.
A fáscia muscular, por ser uma estrutura inelástica, não permite a expansão necessária para acomodar esse volume, transmitindo a elevação da pressão ao sistema venoso, que possui paredes finas e facilmente colapsáveis.
Com o colapso venoso, há prejuízo do retorno venoso e da perfusão local, levando à compressão direta de músculos e nervos, e ao comprometimento da bomba transcelular, resultando em isquemia tecidual progressiva. Quando a pressão intracompartimental ultrapassa a pressão de perfusão, ocorre a redução do fluxo sanguíneo microvascular, que culmina em hipóxia e necrose tecidual, especialmente após um período prolongado de 4 a 8 horas.
Esse processo desencadeia um ciclo vicioso, onde a isquemia leva a lesão endotelial e aumento da permeabilidade vascular, agravando ainda mais o edema e a pressão dentro do compartimento. A extensão e gravidade do comprometimento tecidual dependem diretamente da quantidade de compartimentos musculares envolvidos e do tempo de isquemia não resolvida.
Casos mais graves podem evoluir com complicações sistêmicas, como arritmias cardíacas, hipotermia, insuficiência renal e choque. A intervenção precoce, por meio da fasciotomia, é fundamental, uma vez que essa medida remove as limitações do volume do compartimento, reduz a pressão e restabelece a perfusão, prevenindo danos irreversíveis e colaborando para a recuperação da homeostase tecidual.
Manifestações clínicas e Diagnóstico de Síndrome Compartimental Aguda
O quadro clínico da síndrome compartimental caracteriza-se, inicialmente, por dor intensa desproporcional à lesão aparente, sendo o principal sintoma e um importante sinal de alerta. Essa dor tende a piorar com o estiramento passivo dos músculos localizados dentro do compartimento afetado. Por exemplo, em casos que envolvem o membro inferior, observa-se exacerbação da dor quando se realiza a flexão plantar passiva do tornozelo ou a flexão dos pododáctilos.
Além da dor, outros sinais clássicos relacionados à isquemia tecidual podem surgir, como parestesia, paralisia, palidez e ausência de pulsos distais. À palpação, o compartimento afetado apresenta-se tenso e endurecido. Contudo, a presença de pulso não exclui o diagnóstico, visto que a síndrome compromete mais frequentemente o fluxo capilar e venoso do que o arterial.
O diagnóstico deve ser realizado precocemente, antes mesmo do aparecimento de sinais tardios como palidez ou ausência de pulso, pois esses indicam comprometimento vascular avançado. No entanto, a avaliação clínica isolada pode ser desafiadora, principalmente em pacientes com alterações do estado mental, politraumatizados ou sob sedação, que não conseguem expressar adequadamente os sintomas.
Nesses casos, recomenda-se aferir a pressão intracompartimental. A síndrome compartimental é confirmada quando a pressão do compartimento excede 30 mmHg ou quando a diferença entre a pressão diastólica e a pressão compartimental é inferior a 30 mmHg.
A pressão normal do compartimento é geralmente igual ou inferior a 8 mmHg. Portanto, diante de um quadro suspeito, especialmente em pacientes com risco elevado, o limiar para investigação deve ser baixo a fim de garantir um diagnóstico precoce e instituir o tratamento adequado, prevenindo complicações graves e irreversíveis.
Os 7 Ps da síndrome compartimental são sinais clínicos clássicos que ajudam na suspeita e diagnóstico da síndrome, principalmente em casos de trauma. São eles:
- Pain (Dor) – É o sintoma mais precoce e importante, caracterizando-se como intensa, progressiva e desproporcional à lesão aparente. Piora com a movimentação passiva dos músculos no compartimento afetado.
- Paresthesia (Parestesia) – Sensação de formigamento ou adormecimento na área acometida, indicando sofrimento ou lesão nervosa inicial.
- Pallor (Palidez) – A região pode apresentar-se pálida devido à redução do fluxo sanguíneo arterial secundária ao aumento da pressão compartimental.
- Pulselessness (Pulso ausente) – A ausência ou diminuição do pulso distal pode ocorrer, embora não seja um sinal precoce. Quando presente, indica comprometimento vascular grave.
- Paralysis (Paralisia) – A incapacidade de movimentar o membro afetado surge nas fases mais avançadas, sugerindo dano neuromuscular significativo.
- Poikilothermia (Temperatura alterada) – O membro acometido pode estar mais frio do que o contralateral, indicando alteração na perfusão e comprometimento circulatório.
- Pressure (Pressão aumentada) – O compartimento afetado apresenta-se endurecido, tenso e com aumento da pressão palpável devido ao acúmulo de líquidos e edema.
Tratamento da Síndrome Compartimental Aguda
O tratamento da síndrome compartimental deve ser iniciado de forma imediata e prioritária, especialmente em pacientes vítimas de lesões de alta energia. A abordagem inicial segue o protocolo de Suporte Avançado de Vida em Trauma (ATLS), com a remoção de curativos ou dispositivos que possam exercer constrição sobre o membro afetado. Caso a lesão acometa um membro superior, este deve ser mantido ao nível do coração, evitando elevação excessiva que pode reduzir ainda mais a perfusão tecidual.
A intervenção definitiva para a síndrome compartimental é a fasciotomia descompressiva, procedimento cirúrgico que consiste na realização de incisões amplas na pele e na fáscia muscular para aliviar a pressão no interior do compartimento afetado. A escolha do local e da extensão das incisões depende da região anatômica envolvida e das estruturas comprometidas.
Embora seja a principal medida terapêutica, a fasciotomia possui riscos e complicações, como necessidade de procedimentos cirúrgicos adicionais, dor, lesões nervosas, deformidades estéticas e fraqueza muscular residual. Assim, a decisão pela realização da fasciotomia deve considerar um planejamento cuidadoso, já que o procedimento pode resultar em morbidade significativa e elevação dos custos hospitalares.
A eficácia da fasciotomia está diretamente relacionada ao seu caráter precoce. Quando realizada tardiamente, especialmente após 8 horas do início da síndrome, o risco de infecção e complicações aumenta consideravelmente. Em casos onde o diagnóstico for tardio ou a isquemia já tiver causado danos irreversíveis, o tratamento não operatório pode ser considerado, pois a intervenção cirúrgica, nesse contexto, pode oferecer poucos benefícios e aumentar os riscos ao paciente.
De olho na prova!
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MS – Universidade Federal de Grande Dourados – UFGD (Hospital Universitário da UFGD – HU) – 2021 – Residência (Acesso Direto)
Decorre da compressão do feixe vasculonervoso consequente ao grande edema que se desenvolve no membro atingido, produzindo isquemia de extremidades. As manifestações mais importantes são: dor intensa, parestesia, diminuição da temperatura do segmento distal, cianose e déficit motor.
SOUSA, T. C. J. Picadas de cobras, aranhas e escorpiões. In: GUSSO G. (Org.); LOPES, J. M. C. (Org.); DIAS, L. C. Tratado de Medicina de Família e Comunidade: princípios, formação e prática. 2a. ed. Porto Alegre: Artmed, 2019.
A descrição se refere a uma das possíveis complicações de acidentes com animais peçonhentos considerados graves. Assinale a alternativa em que está corretamente nomeada.
A) Infecção secundária, sem abcesso.
B) Síndrome compartimental.
C) Isquemia renal secundária.
D) Insuficiência respiratória aguda.
E) Choque.
Comentário da questão:
Um edema importante do membro cursando com compressão do feixe vasculonervoso pode levar à SINDROME COMPARTIMENTAL AGUDA. Como possíveis causas temos: traumas diretos aos membros, choque elétrico e queimaduras, picada de animais peçonhentos, síndrome da reperfusão, rabdomiólise traumática. De forma mais rara, a SCA também pode ocorrer por atividade física excessiva.
Qualquer grupo muscular pode desenvolver SCA, incluindo mãos e pés, mas é mais comum na panturrilha e antebraço.
A SCA é causada por uma lesão importante às partes moles, levando a um edema muscular intracompartimental. O aumento da pressão intracompartimental compromete a vascularização dos tecidos, da mesma forma que o edema cerebral, no AVE, levando à sua isquemia. Quanto mais isquemia, mais edema, e quanto mais edema, menor vascularização, levando a um círculo vicioso que deve ser rompido com a fasciotomia. O diagnóstico é presuntivo e o tratamento deve ser feito imediatamente.
A) Errada. Infecção secundária à picada de cobra levaria à hiperemia, hipertermia no membro, e não diminuição da temperatura do segmento distal, cianose e déficit motor.
B) Correta. Como vimos, o diagnóstico mais provável é a síndrome compartimental aguda
C) Errada. Isquemia renal não levaria às alterações descritas no membro.
D) Errada. Paciente com insuficiência respiratória aguda cursa com dispneia, taquipneia, uso de musculatura acessória, e não com as alterações descritas no membro inferior.
E) Errada. Paciente com choque apresenta taquicardia, taquipneia, pele pegajosa, sudorese, palidez, hipotensão arterial, alteração do nível de consciência, a depender da perda volêmica.
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Referências
E Mark Hammerberg, MD. Acute compartment syndrome of the extremities. UpToDate, 2025. Disponível em: UpToDate
Kevin C Chung, MD, MSHidemasa Yoneda, MD, PhDJ Gregory Modrall, MD. Pathophysiology, classification, and causes of acute extremity compartment syndrome. UpToDate, 2025. Disponível em: UpToDate
COELHO, Natália Vaz et al. Síndrome compartimental: uma análise das possíveis complicações no contexto de fraturas expostas. Brazilian Journal of Health Review, Curitiba, v. 7, n. 1, p. 900-907, jan./fev. 2024. Disponível em: https://doi.org/10.34119/bjhrv7n1-068. Acesso em: 1 jun. 2025.