E aí, doc! Vamos explorar mais um tema essencial? Hoje o foco é a Síndrome Complexa da Dor Regional (SCDR), uma condição caracterizada por dor persistente e desproporcional em relação ao evento inicial, geralmente associada a alterações sensoriais, motoras e autonômicas.
O Estratégia MED está aqui para descomplicar esse conceito e ajudar você a aprofundar seus conhecimentos, garantindo uma prática clínica cada vez mais eficaz e humanizada.
Vamos nessa!
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Definição de Síndrome Complexa da Dor Regional (SCDR)
A síndrome complexa de dor regional (SCDR) é uma condição dolorosa que surge com frequência após traumas em membros. Caracterizada por uma incapacidade significativa da região afetada, a SCDR se manifesta por intensas alterações sensitivas, autonômicas, motoras e tróficas, sendo a dor seu sintoma principal.
Anteriormente conhecida como causalgia, atrofia de Sudeck ou distrofia simpática reflexa (DSR), a SCDR apresenta uma variedade de nomes devido à diversidade de suas manifestações clínicas, respostas aos tratamentos e complexidade de sua fisiopatologia. Em 1994, a comunidade médica padronizou o diagnóstico da SCDR, dividindo-a em dois tipos: tipo I e tipo II, que correspondem, respectivamente, à DSR e à causalgia.
Os membros superiores são mais frequentemente acometidos pela SCDR do que os inferiores, e em alguns casos, a doença pode afetar ambos os lados do corpo. O tabagismo é um fator de risco conhecido para o desenvolvimento dessa condição.
A SCDR acomete entre 1% e 2% das fraturas em membros, com uma incidência mais elevada em fraturas de Colles (no pulso). Lesões em nervos periféricos também estão associadas a um maior risco de desenvolver a SCDR. O tipo I é o mais comum, enquanto o tipo II é menos frequente.
Mulheres são mais propensas a desenvolver a SCDR do que homens. A doença acomete principalmente adultos jovens, entre 20 e 49 anos, mas pode ocorrer em qualquer faixa etária.
Etiologia da Síndrome Complexa da Dor Regional
A etiologia da Síndrome Complexa de Dor Regional (SCDR) é um tema complexo e ainda não completamente elucidado. A diversidade de manifestações clínicas e a ausência de um marcador biológico específico dificultam a identificação precisa dos mecanismos envolvidos. No entanto, diversos estudos apontam para a interação de múltiplos fatores que contribuem para o desenvolvimento e a persistência da dor crônica característica dessa condição.
Entre os principais mecanismos fisiopatológicos propostos, destacam-se a sensibilização do sistema nervoso central e periférico, alterações no sistema nervoso autônomo, processos inflamatórios, disfunções oxidativas e fatores genéticos.
A sensibilização neuronal leva a uma amplificação dos sinais dolorosos, enquanto as alterações autonômicas resultam em disfunções vasomotoras e sudorese anormal. A inflamação crônica contribui para a manutenção da dor e a destruição tecidual, e o estresse oxidativo pode exacerbar o dano celular.
Embora a SCDR possa surgir após diversos tipos de lesões, como fraturas, cirurgias e traumas leves, a relação entre o evento desencadeante e o desenvolvimento da doença nem sempre é direta.
Fatores como a intensidade da lesão inicial, a resposta individual ao trauma e a presença de comorbidades podem influenciar a susceptibilidade ao desenvolvimento da SCDR. Além disso, a doença pode se manifestar de forma espontânea, sem um evento desencadeante evidente.
Quadro clínico da Síndrome Complexa da Dor Regional
A SDRC é uma condição dolorosa e complexa que se manifesta com uma variedade de sintomas, afetando significativamente a qualidade de vida dos pacientes. Os sintomas mais comuns incluem:
- Dor: a dor é o sintoma cardinal da SDRC, frequentemente descrita como intensa, queimante, lancinante ou em pontadas. Ela pode ser constante ou intermitente, e pode se agravar com o movimento, o toque ou as mudanças de temperatura. A localização da dor pode variar, mas geralmente é mais intensa no membro afetado.
- Alterações sensoriais: além da dor, os pacientes com SDRC podem apresentar hiperestesia (aumento da sensibilidade), alodinia (dor provocada por estímulos que normalmente não causam dor), e hipestesia (diminuição da sensibilidade). Essas alterações sensoriais podem afetar a pele, os músculos e as articulações.
- Alterações vasomotoras: a SDRC se caracteriza por alterações no fluxo sanguíneo e na temperatura da região afetada. A pele pode apresentar eritema, cianose ou ficar pálida, e a temperatura pode estar aumentada ou diminuída em comparação com o membro contralateral.
- Edema: é um sintoma comum da SDRC, podendo ser leve ou intenso. O edema pode ser causado por alterações vasculares, inflamação e retenção de líquidos.
- Alterações sudoríparas: a sudorese excessiva ou a redução da sudorese na região afetada são frequentes.
- Alterações tróficas: a pele pode apresentar alterações na textura, espessura e pigmentação. As unhas podem ficar quebradiças ou com alterações no crescimento. Os cabelos também podem ser afetados, com queda ou crescimento excessivo.
- Limitação funcional: a dor e as alterações sensoriais e motoras podem levar à limitação da amplitude de movimento e à dificuldade em realizar atividades da vida diária.
- Alterações motoras: fraqueza muscular, espasmos, tremores e coordenação prejudicada podem ocorrer, especialmente em casos mais avançados.
É importante ressaltar que a intensidade e a combinação dos sintomas podem variar significativamente entre os pacientes. A evolução da doença também é variável, com alguns pacientes apresentando melhora espontânea e outros desenvolvendo formas crônicas e debilitantes. Os sintomas podem se manifestar de forma gradual ou súbita, e sua duração pode variar de semanas a anos.
Diagnóstico de Síndrome Complexa da Dor Regional
O diagnóstico de SDRC é baseado nas características clínicas determinadas pela história e exame físico. O diagnóstico é suspeito nas seguintes circunstâncias:
- Os sintomas se desenvolvem após um trauma no membro, geralmente dentro de quatro a seis semanas.
- Os sintomas não são mais totalmente explicados pelo trauma inicial.
- Os sintomas afetam o membro distal, vão além da região envolvida no trauma ou se estendem além do território inervado por um único nervo ou raiz nervosa.
Critérios de Diagnóstico Clínico
Os critérios de diagnóstico clínico do consenso de Budapeste para SDRC são os seguintes:
- Dor contínua, desproporcional a qualquer evento incitante.
- O paciente deve relatar pelo menos um sintoma em três das quatro categorias a seguir:
- Sensorial: Relatos de hiperestesia e/ou alodínia.
- Vasomotor: Relatos de assimetria de temperatura e/ou alterações na cor da pele e/ou assimetria da cor da pele.
- Sudomotor/edema: Relatos de edema e/ou alterações na sudorese e/ou assimetria na sudorese.
- Motor/trófico: Relatos de diminuição da amplitude de movimento e/ou disfunção motora (fraqueza, tremor, distonia) e/ou alterações tróficas (cabelo, unha, pele).
- O paciente deve apresentar pelo menos um sinal no momento da avaliação em duas das quatro categorias a seguir:
- Sensorial: Evidência de hiperalgesia (à picada de agulha) e/ou alodínia (ao toque leve e/ou sensação de temperatura e/ou pressão somática profunda e/ou movimento articular).
- Vasomotor: Evidência de assimetria de temperatura (>1°C) e/ou alterações na cor da pele e/ou assimetria.
- Sudomotor/edema: Evidência de edema e/ou alterações na sudorese e/ou assimetria da sudorese.
- Motor/trófico: Evidência de diminuição da amplitude de movimento e/ou disfunção motora (fraqueza, tremor, distonia) e/ou alterações tróficas (cabelo, unha, pele).
Testes diagnósticos adjuvantes
Imagens diagnósticas e testes autonômicos são usados quando as características clínicas são atípicas para dar suporte ao diagnóstico de SDRC e excluir causas alternativas aos sintomas.
- Cintilografia óssea: A cintilografia óssea trifásica é útil para detectar alterações no metabolismo ósseo em pacientes com SDRC que apresentam reabsorção óssea ativa.
- Radiografia simples: As radiografias simples frequentemente demonstram osteoporose irregular, mas a sensibilidade desse achado para SDRC é muito baixa.
- Teste autonômico: Testes autonômicos que têm sido usados para avaliar pacientes com suspeita de SDRC incluem a produção de suor em repouso (RSO), a temperatura da pele em repouso (RST) e o teste quantitativo do reflexo axonal sudomotor (QSART).
Tratamento da Síndrome Complexa da Dor Regional
Não há um tratamento padrão para a SDRC. Sanar os sintomas de dor e incapacidade funcional são os objetivos principais. O Uso de fármacos, fisioterapia, terapia ocupacional, acupuntura, tratamento psicológicos e procedimentos invasivos, são algumas da possibilidades terapêuticas.
A profilaxia com vitamina C é recomendada pelo American Academy of Orthopaedic Surgeons para prevenir a SDRC após fraturas do punho, pé e tornozelo. A dose recomendada é de 500mg por dia, por 50 dias, e demonstrou reduzir a prevalência de SCDR independentemente do tipo de tratamento realizado.
Tratamento medicamentoso
O tratamento medicamentoso da SCDR é limitado por falta de estudos, mas destacam-se antidepressivos (tricíclicos e duais), anticonvulsivantes e opioides.
Analgésicos simples, como o paracetamol, podem ser adjuvantes, mas não há estudos que avaliem o uso isolado. Anti-inflamatórios esteroidais, como corticosteroides, podem ser úteis em fases precoces da doença, mas seu uso prolongado deve ser evitado devido a efeitos colaterais indesejáveis.
Opioides fracos, como tramadol e codeína, podem ajudar na analgesia, enquanto opioides fortes, como oxicodona e metadona, podem ser necessários para doentes com dores mais intensas. É importante associar a prescrição de laxativos para evitar efeitos colaterais.
Antidepressivos tricíclicos e duais são eficazes no tratamento de doentes com dor crônica, enquanto anticonvulsivantes, como gabapentina e pregabalina, melhoram o componente da alodinia. Medicamentos tópicos, como capsaicina e lidocaína, podem ser úteis em casos específicos.
Além disso, outras opções de tratamento medicamentoso incluem relaxante muscular, calcitonina, bisfosfonatos, toxina botulínica, talidomida, imunoglobulina, antagonista TNF-α e lidocaína endovenosa. É importante lembrar que cada paciente é único e que o tratamento deve ser personalizado com base nas necessidades individuais do paciente.
Tratamento não medicamentoso
O tratamento não medicamentoso da SCDR é uma abordagem importante para ajudar a reduzir a dor e melhorar a qualidade de vida dos pacientes. Embora o tratamento medicamentoso seja comum, o tratamento não medicamentoso pode ser uma opção eficaz para muitos pacientes:
- Fisioterapia: é essencial para melhorar dor, movimento e incapacidade. Recomenda-se começar por um estágio inicial, de preferência imediatamente após o diagnóstico clínico. Resultados promissores são relatados para a terapia do espelho e a terapia imagética progressiva na redução da dor e das incapacidades.
- Terapia Ocupacional: os objetivos são reduzir os sintomas inflamatórios, dar suporte ao membro em posições mais funcionais, melhorar a sensibilidade e a função para a execução das atividades diárias.
- Acupuntura: pode ser muito útil para o tratamento. É um método analgésico e anti-inflamatório, promove relaxamento muscular e estimula o sistema supressor de dor. Pode ser empregada como complemento às medidas de reabilitação, e previamente à cinesioterapia pode facilitar os exercícios.
Bloqueios
Doentes com dor moderada a intensa que não melhoram com o tratamento conservador são candidatos aos bloqueios regionais anestésicos. O objetivo é a promoção de analgesia para possibilitar a reabilitação.
- Bloqueio simpático: o bloqueio simpático torácico, associado ao tratamento farmacoterápico e à fisioterapia, alivia a dor, melhora a qualidade de vida e diminui a incidência de distúrbio de humor dos pacientes com SCDR crônica do membro.
- Bloqueios somáticos: as opções são: bloqueio epidural, bloqueio dos troncos nervosos somáticos ou do plexo braquial ou lombossacro. Podem ser utilizados com cateter implantado conectado a uma bomba de infusão externa, para que sejam infundidos analgésicos a fim de melhorar a dor e facilitar a reabilitação.
Alguns procedimentos são citados na literatura como tratamentos mais invasivos para alguns casos de SCDR, como simpatectomia, infusão de medicação intratecal e peridural e estimulação elétrica da medula espinhal.
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Referências
Salahadin Abdi, MD, PhD. Complex regional pain syndrome in adults: Pathogenesis, clinical manifestations, and diagnosis. UpToDate, 2024. Disponível em: UpToDate
Salahadin Abdi, MD, PhD. Complex regional pain syndrome in adults: Treatment, prognosis, and prevention. UpToDate, 2024. Disponível em: UpToDate
MOTTA FILHO, Geraldo da Rocha; BARROS FILHO, Tarcisio Eloy Pessoa de. Ortopedia e traumatologia. 1. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2018.