CFM e AMB se posicionam contra cotas na residência médica; projeto de lei para proibir a oferta tramita na Câmara 
Foto de divulgação: Conselho Federal de Medicina

CFM e AMB se posicionam contra cotas na residência médica; projeto de lei para proibir a oferta tramita na Câmara 

Em uma semana com polêmicas envolvendo a reserva de vagas para ações afirmativas nas seleções de residência médica, como o cancelamento do edital da Universidade Estadual de Londrina após oferta de 100% das vagas para cotas nas especialidades mais concorridas, entidades médicas emitiram seus posicionamentos a respeito da prática. Tanto o Conselho Federal de Medicina (CFM) quanto a Associação Médica Brasileira (AMB) se mostraram contrários às cotas para ingresso na residência médica

Ambos os órgãos partilham da ideia que o acesso à especialização deve ser baseado no mérito acadêmico e profissional, já que todos os formados compartilham da mesma base de ensino e treinamento. O CFM, por sua vez, já ingressou com uma ação judicial para suspender a adoção de cotas nas residências. Na mesma linha de raciocínio, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 3584/ 2024, que visa proibir as cotas para ingresso nas residências médicas. Saiba mais abaixo!

Posicionamento do Conselho Federal de Medicina

O Conselho Federal de Medicina (CFM) divulgou nesta quarta-feira (30) uma nota pública posicionando-se contrariamente à reserva de vagas em ações afirmativas para negros, indígenas, quilombolas e pessoas com deficiência nas seleções para residência médica. A opinião veio utilizando como exemplo o edital do Exame Nacional de Residência (Enare), que estabeleceu a reserva de 30% das vagas para estes grupos.  

Na nota, a autarquia argumenta que as desigualdades educacionais já foram abordadas na entrada de grupos historicamente marginalizados nas faculdades de Medicina e que todos os estudantes, após admitidos, recebem a mesma formação. Assim, a implementação de cotas nas residências médicas é vista pelo CFM como inadequada para o campo da Medicina. A entidade destaca:

“O registro no Conselho Regional de Medicina (CRM) certifica que todos são médicos e possuem o conhecimento necessário para a prática da medicina, não havendo brechas que justifiquem um tratamento diferenciado na seleção para a residência médica”

O órgão critica a comparação entre a seleção para residências e concursos para cargos públicos, defendendo que o acesso à especialização deve ser fundamentado unicamente no mérito acadêmico e profissional, uma vez que todos os formados compartilham a mesma base de ensino e treinamento. Para o CFM, a introdução de cotas poderia gerar o que chama de “discriminação reversa” dentro da classe médica, além de promover percepções de “privilégios injustificados” entre os profissionais.

Além de se opor às cotas, o CFM reitera a importância de preservar a residência médica como o padrão-ouro na formação de especialistas, e reforça que o acesso aos programas deve ser feito com base em desempenho e mérito. No documento divulgado, o CFM também menciona que já ingressou com uma ação judicial para suspender a adoção de cotas nas residências médicas, argumentando que esta política fere a meritocracia e compromete a qualidade da formação médica no Brasil. A ação corre na 3ª Vara Cível de Brasília, no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT).

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Posicionamento da Associação Médica Brasileira

Seguindo a mesma linha do CFM, em nota publicada no dia 31 de outubro, a Associação Médica Brasileira (AMB) manifestou oposição à reserva de vagas para ações afirmativas, também utilizando como exemplo o ocorrido no edital do Enare. No posicionamento, a AMB pontuou que a residência médica, além de formar especialistas, tem se tornado uma etapa complementar essencial para corrigir deficiências na formação dos médicos no Brasil, e que, por isso, a admissão para essas vagas deve seguir exclusivamente critérios técnicos e meritocráticos.

Por outro lado, a entidade reconhece a importância das políticas afirmativas na graduação, como uma reparação histórica diante das desigualdades sociais e do racismo estrutural no país. “O acesso à educação é um direito do povo brasileiro”, pontuou a AMB na nota. No entanto, para o caso das residências médicas, segundo a entidade, todos os candidatos já concluíram a graduação em medicina em condições consideradas iguais e, por isso, a admissão deve ser orientada por mérito, após anos de estudo e esforço individual.

A associação argumenta que a medida compromete o objetivo principal de garantir que os médicos atuem com competência e tenham o conhecimento necessário para oferecer um atendimento de excelência. 

“O grande objetivo da Associação Médica Brasileira e demais entidades médicas parceiras é que os profissionais da área médica possam atuar com competência, com estrutura adequada e conhecimento necessário para que a população receba atendimento de primeira qualidade, com todo cuidado e atenção que merecem. Nosso maior desejo é pela medicina brasileira de excelência.”

Resposta da EBSERH

Após a AMB e o CFM mencionarem em suas notas as vagas reservadas para cotas no edital do Enare, a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), que operacionaliza o exame, também publicou o seu pronunciamento na noite do dia 31 de outubro. Diante das críticas, a Ebserh reiterou sua discordância às opiniões do CFM e AMB, reforçando que as ações afirmativas no exame são um passo essencial para promover a equidade na formação médica e multiprofissional no Brasil.

Para a empresa, o Enare tem um compromisso com a democratização do acesso às vagas de residência médica e multiprofissional e, por esse motivo, defende que a implementação de cotas para grupos vulnerabilizados está em consonância com os objetivos constitucionais de justiça social e inclusão no Brasil, reforçando que o Supremo Tribunal Federal já declarou a constitucionalidade de políticas afirmativas como esta.

No comunicado, a Ebserh argumenta que as cotas nas residências buscam refletir a diversidade demográfica do país e apoiar um sistema de saúde mais equitativo, combatendo desigualdades que persistem mesmo após o ingresso desses grupos no ensino superior. Ainda, para empresa, a reserva de vagas no Enare não representaria privilégio, mas sim uma medida de reparação histórica e combate a desigualdades estruturais que ainda afetam o acesso a especialidades médicas, em que a competição é acirrada e os custos para preparação são elevados.

Em apoio à Ebserh, o Conselho Deliberativo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) divulgou uma nota defendendo a reserva de vagas para ações afirmativas. De acordo com a Fundação, “o acesso às diferentes modalidades de pós-graduação, inclusive às residências em saúde, ainda é extremamente desigual, com sub-representação das pessoas negras (pretas e pardas), indígenas e pessoas com deficiência”.

Projeto de Lei prevê a proibição da aplicação de cotas 

Indo em direção ao cenário vislumbrado pelo Conselho Federal de Medicina e pela Associação Médica Brasileira, o Projeto de Lei (PL) nº 3584 de 2024, com intuito de proibir as cotas nas residências médicas, tramita na Câmara dos Deputados. 

O PL, de autoria do Deputado Federal Dr. Zacharias Calil, filiado ao União Brasil de Goiás, tem como ementa estabelecer a proibição da aplicação de cotas em processos seletivos para especialização, em residência médica, após a conclusão do curso de Medicina. O projeto foi apresentado em 16 de setembro de 2024 e, até o momento, aguarda despacho do Presidente da Câmara dos Deputados. 

Zacharias Calil, no inteiro teor de seu projeto, respalda a medida no princípio da isonomia, consagrado na Constituição Federal. Assim, a proposta “busca garantir a igualdade de tratamento entre todos os candidatos que já tiveram suas desigualdades corrigidas durante o processo de ingresso no ensino superior”, de acordo com seu autor. Para o deputado, durante a residência e especialização médica, a competência técnica e os méritos devem prevalecer.

Assim, o projeto prevê que o ingresso nos programas de residência médica e demais especializações sejam realizadas exclusivamente por meio de provas, considerando critérios meritocráticos e de competência técnica. Para tal, as seleções deveriam ocorrer sem qualquer tipo de reserva de vagas – como cotas raciais, socioeconômicas ou de qualquer outra natureza

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