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O que é Doença de Kawasaki?
A doença de Kawasaki é uma vasculite com manifestação predominante no período da infância, principalmente entre 1 e 8 anos. Ela compromete artérias de tamanho médio como as coronárias, podendo cursar com aneurisma de artéria coronária.
A doença de Kawasaki foi descrita pela primeira vez em 1967 sendo, portanto, de conhecimento recente. Sua incidência é de 100 casos por 100.000 crianças de até 5 anos, dado que vem aumentando em novas pesquisas. Sua manifestação possui predileção de, aproximadamente, 50% maior para o sexo masculino e a principal idade acometida são crianças de 2 anos.
Causas
A causa da doença de Kawasaki permanece desconhecida, mas algumas teorias epidemiológicas sugerem envolvimento de etiologia infecciosa. Os fatores que contribuem para tal hipótese são:
- Manifestação clínica ser muito parecida a de outras patologias infecciosas, principalmente quadros virais, como o causado por adenovírus;
- O aparecimento da doença parece se dar por epidemias;
- Meninos são mais vulneráveis do que meninas;
- O aparecimento da doença é raro em crianças com menos de 6 meses, o que pode ser explicado pela proteção transplacentária por meio de anticorpos da mãe;
- A distribuição da doença possui variabilidade sazonal, principalmente entre inverno e verão; e
- Crianças com contato próximo, como residentes da mesma casa, possuem risco aumentado de manifestar a doença.
Outra possibilidade etiológica pertinente, e baseada na fisiopatologia, é que a doença seja causada por variação da resposta imunológica, quando o dano vascular pode ser resultado da resposta imune exagerada. Vale mencionar que os macrófagos são as células mais atuantes nesse processo.
Há possível envolvimento genético para a manifestação da doença de Kawasaki com destaque para os genes HLA-B5, B44, Bw51, DR3 e DRB3 em indivíduos brancos. Em israelenses o principal gene que parece estar envolvido é o Bw51, já em japoneses, B54, Bw35 e Bw15.
Sinais e Sintomas da Doença de Kawasaki
Os principais sintomas presentes na doença de Kawasaki podem não ser muito específicos e na fase inicial da doença, por volta de 5 dias, costuma estar presente febre, eritema na mucosa oral e lábios, adenomegalia, conjuntivite não purulenta, rash cutâneo, eritema palmar com descamação palmoplantar e língua com aspecto de ‘framboesa’ ou ‘morango’. Vale ressaltar que a febre inicial pode se apresentar junto com letargia, dor abdominal, irritabilidade e cólicas intermitentes.
Além disso, outros sinais que podem estar presentes são:
- Comprometimento cardíaco: miocardite e pericardite, taquicardia, arritmias ventriculares ou atriais e insuficiência cardíaca congestiva. O sintoma mais grave desse grupo é quando há arterite coronariana, normalmente com formação de aneurisma presente em até 25% das crianças sem tratamento;
- Linfadenopatia cervical, em até 50% dos pacientes;
- Vômitos e diarreia;
- Poliartrite; e
- Meningite asséptica com possível dano aos pares de nervos cranianos.
A doença costuma se apresentar de 2 a 12 semanas e as manifestações cardíacas tendem a aparecer de 1 semana até 1 mês após os primeiros sintomas, configurando a fase subaguda.
Diagnóstico
O diagnóstico, diante de um quadro clínico suspeito, é feito por meio de critérios clínicos. Para o diagnóstico, o paciente precisa apresentar febre por, pelo menos 5 dias, associada a mais 4 entre os 5 dos seguintes achados:
- Conjuntivite bilateral não purulenta;
- Alterações da mucosa oral, como a presença de lábios hiperemiados ou rachados, a língua em ‘framboesa’ ou em aspecto de ‘morango’ e hiperemia localizada na região da laringe;
- Rash polimorfo, normalmente localizado no tronco;
- Linfadenomegalia na porção cervical, os linfonodos devem apresentar mais de 1,5 cm de diâmetro; e
- Alterações de extremidades, o que pode se manifestar por descamação periungueal, edema de mãos e pés, eritema de palma e planta dos pés.
Vale ressaltar que a febre, assim como os outros achados, não podem possuir outra explicação etiológica. Dessa forma, normalmente, indica-se a realização de outros testes para descartar possíveis diagnósticos diferenciais, os mais utilizados são: enzimas hepáticas, fator reumatoide, VHS, hemograma, proteína C-reativa, anticorpos antinucleares, radiografia de tórax, cultura do sangue e da garganta e exame de urina.
Alguns achados de exames laboratoriais estão frequentemente presentes na doença de Kawasaki como: anemia, leucocitúria, hipoalbuminemia, hiponatremia, alterações do perfil lipídico e elevação das transaminases, essa, menos comum.
O ecocardiograma possui pouca relevância diagnóstica, entretanto, é importante que ele seja feito, inclusive com relativa constância, já que pode detectar arritmias, hipertrofia ventricular esquerda, aneurisma coronariano, danos valvulares, miocardites e pericardites, que são manifestações comuns na doença de Kawasaki.
Tratamento
O tratamento é feito, inicialmente, com imunoglobulina endovenosa na dose de 2g/Kg que deve ser administrada em infusão única por um período de 8 a 12 horas. A segunda droga indicada para o tratamento, nesse período, é o ácido acetilsalicílico com 4 administrações ao dia e dose total de 80 a 100 mg/Kg/dia. Caso a febre não seja controlada, é recomendado uma segunda infusão de imunoglobulina na mesma dose. Após 48 horas do controle da febre, a dose de AAS deve ser reduzida para 3 a 5 mg/Kg/dia, por 8 semanas.
A pulsoterapia com metilprednisolona na dose de 30 mg/Kg em 2 a 3 horas de 1 a 3 dias ou 5 mg/Kg de infliximabe podem ser indicados caso a febre persista mesmo após a segunda administração de imunoglobulina. Em pacientes com aneurisma coronariano, a dose reduzida de AAS pode ser mantida para evitar maiores complicações.
O ecocardiograma deve ser repetido para acompanhar, principalmente, aneurismas coronarianos, recomenda-se que seja refeito após 2 semanas do quadro sintomático e, depois, após 6 a 8 semanas do início dos sintomas.
Relação com a Covid-19
O novo coronavírus é, sabidamente, o causador de uma síndrome respiratória aguda grave, conhecida como SARS-CoV-2. Em crianças, tal infecção pode causar a chamada síndrome inflamatória sistêmica (MIS-C) que é caracterizada por distúrbio hiperinflamatório pediátrico após 2 semanas da contaminação, que no início da pandemia foi nomeada de doença Kawasaki-like. A MIS-C, em crianças, pode cursar com sintomas muito semelhantes à manifestação aguda da doença de Kawasaki, dessa forma, o diagnóstico pediátrico deve ser preciso, principalmente para que o tratamento possa ser feito corretamente. Em muitos casos relatados na literatura, os efeitos sistêmicos SARS-CoV-2 mimetizaram os sintomas da doença de Kawasaki, retardando o tratamento com imunoglobulina, o que pode ser prejudicial no processo de controle da doença e de suas possíveis complicações, como o aneurisma coronariano.
Alguns estudos mostraram, ainda, possível relação causal entre a infecção pelo novo coronavírus e o desenvolvimento da doença de Kawasaki, já que a incidência dela entre pacientes pediátricos que já tiveram SARS-CoV-2 é consideravelmente maior, em relação ao grupo com IgG negativo para o novo coronavírus. Além disso, o padrão de manifestação da doença nesses pacientes foi diferente, atingindo uma população com idade mais velha e com padrão inflamatório diferente do habitual.
Muitos pacientes com sorologia positiva para o novo coronavírus passaram a manifestar a doença de Kawasaki de forma mais grave, inclusive apresentando resistência à terapia usualmente indicada (imunoglobulinas), quando foram necessárias administrações de corticoides para o controle sintomático da doença.
Muitas hipóteses foram sugeridas nesse cenário, mas elas ainda carecem de maiores testes e pesquisas para que novos protocolos e indicações terapêuticas sejam sugeridas. Mas, salienta-se que o choque que pode acontecer na doença de Kawasaki, principalmente pela atuação macrofágica exagerada, deve ser diferenciado da infecção pelo novo coronavírus, para fins de tratamento e acompanhamento do doente.
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