Olá, querido doutor e doutora! A síndrome da dor patelofemoral é uma condição clínica frequente em pacientes jovens e ativos, caracterizada por dor na região anterior do joelho, geralmente associada à sobrecarga funcional. Com origem multifatorial, seu manejo exige uma avaliação minuciosa e abordagem terapêutica individualizada, com foco no reequilíbrio muscular e na reeducação de padrões de movimento. A condução adequada permite a maioria dos pacientes retomar suas atividades cotidianas e esportivas com segurança.
Apesar da presença de alterações cartilaginosas em exames de imagem, nem sempre há correlação direta com a intensidade da dor relatada pelo paciente.
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Conceito
A Síndrome da Dor Patelofemoral (SDPF) é caracterizada por dor na região anterior do joelho, geralmente mal localizada, e frequentemente relacionada a atividades que envolvem sobrecarga da articulação com o joelho fletido, como subir escadas, correr ou permanecer longos períodos sentado. Trata-se de um diagnóstico clínico de exclusão, ou seja, é formulado após afastar outras causas de dor anterior no joelho, como tendinopatias, condropatias e lesões ligamentares.
Fisiopatologia
A fisiopatologia da síndrome da dor patelofemoral é multifatorial e envolve alterações biomecânicas, musculares e estruturais que interferem na dinâmica normal da articulação entre a patela e o fêmur. Um dos principais mecanismos propostos é o desalinhamento da patela durante sua movimentação sobre a tróclea femoral, o que aumenta o estresse de contato nas superfícies articulares.
Esse desvio pode ser favorecido por desequilíbrios musculares, como a fraqueza do vasto medial oblíquo, que prejudica o controle do rastreamento patelar, ou ainda pela tensão excessiva da banda iliotibial, que contribui para a lateralização da patela. Além disso, alterações anatômicas como valgo dinâmico, patela alta e displasia troclear podem reduzir a estabilidade da articulação durante a flexão do joelho.
A sobrecarga repetitiva da articulação patelofemoral, sem tempo adequado de recuperação, leva à irritação de estruturas como o retináculo medial, a cartilagem articular e o tecido subcondral, favorecendo o surgimento da dor.
Epidemiologia e fatores de risco
A síndrome da dor patelofemoral é uma das queixas mais frequentes de dor anterior no joelho em ambientes ambulatoriais e esportivos. Estima-se que ela represente até 25% a 40% dos casos de dor no joelho em clínicas de medicina esportiva e aproximadamente 11% a 17% nas consultas gerais. É mais comum em mulheres jovens fisicamente ativas, especialmente durante a adolescência e início da vida adulta, com uma proporção de até 2:1 em relação aos homens.
Entre os principais fatores de risco, destacam-se:
- Sexo feminino, possivelmente por diferenças biomecânicas, como maior ângulo Q e maior frequência de valgo dinâmico;
- Aumento abrupto na carga de treino, como ocorre com frequência em corredores ou militares em fase de adaptação física;
- Especialização precoce em um único esporte, sem variação de estímulos, o que favorece a sobrecarga localizada;
- Desequilíbrios musculares, incluindo fraqueza do quadríceps e abdutores do quadril;
- Encurralamento articular por alterações anatômicas, como displasia troclear, patela alta ou lateralização da tuberosidade tibial;
- Encurtamento muscular, especialmente de isquiotibiais, quadríceps e banda iliotibial.
Além desses, estudos também apontam que um índice de massa corporal elevado pode agravar os sintomas e dificultar a reabilitação.
Avaliação clínica
A dor anterior no joelho é o principal sintoma da síndrome da dor patelofemoral, geralmente descrita como difusa, incômoda e mal localizada, podendo se manifestar tanto ao redor quanto atrás da patela. Em muitos casos, o início dos sintomas é insidioso e progressivo, sem uma lesão traumática associada.
As queixas costumam ser agravadas por atividades que aumentam a compressão da patela contra o fêmur, como:
- Subir e descer escadas;
- Agachar;
- Correr, especialmente em descidas;
- Permanecer longos períodos sentado com o joelho fletido (“sinal do cinema”);
- Levantar-se após ficar sentado por muito tempo.
Outros sintomas relatados incluem:
- Estalidos ou crepitação durante a movimentação do joelho;
- Sensação de instabilidade, como se o joelho fosse “falhar”;
- Rigidez ou desconforto após repouso prolongado;
- Edema discreto ou aumento de sensibilidade ao redor da patela.
O exame físico pode revelar sensibilidade peripatelar, principalmente nas bordas medial e lateral da patela, atrofia do vasto medial e reprodução da dor em testes funcionais, como o agachamento unipodal ou o teste de compressão patelar. É comum que a dor aumente com manobras que exigem suporte de peso em joelhos fletidos.
Diagnóstico
O diagnóstico da síndrome da dor patelofemoral é predominantemente clínico, baseado em uma combinação de história detalhada e exame físico direcionado. Não há um exame específico com alta sensibilidade e especificidade isoladamente, mas o conjunto de achados característicos costuma ser suficiente para estabelecer o diagnóstico.
O critério central é a presença de dor anterior ou retropatelar exacerbada por atividades que aumentam a carga compressiva na articulação, como agachamento, corrida, subir ou descer escadas e manter o joelho fletido por longos períodos.
Testes clínicos e sinais frequentes
- Teste de agachamento (em apoio unipodal ou bipodal): geralmente reproduz a dor;
- Teste do “sinal do cinema”: dor ao levantar-se após período prolongado sentado com o joelho fletido;
- Teste de compressão patelar (Clarke ou grind test): dor à compressão da patela contra o fêmur durante contração do quadríceps;
- Teste do tilt patelar: limitação na elevação da borda lateral da patela sugere tensão lateral;
- J-sign: desvio abrupto lateral da patela na extensão ativa do joelho;
- Palpação da borda medial e lateral da patela: dor frequentemente presente, com ou sem crepitação.
Exames de imagem
Geralmente não são necessários na fase inicial. Contudo, podem ser indicados nos seguintes cenários:
- Dor persistente por mais de 6 semanas sem resposta ao tratamento conservador;
- História de trauma agudo, instabilidade patelar ou subluxações recorrentes;
- Suspeita de condropatia grave, lesão osteocondral, fratura ou tumor ósseo.
A radiografia simples pode ser útil para avaliar alinhamento patelar, presença de patela alta ou bipartida e sinais de artrose. A ressonância magnética, embora sensível para alterações cartilaginosas, tem pouca correlação com a intensidade da dor e deve ser usada apenas em casos específicos, como investigação de lesões intra-articulares.
Tratamento
Controle da dor na fase inicial
O tratamento da síndrome da dor patelofemoral começa com medidas voltadas para o alívio sintomático e redução da sobrecarga na articulação. Recomenda-se que o paciente evite atividades que acentuem a dor, como corrida, agachamentos e escadas. O uso de gelo, elevação do membro e repouso relativo pode ser útil nos primeiros dias. Quando necessário, anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) ou paracetamol podem ser utilizados por curto período, embora sua eficácia seja limitada. Em casos mais intensos, pode-se considerar o uso temporário de muletas para descarregar o membro.
Reabilitação com foco no fortalecimento e alinhamento
A reabilitação é o eixo central do manejo da SDPF e deve ser iniciada assim que possível. O plano fisioterapêutico deve contemplar exercícios de fortalecimento do quadríceps, em especial do vasto medial oblíquo, além de fortalecer os glúteos e o core, com o objetivo de melhorar o controle postural e o alinhamento dinâmico. Pacientes com valgo dinâmico, por exemplo, costumam se beneficiar de exercícios que atuem sobre os abdutores e rotadores laterais do quadril.
Alongamento e controle motor
Além do fortalecimento, muitos pacientes apresentam encurtamentos musculares relevantes, especialmente em isquiotibiais, quadríceps, banda iliotibial e gastrocnêmios. O alongamento dessas cadeias musculares, aliado à liberação miofascial e ao trabalho de propriocepção e controle neuromuscular, contribui para melhorar a mecânica do joelho durante a marcha e movimentos funcionais. A reeducação de padrões de movimento é essencial para evitar recidivas.
Recursos terapêuticos auxiliares
Alguns recursos complementares podem ser utilizados conforme o perfil do paciente. O taping patelar, com técnicas como a de McConnell, pode proporcionar alívio temporário da dor durante a reabilitação. O uso de órteses no joelho ou palmilhas personalizadas pode beneficiar pacientes com pronação excessiva ou desalinhamentos estruturais. Já intervenções como ultrassom terapêutico, eletroestimulação e infiltrações apresentam resultados limitados, sendo indicadas com critério.
Cirurgia como exceção
A intervenção cirúrgica é raramente necessária e reservada para casos que não apresentam melhora significativa após 6 a 12 meses de tratamento bem conduzido, e em que outras causas de dor anterior no joelho foram excluídas. Procedimentos como liberação lateral, realinhamento tibial ou tratamento de condropatia são considerados apenas em situações selecionadas.
Retorno à atividade e prevenção de recidiva
O retorno gradual às atividades esportivas costuma ocorrer entre 4 e 6 semanas, desde que o paciente esteja assintomático e com função restaurada. É essencial que o paciente mantenha os exercícios terapêuticos de forma regular, mesmo após melhora dos sintomas, para evitar recorrência. A educação sobre ajuste progressivo da carga de treino e sinais de sobrecarga deve fazer parte da orientação final.
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Referências Bibliográficas
- CROSSLEY, K. M. et al. Patellofemoral pain: consensus statement from the 4th International Patellofemoral Pain Research Retreat. British Journal of Sports Medicine, v. 50, n. 14, p. 839–852, 2016.
- BUMP, J. M.; LEWIS, L. Patellofemoral Syndrome. In: StatPearls. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing, 2025.