Olá, querido doutor e doutora! A labirintite é frequentemente referida por pacientes como sinônimo de qualquer tipo de tontura, mas seu reconhecimento clínico exige uma avaliação criteriosa, já que envolve processos inflamatórios do ouvido interno, com repercussões tanto no equilíbrio quanto na audição. Este texto apresenta, de forma objetiva, os principais aspectos relacionados à definição, causas, diagnóstico, tratamento e condutas clínicas diante de pacientes com suspeita dessa condição na atenção primária.
A vertigem verdadeira, especialmente a rotatória, indica disfunção vestibular, podendo ser de origem periférica ou central.
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Conceito de labirintite
A labirintite refere-se a um processo inflamatório que afeta as estruturas do labirinto, localizadas no ouvido interno. Essas estruturas são responsáveis por regular tanto o equilíbrio quanto a audição. Quando inflamadas, ocorre uma disfunção na transmissão de sinais ao sistema nervoso central, resultando em manifestações como vertigem, náuseas, desequilíbrio postural e, em alguns casos, perda auditiva e zumbido.
É importante destacar que, embora o termo “labirintite” seja amplamente usado pela população para se referir a qualquer tipo de tontura, na prática clínica ele é reservado para quadros em que há evidência de acometimento tanto vestibular quanto coclear, distinguindo-se de outras síndromes vestibulares periféricas que não comprometem a audição, como a neuronite vestibular.
Causas
Infecções virais
A origem mais comum da labirintite está associada a infecções virais, especialmente aquelas do trato respiratório superior, como gripes e resfriados. Mesmo após a resolução do quadro respiratório, a inflamação pode acometer o labirinto, desencadeando sintomas vestibulares e, em alguns casos, auditivos. Vírus como influenza, parainfluenza, herpesvírus, citomegalovírus, sarampo e caxumba estão entre os mais frequentemente implicados.
Infecções bacterianas
As formas bacterianas, embora menos prevalentes, tendem a apresentar manifestações mais intensas e risco aumentado de complicações. Nesses casos, a inflamação pode resultar de disseminação direta de otites médias agudas, mastoidites ou meningites. Os pacientes geralmente evoluem com vertigem severa, hipoacusia significativa, febre, cefaleia, otorreia e prostração acentuada, configurando um quadro que exige abordagem urgente.
Doenças autoimunes
Algumas doenças inflamatórias sistêmicas, como poliangeíte granulomatosa e arterite de células gigantes, podem afetar estruturas do ouvido interno, provocando labirintite de origem autoimune. Esses casos costumam ser acompanhados por sintomas em outros órgãos, o que auxilia na formulação do diagnóstico.
Infecções oportunistas e sistêmicas
Condições como HIV e sífilis também podem estar relacionadas à labirintite. A inflamação pode ocorrer por infecção direta do labirinto ou por reativação de vírus neurotrópicos em indivíduos imunocomprometidos. A investigação etiológica deve incluir sorologias específicas, especialmente em pacientes com quadro clínico atípico ou recorrente.
Fármacos ototóxicos
O uso de medicamentos com potencial ototóxico representa uma causa não infecciosa de labirintite. Entre os principais estão os aminoglicosídeos (gentamicina, estreptomicina), anticonvulsivantes (como carbamazepina e fenitoína), diuréticos de alça, certos antidepressivos e até agentes quimioterápicos. A toxicidade pode afetar tanto a audição quanto o equilíbrio, sendo, em muitos casos, dose-dependente.
Traumatismos cranianos
Lesões traumáticas envolvendo o osso temporal podem levar à labirintite por fratura da cápsula ótica ou concussão labiríntica. O quadro pode surgir logo após o trauma ou se instalar de forma progressiva, e em algumas situações, pode evoluir com sintomas persistentes.
Tumores do ângulo pontocerebelar
Lesões expansivas nessa região, como o neurinoma do acústico, podem se manifestar inicialmente com hipoacusia unilateral e zumbido. À medida que progridem, podem afetar os componentes vestibulares, levando à vertigem, desequilíbrio e sinais neurológicos focais. Esses casos exigem investigação por imagem.
Avaliação clínica
Caracterização da tontura
A anamnese detalhada é a base da avaliação de pacientes com queixa de tontura. É fundamental compreender como o paciente descreve o sintoma: se como sensação rotatória (vertigem), perda de equilíbrio, sensação de desmaio iminente ou instabilidade durante a marcha. A vertigem verdadeira, especialmente a rotatória, indica disfunção vestibular, podendo ser de origem periférica ou central. O uso de termos como “a cabeça está leve” ou “parece que vou cair” deve ser explorado com cuidado, pois podem indicar diagnósticos diferentes.
Sinais de comprometimento vestibular
A vertigem de origem periférica geralmente se manifesta de forma abrupta, com grande intensidade e sintomas neurovegetativos associados, como náuseas, sudorese e vômitos. Pode haver tendência à queda para o lado afetado, sem prejuízo importante da marcha. Já as vertigens centrais costumam ter início mais gradual, menor intensidade, porém com maior repercussão na coordenação e equilíbrio, podendo surgir acompanhadas de sinais neurológicos, como disartria, ataxia, diplopia ou déficits motores e sensitivos.
Exame físico direcionado
A avaliação física deve incluir inspeção otológica, pesquisa de nistagmo espontâneo ou provocado, testes de equilíbrio como a marcha em linha reta e a prova de Romberg, além da observação do padrão do nistagmo. Nos casos suspeitos de VPPB, a manobra de Dix-Hallpike ou Nylen-Bárány pode ser utilizada para provocar vertigem e nistagmo característicos. O nistagmo horizontal ou rotatório, com latência e esgotamento, sugere origem periférica. Já nistagmos verticais, bidirecionais ou persistentes mesmo com fixação ocular podem apontar para envolvimento central.
Red flags e necessidade de encaminhamento
Sinais de alarme incluem perda auditiva súbita, cefaleia intensa, febre, déficits neurológicos, rigidez de nuca, rebaixamento do nível de consciência ou sintomas persistentes por mais de 72 horas sem melhora. Nesses casos, deve-se considerar causas centrais graves, como AVC de fossa posterior, e encaminhar prontamente para serviço especializado.
Diagnóstico diferencial
- Neuronite vestibular;
- Vertigem Posicional Paroxística Benigna (VPPB);
- Doença de Ménière;
- Enxaqueca vestibular;
- Acidente isquêmico na fossa posterior;
- Tumores do ângulo pontocerebelar;
- Hemorragia labiríntica;
- Fratura de osso temporal;
- Intoxicação por medicamentos ototóxicos;
- Esclerose múltipla Infecções centrais do sistema nervoso (como meningite ou encefalite);
- Transtornos ansiosos com vertigem psicogênica.
Tratamento
Condutas gerais
O manejo da labirintite depende diretamente da causa identificada. Durante o episódio agudo, é indicado o repouso, principalmente em pacientes com instabilidade postural, para reduzir o risco de quedas. A orientação para permanecer em ambiente calmo, com baixa luminosidade e estímulos mínimos, pode ajudar no controle da vertigem. Em casos acompanhados de náuseas e vômitos, uma dieta leve e fracionada é recomendada, conforme a tolerância.
Medicação sintomática
Antieméticos como dimenidrato, ondansetrona e domperidona são frequentemente utilizados para alívio dos sintomas gastrintestinais. Os antivertiginosos, como flunarizina e betaistina, podem ser úteis em episódios mais prolongados, embora seu uso deva ser cauteloso, já que podem interferir na compensação vestibular. Benzodiazepínicos, como o clonazepam, podem ser indicados por períodos curtos, sempre com atenção ao risco de sedação e dependência, especialmente em idosos.
Tratamento etiológico
Quando identificada uma infecção bacteriana, antibióticos devem ser iniciados imediatamente, podendo ser por via oral ou intravenosa, conforme a gravidade e o foco infeccioso. Na doença de Ménière, associa-se dieta hipossódica e, em alguns casos, diuréticos. Em situações de origem autoimune, o tratamento com corticosteroides ou imunossupressores pode ser necessário, sob supervisão especializada. Nos casos associados a enxaqueca, considera-se profilaxia com bloqueadores de canal de cálcio, betabloqueadores ou antidepressivos tricíclicos.
Reabilitação vestibular
Após o controle da fase aguda, a reabilitação vestibular deve ser considerada. Trata-se de um conjunto de exercícios físicos e oculares que estimulam a compensação central e favorecem a recuperação do equilíbrio. A prática supervisionada pode acelerar a melhora funcional e reduzir o impacto da tontura na qualidade de vida do paciente.
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Referências Bibliográficas
- BERTOL, E.; RODRÍGUEZ, C. A. Como fazer o diagnóstico da labirintite na APS? Núcleo Telessaúde SC. Biblioteca Virtual em Saúde – Atenção Primária em Saúde, 2016.
- BARKWILL, D.; ARORA, R. Labyrinthitis. In: STATPEARLS. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2023.