Olá, querido doutor e doutora! Stenotrophomonas maltophilia tem se destacado como um patógeno oportunista cada vez mais relevante no cenário hospitalar, especialmente em pacientes críticos. Sua resistência intrínseca a múltiplas classes de antimicrobianos e sua capacidade de persistência em ambientes hospitalares representam um desafio crescente para a prática clínica.
A presença da bactéria em culturas deve ser interpretada à luz de sinais clínicos de infecção, resposta inflamatória e exames de imagem.
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Características microbiológicas
Stenotrophomonas maltophilia é uma bactéria gram-negativa, aeróbia estrita e não fermentadora, comumente isolada em ambientes úmidos e em superfícies hospitalares. Apresenta formato de bacilo fino, com crescimento típico em meios laboratoriais comuns. Suas colônias costumam ser amareladas a verde-claras, opacas e de bordas irregulares, podendo liberar odor semelhante à amônia.
Do ponto de vista bioquímico, a bactéria é catalase-positiva e geralmente oxidase-negativa, características úteis na diferenciação frente a outros bacilos não fermentadores. Ainda que possa ser cultivada em meios clássicos como o ágar sangue ou MacConkey, o isolamento seletivo é facilitado por meios específicos contendo antibióticos que inibem outras bactérias e promovem o crescimento seletivo da S. maltophilia.
A identificação precisa pode ser um desafio em laboratórios que utilizam apenas métodos fenotípicos, devido à semelhança com outras espécies ambientais. Técnicas moleculares e espectrometria de massa têm sido valiosas para aumentar a acurácia diagnóstica em amostras clínicas.
Outro ponto de destaque é a capacidade de formar biofilmes, o que confere uma vantagem adaptativa frente à ação antimicrobiana e à resposta imune do hospedeiro. Essa habilidade favorece sua persistência em superfícies como cateteres, tubos endotraqueais e sistemas de ventilação mecânica.
A estrutura da membrana externa e a presença de mecanismos de resistência enzimáticos e não enzimáticos tornam a bactéria naturalmente resistente a várias classes de antimicrobianos, especialmente os β-lactâmicos e aminoglicosídeos, reforçando seu potencial patogênico em ambiente hospitalar.
Epidemiologia e fatores de risco
Stenotrophomonas maltophilia é uma bactéria amplamente distribuída no meio ambiente, sendo encontrada em locais como solo, água, vegetação, alimentos frescos e sistemas de tratamento de água. Sua presença em ambientes hospitalares, no entanto, tem ganhado destaque devido ao número crescente de infecções associadas ao cuidado em saúde.
Em hospitais, a bactéria pode colonizar superfícies inertes e úmidas, como torneiras, chuveiros, nebulizadores, ventiladores mecânicos, cateteres e até recipientes de soluções antissépticas. A ampla adaptabilidade ambiental contribui para sua sobrevivência prolongada em superfícies e dispositivos médicos, o que facilita surtos e casos esporádicos, principalmente em unidades de terapia intensiva.
As infecções por S. maltophilia têm sido observadas principalmente em pacientes com alguma condição de fragilidade imunológica ou estrutural. Entre os principais fatores de risco, destacam-se:
- Internação prolongada, especialmente em UTI;
- Ventilação mecânica ou uso de traqueostomia;
- Cateter venoso central ou outros dispositivos invasivos;
- Neutropenia ou imunossupressão grave, como em pacientes oncológicos ou transplantados;
- Uso recente de antibióticos de amplo espectro, principalmente carbapenêmicos, que eliminam bactérias competidoras;
- Doenças pulmonares crônicas, como fibrose cística ou DPOC;
- Queimaduras extensas ou feridas abertas de difícil cicatrização;
- Prematuridade e neonatos com comorbidades.
Embora a taxa de isolamento de S. maltophilia em exames laboratoriais ainda seja relativamente baixa quando comparada a outros patógenos nosocomiais, sua prevalência tem aumentado nos últimos anos. Esse crescimento é atribuído tanto ao maior número de pacientes imunocomprometidos quanto à maior exposição a procedimentos invasivos e antimicrobianos que selecionam microrganismos multirresistentes.
Avaliação clínica
As infecções por Stenotrophomonas maltophilia são mais frequentemente adquiridas no ambiente hospitalar e, em muitos casos, ocorrem em pacientes gravemente debilitados. A apresentação clínica pode variar de acordo com o sítio de infecção e o estado imunológico do hospedeiro, sendo por vezes difícil distinguir colonização de infecção verdadeira — especialmente em secreções respiratórias.
As formas clínicas mais prevalentes incluem:
- Pneumonia associada à ventilação mecânica: é a apresentação mais comum. O microrganismo pode colonizar o trato respiratório inferior, principalmente em pacientes entubados ou com doença pulmonar prévia. A progressão clínica costuma ser lenta, e as manifestações incluem febre persistente, secreção purulenta, piora dos parâmetros ventilatórios e infiltrados pulmonares difusos. Casos mais graves, embora menos frequentes, podem evoluir com pneumonia hemorrágica fulminante, especialmente em pacientes neutropênicos ou com neoplasias hematológicas.
- Bacteremia: em geral, associada a cateteres venosos centrais, ocorre em pacientes submetidos a quimioterapia, internação prolongada ou com múltiplos dispositivos invasivos. Pode se apresentar como sepse de início insidioso, mas com potencial para descompensação hemodinâmica. Em algumas situações, a bacteremia é polimicrobiana, o que dificulta a escolha do tratamento.
- Infecções do trato urinário: especialmente em pacientes sondados ou com anormalidades urológicas. Embora menos comuns, podem evoluir com pielonefrite complicada.
- Infecções de pele e partes moles: incluem celulites, feridas cirúrgicas infectadas e casos de ectima gangrenoso, particularmente em pacientes com imunossupressão.
- Infecções oculares: associadas a traumas ou procedimentos, como ceratite e endoftalmite.
- Outras localizações: há relatos de infecção em praticamente todos os sistemas, incluindo endocardite, meningite (geralmente pós-cirúrgica), sinusite, otite externa maligna, peritonite, colecistite e abscessos intra-abdominais.
Diagnóstico
Isolamento em cultura
A bactéria pode ser cultivada em meios convencionais, como ágar sangue e MacConkey, embora o uso de meios seletivos aumente a chance de recuperação, especialmente em amostras não estéreis. As colônias costumam apresentar coloração amarelada a verde-clara, com aspecto opaco, bordas irregulares e odor semelhante à amônia. Apesar disso, o simples crescimento em cultura não é suficiente para confirmar infecção, sendo fundamental correlacionar com o quadro clínico.
Identificação microbiológica
Fenotipicamente, trata-se de um bacilo gram-negativo, não fermentador, oxidase-negativo e catalase-positivo. Contudo, essas características são compartilhadas com outras espécies de bacilos ambientais, o que torna a identificação por métodos convencionais pouco específica.
Para maior confiabilidade, recomenda-se o uso de sistemas automatizados, como o VITEK 2®, ou técnicas moleculares, como PCR específica ou espectrometria de massa (MALDI-TOF), que oferecem maior precisão e rapidez na diferenciação de outras espécies fenotipicamente semelhantes.
Teste de sensibilidade
A avaliação da sensibilidade antimicrobiana deve ser feita com cautela. O método de microdiluição ou E-test é mais indicado, pois o teste por disco-difusão pode gerar resultados imprecisos, principalmente para quinolonas.
As drogas mais testadas incluem sulfametoxazol-trimetoprim, levofloxacino e minociclina, para as quais existem pontos de corte bem estabelecidos. É importante lembrar que a resistência in vitro nem sempre corresponde à falha terapêutica clínica, especialmente quando há formação de biofilme ou baixa penetração tecidual.
Diferenciar colonização de infecção
Um dos maiores desafios no diagnóstico clínico é diferenciar colonização de infecção verdadeira, especialmente em secreções respiratórias e urinárias. A presença da bactéria em culturas deve ser interpretada à luz de sinais clínicos de infecção, resposta inflamatória e exames de imagem. A ausência de febre, leucocitose ou achados radiológicos compatíveis deve levantar a hipótese de colonização, especialmente em pacientes com múltiplas comorbidades.
Exames complementares
Radiografias, tomografias e exames laboratoriais complementares são fundamentais para localizar o foco da infecção e avaliar a gravidade do quadro. Em pacientes críticos, métodos rápidos de identificação direta a partir de hemoculturas, como MALDI-TOF ou PCR, podem permitir o início precoce de tratamento direcionado, impactando positivamente no desfecho clínico.
Tratamento e prognóstico
Antibiótico de primeira escolha
A droga mais utilizada no tratamento de infecções causadas por S. maltophilia é o sulfametoxazol-trimetoprim (SMX-TMP), que tradicionalmente apresenta alta taxa de sensibilidade in vitro. Em casos graves, utiliza-se a dose elevada do componente trimetoprim, semelhante à empregada em infecções por Pneumocystis jirovecii, com o objetivo de alcançar concentrações eficazes em tecidos profundos.
Contudo, o uso de SMX-TMP pode ser limitado por efeitos adversos, como hipersensibilidade, distúrbios hematológicos e alteração da função renal, exigindo monitoramento próximo ou troca de esquema em pacientes com risco aumentado para essas complicações.
Alternativas terapêuticas
Em situações de alergia, falha clínica, ou resistência microbiológica, existem opções terapêuticas que podem ser consideradas. As fluoroquinolonas, especialmente levofloxacino e moxifloxacino, apresentam atividade satisfatória contra muitas cepas, com vantagem adicional de boa penetração pulmonar e ação sobre biofilmes.
Outra alternativa eficaz é a minociclina, que tem demonstrado atividade mesmo contra cepas resistentes ao SMX-TMP. Tigeciclina, ticarcilina-clavulanato e colistina são opções possíveis, mas seu uso deve ser ponderado com base no perfil de sensibilidade local e no tipo de infecção.
Em casos complexos ou refratários, pode-se considerar combinações de antimicrobianos com efeito sinérgico, como SMX-TMP associado a levofloxacino ou ceftazidima com minociclina. A decisão por terapia combinada deve ser feita em conjunto com o infectologista e baseada em testes de sensibilidade específicos.
Novas abordagens terapêuticas
Diante do aumento de resistência e das limitações terapêuticas, estudos recentes vêm explorando novas possibilidades, como o uso de cefiderecol (um cefalosporínico sideróforo), inibidores de bomba de efluxo, nanopartículas antimicrobianas, e até bacteriófagos. Embora promissoras, essas abordagens ainda carecem de validação clínica ampla.
Duração do tratamento e medidas complementares
Para infecções respiratórias leves a moderadas, o tratamento costuma durar 7 a 10 dias. Já em casos de bacteremia ou pacientes imunossuprimidos, recomenda-se 14 dias ou mais, dependendo da evolução clínica.
Além da terapia antimicrobiana, é indispensável o controle do foco infeccioso, como remoção de cateteres contaminados, drenagem de coleções e desbridamento de feridas quando necessário.
Prognóstico clínico
O prognóstico das infecções por S. maltophilia é variável. Em pacientes imunocompetentes com infecções localizadas e resposta adequada ao tratamento, a evolução costuma ser favorável. No entanto, em pacientes críticos ou imunossuprimidos, as taxas de mortalidade podem superar 40%, especialmente em casos de pneumonia grave ou bacteremia de difícil controle.
Fatores como início tardio do tratamento, falha em retirar dispositivos contaminados e uso de antibióticos ineficazes estão associados a pior desfecho.
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Referências Bibliográficas
- DIAS, Vanessa Cordeiro et al. Prevalência e resistência a antibióticos de Stenotrophomonas maltophilia em amostras clínicas: estudo epidemiológico de 10 anos. HU Revista, Juiz de Fora, v. 45, n. 4, p. 402–407, 2019. DOI: 10.34019/1982-8047.2019.v45.27338.
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- SAID, Mina S.; TIRTHANI, Ekta; LESHO, Emil. Stenotrophomonas maltophilia. In: STATPEARLS. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2025.