E aí, doc! Vamos explorar mais um tema essencial? Hoje o foco é a Febre Oropouche, uma arbovirose transmitida principalmente pelo mosquito Culicoides paraensis, causando febre, dor de cabeça, mialgia e outros sintomas semelhantes aos da dengue.
O Estratégia MED está aqui para descomplicar esse conceito e ajudar você a aprofundar seus conhecimentos, promovendo uma prática clínica cada vez mais eficaz e segura.
Vamos nessa!
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Definição de Febre Oropouche
A febre de Oropouche é uma doença emergente causada pelo Oropouche virus (OROV), um arbovírus do gênero Orthobunyavirus, pertencente à família Peribunyaviridae. O OROV foi identificado pela primeira vez no Brasil na década de 1960 a partir de uma amostra de sangue de um bicho-preguiça (Bradypus tridactylus), capturado durante a construção da rodovia Belém-Brasília.
Desde então, a doença tem sido registrada em surtos periódicos e casos isolados, especialmente nos estados da região Amazônica, como Pará, Amazonas, Amapá, Tocantins e Acre, além do Mato Grosso. Entretanto, em abril de 2024, os primeiros casos de febre de Oropouche foram confirmados no Espírito Santo. Desde então, mais de 450 casos foram registrados em 36 municípios, com destaque para Laranja da Terra, Rio Bananal, Colatina, Anchieta e Itaguaçu. Além do Brasil, outros países da América Central e do Sul também relataram casos.
No início de 2025, o Espírito Santo concentrou 99% dos casos de febre de Oropouche no Brasil. Nas duas primeiras semanas do ano, foram notificados 893 casos no país, dos quais 886 ocorreram no estado.
Apesar de sua descoberta há mais de seis décadas, a febre de Oropouche foi negligenciada ao longo dos anos e ainda é pouco discutida no Brasil. No entanto, com o aumento dos surtos isolados em algumas regiões, a doença tem chamado mais atenção nos últimos anos.
Um dos desafios no estudo do OROV é a falta de um entendimento completo sobre seu processo evolutivo e genômico, o que dificulta a adoção de estratégias eficazes de controle e vigilância.
Transmissão da Febre Oropouche
A transmissão da Febre do Oropouche ocorre principalmente por meio da picada do inseto Culicoides paraensis, popularmente conhecido como maruim ou mosquito-pólvora.
Esse inseto adquire o vírus ao se alimentar do sangue de um hospedeiro infectado e, após um período de incubação dentro do vetor, pode transmiti-lo a um novo hospedeiro ao se alimentar novamente.
Ciclo silvestre
No ambiente silvestre, primatas não humanos, bichos-preguiça e possivelmente aves e roedores atuam como hospedeiros do vírus Oropouche (OROV). Diversos insetos podem estar envolvidos na transmissão dentro desse ciclo, como os mosquitos Coquillettidia venezuelensis e Aedes serratus.
No entanto, o principal vetor continua sendo o Culicoides paraensis. A transmissão ocorre quando esses insetos se alimentam do sangue de um animal infectado e posteriormente picam outro animal, perpetuando a circulação do vírus na natureza.
Ciclo urbano
No ambiente urbano, os seres humanos tornam-se os principais hospedeiros do vírus. O vetor predominante continua sendo o Culicoides paraensis, responsável pela maior parte da transmissão.
Além disso, o mosquito Culex quinquefasciatus, comum em áreas urbanas, pode ocasionalmente atuar como vetor secundário. Esse ciclo é responsável por surtos da doença em áreas densamente povoadas, onde há maior proximidade entre os hospedeiros e os vetores.
A rápida disseminação da Febre do Oropouche está relacionada à alta capacidade reprodutiva do Culicoides paraensis, que se desenvolve facilmente em locais úmidos e com matéria orgânica em decomposição, como margens de rios e áreas de esgoto a céu aberto.
Manifestações clínicas da Febre Oropouche
A febre do Oropouche apresenta um quadro clínico semelhante ao de outras arboviroses, como a dengue. Os sintomas surgem abruptamente e incluem febre alta, cefaleia intensa, mialgia, artralgia, calafrios e dor retroocular. Além disso, podem ocorrer fotofobia, tontura, náuseas, vômitos e diarreia.
Em alguns casos, a doença pode levar ao acometimento do sistema nervoso central, resultando em meningite asséptica ou meningoencefalite, especialmente em pacientes imunocomprometidos. Manifestações hemorrágicas, como petéquias, epistaxe e gengivorragia, também podem ocorrer, embora sejam menos comuns.
A febre do Oropouche geralmente tem evolução benigna, com duração dos sintomas entre dois e sete dias. No entanto, parte dos pacientes pode apresentar recidiva cerca de uma a duas semanas após a recuperação inicial, com retorno de sintomas como febre, cefaleia e mialgia. Até o momento, não há relatos de óbitos associados à infecção pelo Oropouche vírus.
Diagnóstico da Febre Oropouche
O diagnóstico da febre do Oropouche é desafiador devido à semelhança dos sintomas com outras arboviroses, como dengue e chikungunya. Os exames laboratoriais iniciais, como hemograma e dosagem de enzimas hepáticas, podem apresentar alterações inespecíficas, como leucopenia e elevação das transaminases, tornando o diagnóstico clínico inconclusivo.
Para confirmação, são necessários testes mais específicos. Os testes sorológicos, como ensaios imunoenzimáticos (ELISA), podem detectar imunoglobulinas M e G, mas sua eficácia depende da janela imunológica, que ocorre a partir do quinto dia de sintomas.
Métodos moleculares, como a reação em cadeia da polimerase com transcrição reversa (RT-PCR), são mais sensíveis e detectam fragmentos do RNA viral em diferentes amostras, como soro, sangue total e líquido cefalorraquidiano.
Além disso, estudos indicam que a saliva e a urina também podem ser utilizadas para identificação do vírus, ampliando as possibilidades de diagnóstico. No entanto, ainda não há testes imunocromatográficos disponíveis, o que dificulta a detecção rápida da doença.
Tratamento da Febre Oropouche
O tratamento da Febre de Oropouche é predominantemente sintomático, pois não existe um tratamento antiviral específico ou vacina disponível para a doença. O foco é aliviar os sintomas e oferecer suporte clínico para a recuperação do paciente.
1. Controle de sintomas:
- Analgesia e antitérmicos: O uso de medicamentos como paracetamol ou dipirona é fundamental para o controle da febre e da dor, como a cefaleia (dor de cabeça) e as mialgias (dores musculares) associadas à infecção. O ácido acetilsalicílico, um anti-inflamatório com efeito antipirético, deve ser evitado devido ao risco de sangramentos, especialmente em locais onde o diagnóstico diferencial com a dengue não esteja completamente esclarecido.
- Antiinflamatórios não esteroidais (AINEs): Além do controle da dor, medicamentos como o ibuprofeno podem ser usados para reduzir a inflamação, mas sempre com precaução devido ao risco de complicações hemorrágicas em algumas situações.
2. Hidratação: A hidratação adequada é crucial durante o tratamento da febre de Oropouche, uma vez que a doença pode causar desidratação devido à febre, vômitos e diarreia. Em geral, recomenda-se a ingestão de aproximadamente 2 litros de líquidos por dia para um adulto, mas a quantidade pode ser ajustada conforme a condição clínica do paciente.
3. Repouso: O repouso também é um aspecto essencial para a recuperação, pois o descanso ajuda o sistema imunológico a combater o vírus. Pacientes devem ser orientados a evitar esforços físicos durante o período febril.
4. Casos graves: Em casos mais graves, como aqueles com comprometimento neurológico (meningite asséptica ou meningoencefalite), a abordagem clínica se torna mais complexa. A internação hospitalar pode ser necessária para monitoramento constante dos sinais vitais, suporte respiratório e neurológico, e possível uso de medicamentos para controlar complicações.
5. Monitoramento clínico: O acompanhamento médico contínuo é fundamental para ajustar a conduta de acordo com a evolução da doença. O diagnóstico precoce e o acompanhamento adequado evitam complicações graves e permitem intervenções mais eficazes.
6. Estudos experimentais: Embora a doença seja geralmente autolimitada e com boa recuperação, há uma escassez de estudos experimentais in vitro ou in vivo sobre o tratamento específico da doença. Isso destaca a necessidade de mais pesquisas para o desenvolvimento de tratamentos antivirais eficazes.
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Referências
PEREIRA, Cristian dos Santos; Picanço, Maria Rosinete Siqueira; VALE, Gabriella Pinheiro do; OLIVEIRA, Camila Souza de; AMORIM, Flávia Alini Souza de; COSTA, Fábio da Silva. Epidemiologia, diagnóstico e tratamento da febre de Oropouche no Brasil: revisão de literatura. Brazilian Journal of Health Review, Curitiba, v. 4, n. 6, p. 23912-23920, nov./dec. 2021. DOI: 10.34119/bjhrv4n6-023. Recebido em: 08 out. 2021. Aceito em: 05 nov. 2021. Disponível em: https://doi.org/10.34119/bjhrv4n6-023. Acesso em: 31 mar. 2025.
BRASIL. Ministério da Saúde. Oropouche. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/o/oropouche. Acesso em: 31 mar. 2025.
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James M Hughes, MD. Emerging viruses. UpToDate, 2025. Disponível em: UpToDate