E aí, doc! Bora aprofundar mais um tema relevante? Hoje o destaque vai para a Síndrome de Nelson, uma condição rara que pode surgir após a adrenalectomia bilateral em pacientes com doença de Cushing, caracterizada por hiperpigmentação e crescimento agressivo de adenoma hipofisário.
O Estratégia MED está aqui para facilitar o entendimento desse quadro e fortalecer sua base teórica, contribuindo para uma atuação clínica cada vez mais segura e assertiva.
Vamos nessa!
Navegue pelo conteúdo
Definição de Síndrome de Nelson
A síndrome de Nelson é uma complicação rara que pode surgir após a realização de adrenalectomia bilateral, geralmente indicada para o tratamento da doença de Cushing refratária.
Essa condição foi descrita pela primeira vez em 1958 pelo Dr. Don H. Nelson, motivo pelo qual recebeu seu nome, e também é conhecida como síndrome de Nelson-Salassa, após a publicação de mais casos por Salassa e colaboradores em 1959.
A síndrome caracteriza-se pelo desenvolvimento progressivo de um adenoma hipofisário secretor de hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), resultante da perda do mecanismo de retroalimentação negativa do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal após a remoção das glândulas adrenais.
Clinicamente, pode se manifestar com hiperpigmentação cutânea, elevação acentuada dos níveis de ACTH e crescimento tumoral na hipófise, com sintomas relacionados ao efeito de massa. O surgimento da síndrome costuma ocorrer entre um e cinco anos após a cirurgia, exigindo monitoramento rigoroso dos pacientes submetidos a esse tipo de procedimento.
Etiologia da Síndrome de Nelson
A etiologia da síndrome de Nelson está diretamente relacionada à remoção cirúrgica das glândulas adrenais, procedimento conhecido como adrenalectomia bilateral, realizado principalmente em casos graves ou refratários da doença de Cushing.
A principal causa dessa síndrome é a perda da retroalimentação negativa do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal após a retirada das adrenais, o que leva a uma produção exacerbada de hormônio liberador de corticotropina (CRH) pelo hipotálamo.
Esse estímulo excessivo ativa as células corticotrópicas da hipófise, promovendo hipertrofia e hiperplasia dessas células, resultando na formação de um adenoma secretor de adrenocorticotrofina (ACTH).
Há também a hipótese de que as células corticotrópicas previamente alteradas, responsáveis pelo adenoma hipofisário na doença de Cushing, continuem a crescer e se desenvolver após a retirada do estímulo adrenal, contribuindo para a progressão tumoral.
A elevação acentuada dos níveis plasmáticos de ACTH após a adrenalectomia, especialmente quando mantida por longos períodos, é considerada um dos principais fatores de risco para o desenvolvimento da síndrome. Além disso, níveis elevados de cortisol urinário de 24 horas antes da cirurgia e ausência de tratamento radioterápico prévio também são considerados fatores predisponentes.
Fisiopatologia da Síndrome de Nelson
A fisiopatologia da síndrome de Nelson está diretamente relacionada à interrupção da produção de cortisol após a realização da adrenalectomia bilateral em pacientes com doença de Cushing. Na doença de Cushing, há um adenoma hipofisário secretor de ACTH, que estimula as glândulas adrenais a produzirem níveis excessivos de cortisol.
Quando o adenoma não responde ao tratamento convencional ou cirúrgico, a retirada das glândulas adrenais é indicada para eliminar a fonte de cortisol. Com isso, a ausência total do hormônio suprime o mecanismo de retroalimentação negativa sobre o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, levando a um aumento na secreção do hormônio liberador de corticotropina (CRH) pelo hipotálamo. O CRH, por sua vez, estimula intensamente as células corticotrópicas da hipófise, resultando na produção exacerbada de ACTH.
Esse estímulo contínuo pode causar hipertrofia das células corticotrópicas e levar ao surgimento de um novo tumor hipofisário ou ao crescimento de um tumor pré-existente. Além disso, a elevação persistente de ACTH e seus precursores, como a proopiomelanocortina (POMC), está associada à hiperpigmentação cutânea, uma manifestação clínica comum da síndrome, já que a POMC também é precursora do hormônio melanocitário.
Do ponto de vista histopatológico, os tumores associados à síndrome de Nelson apresentam características semelhantes aos adenomas da doença de Cushing, mas tendem a ser mais agressivos, com maior tamanho e potencial invasivo. As células corticotrópicas mostram mitoses frequentes e pleomorfismo celular.
São tumores monoclonais que se coram com coloração basofílica e reagem positivamente à coloração ácido periódico de Schiff (PAS). Apesar da agressividade clínica, o índice de proliferação Ki-67, marcador de atividade celular, geralmente permanece baixo, em torno de 3% ou menos, o que indica uma taxa de crescimento relativamente lenta em termos histológicos.
Manifestações clínicas da Síndrome de Nelson
A hiperpigmentação cutânea é a característica clínica mais marcante e distintiva da síndrome. Trata-se de uma pigmentação escurecida, intensa e difusa, que difere de outras causas de hiperpigmentação.
As áreas mais frequentemente afetadas incluem cicatrizes, aréolas, gengivas, escroto e a linha média abdominal (linea nigra), que se torna visivelmente escura da púbis até o umbigo.
Outros sinais e sintomas surgem devido ao efeito de massa do tumor em crescimento. Tumores maiores podem comprimir o quiasma óptico, resultando em alterações visuais, como hemianopsia bitemporal e perda visual progressiva.
A compressão da hipófise normal também pode causar disfunção hipofisária, levando à redução da produção de outros hormônios tróficos, o que se manifesta com sintomas como fadiga, fraqueza e cefaleia.
Tratamento da Síndrome de Nelson
O tratamento da síndrome de Nelson envolve uma abordagem multidisciplinar que combina cirurgia, radioterapia e, em alguns casos, terapia medicamentosa. A conduta inicial mais recomendada é a ressecção cirúrgica do tumor hipofisário, preferencialmente pela via transesfenoidal, que pode ser realizada de forma microscópica ou endoscópica.
Tumores extensos com invasão lateral podem necessitar de craniotomia. No entanto, a cura endócrina é obtida em cerca de 50% dos casos, em grande parte devido à invasão do seio cavernoso e à extensão extraselar.
A cirurgia pode ser seguida de complicações, como hipopituitarismo pós-operatório em cerca de 30% dos pacientes e diabetes insipidus permanente em aproximadamente 20%. Em alguns casos, pode-se optar inicialmente por um acompanhamento clínico rigoroso, especialmente quando o tumor apresenta crescimento lento ou não causa sintomas significativos.
A radioterapia é uma alternativa importante, sendo aplicada na forma de radioterapia fracionada ou radiocirurgia estereotáxica, como a radiocirurgia com gama knife. Esta última demonstrou controle radiológico do tumor em 92% dos casos e redução dos níveis de ACTH em cerca de 63%.
Contudo, a radioterapia pode causar hipopituitarismo a médio e longo prazo, sendo necessário acompanhamento e reposição hormonal. Problemas visuais também são possíveis complicações após o tratamento radioterápico.
A radioterapia profilática após adrenalectomia bilateral tem sido proposta como medida preventiva contra a síndrome de Nelson, mas sua eficácia ainda é controversa. Atualmente, a radiocirurgia direcionada exclusivamente ao tecido hipofisário é preferida por causar menos efeitos colaterais.
O tratamento medicamentoso apresenta opções limitadas, mas estudos indicam respostas positivas com o uso de análogos da somatostatina (octreotida e pasireotida), agonistas dopaminérgicos (bromocriptina e cabergolina), valproato de sódio e temozolomida.
Além disso, todos os pacientes necessitam de reposição permanente de glicocorticoides, já que não produzem mais cortisol após a adrenalectomia. A hidrocortisona é geralmente administrada em doses de 20 mg pela manhã e 10 mg à tarde. Também é necessária a reposição de mineralocorticoides, com o uso habitual de acetato de fludrocortisona (0,1 mg).
Veja também!
- Resumo sobre Síndrome de Horner: definição, manifestações clínicas e mais!
- Resumo sobre Distrofia Miotônica: definição, manifestações clínicas e mais!
- Resumo de afasia: diagnóstico, tratamento e mais!
- Resumo de disfunção temporomandibular: diagnóstico, tratamento e mais!
- Resumo sobre lamotrigina: indicações, farmacologia e mais!
- Resumo sobre alterações pupilares: etiologia, reflexos e mais!
Referências
Monserrate AE, De Jesus O. Nelson Syndrome. [Updated 2023 Aug 23]. In: StatPearls. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2025 Jan-. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK560755/
Lynnette K Nieman, MD. Persistent or recurrent Cushing disease: Surgical bilateral adrenalectomy. UpToDate, 2024. Disponível em: UpToDate