Resumo sobre Síndrome Pós UTI: definição, manifestações clínicas e mais!
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Resumo sobre Síndrome Pós UTI: definição, manifestações clínicas e mais!

E aí, doc! Vamos explorar mais um tema essencial? Hoje o foco é a Síndrome Pós UTI, um conjunto de alterações físicas, cognitivas e psicológicas que podem surgir após a alta da unidade de terapia intensiva. 

O Estratégia MED está aqui para descomplicar esse conceito e ajudar você a aprofundar seus conhecimentos, promovendo uma prática clínica cada vez mais eficaz e segura.

Vamos nessa!

Definição de Síndrome pós UTI

A Síndrome Pós Unidade de Terapia Intensiva corresponde a um conjunto de alterações novas ou agravadas que surgem após um episódio de doença crítica com necessidade de internação em UTI e que persistem além da alta hospitalar

Essas alterações refletem o impacto cumulativo da doença aguda grave, das intervenções intensivas e do processo de recuperação incompleto, configurando um estado de morbidade prolongada em sobreviventes de cuidados intensivos.

Essa síndrome engloba comprometimentos inter-relacionados que afetam diferentes dimensões da saúde do indivíduo, especialmente os domínios físico, cognitivo e psicológico, podendo coexistir e se potencializar mutuamente ao longo do tempo. 

Trata-se de um fenômeno não transitório, frequentemente associado a redução da funcionalidade, perda de autonomia, queda da qualidade de vida e dificuldades de reintegração social e ocupacional.

A Síndrome Pós UTI emerge como consequência do aumento da sobrevivência à doença crítica, resultado dos avanços na terapia intensiva, e representa um desafio clínico e assistencial de longo prazo, uma vez que seus efeitos podem persistir por meses ou anos após a alta, exigindo acompanhamento contínuo e abordagem multidisciplinar.

Fatores de risco da Síndrome Pós UTI

O desenvolvimento da Síndrome Pós UTI resulta da interação entre características prévias do paciente, gravidade da doença crítica, exposições durante a internação e fragilidades no período pós alta. Os principais fatores de risco identificados incluem:

  • Fatores relacionados ao paciente
    • Presença de doenças crônicas prévias, especialmente cardiopulmonares, neurológicas e metabólicas;
    • Idade avançada, associada a menor reserva funcional;
    • Baixo nível funcional ou dependência antes da internação;
    • Histórico prévio de transtornos psiquiátricos, como depressão ou ansiedade.
  • Fatores relacionados à doença crítica
    • Gravidade elevada da doença aguda, como sepse, síndrome do desconforto respiratório agudo e choque;
    • Ocorrência de falência de múltiplos órgãos;
    • Processos inflamatórios sistêmicos intensos e prolongados.
  • Fatores relacionados à internação em UTI
    • Tempo prolongado de permanência na UTI;
    • Necessidade de ventilação mecânica, especialmente quando prolongada;
    • Uso extensivo de sedativos, analgésicos opioides e bloqueadores neuromusculares;
    • Desenvolvimento de delirium durante a internação, considerado um dos principais fatores associados a prejuízos cognitivos e psicológicos;
    • Imobilidade prolongada e restrição ao leito;
    • Ocorrência de fraqueza adquirida na UTI.
  • Fatores relacionados ao cuidado pós alta
    • Fragmentação do cuidado após a alta hospitalar;
    • Ausência de reabilitação estruturada e acompanhamento multiprofissional;
    • Polifarmácia, com manutenção inadequada de medicamentos iniciados na UTI;
    • Falhas na coordenação do cuidado, incluindo orientações incompletas na alta.

Manifestações clínicas da Síndrome Pós UTI

A Síndrome Pós UTI pode se expressar por alterações físicas, cognitivas, psicológicas e também por repercussões funcionais, sociais e existenciais, muitas vezes ocorrendo em conjunto e se reforçando mutuamente.

Manifestações físicas

  • Fraqueza muscular e redução de desempenho físico, com limitação para atividades do dia a dia e perda de independência.
  • Fadiga persistente, frequentemente com grande impacto na tolerância ao esforço e na rotina.
  • Dor persistente, incluindo dor relacionada a procedimentos e ao período de internação, com potencial de limitar atividades diárias.
  • Distúrbios do sono, que podem piorar fadiga, humor e recuperação funcional.
  • Necessidade de ajuda para atividades diárias em parte dos sobreviventes, evidenciando perda de autonomia após a alta.

Manifestações cognitivas

  • Comprometimento cognitivo em proporção relevante de sobreviventes, envolvendo dificuldades como memória, atenção e funções executivas.
  • Impacto prático com nova dependência ou piora de dependência em atividades instrumentais, como organizar medicações, finanças, compras e preparo de alimentos, dificultando a retomada de autonomia plena.

Manifestações psicológicas

  • Ansiedade, sintomas depressivos e sintomas de estresse pós-traumático, com ocorrência frequente após a alta.
  • No estresse pós traumático, podem surgir:
    • Reexperiência do evento, com memórias intrusivas e imagens vívidas
    • Evitação de lembranças e situações associadas ao período de internação
    • Hiperexcitação, com alterações do sono, irritabilidade e dificuldade de concentração
  • A depressão pode aparecer com componentes somáticos importantes e se associar a pior adesão ao cuidado e pior recuperação global.

Manifestações funcionais e sociais

  • Limitações em atividades de vida diária e redução sustentada da funcionalidade, com dificuldade de retomar rotina prévia.
  • Perda de trabalho, redução do retorno às atividades ocupacionais e reconfiguração de redes sociais, com impacto econômico e familiar.
  • Reinternações e maior utilização de serviços de saúde nos meses seguintes, inclusive por complicações potencialmente evitáveis.

Aspectos existenciais e do cuidado

  • Sensação de ameaça existencial e sofrimento ligado à percepção de estar desamparado no período pós alta, especialmente quando há grande necessidade de suporte e pouca sustentação prática.
  • Presença de complicações iatrogênicas e dificuldades de transição de cuidado, incluindo polifarmácia e fragmentação do cuidado, o que pode piorar a recuperação e aumentar vulnerabilidades.

Impacto em familiares e cuidadores

  • Em familiares e cuidadores, podem ocorrer ansiedade, depressão, estresse pós-traumático, além de sobrecarga, restrição de atividades e, em alguns contextos, luto complicado.

Tratamento da Síndrome Pós UTI

O tratamento da Síndrome Pós UTI baseia-se em uma abordagem longitudinal, integrada e centrada no paciente, reconhecendo que as alterações físicas, cognitivas, psicológicas e funcionais frequentemente coexistem e se influenciam mutuamente. O objetivo principal é promover a recuperação funcional, reduzir incapacidades persistentes, melhorar a qualidade de vida e prevenir complicações tardias.

Abordagem multidisciplinar

O manejo da Síndrome Pós UTI requer atuação coordenada de uma equipe multiprofissional, envolvendo médicos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, psicólogos, enfermeiros, nutricionistas e assistentes sociais. A integração entre os profissionais é fundamental para identificar déficits precocemente, definir metas realistas e ajustar intervenções ao longo do tempo.

Reabilitação física

A reabilitação física é um dos pilares do tratamento e deve ser iniciada o mais precocemente possível, com continuidade após a alta hospitalar. As estratégias incluem:

  • Programas de exercícios progressivos, voltados para recuperação da força muscular, resistência e equilíbrio
  • Treinamento funcional para atividades da vida diária, visando restauração da independência
  • Incentivo à mobilidade gradual, respeitando limites individuais

Essas intervenções contribuem para redução da fraqueza adquirida, melhora da capacidade funcional e diminuição da dependência.

Reabilitação cognitiva

Pacientes com comprometimento cognitivo podem se beneficiar de estratégias estruturadas de reabilitação, focadas em memória, atenção e funções executivas. O acompanhamento permite:

  • Identificação precoce de déficits persistentes
  • Adaptação de rotinas e tarefas do cotidiano
  • Orientação prática para organização de medicações, finanças e atividades complexas

Quando necessário, o suporte de terapia ocupacional e neuropsicologia auxilia na compensação das limitações cognitivas.

Cuidado em saúde mental

O tratamento das alterações psicológicas envolve avaliação sistemática e intervenções direcionadas para ansiedade, depressão e sintomas de estresse pós traumático. As estratégias incluem:

  • Psicoterapia, com foco na adaptação à doença crítica e ao período pós alta
  • Acompanhamento psiquiátrico quando indicado
  • Abordagem dos distúrbios do sono e do sofrimento emocional persistente

O cuidado em saúde mental é essencial para favorecer a adesão às demais etapas da reabilitação e melhorar os desfechos globais.

Seguimento clínico estruturado

O acompanhamento após a alta deve ser organizado e contínuo, com revisões periódicas que avaliem evolução funcional, cognitiva e emocional. Esse seguimento permite:

  • Ajuste do plano terapêutico ao longo do tempo;
  • Identificação precoce de complicações e necessidade de encaminhamentos;
  • Revisão criteriosa de medicamentos, reduzindo riscos associados à polifarmácia.

Educação do paciente e da família

A orientação adequada ao paciente e aos familiares é parte essencial do tratamento. A educação em saúde contribui para:

  • Compreensão das limitações esperadas e do processo de recuperação;
  • Redução da ansiedade relacionada à incerteza pós alta;
  • Fortalecimento do papel do cuidador e da rede de apoio.

Transição do cuidado e suporte social

A transição entre hospital, domicílio e atenção ambulatorial deve ser planejada, minimizando descontinuidade do cuidado. Estratégias de suporte social e articulação com a atenção primária ajudam a:

  • Reduzir reinternações;
  • Facilitar acesso à reabilitação e acompanhamento especializado;
  • Promover recuperação sustentável no longo prazo.

Veja também!

Referências

RAMNARAIN, Dharmanand; AUPERS, Emily; DEN OUDSTEN, Brenda; OLDENBEUVING, Annemarie; DE VRIES, Jolanda; POUWELS, Sjaak. Post intensive care syndrome (PICS): an overview of the definition, etiology, risk factors, and possible counseling and treatment strategies. Expert Review of Neurotherapeutics, Londres, v. 21, n. 10, p. 1159–1177, 2021. DOI: 10.1080/14737175.2021.1981289.

INOUYE, Sharon K.; WESTENDORP, Rudi G. J.; SACZYNSKI, Jane S. Delirium in elderly people. The Lancet, Londres, v. 383, n. 9920, p. 911–922, 2014.

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