Olá, querido doutor e doutora! A Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) é uma medida de prevenção biomédica altamente eficaz no enfrentamento da infecção pelo HIV, indicada para pessoas em situação de maior vulnerabilidade. Por meio do uso contínuo ou sob demanda de antirretrovirais, a PrEP atua bloqueando a replicação viral nas fases iniciais da exposição.
A proteção ideal da PrEP depende do esquema adotado e da regularidade na tomada dos comprimidos.
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Conceito
A Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) consiste no uso antecipado e contínuo de medicamentos antirretrovirais por pessoas que não vivem com HIV, mas que apresentam risco elevado de exposição ao vírus. Essa estratégia atua como uma barreira farmacológica, reduzindo a chance de infecção durante práticas sexuais desprotegidas ou compartilhamento de instrumentos perfurocortantes, como seringas.
A PrEP é disponibilizada no Brasil sob a forma de comprimido único diário que combina tenofovir disoproxila e entricitabina, ambos inibidores da transcriptase reversa, bloqueando etapas iniciais do ciclo de replicação do HIV no organismo.
Indicações e população-alvo
A PrEP é indicada para pessoas com maior vulnerabilidade à infecção pelo HIV, a partir dos 15 anos de idade e com peso corporal igual ou superior a 35 kg. O foco da profilaxia está em indivíduos com práticas de risco contínuas, especialmente aquelas relacionadas à atividade sexual ou uso de drogas injetáveis.
Entre os principais critérios clínicos e comportamentais que justificam a indicação da PrEP, destacam-se:
- Relações sexuais frequentes sem preservativo, principalmente anais ou vaginais;
- Histórico de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) nos últimos 12 meses;
- Busca repetida por PEP (Profilaxia Pós-Exposição);
- Parceria sexual com HIV detectável ou de sorologia desconhecida;
- Envolvimento em contextos de troca de sexo por dinheiro, moradia, drogas ou objetos de valor;
- Prática de chemsex – uso de substâncias psicoativas para intensificar ou prolongar relações sexuais;
- Compartilhamento de seringas ou agulhas, em usuários de drogas injetáveis.
A solicitação espontânea do paciente pela PrEP também é um indicativo relevante, pois demonstra reconhecimento pessoal do risco, sendo considerada critério de elegibilidade para início da profilaxia.
Esquemas de uso: PrEP diária e sob demanda
PrEP diária
É o regime mais amplamente recomendado, especialmente para a maioria das populações elegíveis. Consiste na ingestão de 1 comprimido por dia da combinação tenofovir disoproxila (300 mg) + entricitabina (200 mg). No início, orienta-se a administração de 2 comprimidos no primeiro dia (dose de ataque), seguida da dose única diária de manutenção.
Este esquema é indicado para:
- Todas as populações elegíveis, incluindo mulheres cis, homens cis, pessoas trans e não binárias;
- Pacientes com frequência sexual maior que duas vezes por semana;
- Indivíduos que não conseguem prever ou planejar suas relações sexuais com antecedência.
PrEP sob demanda (esquema 2+1+1)
Recomendada apenas para homens cisgêneros e pessoas não binárias designadas como do sexo masculino ao nascer que tenham relações sexuais com frequência inferior a duas vezes por semana e consigam antecipar o momento da exposição.
O esquema consiste em:
- 2 comprimidos entre 2 e 24 horas antes da relação sexual;
- 1 comprimido 24 horas após a primeira dose;
- 1 comprimido 24 horas após a segunda dose.
Caso ocorram novos encontros sexuais nos dias seguintes, o usuário deve manter 1 comprimido ao dia até 48 horas após o último ato sexual. Se houver intervalo de mais de um dia entre exposições, é necessário recomeçar o esquema desde o início (2+1+1).
A PrEP sob demanda não deve ser utilizada por mulheres cis, pessoas trans ou qualquer pessoa em uso de estradiol, devido à ausência de estudos que garantam proteção eficaz para essas populações em práticas vaginais receptivas.
Avaliação inicial
Antes de iniciar a PrEP, é necessário realizar uma avaliação clínica e laboratorial minuciosa, a fim de garantir a segurança do paciente, descartar infecção prévia pelo HIV e identificar eventuais contraindicações ou condições que exigem condutas específicas.
Testagem laboratorial obrigatória
- HIV: teste rápido ou sorologia deve ser negativo nos últimos 7 dias. Em caso de exposição recente ou sintomas sugestivos de infecção aguda, considerar PCR para carga viral.
- Sífilis: teste rápido (ou VDRL, se histórico de sífilis).
- Hepatite B e C: avaliação com HBsAg e anti-HCV.
- Clamídia e Gonorreia: por biologia molecular (PCR), com coleta conforme prática sexual (urina, swab anal, vaginal ou orofaríngeo).
- Função renal: creatinina e cálculo da taxa de filtração glomerular (TFG). A PrEP está contraindicada se TFG < 60 mL/min.
Avaliação clínica complementar
- Identificação de exposições recentes de risco: se houver relação desprotegida nas últimas 72 horas, considerar PEP antes da PrEP.
- Investigação de sinais de síndrome retroviral aguda (febre, rash, linfadenopatia, faringite, mialgia).
- Histórico vacinal e presença de comorbidades crônicas (diabetes, hipertensão, doença renal prévia).
A PrEP pode ser iniciada antes da liberação de exames não essenciais, desde que o HIV esteja descartado clinicamente e laboratorialmente. Resultados pendentes devem ser avaliados na consulta de retorno, em até 30 dias, com revisão da elegibilidade.
Acompanhamento e adesão
O seguimento clínico regular é indispensável para garantir a eficácia da PrEP e a segurança do paciente ao longo do uso. O acompanhamento deve considerar a frequência de exposições, sintomas intercorrentes, efeitos adversos, além da adesão ao esquema prescrito.
Consultas de seguimento
- Primeira revisão: deve ocorrer entre 20 e 30 dias após o início da medicação.
- Consultas subsequentes: em geral, a cada 4 meses. Pacientes com uso contínuo por mais de 1 ano e boa adesão podem ter o intervalo estendido para 6 meses, conforme avaliação clínica.
Avaliações obrigatórias em todas as consultas
- Teste de HIV (preferencialmente teste rápido);
- Reforço da adesão e investigação de possíveis falhas no uso;
- Avaliação de comportamentos de risco e estratégias de redução de danos;
- Verificação de efeitos colaterais e sinais de infecção viral aguda ou IST.
Avaliações periódicas complementares
- Sífilis: a cada 4 meses (com VDRL ou teste rápido).
- Clamídia e gonorreia: a cada 6 meses (PCR, conforme via de exposição).
- Função renal: anual para pacientes com menos de 50 anos e TFG ≥ 90 mL/min; semestral se houver comorbidades ou TFG < 90.
- Hepatite B e C: anual ou conforme status vacinal e histórico clínico.
- Gravidez: em mulheres cis e pessoas com capacidade gestacional, a cada 4 meses.
Adesão mínima recomendada para eficácia
- Mulheres cis e pessoas em uso de estradiol: devem tomar pelo menos 6 comprimidos por semana.
- Demais grupos (homens cis, pessoas não binárias designadas do sexo masculino ao nascer, travestis e mulheres trans sem estradiol): pelo menos 4 comprimidos por semana.
Adesão insuficiente associada a exposição recente pode exigir transição temporária para PEP, com reavaliação da elegibilidade para retorno à PrEP após 28 dias e exclusão de infecção pelo HIV.
Situações especiais
Gestantes e lactantes
O uso da PrEP diária é considerado seguro durante a gestação e amamentação. Deve ser mantida em mulheres com risco contínuo de exposição ao HIV, especialmente quando há parceiro com sorologia positiva ou desconhecida e prática sexual desprotegida.
Pessoas trans e uso de estradiol
Embora não haja contraindicação formal, estudos apontam que o uso de hormônios à base de estradiol pode reduzir a concentração de tenofovir em mucosa retal, especialmente em casos de adesão inadequada. Por isso, a PrEP sob demanda não é recomendada para pessoas trans ou não binárias em hormonização com estradiol. Nestes casos, opta-se pela PrEP diária com reforço na adesão.
Diagnóstico de Hepatite B crônica
Pessoas com hepatite B crônica podem usar a PrEP, desde que haja avaliação médica sobre benefício e risco. Recomenda-se o uso do regime diário, evitando o sob demanda, para minimizar o risco de reativação viral e resistência ao tenofovir. Em caso de interrupção da PrEP, deve-se considerar manutenção de tratamento antiviral específico.
Infecções recentes ou suspeita de soroconversão
Pacientes com exposição de risco nos últimos 30 dias e sintomas compatíveis com infecção aguda pelo HIV (febre, rash, faringite, linfadenopatia) devem ser avaliados com exame de carga viral e genotipagem. A PrEP deve ser suspensa imediatamente e iniciado esquema de TARV preemptiva, até confirmação ou exclusão diagnóstica.
Vacinação recomendada durante o uso de PrEP
Usuários devem ser avaliados quanto à situação vacinal e receber, se necessário:
- Hepatite B: 3 doses (0, 2 e 6 meses).
- Hepatite A: 2 doses (0 e 6 meses), se suscetível.
- HPV: 3 doses (0, 2 e 6 meses), entre 15 e 45 anos.
A vacinação pode ser realizada em unidades públicas, mediante comprovação de uso da PrEP.
Interrupção da PrEP
A descontinuação da PrEP deve ser realizada com critérios clínicos bem definidos, respeitando tanto as condições de saúde do paciente quanto seu contexto de vida e desejo pessoal. A suspensão inadequada pode aumentar o risco de infecção, especialmente se ocorrer em período de vulnerabilidade.
Indicações para interrupção
A PrEP deve ser suspensa nas seguintes situações:
- Confirmação de infecção pelo HIV;
- Decisão do paciente de não continuar o uso;
- Mudança no comportamento sexual, com cessação ou significativa redução de práticas de risco;
- Eventos adversos relevantes ou intolerância medicamentosa;
- Adesão persistentemente baixa, mesmo após tentativas de abordagem e apoio individualizado.
Tempo de manutenção pós-exposição
Para interromper o uso de forma segura, é necessário manter a medicação por um período mínimo após a última exposição de risco:
- Homens cis, HSH, pessoas não binárias designadas do sexo masculino ao nascer, travestis e mulheres trans sem estradiol: continuar a PrEP por 2 dias após a última relação sexual.
- Mulheres cis, pessoas trans e não binárias em uso de estradiol: manter por 7 dias após a última exposição.
Condutas adicionais na interrupção
- Realizar teste para HIV no momento da suspensão;
- Documentar a adesão ao tratamento, motivos da interrupção e qualquer evento de risco recente;
- Avaliar necessidade de encaminhamento para outras estratégias preventivas, como testagem periódica, aconselhamento ou uso eventual de PEP.
Se, futuramente, o paciente desejar retomar a profilaxia, deve-se refazer toda a avaliação inicial, incluindo testagem laboratorial, análise do perfil de risco e retomada da prescrição com orientação atualizada.
Nos casos de hepatite B crônica, a interrupção da PrEP exige avaliação cuidadosa, pois a retirada do tenofovir pode desencadear reativação viral ou agravar a doença hepática. Nessas situações, considerar manter o tratamento antiviral contínuo.
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Referências Bibliográficas
- BRASIL. Ministério da Saúde. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) oral à infecção pelo HIV. Brasília: Ministério da Saúde, 2024.
- UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL. TelessaúdeRS-UFRGS. Como prescrever a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) de risco à infecção pelo HIV? Porto Alegre: UFRGS, 2025.