E aí, doc! Vamos ver um caso clínico? O tema de hoje é Tetralogia de Fallot, uma cardiopatia congênita cianótica.
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Identificação
Paciente LSS, 6 meses, sexo masculino, natural de Volta Redonda – RJ
Apresentação do caso clínico
Paciente foi encaminhada ao Hospital pelo pediatra devido a cianose aos esforços e dificuldade alimentar. Sua mãe relata que desde o nascimento parecia mais “azulada” que outros bebês, especialmente durante a amamentação e atividade física. Recentemente, sua cianose tem sido mais pronunciada e ele demonstra desconforto ao se alimentar, muitas vezes interrompendo a mamada para respirar.
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História familiar (HF)
A genitora relata que possui um sobrinho que teve um problema do coração quando nasceu e fez uma cirurgia para corrigir, mas não sabe informar qual.
Antecedentes médicos (AM)
Desenvolvimento neuropsicomotor: Não rola da posição supina para prona, vira a cabeça na direção de um som, levantada pelos braços, reconhece quando fala com ele.
Alergias: Nega alergias.
Internações prévias: Nega internações.
Cirurgias realizadas: Nega cirurgias.
Doenças crônicas: Nega doenças.
Medicamentos em uso: Não faz uso de num medicamento.
Calendário vacinal: Calendário vacinal atualizado.
Exame Físico
– Dados antropométricos:
Estatura: 63 cm (Z: -2) Peso: 6,1 kg (Z: -2/-3) IMC: 15,36 (Z: -1/-2) FC: 172 bpm FR: 68 irpm PA: 100 x70 mmHg SatO2 : 79% TEC: 2 sec
Geral: Paciente irritado e gemente ao leito, com estado geral regular. Ativo e reativo, porém com fácies atípica. Anictérico, eupneico, afebril, hidratado e com cianose central. Enchimento capilar de 2 segundos.
Pulmonar: Tórax atípico, eupneico, sem esforço respiratório e com expansibilidade preservada bilateralmente. Frêmito toracovocal uniformemente palpável bilateralmente. Som claro atimpânico à percussão. Murmúrio vesicular universalmente audível, sem ruídos adventícios.
Cardíaco: Ictus palpável. Ritmo cardíaco regular em dois tempos com B2 única e hiperfonética. Sopro sistólico de ejeção 4+/6+ em foco pulmonar. Pulsos periféricos simétricos e palpáveis nas 4 extremidades, sincrônicos e com boa amplitude. Ausência de turgência jugular.
Abdome: Plano, sem distensão, simétrico, cicatriz umbilical em linha mediana. Ausência de abaulamentos, retrações, circulação colateral ou herniações. Peristalse presente e normal nos quatro quadrantes e ausência de sopros abdominais. Fígado a 2 cm do rebordo costal direito. Espaço de Traube livre. Ausência de visceromegalias.
Exames Complementares
Hemograma
Parâmetro | Resultado | Valores de Referência |
---|---|---|
Hemácias | 4,5 milhões/mm³ | 4,00 a 5,00 milhões/mm³ |
Hemoglobina | 11,6 g/dL | 11 a 13 g/dL |
Hematócrito | 38,2 % | 36 a 47 % |
Volume Globular Médio | 78,3 fL | 80 a 99 fl |
Hemoglobina Globular Média | 29,2 pg | 27 a 33 pg |
Concentração de Hemoglobina Globular Média | 34 g/dL | 32 a 36 g/dL |
RDW (Amplitude de Distribuição dos Eritrócitos) | 11% | Até 16,0% |
Radiografia de tórax
Radiografia apresenta Trama Vascular Pulmonar (TVP) reduzida; área cardíaca sugere hipertrofia de VD (HVD); “coração em tamanco holandês”.
Eletrocardiograma
Eletrocardiograma evidencia sobrecarga de ventrículo direito, além de um desvio de eixo para a esquerda.
Hipóteses Diagnósticas
Tetralogia de Fallot: a Tetralogia de Fallot é uma cardiopatia congênita caracterizada por quatro anormalidades cardíacas: estenose pulmonar, comunicação interventricular, dextroposição da aorta e hipertrofia do ventrículo direito. Essas anomalias resultam em uma mistura de sangue oxigenado e desoxigenado no coração, levando a sintomas como cianose, dificuldade respiratória e fadiga.
Transposição de grandes vasos: na transposição de grandes vasos, as artérias principais que transportam sangue do coração para o corpo (aorta) e para os pulmões (artéria pulmonar) estão trocadas de posição. Isso resulta em uma circulação sanguínea anormal, onde o sangue oxigenado pelo pulmão retorna ao coração e é bombeado de volta para os pulmões, enquanto o sangue desoxigenado do corpo é bombeado para o corpo novamente. Os sintomas incluem cianose grave desde o nascimento, dificuldade respiratória e fadiga. O tratamento geralmente envolve intervenção cirúrgica para corrigir a posição das artérias e restaurar a circulação normal.
Definição de Tetralogia de Fallot
A Tetralogia de Fallot é uma cardiopatia congênita complexa cuja anormalidade embriológica exata ainda não é completamente compreendida. Durante o desenvolvimento fetal, ocorre um desvio anterior e cefálico do septo infundibular, resultando em um defeito no septo ventricular (CIV) desalinhado.
Esse desalinhamento leva à sobreposição da raiz da aorta sobre o defeito, causando obstrução subsequente da via de saída do ventrículo direito (VSVD). A hipertrofia subsequente do ventrículo direito é considerada uma resposta ao grande CIV e à obstrução da VSVD, levando à pressão sistólica sistêmica do ventrículo direito.
O defeito do septo ventricular na Tetralogia de Fallot é geralmente um único defeito subaórtico grande e desalinhado, localizado na região perimembranosa do septo. Esse defeito pode estender-se até o septo muscular, embora defeitos musculares adicionais sejam raros.
A obstrução da VSVD ocorre em vários níveis, incluindo o desvio anterior e cefálico do septo infundibular, hipertrofia de bandas musculares na região subvalvar, hipoplasia do anel da válvula pulmonar e estenose da válvula pulmonar. Além disso, pode haver estreitamento supravalvar no tronco da artéria pulmonar e obstrução adicional nos ramos das artérias pulmonares.
A presença de aorta sobreposta é outra característica da Tetralogia de Fallot, na qual a aorta é deslocada para a direita sobre o defeito do septo ventricular em vez de sobre o ventrículo esquerdo. Isso resulta em um fluxo sanguíneo misto de ambos os ventrículos entrando na aorta.
Características anatômicas da Tetralogia de Fallot
A tetralogia de Fallot é uma condição cardíaca congênita que apresenta quatro características anatômicas principais:
- Defeito do Septo Ventricular (DSV);
- Comunicação Interventricular (CIV);
- Estenose da Válvula Pulmonar; e
- Hipertrofia Ventricular Direita.
Diagnóstico de Tetralogia de Fallot
O diagnóstico de Tetralogia de Fallot (TOF) é geralmente feito por ecocardiografia, embora outros exames como eletrocardiograma (ECG) e radiografia de tórax também sejam realizados. A ecocardiografia bidimensional e Doppler permite avaliar as características essenciais da TOF, incluindo localização e número de defeitos do septo ventricular (CIV), obstrução da via de saída do ventrículo direito (VSVD), anatomia das artérias coronárias e pulmonares, entre outros aspectos.
O ECG tipicamente mostra aumento do átrio direito e hipertrofia do ventrículo direito, enquanto a radiografia de tórax exibe um coração em formato de bota com ápice voltado para cima e segmento principal côncavo da artéria pulmonar.
O cateterismo cardíaco pode ser necessário para delineamento mais preciso da anatomia, especialmente em casos de obstrução grave da VSVD e avaliação das artérias coronárias. Além disso, outras modalidades avançadas de imagem, como tomografia computadorizada de alta resolução e ressonância magnética cardíaca, podem ser utilizadas para fornecer informações adicionais sobre a anatomia vascular e cardíaca.
Esses exames permitem uma avaliação abrangente da TOF, incluindo características anatômicas, hemodinâmicas e funcionais, desempenhando um papel crucial no diagnóstico, planejamento terapêutico e acompanhamento dos pacientes com essa condição cardíaca congênita.
Tratamento da Tetralogia de Fallot
O tratamento da Tetralogia de Fallot (TOF) pode ser dividido em duas abordagens principais: o tratamento clínico e o tratamento cirúrgico.
Tratamento Clínico
Consiste em fornecer suporte para evitar agravamento da cianose e crises de hipóxia. Isso envolve manter um controle rigoroso dos níveis de hemoglobina para evitar anemia ou policitemia.
Em pacientes com crises de cianose enquanto aguardam cirurgia, o uso de propranolol (1 a 3 mg/kg/dia) pode ser benéfico para relaxar a musculatura infundibular e prevenir crises de hipóxia.
Em casos de crise de hipóxia, que representam uma emergência de alto risco, são adotadas várias medidas, incluindo:
- Posição joelho-tórax para aumentar a resistência vascular periférica;
- Oxigenoterapia;
- Administração de sulfato de morfina (0,2 mg/kg) para suprimir o centro respiratório;
- Betabloqueadores para relaxar a musculatura infundibular;
- Cetamina (1 a 3 mg/kg) para sedação e aumento da resistência vascular periférica;
- Bicarbonato de sódio (1 mEq/kg);
- Vasoconstritores como epinefrina (0,01 mg/kg).
Tratamento Cirúrgico
A correção total definitiva dos defeitos é geralmente realizada em centros especializados a partir dos 6 meses de vida, embora alguns serviços possam indicá-la aos 3 meses. A cirurgia paliativa é reservada para situações de urgência ou quando a anatomia é desfavorável, como no caso de artérias pulmonares hipoplásicas, ou em crianças com menos de 3 meses de idade.
Os procedimentos cirúrgicos paliativos incluem a cirurgia de Blalock-Taussig clássica ou modificada, o shunt de Waterston e a cirurgia de Pots, sendo a cirurgia de Blalock-Taussig modificada mais frequente. A cirurgia de correção total definitiva envolve o fechamento do defeito do septo ventricular e a ampliação da via de saída do ventrículo direito. Em alguns casos, quando a valva pulmonar e o tronco pulmonar são hipoplásicos, é necessária a colocação de homoenxerto para manter um fluxo pulmonar adequado.
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A tetralogia de Fallot consiste em 4 anomalias que fazem com que o sangue circule pelo corpo sem oxigênio suficiente, sendo elas:
A) Perfusão sistêmica inadequada, taquicardia ventricular, diminuição da resistência vascular e diurese osmótica.
B) Estenose da válvula pulmonar, dextroposição da aorta, hipertrofia do ventrículo direito e comunicação interventricular.
C) Perfusão sistêmica inadequada, taquicardia interventricular, aumento da resistência vascular e diurese osmótica.
D) Estenose da válvula pulmonar, dextroposição da aorta, hipertrofia do ventrículo esquerdo e comunicação interventricular.
Opção correta: Alternativa “B”
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Referências
Thomas Doyle, MDAnn Kavanaugh-McHugh, MD. Tetralogy of Fallot (TOF): Pathophysiology, clinical features, and diagnosis. UpToDate, 2023. Disponível em: UpToDate
TRATADO DE PEDIATRIA: Sociedade Brasileira de Pediatria,5ª edição, Barueri, SP: Manole, 2022