Resumo de Exame Físico Abdominal: semiologia e mais!
Estratégia MED

Resumo de Exame Físico Abdominal: semiologia e mais!

Olá, querido doutor e doutora! O exame físico abdominal é uma ferramenta essencial para o diagnóstico de várias de condições que afetam os órgãos internos. Através dele, podemos identificar alterações estruturais, funcionais e sinais de doença, utilizando métodos simples, porém eficazes. A abordagem sistemática permite avaliar, de forma detalhada, o estado do abdômen e suas estruturas, sendo uma prática indispensável em qualquer avaliação clínica. Neste texto, mencionaremos as principais etapas do exame físico abdominal, que incluem a inspeção, ausculta, percussão e palpação abdominal.  

O Exame Físico Abdominal  

O exame físico abdominal é um procedimento clínico fundamental para avaliar o estado dos órgãos intra-abdominais e identificar possíveis sinais de doença. Ele é conduzido de maneira organizada e segue uma sequência específica — inspeção, ausculta, percussão e palpação — que permite ao médico obter informações importantes sobre a anatomia e função do abdômen. Através dessa abordagem, é possível detectar alterações visíveis, como abaulamentos ou retrações, avaliar sons intestinais e vasculares, determinar a presença de líquidos, massas ou gases, além de identificar áreas de dor ou sensibilidade. Esse exame é essencial para a elaboração de hipóteses diagnósticas e para o direcionamento de exames complementares.

Regiões do Abdômen

O abdômen é classicamente dividido em regiões para facilitar a avaliação clínica e a localização de possíveis anormalidades. Essa divisão permite que o examinador relacione sintomas e sinais a estruturas anatômicas específicas, orientando assim o raciocínio diagnóstico. O abdômen é dividido em nove regiões principais, formadas pela interseção de quatro linhas imaginárias: duas horizontais e duas verticais.

Hipocôndrio Direito (HCD) 

  • Estruturas: fígado (principalmente o lobo direito), vesícula biliar, rim direito e parte do intestino delgado. 
  • Patologias comuns: colecistite, hepatomegalia, abscessos hepáticos.

Epigástrio 

  • Estruturas: parte do fígado (lobo esquerdo), estômago, duodeno, pâncreas, aorta abdominal. 
  • Patologias comuns: gastrite, úlcera péptica, pancreatite. 

Hipocôndrio Esquerdo 

  • Estruturas: baço, parte do estômago, rim esquerdo, cauda do pâncreas. 
  • Patologias comuns: esplenomegalia, ruptura esplênica, doenças renais. 

Flanco Direito 

  • Estruturas: cólon ascendente, parte do rim direito. 
  • Patologias comuns: pielonefrite, abscessos perinefréticos, colite. 

Mesogástrio (Região Umbilical) 

  • Estruturas: intestino delgado (duodeno, jejuno, íleo), parte do cólon transverso, aorta. 
  • Patologias comuns: apendicite em estágios iniciais, hérnias umbilicais, obstrução intestinal. 

Flanco Esquerdo 

  • Estruturas: cólon descendente, parte do rim esquerdo. 
  • Patologias comuns: colite, diverticulite, doenças renais. 

Fossa Ilíaca Direita 

  • Estruturas: ceco, apêndice, ovário e tuba uterina direita. 
  • Patologias comuns: apendicite, doença inflamatória pélvica, cistos ovarianos. 

Hipogástrio 

  • Estruturas: bexiga, útero em mulheres, parte do intestino delgado e reto. 
  • Patologias comuns: cistite, gravidez, diverticulite. 

Fossa Ilíaca Esquerda 

  • Estruturas: cólon sigmoide, ovário e tuba uterina esquerda. 
  • Patologias comuns: diverticulite, doença inflamatória pélvica, cistos ovarianos.
Regiões abdominais: (1) hipocôndrio direito; (2) epigástrio; (3) hipocôndrio esquerdo; (4) flanco direito; (5) mesogástrio ou região umbilical; (6) flanco esquerdo; (7) fossa ilíaca direita; (8) hipogástrio; (9) fossa ilíaca esquerda. Porto 

Ordem do Exame Físico Abdominal 

A ordem do exame físico abdominal segue uma sequência que visa evitar interferências nos resultados e maximizar a acurácia dos achados. A sequência correta é: 

  1. Inspeção: o abdômen é observado quanto a simetria, abaulamentos, retrações, cicatrizes, circulação colateral e movimentos peristálticos. A posição do paciente deve ser adequada para garantir o relaxamento abdominal. 
  1. Ausculta: realizada em todos os quadrantes abdominais para identificar ruídos hidroaéreos e sopros. É feita antes da palpação e percussão para evitar que estas manobras alterem os sons intestinais. 
  1. Percussão: avalia a presença de líquidos, massas ou gases, delimitando áreas de som timpânico (ar) ou maciço (estruturas sólidas ou líquidas). É útil para delimitar órgãos como fígado e baço. 
  1. Palpação: pode ser superficial ou profunda. A palpação identifica sensibilidade, massas, órgãos aumentados e sinais de irritação peritoneal, como a descompressão brusca dolorosa (sinal de Blumberg).

Inspeção 

  1. Simetria: o abdômen deve ser avaliado quanto a sua simetria. Assimetrias podem sugerir a presença de massas, hérnias ou órgãos aumentados de um lado, como esplenomegalia ou hepatomegalia. 
  1. Forma do Abdômen: a forma geral pode ser classificada como: 

Plano: considerado fisiológico. 

Globoso: pode indicar ascite (acúmulo de líquido) ou obesidade. 

Escavado: associado à caquexia, desnutrição severa ou doenças crônicas. 

Pendular: observado em obesidade avançada ou após múltiplas gestações. 

Abdome globoso em consequência de obesidade. Porto
  1. Abaulamentos e retrações: avalia-se a presença de abaulamentos, que podem indicar hérnias (inguinais, umbilicais), tumores ou dilatações visíveis. Retrações podem estar relacionadas a bridas intestinais, cicatrizes de cirurgias prévias ou perda severa de massa muscular. 
Abdomen globoso com presença de hérnia umbilical. Alvarez
  1. Circulação colateral: a presença de vasos dilatados na parede abdominal pode sugerir hipertensão portal, frequentemente observada em pacientes com cirrose hepática. O padrão dos vasos deve ser observado, como a aparência típica em “cabeça de medusa” ao redor do umbigo. 
Cabeça de medusa. Estratégia MED
  1. Movimentos peristálticos: ondas peristálticas visíveis podem ser observadas em casos de obstrução intestinal. A peristalse visível é normalmente rítmica e pode indicar um esforço exagerado do intestino para mover o conteúdo. A presença de movimentos amplos e visíveis deve ser correlacionada com outros achados. 
  1. Lesões cutâneas: verificam-se também sinais na pele, como estrias (resultantes de ganho ou perda de peso, gravidez), equimoses (sugestivas de pancreatite, como o sinal de Cullen ou de Grey-Turner), além de cicatrizes que podem dar pistas sobre cirurgias anteriores. 
Sinal de Grey-Turner e Cullen. Alvarez 
  1. Distensão abdominal: avaliar o grau de distensão, que pode estar associada a várias condições, como ascite, dilatação de alças intestinais, obstrução intestinal ou megacólon. A localização da distensão pode fornecer pistas importantes, como a presença de uma massa localizada. 
  1. Umbigo: observar a posição e forma do umbigo, que pode estar protruso em casos de hérnia umbilical ou retraído em cicatrização de cirurgias anteriores. 

Auscultação 

A auscultação abdominal é a segunda etapa do exame físico e deve ser realizada antes da percussão e palpação para evitar a interferência mecânica que essas manobras podem provocar nos sons intestinais. Utiliza-se um estetoscópio para ouvir os ruídos produzidos pelos movimentos peristálticos, além de buscar por sons vasculares anômalos, como sopros. A ausculta deve ser realizada em todos os quadrantes abdominais, com atenção à frequência, intensidade e características dos sons. 

Ausculta abdominal. Baré

Ruídos intestinais 

  • Ruídos hidroaéreos (RHA): são sons normais gerados pelo movimento de líquidos e gases no trato digestivo. Sua frequência normal varia de 5 a 35 ruídos por minuto. Ruídos aumentados, com som mais metálico, podem sugerir obstrução intestinal, enquanto a ausência ou diminuição dos sons, chamada de íleo paralítico, indica diminuição ou ausência de peristalse, que pode ocorrer em situações como peritonite, pós-operatório e condições metabólicas. 
  • Sons ausentes: quando os sons intestinais estão ausentes após 2 a 5 minutos de ausculta, isso pode indicar condições graves como íleo paralítico, peritonite ou obstrução completa. 
  • Aumento de ruídos: ruídos aumentados, rápidos e de alta intensidade sugerem hiperatividade intestinal, o observável em casos de diarreia, síndrome do intestino irritável ou início de obstrução intestinal. No entanto, esses ruídos podem evoluir para ausência completa com a progressão da obstrução.

Sopros vasculares 

Além dos ruídos intestinais, a ausculta também avalia possíveis sopros vasculares, sendo sons originados pelo fluxo turbulento de sangue. Os principais locais de ausculta para detectar sopros são: 

  • Aorta abdominal: localizada acima do umbigo, na linha média, pode apresentar sopros em casos de aneurismas ou estenose. 
  • Artérias renais: auscultadas lateralmente ao umbigo, são importantes para detectar estenoses renais, especialmente em pacientes hipertensos. 
  • Artérias ilíacas e femorais: avaliadas abaixo do umbigo, em ambos os lados, podem revelar obstruções ou dilatações vasculares.
Pontos vasculares. Bates

Percussão

A percussão abdominal é a terceira etapa do exame físico e procura avaliar o conteúdo das cavidades abdominais, delimitando órgãos e identificando a presença de ar, líquidos ou massas. A percussão é realizada utilizando a técnica digito-digital, onde o examinador golpeia suavemente o dedo de uma mão com o dedo da outra sobre a parede abdominal do paciente, avaliando os sons gerados.

Técnica de percussão. Baré

Sons obtidos na percussão 

  • Timpanismo: o som timpânico é produzido quando há presença de ar nas alças intestinais e é o som predominante na maioria do abdômen, sobre principalmente o intestino delgado e o cólon. O aumento do timpanismo pode indicar distensão por gases, comum em quadros de obstrução intestinal ou distúrbios de absorção. 
  • Macicez: a macicez indica a presença de tecido sólido ou líquido. Esse som é ouvido ao percutir sobre órgãos sólidos, como o fígado ou baço, ou em áreas com acúmulo de líquido, como na ascite. A macicez pode também sugerir a presença de massas abdominais, como tumores ou fecalomas. 
  • Submacicez: é um som intermediário entre o timpânico e o maciço, geralmente encontrado em áreas de transição entre as alças intestinais e órgãos sólidos ou entre alças intestinais preenchidas com conteúdo sólido. 

Procedimentos importantes na percussão abdominal 

  • Delimitação do fígado: a percussão é usada para determinar os limites hepáticos. O examinador percurte o hemitórax direito, descendo a linha hemiclavicular, até que o som claro pulmonar seja substituído por um som maciço, indicando a borda superior do fígado. A partir daí, percurte-se inferiormente para localizar a borda inferior, que normalmente está a 1-2 cm abaixo do rebordo costal em adultos.
Hepatimetria. Bates
  • Espaço de Traube: localizado no hipocôndrio esquerdo, o espaço de Traube normalmente produz um som timpânico devido à presença de ar no estômago. A perda desse som (macicez) pode indicar esplenomegalia (aumento do baço), além de outras condições, como derrame pleural ou massas.

Pesquisa de Ascite

Sinal do Piparote: com uma mão na linha média do abdômen, o examinador percurte um dos flancos enquanto sente a transmissão de ondas líquidas no flanco oposto. A presença desse sinal sugere ascite significativa (geralmente >5 litros). 

Piparote. Porto

Macicez móvel: com o paciente em decúbito dorsal, a percussão revela áreas de macicez nos flancos e timpanismo central. Ao virar o paciente lateralmente, se o líquido se mover, a área previamente timpânica pode se tornar maciça, confirmando a presença de ascite.

Macicez móvel. Alvarez

Palpação 

A palpação abdominal é a última etapa do exame físico abdominal e visa avaliar a sensibilidade, a presença de massas, o tamanho dos órgãos e identificar sinais de irritação peritoneal. A palpação pode ser realizada de forma superficial ou profunda, dependendo do que se deseja investigar. Durante a palpação, o paciente deve estar em decúbito dorsal, com as pernas levemente flexionadas para relaxar a musculatura abdominal. 

Palpação Superficial 

A palpação superficial é feita com o uso das polpas digitais dos dedos, de maneira suave e sem profundidade, em todos os quadrantes abdominais. Essa técnica é utilizada para avaliar: 

  • Sensibilidade: o examinador verifica se há dor à palpação leve, o que pode sugerir inflamações ou irritações localizadas. 
  • Tensão da parede abdominal: rigidez involuntária ou “abdome em tábua” pode indicar irritação peritoneal grave, como em casos de peritonite. 
  • Presença de massas superficiais: a palpação pode detectar tumores, hérnias ou outras alterações palpáveis próximas à superfície.
Palpação superficial. Porto

Palpação Profunda 

A palpação profunda é realizada pressionando-se de maneira mais firme, mas sempre com cuidado para evitar desconforto excessivo ao paciente. Utiliza-se a técnica de sobreposição manual, onde uma mão é posicionada sobre a outra para aplicar pressão controlada. Os principais objetivos da palpação profunda são:

Palpação profunda. Porto

Fígado: a borda hepática pode ser palpada durante uma inspiração profunda, sendo normalmente macia e não dolorosa. Hepatomegalias (aumento do fígado) podem ser detectadas pela palpação abaixo do rebordo costal direito. 

Palpação do fígado. Bates

Baço: a palpação esplênica é feita com o paciente deitado ou em posição especial (decúbito lateral direito). Esplenomegalias podem ser detectadas se o baço for palpável além do rebordo costal esquerdo.

Palpação do baço. Bates

Massas abdominais: a palpação profunda permite caracterizar massas abdominais quanto à sua consistência (mole, firme, rígida), mobilidade, localização e sensibilidade. Essas características ajudam a diferenciar tumores, abscessos, fecalomas ou outras massas. 

Descompressão brusca: conhecido como o sinal de Blumberg, é um teste para irritação peritoneal. Consiste em pressionar profundamente uma área do abdômen e, em seguida, soltar rapidamente. A dor intensa que surge imediatamente após a retirada da pressão sugere inflamação do peritônio, como ocorre em apendicite, peritonite e outras condições. 

Sinal de Blumberg. Estratégia MED

Sinal de Murphy: utilizado para avaliar a vesícula biliar. O paciente é instruído a inspirar profundamente enquanto o examinador pressiona o hipocôndrio direito. Se o paciente interromper abruptamente a inspiração devido à dor, o teste é considerado positivo, sugerindo colecistite aguda.

Sinal de Murphy. Estratégia MED

Venha fazer parte da maior plataforma de Medicina do Brasil! O Estrategia MED possui os materiais mais atualizados e cursos ministrados por especialistas na área. Não perca a oportunidade de elevar seus estudos, inscreva-se agora e comece a construir um caminho de excelência na medicina! 

Veja Também

Referências Bibliográficas 

  1. BATES, propedêutica médica / Lynn S. Bickley; Peter G. Szilagyi; tradução Maria de Fátima Azevedo. – 11. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2015.
  1. BARÉ, Gerardo M.; CALIFANO, Jorge E. Semiotecnia: maniobras de exploración. 4. ed. México: McGraw-Hill Interamericana.
  1. ARGENTE, Horacio A.; ÁLVAREZ, Marcelo. Semiología médica: fisiopatología, semiotecnia y propedéutica. 3. ed. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Médica Panamericana, 2021.
  1. PORTO, Celmo Celeno. Semiologia médica. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2019.
Você pode gostar também