Resumo da Síndrome Aguda da Radiação: riscos e mais!
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Resumo da Síndrome Aguda da Radiação: riscos e mais!

Olá, querido doutor e doutora! A síndrome aguda da radiação representa um conjunto de manifestações sistêmicas desencadeadas por exposição intensa e breve a radiação ionizante, afetando preferencialmente tecidos de alta renovação celular. O reconhecimento das fases clínicas e das diferentes subsíndromes permite estimar a gravidade da exposição e orientar o manejo inicial. 

A evolução pode variar de recuperação gradual a falência orgânica acelerada, conforme a dose absorvida.

O que é Síndrome aguda da radiação 

A síndrome aguda da radiação corresponde a um conjunto de manifestações sistêmicas decorrentes da exposição súbita a radiação ionizante, geralmente em doses superiores a 1 Gy, atingindo todo o corpo ou sua maior parte. 

A agressão ocorre em intervalo curto, com deposição rápida de energia nos tecidos e dano imediato às células, especialmente aquelas de alta taxa de renovação, como medula óssea, epitélio gastrointestinal e camadas basais da pele. A apresentação envolve progressão por fases clínicas sucessivas, refletindo o grau de lesão tecidual e a intensidade da dose absorvida.

Etiologia e mecanismos fisiopatológicos  

Fontes de exposição

A síndrome aguda da radiação resulta de exposição intensa e abrupta a radiação ionizante, geralmente por acidentes nucleares, falhas em equipamentos de radioterapia, manipulação inadequada de radioisótopos ou eventos intencionais envolvendo dispositivos radiológicos. A maioria dos casos decorre de radiações penetrantes, como raios gama e raios-x, enquanto partículas alfa e beta podem causar lesões internas quando ingeridas ou inaladas.

Tipos de radiação e características de penetração

A radiação alfa possui baixa penetração e lesões ocorrem principalmente após incorporação interna. A radiação beta penetra poucos milímetros e pode gerar queimaduras cutâneas. Os raios gama e raios-x atravessam tecidos com facilidade, sendo os principais responsáveis pela síndrome sistêmica. Nêutrons apresentam alto potencial de dano pela capacidade de ativação de núcleos celulares e pela elevada transferência linear de energia.

Unidades de dose e efeito biológico

A absorção é quantificada em Gray (Gy), unidade que expressa a energia depositada por quilograma de tecido. A estimativa de risco biológico utiliza o Sievert (Sv), que incorpora o tipo de radiação por meio de fatores de ponderação. Doses acima de 1 Gy são capazes de desencadear o quadro, com lesões progressivamente mais extensas conforme aumenta a deposição de energia nos tecidos.

Dano celular inicial

A agressão ocorre em microssegundos, com ionização das moléculas, quebra de fios de DNA e formação de radicais livres. Tecidos com elevada taxa de renovação, como medula óssea, criptas intestinais e camada basal da pele, sofrem maior destruição celular. A perda de células progenitoras impede a reposição adequada dos tecidos, alimentando o ciclo de disfunção orgânica.

Progressão fisiopatológica

A partir do dano inicial, instala-se um processo de inflamação sistêmica, disfunção microvascular e perda da integridade de barreiras epiteliais. A medula óssea evolui para linfopenia, neutropenia e trombocitopenia, enquanto o trato gastrointestinal apresenta comprometimento da mucosa e risco de translocação bacteriana. Em exposições mais altas, a radiação atinge sistema nervoso central e vasculatura, desencadeando colapso circulatório e falência multissistêmica.

Epidemiologia e fatores associados

A síndrome aguda da radiação é incomum, com poucas centenas de casos documentados em registros internacionais. A maioria dos episódios conhecidos ocorreu em acidentes nucleares, incluindo cenários industriais, laboratoriais e eventos de grande escala. Grupos profissionais como trabalhadores de usinas nucleares, técnicos em radiologia, equipes de emergência e indivíduos expostos em zonas de conflito com armamentos radiológicos constituem populações de risco. Crianças e idosos apresentam suscetibilidade aumentada devido à menor reserva fisiológica e maior sensibilidade tecidual.

Entre os fatores associados destacam-se exposição ocupacional repetida, falhas de contenção em ambientes de manipulação de radioisótopos e contato com materiais emissivos em contextos de terrorismo. Condições clínicas como diabetes, hipertireoidismo, doenças autoimunes e síndromes genéticas relacionadas à instabilidade cromossômica podem amplificar a resposta ao dano por radiação. Alguns fármacos, especialmente quimioterápicos, também elevam a radiossensibilidade, favorecendo quadros mais graves diante de exposições equivalentes.

Avaliação clínica

Fase prodrômica

Caracteriza-se por náuseas, vômitos, mal-estar, cefaleia e anorexia, surgindo minutos a horas após a exposição. Quanto menor for o intervalo até o início dos sintomas, maior a probabilidade de dose elevada. Podem ocorrer febre leve, eritema cutâneo transitório, parotidite e diarreia nos casos de dose mais alta.

Período de latência

Há melhora parcial dos sintomas, com sensação transitória de recuperação. Esse período dura de horas a semanas e tende a ser mais curto em exposições maiores. Em doses muito altas, pode não existir fase latente.

Período de manifestação da doença

Corresponde ao surgimento das subsíndromes:

Síndrome hematopoiética: instala-se em exposições a partir de 0,7 Gy, com queda progressiva de linfócitos, seguida de neutropenia e trombocitopenia. Febre, infecções recorrentes, hemorragias e anemia são achados comuns.

Síndrome gastrointestinal: ocorre geralmente acima de 6 Gy. Há vômitos intensos, diarreia volumosa, dor abdominal e desidratação. A destruição das criptas intestinais leva à perda de barreira mucosa e risco elevado de sepse.

Síndrome neurovascular: manifesta-se em exposições ≥ 8 Gy, iniciando-se com náuseas abruptas, vômitos e confusão, evoluindo para prostração, hipotensão, alterações neurológicas, instabilidade hemodinâmica e rápida deterioração.

Manifestações cutâneas: podem surgir em exposições sistêmicas ou focais. Incluem eritema, epilação, desidratação cutânea, bolhas e ulcerações, com evolução tardia para radionecrose em doses elevadas.

Recuperação ou morte

Pacientes expostos a doses moderadas podem recuperar-se ao longo de semanas ou meses, acompanhados de reconstituição hematológica gradual. Em exposições intensas, predominam falência orgânica progressiva, choque e morte em poucos dias.

Diagnóstico 

Avaliação clínica inicial

A identificação da síndrome aguda da radiação baseia-se na história de exposição, no tempo de início dos sintomas e na progressão clínica por fases. A avaliação preliminar considera o intervalo até o vômito pós-exposição, padrão das manifestações prodrômicas, presença de linfopenia precoce e indícios de contaminação ambiental. A anamnese deve explorar localização no evento, possível incorporação de partículas e comorbidades que aumentam a radiossensibilidade.

Estimativa de dose

A estimativa da dose recebida é parte central do diagnóstico. Parâmetros úteis incluem tempo até o início do vômito, cinética de queda de linfócitos, achados cromossômicos e leitura por detectores de radiação quando disponíveis. A análise de dicêntricos cromossômicos em linfócitos é considerada um método de alta precisão para exposições superiores a 0,1 Gy.

Exames laboratoriais

O hemograma seriado é o exame básico e obrigatório em qualquer suspeita. A queda sustentada de linfócitos nas primeiras 24 a 48 horas sugere exposição significativa. Monitoram-se também neutrófilos, plaquetas, hemoglobina e marcadores de inflamação. Biomarcadores como citrulina, FLT-3 ligand e níveis de amilase podem auxiliar na avaliação de dano gastrointestinal e hematopoiético.

Métodos de imagem

A imagem tem papel complementar, principalmente para avaliar lesões cutâneas e complicações associadas. Ultrassonografia, perfis Doppler e PET podem demonstrar alterações vasculares, inflamação intestinal e mudanças no metabolismo da medula óssea. Em pacientes com exposições muito altas, evitam-se exames que utilizam radiação, priorizando métodos não ionizantes.

Avaliação de contaminação

A pesquisa de contaminação externa é feita com detectores específicos, e o exame com swab nasal auxilia na suspeita de incorporação de partículas. Urina e fezes podem ser analisadas para quantificar radioisótopos e estimar dose interna. Em cenários de suspeita de dano hematopoiético persistente, aspirado e biópsia de medula óssea entre o 14º e o 21º dia podem avaliar a capacidade residual de hematopoiese.

Tratamento

Abordagem inicial e suporte vital

O tratamento começa sempre pela estabilização hemodinâmica e respiratória, priorizando medidas que preservem vida e função de órgãos. Reposição de fluidos e eletrólitos, controle rigoroso da dor, antieméticos após estimativa inicial de dose e correção de distúrbios metabólicos são pilares do cuidado. Em pacientes críticos são indicados ventilação mecânica com estratégia protetora, controle de glicemia em faixa intermediária e monitorização intensiva de sinais de disfunção orgânica.

Descontaminação e manejo da exposição

A descompressão da cena e o atendimento em ambiente seguro precedem qualquer tentativa de descontaminação. A remoção das roupas e a lavagem suave da pele com água e sabão reduzem de forma significativa a contaminação externa. Wounds devem ser irrigadas e limpas com cuidado, evitando procedimentos agressivos. Na suspeita de incorporação interna, avalia se a necessidade de medidas específicas, como iodeto de potássio para radioiodo, azul da Prússia para césio ou DTPA para actinídeos, sempre que disponíveis e conforme o radionuclídeo envolvido.

Manejo da síndrome hematopoiética

Em exposições que cursam com neutropenia significativa, o uso de fatores de crescimento hematopoiético como G CSF, GM CSF ou análogos é recomendado quando a contagem absoluta de neutrófilos cai abaixo de 0,5 x 10⁹ por litro. Esses agentes são mantidos até recuperação sustentada da neutrofilia na ausência de infecção ativa. Transfusões de concentrado de hemácias e plaquetas são utilizadas conforme sinais de anemia sintomática e sangramentos, preferencialmente com hemocomponentes leucorreduzidos e irradiados. Em casos de aplasia persistente após algumas semanas de terapia com citocinas, pode se considerar transplante de células-tronco hematopoiéticas, desde que não haja falência grave de outros órgãos.

Manejo da síndrome gastrointestinal e suporte nutricional

A síndrome gastrointestinal exige hidratação vigorosa, correção de distúrbios eletrolíticos e controle de vômitos e diarreia. Antieméticos, como antagonistas de receptor de serotonina, reduzem náuseas intensas, enquanto loperamida pode ser utilizada para diarreia importante, com vigilância para íleo. A perda de integridade da mucosa intestinal aumenta o risco de sepse, motivo pelo qual se indica frequentemente profilaxia ou tratamento empírico com antibióticos de amplo espectro, especialmente em pacientes neutropênicos. A nutrição preferencialmente é enteral, com início precoce, mas nutrição parenteral pode ser necessária em quadros de intolerância digestiva grave.

Manejo da síndrome neurovascular e falência orgânica

Nas exposições de alta dose, com envolvimento neurovascular, o tratamento concentra se em medidas de suporte intensivo, controle de edema cerebral, analgesia adequada e sedação quando indicada. Nesses cenários, a evolução costuma ser rápida para instabilidade hemodinâmica e falência multissistêmica, sendo frequentes decisões de limitação terapêutica baseadas no prognóstico extremamente reservado.

Tratamento das manifestações cutâneas

Lesões cutâneas relacionadas à radiação são tratadas com corticosteroide tópico de média a alta potência, antibióticos tópicos e anti histamínicos locais para prurido e desconforto. Deve se evitar corticosteroide sistêmico exclusivamente para queimaduras por radiação, salvo outra indicação clínica. Ulcerações extensas, radionecrose ou dor intratável podem exigir excisão cirúrgica e enxertia de pele, com acompanhamento de equipe de cirurgia plástica reconstrutora. O controle de infecção local, analgesia otimizada e acompanhamento seriado da profundidade da lesão são indispensáveis para preservar a função e limitar sequelas.

Estratégias de antibióticos, antifúngicos e antivirais

Pacientes com neutropenia prolongada ou febre são estratificados em grupos de risco para orientar terapia antimicrobiana empírica. Casos de maior risco recebem antibióticos intravenosos de amplo espectro, com cobertura para bacilos gram negativos, associando antifúngicos e antivirais conforme perfil clínico, sorologias prévias e achados de imagem. O objetivo é reduzir a mortalidade por sepse em cenário de profunda imunossupressão induzida pela radiação.

Terapias de decorporação e medidas específicas

Quando identificados radionuclídeos internos, utilizam se agentes de decorporação que modificam a cinética e facilitam a eliminação. Exemplos incluem DTPA para plutônio, amerício e cúrio, azul da Prússia para césio e tálio, soluções de fosfato para fósforo radioativo e alcalinização urinária com bicarbonato em exposição a urânio. A escolha do agente, da via e da duração baseia se no tipo de radionuclídeo, na via de exposição e na avaliação de dose interna estimada por exames de bioensaio.

Critérios de internação, terapia intensiva e seguimento

A necessidade de internação é guiada pela gravidade das subsíndromes hematopoiética, gastrointestinal, neurovascular e cutânea, bem como por comorbidades e presença de lesões traumáticas associadas. Pacientes com toxicidade grau moderado ou grave geralmente requerem hospitalização prolongada em centros com experiência em cuidados de pacientes pancitopênicos. Casos muito graves, com falência orgânica múltipla, são manejados em terapia intensiva, com foco em suporte, controle de infecção e decisões compartilhadas sobre extensão terapêutica.

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Referências Bibliográficas 

  1. EBSCO Information Services. Acute Radiation Syndrome – DynaMed. Ipswich: DynaMed; 2025.

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