Olá, querido doutor e doutora! Durante a gestação, algumas alterações fisiológicas podem provocar sintomas pouco discutidos, mas altamente impactantes. O ptialismo gravídico, caracterizado pela salivação exagerada e involuntária, pode comprometer o bem-estar físico, emocional e social da gestante. Embora seja uma condição rara, sua intensidade em certos casos justifica atenção clínica e manejo específico. Confira os principais aspectos do quadro, desde os mecanismos envolvidos até as opções terapêuticas seguras durante a gravidez.
Algumas pacientes chegam a relatar a produção de mais de dois litros de saliva por dia, afetando significativamente sua rotina.
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Conceito
A hipersalivação na gestação, conhecida como ptialismo gravídico, é uma condição caracterizada pela produção aumentada e involuntária de saliva durante a gestação, geralmente manifestando-se nas primeiras semanas. A saliva torna-se abundante, espessa e de sabor amargo, provocando desconforto físico e social relevante.
Muitas gestantes relatam a necessidade constante de cuspir ou utilizar toalhas e copos para conter o excesso de secreção, uma vez que engolir a saliva pode gerar náuseas ou até reflexo de vômito. Apesar de não representar risco direto à gestação, pode prejudicar de forma significativa o bem-estar da paciente, afetando alimentação, sono e convívio social.
Fisiopatologia
A fisiopatologia do ptialismo gravídico ainda não é completamente compreendida, mas acredita-se que envolva uma combinação de fatores hormonais, neurológicos e gastrointestinais. Durante a gestação, ocorre um aumento da estimulação parassimpática, especialmente pelas alterações nos níveis de estrogênio e hCG, que podem influenciar os centros reguladores da salivação no sistema nervoso central.
Além disso, a redução do pH salivar e a queda da pressão do esfíncter esofágico inferior, comum no início da gravidez, favorecem episódios de refluxo gastroesofágico, os quais ativam o reflexo esofágico-salivar, intensificando ainda mais a produção de saliva. Algumas gestantes podem apresentar também hipersensibilidade ao estímulo oral ou dificuldade em engolir a própria saliva, o que contribui para o acúmulo e necessidade constante de expectoração.
Epidemiologia e fatores de risco
O ptialismo gravídico é uma condição pouco frequente, com prevalência bastante variável entre diferentes regiões do mundo. Estimativas indicam taxas em torno de 0,08% nos Estados Unidos e até 0,3% no Japão, enquanto em alguns países africanos e no Caribe a incidência pode ultrapassar 30% das gestantes, o que sugere uma possível influência genética e cultural.
Entre os fatores de risco descritos, destacam-se:
- Histórico pessoal ou familiar da condição, com recorrência em gestações subsequentes;
- Hiperêmese gravídica, com a qual frequentemente coexiste;
- Refluxo gastroesofágico, que pode estimular o reflexo salivar;
- Geofagia, prática alimentar comum em algumas culturas, que pode alterar o pH oral e aumentar a salivação;
- Fatores emocionais, como ansiedade e estresse, que podem interferir na deglutição da saliva;
- Sexo fetal masculino, descrito em algumas observações clínicas como mais frequente nesses casos.
Avaliação clínica
O ptialismo gravídico se manifesta por uma salivação intensa, espessa e contínua, geralmente com início entre a 2ª e a 8ª semana de gestação. A paciente pode produzir até 2 litros de saliva por dia, o que a obriga a cuspir constantemente ou carregar toalhas e copos para conter o excesso. Tentar engolir a saliva frequentemente desencadeia náuseas ou ânsia de vômito, agravando ainda mais o desconforto.
Outros achados comuns incluem:
- Distúrbios do sono, devido ao acúmulo de saliva na cavidade oral;
- Irritação da mucosa oral, com fissuras, língua avermelhada e dor;
- Maceramento da pele do queixo e pescoço;
- Inchaço das glândulas salivares e sensação de pressão facial;
- Perda de apetite e redução da ingestão alimentar;
- Emagrecimento e fadiga;
- Desconforto emocional, ansiedade e retraimento social, pela limitação nas interações e no ambiente de trabalho.
Em casos mais graves, o impacto psicológico pode ser tão significativo que leva algumas pacientes a considerarem a interrupção da gestação.
Diagnóstico
O diagnóstico do ptialismo gravídico é clínico, baseado na observação da salivação excessiva em uma gestante sem causas locais ou sistêmicas identificáveis. Costuma-se considerar o diagnóstico quando a paciente relata produção persistente de grandes volumes de saliva, associada à incapacidade de engolir o conteúdo salivar, sem evidência de infecção oral, distúrbios neurológicos ou uso de medicamentos sialagogos.
Para afastar outras causas de hipersalivação, a avaliação pode incluir:
- História clínica detalhada, incluindo sintomas de refluxo gastroesofágico, hiperêmese gravídica e práticas como geofagia;
- Exame físico, com inspeção da cavidade oral e glândulas salivares;
- Dosagens laboratoriais, em casos selecionados, para verificar deficiências nutricionais ou distúrbios metabólicos (ex.: ferro, B12);
- Avaliação neurológica, quando há sinais atípicos ou associação com sialorreia em repouso ou fora da gestação.
A exclusão de causas secundárias é importante para confirmar que a hipersalivação está realmente associada à gestação e não a outras condições clínicas.
Tratamento
O manejo do ptialismo gravídico é desafiador, principalmente pela escassez de evidências científicas consolidadas e pela necessidade de garantir segurança fetal. Na maioria dos casos, o tratamento é conservador e visa melhorar o conforto da gestante por meio de estratégias comportamentais e, quando necessário, intervenção medicamentosa cuidadosamente avaliada.
Medidas não farmacológicas
- Chicletes e balas duras: estimulam a deglutição e ajudam a reduzir o acúmulo salivar.
- Fracionamento das refeições: com alimentos secos, como torradas ou biscoitos salgados.
- Evitar alimentos ácidos ou condimentados, que podem intensificar a salivação.
- Uso de toalhas, copos ou lenços absorventes para lidar com o excesso de saliva.
- Apoio psicológico, especialmente em casos com impacto emocional ou social relevante.
Terapias farmacológicas
- Clonidina oral (0,05 a 0,1 mg/dia): utilizada off-label, tem como efeito colateral a xerostomia, sendo promissora em alguns relatos de caso. Seu uso deve ser individualizado, com monitoramento da pressão arterial materna, já que é um anti-hipertensivo.
- Anticolinérgicos tópicos, como escopolamina transdérmica ou glicopirrolato oral, são opções com bons resultados em outros contextos clínicos, mas ainda sem segurança comprovada na gestação.
- Prometazina com alcaloides da beladona: demonstraram benefício em casos específicos, mas exigem cautela pelo perfil de efeitos adversos.
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Referências Bibliográficas
- DE BRAGA, Victoria; DAHDOUH, Elias M.; BALAYLA, Jacques. Successful treatment of ptyalism gravidarum with clonidine hydrochloride: a case report. Case Reports in Women’s Health, v. 34, p. e00409, 2022.
- MORTON, Adam; HE, Jin-Wen. Ptyalism gravidarum. Obstetric Medicine, 2024.