Olá, querido doutor e doutora! A lesão do ligamento cruzado anterior (LCA) representa uma das causas mais comuns de instabilidade do joelho, principalmente em indivíduos jovens e atletas. Sua ocorrência está relacionada a movimentos de torção, desaceleração ou aterrissagem inadequada, que geram ruptura parcial ou total das fibras ligamentares.
A maioria dos pacientes submetidos à reconstrução do LCA recupera função normal ou quase normal do joelho após o tratamento, especialmente quando seguem protocolos de reabilitação progressiva.
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O que é Lesão do ligamento cruzado anterior do joelho
A lesão do ligamento cruzado anterior (LCA) consiste em um estiramento, ruptura parcial ou completa das fibras que compõem esse ligamento, responsável por estabilizar o joelho nos planos anterior e rotacional. Ocorre, na maioria das vezes, durante movimentos de torção súbita, desaceleração brusca, ou aterrissagem incorreta após um salto, especialmente em atividades esportivas.
Anatomia
Morfologia e estrutura
O LCA possui cerca de 32 a 38 mm de comprimento e 7 a 12 mm de largura. É formado por dois feixes principais:
- Feixe anteromedial: mais tenso na flexão, limita a translação anterior da tíbia.
- Feixe pôsterolateral: mais tenso na extensão, controla a rotação interna e a estabilidade medial-lateral.
Essa disposição anatômica permite que o LCA atue de forma integrada durante os diferentes graus de flexoextensão do joelho, garantindo controle dinâmico e proprioceptivo.
Função Biomecânica
O LCA resiste à translação anterior da tíbia sobre o fêmur e contribui para limitar a rotação interna e o valgo excessivo. Em conjunto com o ligamento cruzado posterior (LCP), forma um “X” dentro da articulação, coordenando os movimentos de deslizamento e rotação entre os côndilos femorais e a tíbia.
Sua força de ruptura média é de aproximadamente 2.200 N, o que evidencia sua resistência, embora seja vulnerável a torções com desaceleração ou aterrissagem em extensão.
Suprimento Vascular e Inervação
A vascularização é fornecida principalmente pela artéria genicular média, que assegura nutrição às fibras ligamentares. A inervação deriva de ramos do nervo tibial, responsáveis por mecanismos proprioceptivos que informam o cérebro sobre a posição e o movimento do joelho.
Mecanismo de lesão
A lesão do LCA acontece quando forças aplicadas ao joelho superam a resistência das fibras ligamentares, provocando estiramento ou ruptura parcial ou completa. Em grande parte dos casos, o trauma ocorre sem contato direto, geralmente durante mudanças bruscas de direção, aterrissagem de um salto ou desaceleração súbita. Nesses movimentos, o pé permanece fixo no solo enquanto o corpo gira, gerando valgo e rotação interna do joelho. A contração intensa do quadríceps, associada à pouca ativação dos isquiotibiais, aumenta ainda mais a tração anterior da tíbia sobre o fêmur, resultando na ruptura do ligamento.
O mecanismo com contato direto representa uma parcela menor dos casos e surge quando há impacto lateral sobre o joelho, forçando o valgo e a rotação externa da tíbia. Esse tipo de trauma é comum em esportes de contato, como futebol americano e rugby, e pode estar associado a lesões do ligamento colateral medial e dos meniscos.
Alguns fatores aumentam a vulnerabilidade à ruptura, como ângulo Q elevado, inclinação tibial posterior acentuada, fraqueza dos isquiotibiais e fadiga muscular. Nas mulheres, o risco é maior devido à laxidade articular aumentada, padrões de aterrissagem em valgo e influência hormonal cíclica.
Durante o evento traumático, o paciente costuma relatar um estalo audível (“pop”), seguido de dor aguda e inchaço imediato, resultado da hemartrose. Após o episódio, há instabilidade ao caminhar ou girar sobre o membro afetado, caracterizando o comprometimento da estabilidade anterior e rotacional do joelho.
Epidemiologia
A lesão do LCA é uma das mais frequentes entre as patologias do joelho e representa quase metade das lesões ligamentares dessa articulação. A incidência anual estimada é de 1 caso para cada 3.000 a 3.500 pessoas, com uma média de 200.000 a 400.000 novos casos por ano em países como os Estados Unidos. A maioria dos pacientes são adultos jovens e fisicamente ativos, especialmente aqueles envolvidos em esportes que exigem mudanças rápidas de direção, saltos e desaceleração súbita.
O pico de ocorrência situa-se entre os 15 e 30 anos, período em que há maior exposição a atividades esportivas competitivas. A incidência aumenta novamente na faixa dos 40 a 50 anos, geralmente em indivíduos que mantêm prática esportiva recreativa.
A diferença entre os sexos é marcante: mulheres apresentam um risco duas a oito vezes maior de ruptura do LCA em comparação aos homens que praticam o mesmo esporte. Esse padrão está relacionado a fatores anatômicos, hormonais e neuromusculares, como maior ângulo Q, intercondilo femoral mais estreito, maior laxidade ligamentar e padrão de aterrissagem em valgo com menor flexão do joelho.
Os esportes de maior risco incluem futebol, basquete, vôlei, ginástica, esqui e handebol, nos quais há movimentos frequentes de corte e rotação. Em esportes de contato, como rugby e futebol americano, as lesões ocorrem tanto por mecanismos diretos (colisões laterais) quanto indiretos (mudanças de direção com o pé fixo).
Nas últimas décadas, observou-se um aumento progressivo das reconstruções do LCA, especialmente em crianças e adolescentes, devido à maior participação em esportes competitivos. Em contraste, indivíduos com estilo de vida sedentário e menor demanda funcional apresentam incidência mais baixa e, quando lesionados, costumam responder bem ao tratamento conservador.
Avaliação clínica
Manifestações iniciais
A lesão do LCA geralmente ocorre durante uma manobra esportiva que combina valgo, rotação e desaceleração súbita. O paciente costuma relatar um estalo audível no momento do trauma, acompanhado de dor intensa e inchaço rápido. O edema se instala em poucas horas devido à hemartrose intra-articular.
Na avaliação inicial, o joelho apresenta aumento de volume, calor local e limitação para flexão e extensão. O paciente descreve frequentemente a sensação de que o joelho “saiu do lugar e voltou”, indicando o deslocamento anterior súbito da tíbia em relação ao fêmur.
Com a redução da dor e do edema nos dias seguintes, tornam-se evidentes os episódios de instabilidade funcional, especialmente durante mudanças de direção, saltos ou descidas de escada. Muitos pacientes relatam falseios repetidos, que refletem a perda de controle rotacional e anterior do joelho.
Achados do exame físico
O exame físico deve ser realizado com o paciente relaxado, preferencialmente após controle do edema e da dor. As principais manobras utilizadas para avaliar o LCA são:
Teste de Lachman
É o mais sensível para detectar ruptura do LCA. O examinador posiciona o joelho a cerca de 20 a 30 graus de flexão, estabiliza o fêmur com uma mão e traciona a tíbia anteriormente com a outra.
- Resultado positivo: aumento da translação anterior da tíbia e ausência de um ponto final firme.
- Indica: ruptura completa ou parcial do LCA.
Teste da gaveta anterior
Realizado com o joelho a 90 graus de flexão e o pé apoiado na mesa. O examinador puxa a tíbia anteriormente.
- Resultado positivo: deslocamento anterior acentuado da tíbia em relação ao fêmur.
- Tem maior sensibilidade em lesões crônicas.
Teste do pivot shift
Reproduz a sensação de instabilidade experimentada pelo paciente. Com o joelho em extensão, o examinador aplica rotação interna e estresse em valgo, flexionando lentamente o joelho.
- Resultado positivo: ocorre subluxação e redução súbita da tíbia, percebida como um “clunk”.
- Altamente específico para lesão do LCA, mas pode ser difícil de realizar na fase aguda.
Sinal de alavanca
Com o paciente em decúbito dorsal e o punho do examinador sob a panturrilha, aplica-se uma leve pressão sobre a coxa.
- Resultado positivo: o calcanhar não se eleva da mesa, sugerindo ruptura do LCA.
Diagnóstico
Avaliação clínica
O diagnóstico é inicialmente suspeito diante de um paciente que relata estalo audível, dor aguda e edema imediato após movimento de torção do joelho. Na fase subaguda, a instabilidade ao caminhar ou girar sobre o membro afetado reforça a hipótese de ruptura do LCA.
O exame físico é o principal instrumento diagnóstico, e sua acurácia aumenta após redução do edema e relaxamento muscular.
- O teste de Lachman é o mais sensível e deve ser realizado de rotina.
- O teste da gaveta anterior auxilia na confirmação, principalmente em lesões crônicas.
- O pivot shift, quando positivo, tem alta especificidade para ruptura completa.
- O sinal de alavanca é útil como alternativa rápida e objetiva.
Exames de imagem
Os exames complementares são utilizados para confirmar a lesão e avaliar estruturas associadas.
Radiografia
Deve ser solicitada em todos os casos de trauma agudo do joelho para excluir fraturas ou avulsões ósseas. O sinal de Segond, caracterizado por uma pequena avulsão do platô tibial lateral, é altamente sugestivo de ruptura do LCA.
Ressonância Magnética (RM)
É o padrão-ouro não invasivo para o diagnóstico. Apresenta sensibilidade em torno de 85–95% e especificidade próxima de 90–100%.
Os achados típicos incluem:
- Discontinuidade das fibras ligamentares;
- Alteração no trajeto normal do ligamento, com aspecto afrouxado ou achatado;
- Sinal hiperintenso em T2, indicando edema ou ruptura;
- Edema ósseo no côndilo femoral lateral e platô tibial posterior;
- Presença de lesões meniscais, condrais ou de outros ligamentos associadas.
Ultrassonografia
Tem aplicação limitada, mas pode ser útil em situações agudas para detectar derrame articular ou lesões superficiais associadas.
Artroscopia diagnóstica
É o método mais preciso e pode confirmar o diagnóstico quando há dúvida após os exames não invasivos. Além da avaliação direta do ligamento, permite o tratamento simultâneo de lesões associadas.
Diagnóstico diferencial
Diversas condições podem simular sintomas semelhantes e devem ser consideradas:
- Lesão do ligamento colateral medial ou lateral;
- Ruptura do ligamento cruzado posterior;
- Lesões meniscais isoladas;
- Luxação patelar;
- Fraturas osteocondrais ou do planalto tibial.
Tratamento
O tratamento visa restaurar a estabilidade do joelho, aliviar sintomas e permitir o retorno seguro às atividades físicas. A escolha entre abordagem conservadora ou cirúrgica depende da idade, nível de atividade e grau de instabilidade.
Na fase aguda, o manejo inclui repouso, gelo, compressão e elevação (RICE), uso de anti-inflamatórios e início precoce de fisioterapia para recuperar amplitude de movimento e ativar o quadríceps. A mobilização precoce previne rigidez e artrofibrose.
O tratamento não cirúrgico é indicado em pacientes com pouca instabilidade, boa força muscular e menor demanda esportiva. O programa de reabilitação inclui fortalecimento de quadríceps, isquiotibiais e musculatura do core, treino proprioceptivo e retorno gradual à atividade. Mesmo com bons resultados, há risco aumentado de falseios recorrentes e lesões meniscais secundárias.
A reconstrução cirúrgica é recomendada para pacientes jovens, atletas e indivíduos com instabilidade persistente. O objetivo é repor a função estabilizadora do ligamento e evitar degeneração articular. Utilizam-se enxertos autólogos de tendão patelar, isquiotibiais ou quadríceps, conforme o perfil do paciente. A reconstrução costuma oferecer melhor estabilidade e menor risco de novas lesões, quando associada a reabilitação adequada.
Após a cirurgia, a reabilitação foca em recuperar extensão completa, força e controle neuromuscular, com ênfase em exercícios de cadeia cinética fechada. O retorno ao esporte ocorre geralmente entre 6 e 9 meses, condicionado à força simétrica e ausência de instabilidade.
Complicações possíveis incluem rigidez, dor anterior, falha do enxerto e artrose tardia. A adesão à reabilitação e o tempo adequado de retorno ao esporte são determinantes para o sucesso funcional.
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Referências Bibliográficas
- DYNAMED. Anterior Cruciate Ligament (ACL) Injury. EBSCO Information Services, 2025. Disponível em: https://www.dynamed.com/condition/anterior-cruciate-ligament-acl-injury.
- EVANS, Jennifer; MABROUK, Ahmed; NIELSON, Jeffery L. Anterior Cruciate Ligament Knee Injury. StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing, 2025. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK499848/.



