Olá, querido doutor e doutora! O supercrescimento bacteriano do intestino delgado (SCBID) é uma condição caracterizada pela proliferação anormal de bactérias no intestino delgado, resultando em sintomas que variam de desconforto gastrointestinal a deficiências nutricionais significativas. Sua identificação e manejo eficaz requerem uma abordagem clínica integrada, considerando fatores de risco, quadro clínico, métodos diagnósticos e estratégias terapêuticas. Este texto tem como objetivo apresentar uma visão geral do SCBID, com foco nas evidências mais recentes para o diagnóstico e tratamento dessa condição.
Pacientes com SCBID frequentemente apresentam deficiência de vitamina B12, causada pelo consumo excessivo dessa vitamina pelas bactérias no intestino delgado.
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Conceito de SCBID
O supercrescimento bacteriano do intestino delgado (SCBID) é caracterizado pela presença excessiva de bactérias no intestino delgado, geralmente oriundas do intestino grosso. Essa condição interfere na digestão e absorção de nutrientes, podendo levar a sintomas gastrointestinais variados, como dor abdominal, inchaço, diarreia e, em casos mais severos, desnutrição. O equilíbrio bacteriano normal é mantido por mecanismos como a acidez gástrica, motilidade intestinal e barreiras imunológicas. Quando esses mecanismos são comprometidos, ocorre o desenvolvimento do SCBID.
Fisiopatologia do SCBID
No SCBID, ocorre um aumento anormal no número de bactérias no intestino delgado, superando a concentração usualmente baixa dessa região. Essas bactérias podem produzir enzimas e toxinas que irritam o revestimento intestinal, causando inflamação e alterações na função digestiva. Além disso, a fermentação de carboidratos não absorvidos pelos microrganismos resulta na produção de gases como hidrogênio e metano, provocando distensão abdominal, flatulência e desconforto.
As bactérias mais frequentemente associadas ao SCBID incluem tanto microrganismos aeróbios quanto anaeróbios, que normalmente habitam o intestino grosso. Entre as principais espécies identificadas estão Escherichia coli, Klebsiella spp. e Aeromonas spp.
As bactérias envolvidas também podem competir por nutrientes, interferindo na absorção de vitaminas e minerais, como a vitamina B12, ao mesmo tempo que utilizam compostos essenciais ao metabolismo humano. Outro mecanismo relevante é a alteração na motilidade intestinal, com redução da capacidade de peristalse, permitindo maior estagnação e proliferação bacteriana. Em alguns casos, a inflamação causada pelas toxinas pode levar a danos na mucosa intestinal, aumentando a permeabilidade e favorecendo outras complicações sistêmicas.
Epidemiologia e Fatores de Risco do SCBID
O SCBID é uma condição cuja prevalência exata ainda é incerta, mas é mais frequentemente observada em pessoas com alterações anatômicas ou funcionais do trato gastrointestinal. Estima-se que cerca de 80 a 90% dos casos estejam associados a distúrbios de motilidade intestinal, como a síndrome do intestino irritável e a pancreatite crônica.
Alguns fatores de risco incluem:
- Idade avançada, devido à redução da acidez gástrica;
- Diabetes mellitus;
- Hipotireoidismo;
- Esclerodermia;
- Uso prolongado de opioides ou inibidores da bomba de prótons (IBPs), que comprometem a motilidade intestinal ou as defesas naturais contra o crescimento bacteriano;
- Alterações anatômicas, como divertículos intestinais, ressecção da válvula ileocecal, aderências pós-cirúrgicas e bypass gástrico.
Quadro Clínico do SCBID
O SCBID pode se manifestar de forma bastante variada, refletindo tanto alterações no trato gastrointestinal quanto repercussões sistêmicas. Os sintomas mais comuns incluem desconforto abdominal persistente, sensação de inchaço e flatulência, muitas vezes acompanhados por diarreia crônica. Em alguns casos, há relato de constipação, especialmente quando o supercrescimento bacteriano é dominado por espécies produtoras de metano.
Pacientes podem também apresentar sintomas relacionados à má absorção de nutrientes, como esteatorreia (fezes gordurosas) e perda de peso não intencional. A deficiência de vitamina B12, causada pelo consumo excessivo dessa vitamina pelas bactérias, pode levar a sinais neurológicos, como fraqueza, formigamento em extremidades e dificuldades de equilíbrio. Deficiências de outras vitaminas, como D, A e K, podem resultar em alterações ósseas, cãibras musculares e hematomas fáceis.
Diagnóstico do SCBID
O diagnóstico do SCBID requer uma combinação de análise clínica detalhada e testes específicos, já que os sintomas podem se sobrepor a outras condições gastrointestinais. Não existe um exame padrão universalmente aceito, mas algumas abordagens são amplamente utilizadas.
Testes de Respiração
Os testes de respiração, como o teste do hidrogênio e metano expirados após a ingestão de lactulose ou glicose, são métodos não invasivos frequentemente utilizados. Esses testes detectam a produção de gases pelas bactérias presentes no intestino delgado. Um aumento significativo nos níveis de hidrogênio (mais de 20 partes por milhão) ou metano dentro de 90 minutos após a ingestão do substrato sugere SCBID. No entanto, esses testes têm limitações, como falsos positivos em pacientes com trânsito intestinal acelerado ou falsos negativos em casos de supercrescimento bacteriano localizado.
Cultura de Aspirado Jejunal
A cultura de aspirado jejunal, obtida por endoscopia, é considerada uma abordagem mais direta para diagnosticar SCBID. Um crescimento bacteriano superior a 10⁵ unidades formadoras de colônia por mililitro (UFC/mL) confirma o diagnóstico. Apesar de ser mais precisa, essa técnica é invasiva, cara e apresenta desafios relacionados à contaminação e à variabilidade dos resultados.
Marcadores Laboratoriais
Alterações nos níveis de vitaminas e marcadores de nutrição também podem apoiar o diagnóstico. Níveis reduzidos de vitamina B12, ferro e albumina, além de elevação nos níveis de ácido fólico, podem indicar a presença do SCBID. Exames que detectam má absorção, como gordura fecal elevada, também podem ser úteis.
Diagnóstico Diferencial
É importante diferenciar o SCBID de condições como síndrome do intestino irritável, doença celíaca e doença inflamatória intestinal, que compartilham sintomas semelhantes. A presença de resultados negativos em testes específicos para essas condições, como sorologias para doença celíaca e marcadores inflamatórios para doença de Crohn, pode reforçar a hipótese de SCBID.
Tratamento do SCBID
O tratamento do SCBID baseia-se em três pilares principais: erradicação do supercrescimento bacteriano, correção de deficiências nutricionais e manejo da causa subjacente para prevenir recorrências.
Terapia Antibiótica
O uso de antibióticos é a base do tratamento para eliminar as bactérias em excesso no intestino delgado. Rifaximina, metronidazol, ciprofloxacino e amoxicilina-clavulanato são opções comumente empregadas, sendo a rifaximina uma das mais estudadas. Para casos de supercrescimento associado a produção predominante de metano, a combinação de rifaximina com neomicina pode ser mais eficaz. O curso típico de tratamento dura de 10 a 14 dias. No entanto, cerca de 45% dos pacientes apresentam recorrência após a terapia inicial, especialmente aqueles com fatores de risco persistentes, como alterações anatômicas ou distúrbios de motilidade.
Suplementação Nutricional
Pacientes com SCBID frequentemente apresentam deficiências de vitaminas e minerais devido à má absorção. A reposição de vitamina B12, ferro, vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K) e outros nutrientes deve ser individualizada, com base nas necessidades específicas de cada paciente. Em casos mais graves, pode ser necessário suporte nutricional mais intensivo.
Tratamento da Causa Subjacente
Identificar e corrigir a causa subjacente do SCBID é fundamental para reduzir as taxas de recorrência. Isso pode incluir o manejo de condições como diabetes mellitus, hipotireoidismo, esclerodermia e insuficiência pancreática. Quando alterações anatômicas, como divertículos intestinais ou ressecção da válvula ileocecal, são responsáveis, pode ser necessário considerar intervenções cirúrgicas.
Dieta e Modificações no Estilo de Vida
Mudanças na dieta podem ajudar a reduzir os sintomas e minimizar o risco de recorrência. A dieta com baixo teor de FODMAPs (oligo, di e monossacarídeos fermentáveis) é frequentemente recomendada para aliviar sintomas como inchaço e diarreia. Em casos refratários ou onde os antibióticos não são tolerados, dietas elementares podem ser utilizadas, embora seu custo e palatabilidade sejam desvantagens.
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Referências Bibliográficas
- SORATHIA, Sufian J.; CHIPPA, Venu; RIVAS, John M. Small Intestinal Bacterial Overgrowth. StatPearls. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing, 2024. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK546634/. Acesso em: 27 dez. 2024.