Resumo sobre Câncer de Uretra: definição, manifestações clínicas e mais!
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Resumo sobre Câncer de Uretra: definição, manifestações clínicas e mais!

E aí, doc! Vamos explorar um tema importante e muitas vezes pouco discutido? Hoje o foco é o Câncer de Uretra, uma condição rara, mas de grande relevância, que afeta as vias urinárias. 

O Estratégia MED está aqui para descomplicar esse assunto e ajudá-lo a aprofundar seu entendimento, aprimorando sua prática clínica e o cuidado com seus pacientes.

Vamos nessa!

Definição de Câncer de Uretra

As neoplasias malignas geniturinárias mais comuns possuem diretrizes bem estabelecidas que auxiliam tanto no tratamento quanto na comunicação entre urologistas e pacientes. No entanto, neoplasias raras, como os tumores de uretra, nem sempre são contempladas em bases de dados nacionais de câncer, o que evidencia a falta de ferramentas padronizadas. 

A baixa incidência, a variação histopatológica conforme a localização e o gênero, e a ausência de protocolos específicos dificultam o acúmulo de experiência clínica, tornando o diagnóstico tardio e o manejo desses casos especialmente desafiadores.

Os tumores de uretra representam menos de 1% das neoplasias geniturinárias. Embora historicamente mais comuns em mulheres, com aumento de incidência relacionado ao envelhecimento, dados da base norte-americana SEER, coletados entre 1973 e 2002, revelaram uma predominância masculina. Dos 1.615 casos de tumores primários de uretra registrados nesse período, 66% ocorreram em homens, com uma incidência anual média de 4,3 casos por milhão de habitantes. Em mulheres, a incidência foi de 1,5 caso por milhão de habitantes, com pico de incidência na faixa etária de 75 a 84 anos.

Outras condições como leucoplasia, carúnculas e papilomas também aumentam o risco. Nos casos de divertículos de uretra feminina, que ocorrem em 1% a 6% das mulheres dependendo da série analisada, há uma associação importante, com cerca de 100 casos descritos na literatura de tumores de uretra desenvolvidos nesses divertículos.

Fatores de risco para Câncer de Uretra

A inflamação crônica desempenha um papel significativo no surgimento do câncer de uretra. Indivíduos com histórico de infecções sexualmente transmissíveis, uretrite ou estenose uretral estão em maior risco. Estudos indicam que, em homens com câncer uretral, a uretrite gonocócica, a estenose uretral e traumas significativos estão presentes em uma proporção considerável dos casos. A estenose uretral, que pode surgir após traumas, é frequentemente encontrada na uretra bulbomembranosa, que também é o segmento uretral mais comumente acometido por câncer.

Nas mulheres, os divertículos uretrais representam um fator de risco importante, implicados no desenvolvimento de câncer em até 5% dos casos. Esses divertículos podem causar estase urinária e infecções, promovendo inflamação crônica que predispõe ao câncer. Estudos demonstraram que, entre mulheres submetidas à diverticulectomia, uma parcela apresentou adenocarcinoma invasivo, metaplasia ou displasia intestinal.

A infecção pelo vírus do papiloma humano (HPV), especialmente o subtipo 16, está associada ao câncer de uretra em homens e mulheres. Em séries de casos, o HPV foi identificado em uma proporção significativa de pacientes com câncer uretral. Em mulheres, o vírus foi detectado em até 61% dos casos, enquanto em homens, cerca de 29% dos tumores analisados apresentaram o subtipo HPV 16.

Por fim, o carcinoma urotelial, frequentemente multifocal, pode surgir simultaneamente com lesões na uretra ou estar associado a cânceres da bexiga, ureteres ou pelve renal. Essa relação destaca a importância de uma avaliação ampla do trato urinário em pacientes com lesões uroteliais.

Anatomia e histologia do Câncer de Uretra

Homens

Os tumores da uretra masculina são classificados conforme a localização anatômica e o tipo histológico. O carcinoma urotelial é o subtipo mais prevalente, sendo responsável por 54 a 65% dos casos, seguido pelo carcinoma de células escamosas (16 a 22%) e pelo adenocarcinoma (10 a 16%).

A uretra masculina se estende do colo vesical até o meato uretral, com um comprimento médio de 21 cm. Ela é dividida em três segmentos principais: uretra prostática, bulbomembranosa e peniana. Os segmentos prostático e bulbomembranoso são revestidos por epitélio transicional, semelhante ao da bexiga e do trato urinário superior. Já a uretra peniana é coberta por epitélio colunar pseudoestratificado, enquanto o meato uretral apresenta epitélio escamoso estratificado.

O local mais frequentemente acometido pelo câncer de uretra nos homens é a uretra bulbomembranosa, seguida pela uretra peniana e pela prostática, com uma prevalência de 60%, 30% e 10%, respectivamente. A maior parte dos carcinomas nas regiões peniana e bulbomembranosa é de origem escamosa, enquanto os tumores uroteliais e os adenocarcinomas são menos frequentes. Na uretra prostática, entretanto, os carcinomas uroteliais predominam, embora cerca de 10% sejam de células escamosas.

O câncer de uretra pode se disseminar diretamente para tecidos adjacentes, como o pênis, ou por meio da drenagem linfática. A uretra distal drena para os linfonodos inguinais superficiais e profundos, enquanto a uretra proximal drena para os linfonodos ilíacos externos, internos e obturadores.

Mulheres

A uretra feminina possui um comprimento médio de 3 a 4 cm e é dividida em duas partes: o segmento anterior, que abrange o terço distal, e o segmento posterior, que corresponde aos dois terços proximais. A porção proximal é composta por epitélio transicional, enquanto a distal é revestida por epitélio escamoso estratificado. Além disso, ao longo de toda a extensão uretral, há glândulas submucosas constituídas por epitélio colunar.

Assim como nos homens, a drenagem linfática da uretra feminina ocorre de maneira segmentada. O terço distal drena para os linfonodos inguinais superficiais ou profundos, enquanto os dois terços proximais drenam para os linfonodos pélvicos.

Nos casos de câncer uretral em mulheres, o carcinoma de células escamosas é o subtipo mais frequente, representando até 60% dos casos. Em seguida, estão o carcinoma urotelial (15 a 20%) e o adenocarcinoma (5 a 7%). Os carcinomas de células escamosas que acometem a uretra proximal geralmente se originam de metaplasia escamosa em resposta a inflamações crônicas. 

Já os adenocarcinomas podem surgir das glândulas de Skene, sendo, em alguns casos, positivos para o antígeno prostático específico, ou de metaplasia glandular, originando adenocarcinomas colunares ou mucinosos. Outras formas mais raras incluem adenocarcinomas de células claras.

Manifestações clínicas do Câncer de Uretra

O câncer de uretra apresenta sinais e sintomas variados, que podem diferir conforme o sexo do paciente e o estágio da doença.

Em homens

Nos homens, os sintomas costumam ser inespecíficos, o que frequentemente resulta em um diagnóstico tardio. Muitas vezes, os sinais iniciais são confundidos com estenoses uretrais benignas, que são mais comuns do que o câncer uretral. Em casos de estenoses recorrentes, recomenda-se a realização de biópsia do segmento afetado, já que essas alterações podem estar associadas ao carcinoma uretral.

Os sintomas mais frequentes incluem:

  • Hematúria inicial, que se apresenta no início da micção;
  • Dificuldade para urinar;
  • Disúria (dor ou desconforto ao urinar);
  • Secreção uretral;
  • Retenção urinária em casos avançados.

Além disso, sinais como dor perineal inexplicável, inchaço genital, priapismo, abscesso periuretral ou formação de fístulas em homens idosos devem levantar a suspeita de carcinoma uretral.

Em mulheres

Nas mulheres, os sintomas também podem ser inespecíficos, frequentemente confundidos com infecções do trato urinário, que são mais prevalentes. Os principais sinais incluem:

  • Hematúria;
  • Sintomas irritativos ao urinar, como dor ou urgência miccional;
  • Dispareunia (dor durante a relação sexual);
  • Sintomas pélvicos recorrentes ou persistentes, principalmente em mulheres mais velhas.

Metástases

Em aproximadamente 30% dos homens com câncer uretral, há metástases para linfonodos regionais, embora menos da metade seja clinicamente palpável no momento da apresentação. 

Metástases distantes estão presentes em cerca de 10% dos casos e geralmente envolvem os pulmões, fígado e ossos. Esses casos frequentemente se associam a tumores localmente avançados e envolvimento significativo dos linfonodos regionais.

As manifestações clínicas do câncer de uretra, portanto, exigem atenção diferenciada para sintomas urinários persistentes, especialmente quando combinados a alterações estruturais ou sinais sistêmicos, com o objetivo de garantir diagnóstico e tratamento precoces.

Diagnóstico do Câncer de Uretra

O diagnóstico do câncer de uretra requer uma abordagem detalhada para confirmar a presença da doença e avaliar sua extensão, sendo fundamental a realização de uma biópsia para a confirmação definitiva.

A avaliação inicial começa com um exame físico completo, incluindo a palpação da uretra e dos linfonodos inguinais. No caso das mulheres, realiza-se também um exame bimanual, essencial para identificar possíveis alterações locais. Essas etapas são importantes para identificar sinais sugestivos que possam guiar a necessidade de exames complementares.

Entre os exames complementares, destaca-se a uretroscopia, fundamental para avaliar a extensão do tumor. Nos homens, a uretrografia retrógrada pode ajudar a localizar e determinar a extensão da doença. 

Em pacientes com estenoses recorrentes ou alterações na mucosa uretral, a citologia urinária pode ser solicitada, embora sua sensibilidade seja limitada. Em casos de alta suspeita clínica, a realização de biópsia transuretral é indispensável para o diagnóstico definitivo e análise histológica.

A tomografia computadorizada (TC) e a ressonância magnética (RM) são essenciais para avaliar a disseminação locorregional do tumor. A RM, em particular, oferece melhor resolução de tecidos moles, o que é útil para o estadiamento e planejamento cirúrgico. 

Além disso, a radiografia de tórax é frequentemente realizada para verificar a presença de metástases pulmonares. Em casos específicos, como sintomas ósseos ou alterações laboratoriais, pode-se solicitar a cintilografia óssea, enquanto o uso de tomografia por emissão de pósitrons (PET) ainda carece de evidências suficientes para ser utilizado rotineiramente.

Estadiamento

O estadiamento clínico detalhado é essencial para orientar o tratamento. Inclui:

  • Exames de imagem apropriados (TC, RM, radiografia de tórax);
  • Exame sob anestesia com cistoscopia;
  • Palpação da genitália, uretra, reto e períneo, além de exame bimanual para avaliar o envolvimento local do tumor.
CategoriaEstágioDescrição
Tumor Primário (T)TxTumor primário não pode ser avaliado
T0Nenhuma evidência de tumor primário
TaCarcinoma papilar, polipoide ou verrucoso não invasivo
TisCarcinoma in situ
T1Tumor invade o tecido conjuntivo subepitelial
T2Tumor invade o corpo esponjoso, próstata ou músculo periuretral
T3Tumor invade o corpo cavernoso, além da cápsula prostática, vagina anterior ou colo da bexiga
T4Tumor invade outros órgãos adjacentes (exemplo: bexiga)
Linfodos Regionais (N)NxLinfonodos regionais não podem ser avaliados
N0Nenhuma metástase nos linfonodos regionais
N1Metástases em um único linfonodo, até 2 cm de maior dimensão
N2Metástases em um único linfonodo > 2 cm, mas ≤ 5 cm de maior dimensão, ou múltiplos linfonodos (≤ 5 cm)
N3Metástases em linfonodo > 5 cm de maior dimensão
Metástases Distantas (M)MxMetástases distantes não podem ser avaliadas
M0Nenhuma metástase distante
M1Metástases distantes

Tratamento do Câncer de Uretra

O tratamento do câncer uretral varia dependendo da localização, extensão, histologia e sexo do paciente. Para casos localizados (pTa a T2), a cirurgia é o tratamento inicial preferido, podendo incluir ressecção transuretral ou uretrectomia parcial ou total. 

Para tumores localmente avançados, é recomendado um tratamento multimodal com quimioterapia neoadjuvante e/ou radioterapia seguida de cirurgia. Nos casos metastáticos, o prognóstico é ruim, e o tratamento geralmente envolve terapia sistêmica, com cirurgia paliativa em casos raros.

Nos homens, a abordagem cirúrgica depende do grau e da localização do tumor. Tumores pequenos ou de baixo grau podem ser tratados com ressecção endoscópica, enquanto tumores mais invasivos requerem ressecção segmentar ou uretrectomia. 

Pacientes com tumores avançados podem precisar de cirurgia extensa, como cistoprostatectomia radical. Em mulheres, o tratamento pode incluir ressecção endoscópica ou uretrectomia com desvio urinário, com opções como ileovesicostomia ou estoma cateterizável.

A radioterapia pode ser uma alternativa ao tratamento cirúrgico, sendo eficaz para tumores localizados e alguns casos avançados. Em mulheres, a radioterapia, incluindo braquiterapia ou radioterapia de feixe externo, pode oferecer bons resultados em tumores em estágio inicial. 

A quimiorradioterapia, com combinação de radioterapia e quimioterapia, pode ser usada quando a cirurgia não é viável. A quimioterapia neoadjuvante e adjuvante é indicada para reduzir o tumor antes da cirurgia, com regimes baseados no tipo histológico do câncer.

Veja também!

Referências

NARDI, Aguinaldo Cesar et al. Urologia Brasil. São Paulo: PlanMark; Rio de Janeiro: SBU-Sociedade Brasileira de Urologia, 2013.

Siamak Daneshmand, MDJason A Efstathiou, MD, DPhil. Urethral cancer. UpToDate, 2024. Disponível em: UpToDate

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