Resumo sobre Estrongiloidíase: definição, manifestações clínicas e mais!
Imagem do S. stercoralis na microscopia óptica. Fonte Shutterstock.

Resumo sobre Estrongiloidíase: definição, manifestações clínicas e mais!

E aí, doc! Vamos explorar mais um tema essencial? Hoje o foco é a Estrongiloidíase, uma helmintíase causada pelo Strongyloides stercoralis, parasita capaz de estabelecer infecção crônica e persistente no hospedeiro. 

O Estratégia MED está aqui para descomplicar esse conceito e ajudar você a aprofundar seus conhecimentos, promovendo uma prática clínica cada vez mais eficaz e segura.

Vamos nessa!

Definição de Estrongiloidíase

A estrongiloidíase é uma parasitose causada pelo nematódeo Strongyloides stercoralis, classificado entre os helmintos transmitidos pelo solo e considerado uma das doenças tropicais mais negligenciadas. 

Embora esteja presente em grande parte do mundo, sua real prevalência é subestimada pela dificuldade de obtenção de dados precisos em áreas endêmicas. O parasita possui características biológicas singulares entre os nematódeos humanos, especialmente a capacidade de alternar entre ciclos parasitário e de vida livre no ambiente.

Após serem eliminadas nas fezes, as larvas podem desenvolver-se em vermes de vida livre capazes de reproduzir-se no solo e gerar novas larvas infectantes. Essa versatilidade permite a manutenção contínua do ciclo do parasita no ambiente.

 Além disso, sua habilidade de realizar autoinfecção dentro do próprio hospedeiro possibilita que a infecção persista indefinidamente, mesmo sem novas exposições. O Strongyloides stercoralis infecta principalmente humanos, mas também ocorre naturalmente em cães, gatos e alguns primatas, o que contribui para a sua manutenção em áreas endêmicas e reforça sua importância epidemiológica.

Transmissão da Estrongiloidíase

A transmissão da estrongiloidíase ocorre principalmente por meio da penetração ativa das larvas filariformes pela pele íntegra do hospedeiro, mecanismo semelhante ao observado na ancilostomíase. Esse processo geralmente acontece após o contato direto com solo contaminado por fezes humanas que contenham as formas larvárias do Strongyloides stercoralis.

Embora essa seja a via predominante, outras formas de transmissão, embora menos frequentes, também são possíveis. Entre elas estão a transmissão fecal-oral, quando há ingestão acidental de partículas contaminadas; a transmissão de pessoa para pessoa ou por fômites contaminados com material fecal; e a transmissão relacionada ao transplante de órgãos, na qual o parasita pode ser transferido do doador para o receptor. 

Ciclo de vida do parasita

O ciclo de vida do Strongyloides stercoralis inicia-se quando as larvas filariformes, forma infectante presentes no solo ou em materiais contaminados por fezes humanas, entram em contato com a pele íntegra do hospedeiro e penetram ativamente. Após a penetração, essas larvas migram pela circulação sanguínea e linfática até atingirem os pulmões, onde atravessam os alvéolos, sobem pela árvore brônquica até a traqueia e, então, são deglutidas.

No intestino delgado, as larvas completam sua maturação e tornam-se vermes adultos. As fêmeas, que podem sobreviver por vários anos, produzem ovos que eclodem ainda no intestino, liberando larvas rabditoides. Essas larvas, inicialmente não infectantes, são eliminadas nas fezes e no ambiente transformam-se novamente em larvas filariformes, perpetuando o ciclo de transmissão.

O aspecto singular desse parasita é sua capacidade de realizar autoinfecção. Em vez de serem eliminadas nas fezes, algumas larvas rabditoides transformam-se em filariformes ainda dentro do intestino e invadem novamente os vasos sanguíneos e linfáticos do próprio hospedeiro, reiniciando o ciclo sem necessidade de exposição ambiental. 

Esse processo pode ser favorecido por condições como constipação, uso de corticoides e outros imunossupressores. Em indivíduos imunocomprometidos, essa autoinfecção pode intensificar-se e evoluir para quadros de hiperinfecção ou disseminação sistêmica, tornando a estrongiloidíase potencialmente grave.

Ciclo do parasita
Ciclo do Strongyloides stercoralis. As setas em vermelho indicam o ciclo de vida livre. Como ele não é cobrado em provas, não me aprofundei no assunto. O que nos interessa mais é o ciclo com setas em lilás. Perceba que o homem se infecta por meio da penetração das larvas filarioides/filariformes na pele íntegra e que esse verme pode levar a uma autoinfecção. Fonte: EstratégiaMED

Manifestações clínicas da Estrongiloidíase

As manifestações clínicas da estrongiloidíase variam amplamente e dependem do estado imunológico do hospedeiro. Na maioria dos indivíduos imunocompetentes, a infecção permanece assintomática, sendo a eosinofilia periférica inexplicada, muitas vezes, o único achado associado. Ainda assim, mais da metade dos pacientes pode apresentar sintomas inespecíficos.

Na fase aguda, a penetração das larvas pela pele provoca prurido intenso, eritema e edema no local de entrada, quadro conhecido como ground itch, que pode ocorrer principalmente nos pés e mãos, mas também em outras regiões. 

A migração intradérmica rápida das larvas pode produzir o larva currens, manifestação dermatológica característica, descrita como estria serpiginosa, rósea e pruriginosa que progride vários centímetros por hora. 

Durante a migração pulmonar, podem surgir tosse seca, sibilância, dispneia, eosinofilia e infiltrados pulmonares migratórios, compondo um quadro semelhante à síndrome de Loeffler. No trato gastrointestinal, podem ocorrer dor epigástrica, náuseas, vômitos e diarreia.

Em infecções crônicas, a doença pode persistir por anos com sintomas respiratórios e gastrointestinais leves, como tosse, dispneia, dor abdominal, diarreia ou constipação, além de manifestações cutâneas como urticária e recorrência de larva currens.

A síndrome de hiperinfecção ocorre quando há aceleração do ciclo de autoinfecção, resultando em aumento significativo da carga parasitária e agravamento dos sintomas. Nesses casos, podem surgir febre, bacteremia por gram-negativos, sepse e sinais de lesão de órgãos, como hemoptise, sangramento gastrointestinal e íleo. 

Quando a disseminação é ampla, as larvas podem atingir órgãos como fígado, pâncreas, rins, linfonodos mesentéricos, músculos esqueléticos e sistema nervoso central, configurando doença disseminada, frequentemente grave e potencialmente fatal.

Diagnóstico de Estrongiloidíase

O diagnóstico da estrongiloidíase baseia-se principalmente na detecção de larvas nas fezes, sendo a técnica de Baermann-Moraes o método mais sensível e classicamente cobrado em provas. 

Mesmo assim, a eliminação larvária pode ser escassa e intermitente, exigindo a análise de múltiplas amostras. Exames sorológicos, como ELISA e outros testes imunológicos, ajudam a aumentar a sensibilidade diagnóstica e são úteis especialmente para excluir a infecção, apesar da possibilidade de reações cruzadas com outros helmintos. 

Em casos de doença disseminada ou hiperinfecção, outras amostras biológicas, como o escarro, podem confirmar o diagnóstico, já que a carga parasitária é muito maior.

Tratamento da Estrongiloidíase

O tratamento da estrongiloidíase visa eliminar totalmente o parasita e deve ser feito mesmo em pacientes assintomáticos. A ivermectina é a droga de escolha, usada em casos não complicados na dose de 200 mcg/kg por dois dias; em imunocomprometidos, esse ciclo é repetido após duas semanas.

Na síndrome de hiperinfecção ou na doença disseminada, a ivermectina deve ser administrada diariamente por pelo menos 14 dias, ou até que exames de fezes fiquem negativos por duas semanas seguidas, associando-se antibióticos de amplo espectro para prevenir ou tratar infecções por bactérias gram-negativas.

Albendazol e tiabendazol são alternativas, embora com menor eficácia. Em pacientes imunossuprimidos, o tratamento costuma ser prolongado, com recomendação de reduzir a imunossupressão quando possível. A resposta deve ser monitorada com exames seriados por até um a dois anos, garantindo erradicação completa do parasita.

De olho na prova!

Não pense que esse assunto fica fora das provas de residência, concursos públicos e até das avaliações da graduação. Veja abaixo:

(UFRJ – RJ 2018) 

Pré-escolar, quatro anos, apresenta dor abdominal, diarreia, esteatorreia, vômitos e perda de peso no últimomês.Apresentou, antes do aparecimento destessintomas, lesões nas nádegas que pareciam “linhas entortadas”, pruriginosas, além de tosse e chiado no peito. Nega sintomas respiratórios semelhantes anteriores. O agente suspeito desse quadro é: 

A) Strongyloides stercoralis. 

B) Leishmania chagasi. 

C) Wuchereria bancrofti. 

D) Ascaris lumbricoides. 

COMENTÁRIO: Vamos lá: temos aqui um quadro de acometimento do trato gastrointestinal + lesões nas nádegas (provavelmente a larva currens) + quadro respiratório (sugerindo um parasita que faz ciclo pulmonar). Ao analisarmos as alternativas, só temos opções de parasitoses e, de todas, quem justifica todo esse quadro é o S. stercoralis. 

Correta a alternativa A: Como já lhe expliquei, a estrongiloidíase justifica todo esse quadro clínico. 

Incorreta a alternativa B: porque a Leishmania chagasi causa leishmaniose visceral, que cursa com febre com evolução subaguda a crônica, esplenomegalia e citopenias. Não é um diagnóstico diferencial para esse caso. 

Incorreta a alternativa C: porque Wuchereria bancrofti causa filariose (doença que está próxima da erradicação no Brasil), que cronicamente cursa com linfedema. Não é um diagnóstico diferencial para esse caso. P

Incorreta a alternativa D: porque grande parte dos infectados é assintomática e a transmissão de Ascaris lumbricoides é via ingestão de água e alimentos contaminados, então não se espera no quadro inicial essa dermatite descrita no enunciado. Os sintomas pulmonares são menos frequentes do que na estrongiloidíase, mas esse também é um helminto com ciclo pulmonar. Após 8 semanas da infecção, podem aparecer sintomas inespecíficos, como diarreia, dor abdominal e vômitos.

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Referências

Mora Carpio AL, Meseeha M. Strongyloidiasis. [Updated 2023 Sep 4]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2025 Jan-. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK436024/

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Doenças infecciosas e parasitárias: guia de bolso. 8. ed. rev. Brasília: Ministério da Saúde, 2010. 444 p. (Série B. Textos Básicos de Saúde).

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