Olá, querido doutor e doutora! A dor crônica é uma condição complexa que persiste por mais de três meses e pode impactar significativamente a qualidade de vida. Seu tratamento exige uma abordagem multidisciplinar, combinando estratégias farmacológicas e não farmacológicas para melhorar a funcionalidade do paciente. A correta identificação do tipo de dor e a escolha adequada das intervenções são essenciais para um controle eficaz e duradouro.
Opioides não são recomendados para dor nociplástica, pois podem agravar a sensibilização central e piorar o quadro.
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Conceito de Dor Crônica
A dor crônica é uma experiência sensorial e emocional que persiste por um período superior a três meses, independentemente da causa subjacente. Diferente da dor aguda, que tem um papel biológico de alerta para um dano iminente ou em curso, a dor crônica se mantém além do tempo esperado de cicatrização tecidual, podendo ocorrer mesmo na ausência de uma lesão evidente.
Fisiopatologia da Dor
Mecanismos Biológicos da Dor
A dor pode ser classificada de acordo com os mecanismos subjacentes, sendo os principais:
- Dor nociceptiva: ocorre quando há ativação dos nociceptores em resposta a lesões teciduais. A liberação de mediadores inflamatórios, como prostaglandinas, bradicinina e substância P, sensibiliza os nociceptores, reduzindo o limiar de ativação e tornando os estímulos mais intensos.
- Dor neuropática: resulta de lesão ou disfunção do sistema nervoso somatossensitivo. Alterações nas vias nervosas podem causar hipersensibilidade, levando a sintomas como alodinia (dor causada por estímulos que normalmente não são dolorosos) e hiperalgesia (resposta aumentada a estímulos dolorosos).
- Dor nociplástica: ocorre mesmo sem uma lesão identificável e está associada a uma modulação disfuncional da dor no sistema nervoso central. Esse tipo de dor é observado em condições como fibromialgia, onde há amplificação da percepção dolorosa sem um dano estrutural evidente.
Sensibilização Periférica e Central
A persistência da dor crônica está associada a dois fenômenos principais:
- Sensibilização periférica: a inflamação contínua ou repetida reduz o limiar de ativação dos nociceptores, tornando-os mais responsivos a estímulos normais. Isso leva a um estado de hipersensibilidade e pode perpetuar a dor mesmo após a resolução da lesão inicial.
- Sensibilização central: alterações na medula espinhal e no cérebro amplificam os sinais dolorosos, tornando o sistema nervoso mais responsivo a estímulos. Ocorrem mudanças na plasticidade neuronal, resultando em um aumento persistente da atividade dos neurônios envolvidos na dor, mesmo sem um estímulo periférico contínuo.
Causas de Dor Crônica
Doenças Musculoesqueléticas
As condições que afetam ossos, articulações, músculos e tendões estão entre as principais causas de dor crônica. Algumas das mais comuns incluem:
- Osteoartrite: degeneração da cartilagem articular, levando à dor persistente e limitação funcional.
- Lombalgia crônica: frequentemente associada a degeneração dos discos intervertebrais, hérnias de disco e instabilidade da coluna.
- Síndrome miofascial: presença de pontos-gatilho musculares que geram dor referida e disfunção motora.
- Fibromialgia: caracterizada por dor musculoesquelética difusa e amplificação da sensibilidade dolorosa, sem inflamação evidente.
Doenças Neuropáticas
A dor neuropática ocorre devido a lesão ou disfunção do sistema nervoso, resultando em sintomas como queimação, formigamento e hipersensibilidade. As principais causas incluem:
- Neuropatia diabética: complicação do diabetes que afeta nervos periféricos, levando a dor crônica em extremidades.
- Neuralgia pós-herpética: dor persistente após infecção pelo vírus varicela-zóster (herpes zóster).
- Radiculopatias: compressão de raízes nervosas, como na hérnia de disco, causando dor irradiada.
- Doenças desmielinizantes: como a esclerose múltipla, que afeta a transmissão dos impulsos nervosos.
Doenças Inflamatórias e Autoimunes
A inflamação crônica pode causar dor persistente, sendo comum em doenças como:
- Artrite reumatoide: inflamação articular crônica que pode levar à deformidade e incapacidade funcional.
- Espondiloartrites: grupo de doenças inflamatórias que afetam a coluna vertebral e articulações sacroilíacas.
- Lúpus eritematoso sistêmico: pode gerar dor musculoesquelética e neuropática devido ao comprometimento inflamatório sistêmico.
Causas Traumáticas e Pós-Cirúrgicas
Lesões físicas e procedimentos cirúrgicos podem desencadear dor persistente devido a danos nos tecidos ou nervos, como:
- Síndrome da dor regional complexa (SDRC): desenvolvida após traumas ou cirurgias, caracterizada por dor intensa e disfunção autonômica.
- Dor pós-amputação: ocorre devido à sensibilização do sistema nervoso, levando à dor fantasma.
- Cicatrizes dolorosas: resultantes de lesões cirúrgicas ou queimaduras, podendo evoluir para dor crônica.
Diagnóstico e Avaliação da Dor Crôncia
A identificação da dor crônica envolve uma abordagem estruturada, considerando a história clínica detalhada, exame físico minucioso e, quando necessário, exames complementares. O diagnóstico é clínico, baseado em critérios temporais (dor com duração superior a três meses) e na caracterização do tipo de dor. A avaliação deve incluir aspectos físicos, emocionais e funcionais do paciente.
Anamnese da Dor Crônica – Método ALICIA FREDUSAH
- Aparição: O sintoma começou há quanto tempo? Foi um início súbito ou progressivo? A dor é contínua ou intermitente?
- Localização: Onde exatamente a dor está localizada? É uma dor bem delimitada ou difusa? Há variação na localização ao longo do tempo?
- Irradiação: A dor se espalha para outras regiões do corpo? Há algum trajeto específico de irradiação?
- Característica: Como o paciente descreve a dor? É uma dor latejante, em pontada, queimação, pressão, choque elétrico? Alguma característica a diferencia de outras dores já sentidas?
- Intensidade: Qual a gravidade da dor em uma escala de 0 a 10? A dor afeta a rotina diária do paciente?
- Alívio: O que melhora a dor? O alívio ocorre espontaneamente ou é necessário algum tipo de intervenção, como repouso ou medicação?
- Frequência: Com que regularidade a dor se manifesta? É diária, semanal ou ocasional? Algum padrão identificável?
- Duração: Quando presente, a dor persiste por quanto tempo? É uma dor breve ou prolongada?
- Sintomas acompanhantes: Há outros sintomas associados, como fadiga, distúrbios do sono, formigamentos, rigidez matinal ou perda de força?
- Horário: A dor ocorre em algum período específico do dia? É mais intensa pela manhã, ao longo do dia ou à noite?
Exame Físico
O exame físico deve ser conduzido de forma sistemática, incluindo:
- Inspeção: identificação de alterações posturais, deformidades, atrofias musculares ou sinais inflamatórios.
- Palpação: avaliação de pontos dolorosos, espasmos musculares, pontos-gatilho e regiões com hipersensibilidade.
- Avaliação da mobilidade articular: movimentos ativos e passivos devem ser testados para verificar limitação ou dor.
- Testes neurológicos: investigação de déficits sensoriais, motores e reflexos para suspeita de dor neuropática.
Questionários e Escalas de Avaliação
Ferramentas padronizadas ajudam na classificação da dor e no monitoramento da resposta ao tratamento. Alguns instrumentos frequentemente utilizados incluem:
- Escala visual analógica (EVA): paciente indica a intensidade da dor em uma linha de 0 a 10.
- Escala numérica de dor: similar à EVA, onde o paciente classifica a dor de 0 (sem dor) a 10 (pior dor possível).
- Escala de faces: utilizada principalmente em crianças e idosos, permite avaliação subjetiva da intensidade da dor.
- DN4 (Douleur Neuropathique 4): questionário para diferenciar dor neuropática de outras formas de dor crônica.
- LANSS (Leeds Assessment of Neuropathic Symptoms and Signs): outra ferramenta para triagem de dor neuropática.
- Oswestry Disability Index: avalia incapacidade funcional em pacientes com dor lombar crônica.
- SF-36 e WHOQOL-Bref: questionários de qualidade de vida relacionados à saúde.
Exames laboratoriais
Podem ser úteis para investigar causas inflamatórias, infecciosas ou metabólicas da dor. Exemplos incluem:
- Hemograma, velocidade de hemossedimentação (VHS), proteína C reativa (PCR): avaliação inflamatória.
- Glicemia e hemoglobina glicada: investigação de neuropatia diabética.
- Função renal e hepática: ajustes na prescrição de medicamentos analgésicos.
- Marcadores autoimunes (FAN, fator reumatoide): suspeita de doenças reumatológicas.
Exames de imagem
São úteis quando há suspeita de comprometimento estrutural.
- Radiografia: avaliação inicial de osteoartrite, fraturas e desalinhamentos ósseos.
- Ultrassonografia: auxilia na identificação de tendinopatias e inflamações articulares.
- Tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética (RM): investigação mais detalhada para compressão nervosa, hérnias de disco e lesões musculoesqueléticas.
Tratamento da Dor Crônica
Tratamento Não Medicamentoso
- Educação do paciente: esclarecer sobre os mecanismos da dor crônica ajuda a reduzir crenças errôneas e melhorar a adesão ao tratamento. O foco deve ser na funcionalidade e qualidade de vida, e não apenas na eliminação da dor.
- Exercícios e reabilitação: atividades físicas, como caminhada e fortalecimento muscular, reduzem a dor e melhoram a resistência. Hidroterapia é eficaz para osteoartrite e fibromialgia, proporcionando menor impacto articular.
- Terapias físicas e complementares: fisioterapia e terapia manual ajudam na mobilidade e redução da dor muscular. Acupuntura e mindfulness são opções complementares, enquanto a terapia cognitivo-comportamental auxilia no controle emocional.
Tratamento Medicamentoso
- Dor nociceptiva: paracetamol e dipirona são opções iniciais, enquanto AINEs, como ibuprofeno, são úteis para dor inflamatória. Opioides devem ser usados com cautela e apenas em casos refratários.
- Dor neuropática: antidepressivos tricíclicos (amitriptilina) e inibidores da recaptação de serotonina e noradrenalina (duloxetina) são eficazes. Anticonvulsivantes, como gabapentina, ajudam na estabilização da dor.
- Dor nociplástica: duloxetina e amitriptilina auxiliam no controle da dor e na melhora do sono. Opioides não são recomendados, pois podem agravar a sensibilização central e piorar o quadro.
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Referências Bibliográficas
- BRASIL. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Dor Crônica. Ministério da Saúde, 2024.
- BRASIL. Resumo do PCDT da Dor Crônica. Ministério da Saúde, 2024.