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A eosinofilia
Os eosinófilos são um tipo de leucócitos, que são células que quando em suspensão no sangue têm a função de proteger o organismo contra infecções. São bem menos numerosas que os neutrófilos, constituindo apenas 1 a 3% do total de leucócitos no sangue.
São células derivadas da medula óssea da linhagem dos granulócitos. Seu núcleo em geral é bilobulado e em seu citoplasma o retículo endoplasmático, as mitocôndrias e o complexo de Golgi são pouco desenvolvidos. Sua principal característica em lâmina são granulações ovoides que se coram pela eosina, ou seja, granulações acidófilas.
Apresenta várias funções no sistema imune, incluindo apresentação de antígenos, liberação de mediadores derivados de lipídios, peptídeos e citocinas para inflamação aguda e crônica, respostas à eliminação de helmintos e parasitas por degranulação e respostas imunes homeostáticas contínuas.
A eosinofilia representa um número aumentado de eosinófilos nos tecidos ou sangue e está associada a uma ampla variedade de distúrbios alérgicos, reumatológicos, infecciosos, neoplásicos e idiopáticos raros. Com base nas contagens do leucograma, a eosinofilia pode ser subdividida em:
- leve: entre 500 e 1500/mm^3
- moderada: entre 1500 a 5000/mm3 e
- grave >5000/mm^3
Etiologia da eosinofilia
A real incidência e prevalência da eosinofilia não é conhecida, mas não parece haver predileção por sexo. No entanto, pode haver influências geográficas dependendo de sua causa, por exemplo, infestações parasitárias são mais prevalentes em países em desenvolvimento e tropicais, por outro lado, distúrbios alérgicos são comuns em países desenvolvidos.
A eosinofilia pode ser primária ou secundária, sendo que a depender da causa pode gerar sinais e sintomas em múltiplos sistemas ou em um órgão localizado.
Causas primárias
Leucemia eosinofílica crônica, neoplasias mielóides e linfóides, eosinofilia hereditária e síndrome hipereosinofílica idiopática.
Causas secundárias
Uma das principais causas são infecções, como infestações parasitárias, como ancilostomíase, ascaridíase, estrongiloidíase, e infecções fúngicas e bacterianas, como aspergilose broncopulmonar, tuberculose crônica, coccidioidomicose, histoplasmose disseminada e escarlatina.
Outra causa comum são distúrbios alérgicos, como asma brônquica, rinite alérgica, síndrome de Stevens-Johnson, reações alérgicas a medicamentos e alimentos, síndrome DRESS.
Nas causas secundárias, também está incluído as principais causas de eosinofilia com acometimento em órgão único, como doenças de pele, dermatite atópica, eczema, pênfigo, micose fungóide, reação enxerto versus hospedeiro, doenças do tecido conjuntivo, como síndrome de Chrug-Strauss ou síndrome de mialgia eosinofílica. Além disso, outras diversas causas como eosinofilia pulmonar reativa, eosinofilia tropical, pancreatite e gastroenterite eosinofílica.
Manifestações clínicas da eosinofilia
Os pacientes podem apresentar várias combinações de sintomas e sinais de lesão de órgão-alvo mediada por eosinófilos. Os sintomas de febre, suores, perda de peso inexplicável e fadiga profunda são inespecíficos e podem estar associados a inúmeras causas de eosinofilia.
Em mais de 5 % dos pacientes nenhum órgão é reconhecido e pacientes apresentarão hipereosinofilia detectada incidentalmente e clinicamente assintomáticos.
- Dermatológico: responsável por mais de 35% das apresentações e as manifestações cutâneas comuns incluem eczema, envolvendo mãos, áreas flexurais ou placas dispersas. Outras formas de acometimento incluem a eritrodermia, espessamento generalizado da pele (liquenificação), dermografismo, urticária recorrente e angioedema.
- Pulmonar e respiratório: Segundo órgão mais acometido, sendo os sintomas mais comuns tosse seca, falta de ar e chiado no peito. Além disso, queixas nasais crônicas podem estar presentes na rinite alérgica.
Podem ser observados em várias condições, incluindo asma brônquica, aspergilose broncopulmonar, síndrome de Loeffler (pneumonite reacional causada pela passagem do parasito no pulmão), eosinofilia pulmonar reativa e síndrome de Churg strass.
- Gastrointestinais: Presente em cerca de 15% dos casos, marcada pela gastrite eosinofílica, enterite e ou colite, podendo causar dores abdominais, pirose, DRGE, perda de peso, vômitos ou diarreia.
- Cardíaco: A miocardite eosinofílica é uma das principais causas de morbidade e mortalidade entre pacientes com síndrome hipereosinofílica, presente em até 5 % dos casos.
- Neurológicas: São condições menos comuns, presentes em menos de 5% dos casos de eosinofilia. A hipereosinofilia pode estar presente em condições como tromboembolismo cerebral, encefalopatia ou neuropatia periférica.
Avaliação da eosinofilia
A avaliação inicial em pacientes sintomáticos e estáveis deve incluir uma revisão completa dos sistemas para entender quais órgãos envolvidos ou possível causa subjacente de eosinofilia, como presença de sintomas respiratórios crônicos ou erupções cutâneas.
#Ponto importante: Na presença de sinais e sintomas graves ou valores muito elevados de eosinofilia, o paciente deve ser hospitalizado e uma avaliação urgente de possíveis sistemas envolvidos.
O paciente deve ser questionado sobre possíveis exposições, incluindo medicamentos e dieta, uso de água não filtrada para beber, hábitos de higiene,acesso a saneamento básico.
A análise detalhada do leucograma, eritrograma e esfregaço sanguíneo são peças fundamentais no diagnóstico. Os sinais e sintomas, em combinação com os resultados da avaliação inicial, devem direcionar uma avaliação posterior, por exemplo, radiografia ou TC de tórax em pacientes com tosse e dispneia.
Uma síndrome hipereosinofílica (SHE) pode ser definida por contagem periférica de eosinófilos >1500 células/microL em mais de duas amostras ou eosinofilia tecidual acentuada, com dano ou disfunção de órgão mediado por eosinófilos, desde que outras causas potenciais para o dano tenham sido excluídas.
A vantagem de definir a SHE dessa maneira é que ela fornece um ponto de partida para uma abordagem pragmática de qualquer paciente que apresente doença eosinofílica.
Manejo da eosinofilia
O objetivo da terapia é amenizar os danos aos órgãos-alvo causados pela eosinofilia. Em condições de emergência com instabilidade hemodinâmica ou falência de órgãos sem foco aparente para a eosinofilia, pode ser necessário tratamento com altas doses de corticosteróides, leucaférese (remoção terapêutica de leucócitos) ou citorredução.
Para algumas condições, como alergias ou infecções a medicamentos e alimentos, o tratamento deve ser voltado para causa base, por exemplo, retirar o agente agressor nas alergias, tratar infecções com antibióticos, antiparasitários e antifúngicos a depender da etiologia ou aplicar o protocolo GINA para asma brônquica. Em muitos casos, pode ser necessária uma abordagem multidisciplinar envolvendo hematologista, pneumologista, infectologistas.
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Referências bibliográficas:
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